XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

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1 A BIBLIOTECA ESCOLAR DO TRABALHO NO CONTEXTO DA ESCOLA DO CAMPO Dr. Marcos Gehrke Departamento de Pedagogia (Unicentro - Paraná) marcosgehrke@gmail.com Resumo Eduardo Maciel Ferreira Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação (Unicentro - Paraná) themacphisto@gmail.com Discute o trabalho na Biblioteca Escolar da Escola do Campo, na perspectiva da Educação do Campo. Trata-se de uma Pesquisa Qualitativa, vinculada ao Grupo de Pesquisa Campo, Movimentos Sociais e Educação do Campo (MovECampo) e ao Programa de Mestrado em educação da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO - Paraná), mediada pela revisão bibliográfica e estudo exploratório em campo. Explicita a concepção de trabalho na escola e na biblioteca; analisa as práticas de trabalho possíveis na biblioteca escolar. Argumenta que o trabalho na Biblioteca Escolar se coloca como condição para superação de uma concepção e prática de biblioteca em voga na atualidade, especialmente no contexto do campo. Justifica a necessidade de um projeto de leitura para biblioteca escolar desde a conjuntura e os sujeitos que ocupam este espaço educativo. Argumenta que a biblioteca deva se estender à comunidade, tanto como prestadora de serviços, quanto provocadora de práticas de leitura. Sugere que o acervo a ser lido seja, também, produzido localmente, e que o Estado Educador faça desta prática uma política pública. Conclui pela atualidade da pesquisa nas bibliotecas, desde que, vinculada aos processos de luta da Educação do Campo. Introdução Palavras-chave: Biblioteca Escolar. Trabalho. Escola do Campo. Acreditamos que a pesquisa sobre a Biblioteca Escolar (BE) é uma questão pertinente na atualidade educacional, não perdeu prestígio. Mesmo quando tudo parece estar no mundo digital, nas mídias, nos laboratórios de informática. A biblioteca, o livro impresso e os demais documentos de um acervo permanecem no contexto escolar, especialmente na Escola do Campo, onde, nem sempre as tecnologias são disponibilizadas e garantidas pelas políticas públicas. Logo, a BE precisa ser tratada nas pesquisas e nas práticas de ensino. A Biblioteca Escolar do Trabalho (BET) é uma proposição a partir tríade investigativa - pesquisa na área da biblioteca, da Educação do Campo e da Pedagogia Socialista - e o trabalho de extensão desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Campo, Movimentos Sociais e Educação do Campo (MovECampo) da Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro - Paraná). Explicita a concepção de trabalho na escola e na biblioteca; analisa as práticas de trabalho possíveis na biblioteca escolar

2 2 O trabalho é resultado da revisão bibliográfica na área da leitura, livro e biblioteca escolar (MILANESI,1988; 1986; SILVA, 1986; SILVA 2003; CAMPELLO, 2005); em estudos sobre a pedagogia socialista (PISTRAK, 1981; 2009) e (SCHULGIN, 2013); e nos fundamentos da Educação do Campo (CALDART, 2012). Estudos sempre produzidos na articulação práxis com as Escolas do Campo, seja em acampamentos e assentamentos, nas comunidades de agricultores familiares. Para Marx e Engels (1986), o trabalho é o fundamento de toda vida e gênese humana. Num sentido amplo, é compreendido como o conjunto de atividades intelectuais e manuais, realizados pelo ser humano, homens e mulheres, na relação com a natureza, dentro de uma cultura ao longo da história. Para pedagogia socialista e seus intelectuais, o trabalho na escola se coloca em duas posições distintas: o trabalho escolar e o trabalho socialmente necessário (SHULGUIN, 2013; PISTRAK, 2009). Portanto, defendemos que a biblioteca da escola precisa ser projetada e compreendida como lugar de trabalho, estar para todos como uma atividade vital, criadora, forjadora do ser humano. Shulguin (2013) trata o trabalho escolar como aquele que o estudante realiza para a escola ou na escola, fica restrito ao ensino, que originou a situação de estudo. A sala de aula, a biblioteca e os laboratórios escolares são o principal espaço de produção dessa forma de trabalho. Já o trabalho socialmente necessário (SHULGUIN, 2013), é demandado pelo contexto próximo ou entorno da escola, exige e necessita do trabalho escolar, mas inclui outras dimensões, entre elas, ser colocado a serviço de uma coletividade para além da escolar. Esse tipo de trabalho, segundo a pedagogia socialista, assume características de trabalho social da escola, algo que a escola organiza a serviço da comunidade; trabalho cultural-educativo, o que Freire (1984) chamaria de ação cultural. Essas considerações e posições nos permitem a propor para a Escola do Campo (CALDART, et al 2012), uma BET. Uma escola e biblioteca que assumem funções, entre elas a formação de um sujeito, capaz de ler e escrever como forma de luta, um sujeito integral, que na BET lê e escreve. Seja no trabalho escolar especificamente, ou no trabalho socialmente necessário. Afinal, ela assume no fazer educativo um duplo papel: primeiro, e quem sabe mais importante, formar na ação cultural para liberdade e a 12270

3 3 luta contra opressão (FREIRE, 1984; 2001), ou para uma ação revolucionária (GRAMSCI, 1991), quando ajuda a elevar o conhecimento e a cultura local, a organização política e; segundo, organizar o conhecimento produzido e incorporá-lo ao acervo, disposto para comunidade local, que sempre será um trabalho socialmente necessário. Portanto, a BET se faz pelo trabalho e no trabalho (escolar, auto serviço, trabalho socialmente necessário) de coletivos organizados de estudantes e educadores, num determinado espaço, a escola pública, vinculada ao contexto do campo, marcado pela cultura, pelo trabalho e o conhecimento, direito dos camponeses e camponesas, estudantes da escola do Campo. No contexto escola e numa perspectiva de evolução e ampliação da práxis poderíamos evoluir do trabalho escolar: pesquisa bibliográfica; pesquisa na internet, a preparação de seminários, produção de cartazes, resumos de temas, cópias de fragmentos dos livros, desenhos e pinturas, preenchimento de questionários, hora do conto, tempo leitura, troca de livros para leitura domiciliar; para o autoserviço: organizