: MIN. GILMAR MENDES

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1 MANDADO DE SEGURANÇA DISTRITO FEDERAL RELATOR IMPTE.(S) ADV.(A/S) IMPDO.(A/S) ADV.(A/S) : MIN. GILMAR MENDES :HEIDRICH S/A CARTÕES RECICLADOS :MARIALVA PORTES :PRESIDENTE DA REPÚBLICA :ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO DECISÃO: Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de medida liminar, impetrado por Heidrich S/A Cartões Reciclados, contra ato do Presidente da República, consubstanciado no Decreto de 22 de janeiro de 2008, publicado no DOU de 23 de janeiro de 2008, que declarou de interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural denominado Fazenda HCR, situado no Município de Taió/SC (fl.62). A impetrante alega que está instalada na região há mais de 50 anos e é proprietária de alguns imóveis rurais contíguos ou próximos, onde realiza suas atividades industriais de fabricação de papéis especiais, florestamento, reflorestamento, geração de energia elétrica (autoprodutora) e atividades de agropecuária. Nesses imóveis contíguos, estão instaladas as fábricas, mais de 130 casas de funcionários, escolas, igrejas, quadras de esporte, clube de lazer, refeitórios, casas de hospedagem de funcionários e visitantes (há muitas fotos). Aduz que, em , recebeu ofício do INCRA (fl.103) que, com base nos dados colhidos na vistoria realizada de 22 a 26 de janeiro de 2007, informa: a) a medida de propriedade passava a ser de 3.734,4017 hectares, tendo sido elaborada a declaração de propriedade ex officio; b) os índices atingidos pelo imóvel, grau de utilização da terra (GUT), 100% e grau de eficiência na exploração da terra (GEE), 74,95%, foram aquém do exigido nos parágrafos 1º e 2º do art. 6º da Lei nº 8.629/93, sendo o imóvel rural passível, portanto, de desapropriação. A impetrante pede a declaração de nulidade do Decreto Expropriatório de Sustenta a plausibilidade jurídica do pedido, pelos seguintes argumentos: a) não restou clara a parte do imóvel que será objeto de desapropriação, gerando-se insegurança jurídica, pois tal

2 procedimento de vistoria e imissão na posse (de limites indefinidos, imprecisos e sem confrontações) poderá vir a afetar quatro usinas hidrelétricas instaladas na propriedade, usinas estas que geram energia não só para as fábricas de propriedade da impetrante, como para todos os demais imóveis (casas, hotel de funcionários, refeitórios, escolas, igrejas) da vila rural ali instalada. b) não restou devidamente considerada, no procedimento administrativo que levou ao decreto expropriatório (ora impugnado), a situação de emergência decretada no Município de Taió, no ano de 2006 (em face de uma das piores secas dos últimos 70 anos), afrontando o art. 6º, 7º, da Lei 8.629/1993. Por fim, requer a concessão de medida liminar para suspender os efeitos do decreto impugnado até a decisão final do presente writ. No mérito, pede a concessão definitiva da segurança com a declaração de nulidade do Decreto do Presidente da República de O pedido liminar foi deferido às fls , motivo pelo qual a União interpôs pedido de reconsideração (fls ). A autoridade coatora apresentou suas informações às fls A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da ordem, em parecer ementado nos seguintes termos: Mandado de segurança. Desapropriação Interesse social Reforma agrária Decreto de desapropriação. Desmembramento do imóvel original. Propriedade rural média insuscetível de desapropriação. Ausentes os requisitos do art. 4º, III, da lei n /93. Parecer pela denegação da ordem. (fl. 783) Decido. Conforme relatado, a impetrante aduz, em síntese, a nulidade do decreto expropriatório, ao argumento de que não teria delimitado a área objeto da desapropriação, bem como de que não teria levado em consideração a situação de emergência decretada pelo Município de Taió, decorrente de estiagem severa. 2

3 O decreto expropriatório assim dispôs: Art. 1º Fica declarado de interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural denominado Fazenda HRC - parte, com área registrada de três mil, quatrocentos e cinquenta e quatro hectares, cinquenta e oito ares e onze centiares, área medida de três mil, setecentos e trinta e quatro hectares, quarenta ares e dezessete centiares, e área visada de novecentos e sessenta e dois hectares, noventa e um ares e tinta e oito centiares, situado no Município de Taió, objeto da Matrícula n , fls 01, Livro 2, do Cartório de registro de Imóveis da Comarca de Taió, Estado de Santa Catarina (Processo INCRA/SR- 10/n / ). (fl. 62) Inicialmente, destaco que o decreto cumpriu sua função, indicando a matrícula do imóvel a ser objeto de desapropriação, bem como consignou que a área visada se refere a novecentos e sessenta e dois hectares, noventa e um ares e tinta e oito centiares da área total. No mais, melhor sorte não assiste à impetrante. A Lei 8.629/1993 dispõe em seu art. 6º, 7º, que o imóvel não perderá a qualificação de propriedade produtiva, apesar de deixar de apresentar os graus de eficiência na exploração exigidos, quando constatada a existência de força maior, caso fortuito ou renovação de pastagens, devidamente comprovados, a saber: Art. 6º Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente. 7º Não perderá a qualificação de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie. 3

4 Extrai-se dos autos que o Município de Taió efetivamente estava em situação de emergência entre 2003 e 2006 (fls ), em virtude de estiagem severa no período. A autoridade coatora sustenta que tal fato não é apto, por si só, a justificar a improdutividade da propriedade no período. Isso porque seria necessária a comprovação de que o imóvel rural, antes produtivo, tenha suportado os efeitos danosos da calamidade. A esse propósito, aduz o seguinte: O reconhecimento fo4rmal, pelo Poder Público, de situações de emergência, é insuficiente à configuração da hipótese de força maior (ou de caso fortuito) para os fins do artigo 6º, 7º, da Lei n /93. Com efeito, para que mantenha a qualificação de propriedade produtiva, faz-se imperioso que o imóvel rural, antes comprovadamente produtivo, tenha efetivamente suportados os efeitos danosos da calamidade motivadora do estado emergencial, sob pena de violação aos artigos 5º, XXIII e 184 da CF/88. Fosse a edição decreto municipal declaratório da situação de emergência bastante à caracterização de força maior impeditiva da perda da qualificação de propriedade produtiva, a União ficaria impedida de desapropriar, na região abarcada pelo ato, os imóveis que, embora não afetados por intempéries, continuassem improdutivos e, por conseguinte, descumpridores da função social da propriedade rural pela vertente economicista (ar.t 186, I, da CF/88. (fl. 626) E prossegue: A Fazenda HCR não sentiu as implicações negativas da estiagem responsável pela situação de emergência declarada, no Município de Taió, em pare do ano de É o que assegura a decisão que indeferiu a impugnação administrativa ( ). (fl. 628) De fato, além da decretação de estado de emergência pelo Município 4

5 em virtude da seca enfrentada no período, é necessária a comprovação de que o imóvel era produtivo antes do referido evento e, em virtude dele, não alcançou os graus de eficiência na exploração exigidos. Nesse sentido, cito o seguinte julgado desta Corte: MANDADO DE SEGURANÇA - REFORMA AGRÁRIA - DESAPROPRIAÇÃO. NOTIFICAÇÃO. PRAZO DO LAUDO DE VISTORIA. FATOS E PROVAS. 1. A nulidade da notificação fica afastada com a comprovação de que o levantamento pericial foi acompanhado por prepostos do proprietário do imóvel, sem qualquer impugnação ou recurso na esfera administrativa. 2. É desnecessária a expedição de notificação à entidade de classe, desde que não tenha sido ela a deflagrar o processo expropriatório. 3. O art. 2º, 4º, da Lei 8.629/93 não fixa prazo de validade do laudo de vistoria ou termo final para edição do decreto de declaração de interesse social, para fins de reforma agrária. 4. Para que se possa concluir que a produtividade do ano da vistoria foi prejudicada pela seca, é necessário que se faça prova cabal de que, nos anos anteriores, o imóvel era produtivo. 5. Questionamentos relativos à utilização da propriedade e não-observância da área de reserva legal envolvem fatos e provas, inviáveis de serem debatidos em sede de mandamus. 6. Segurança denegada. (grifei) (MS , Rel. Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, DJ ) No presente caso, não é possível extrair dos autos a existência de nexo de causalidade entre a improdutividade do imóvel rural em comento e a estiagem que assolou a região. O Laudo Agronômico de Fiscalização (fls ) não faz qualquer menção a consequências causadas pela seca que obstassem o desenvolvimento normal da propriedade. Além disso, os Documentos de Informação e Apuração do ITR de 2005 e 2006 (fls ) consignaram que a Fazenda HCR não teve qualquer área de frustração de safra ou destruição de pastagem por calamidade pública no período. Dessa forma, a solução da controvérsia demandaria dilação 5

6 probatória, providência vedada no âmbito do mandado de segurança, que exige a demonstração incontroversa dos fatos e provas, de forma pré-constituída, para a caracterização do direito líquido e certo. A esse propósito, confira-se os seguinte precedente do Pleno do STF: DESAPROPRIAÇÃO. INTERESSE SOCIAL. IMÓVEL RURAL. PROIBIÇÃO TEMPORAL NA HIPÓTESE DE ESBULHO POSSESSÓRIO MOTIVADO POR CONFLITO AGRÁRIO. LEI 8.629/1993. PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE CERTEZA QUANTO AO QUADRO FÁTICO. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE. Caracterizada divergência entre as alegações da impetrante e as informações prestadas pela autoridade-coatora acerca do quadro fático, cuja superação depende necessariamente de dilação probatória, é inadmissível a ação de mandado de segurança. Segurança denegada. Medida liminar cassada. (MS , Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, DJe 1º ) Ademais, acrescente-se que a referida controvérsia é objeto da Ação Ordinária n , que tramita na 1ª Vara Federal de Rio do Sul/SC, a qual se encontra em fase de produção de prova pericial, a fim de verificar se a estiagem dos anos de 2004, 2005 e 2006 influenciaram na atividade produtiva da Fazenda HRC a ponto de caracterizar-se a ocorrência de força maior. Ante o exposto, casso a liminar anteriormente deferida, julgo prejudicado o pedido de reconsideração e nego seguimento ao mandado de segurança (art. 21, 1º, do RI/STF). Publique-se. Brasília, 11 de fevereiro de Ministro GILMAR MENDES Relator Documento assinado digitalmente. 6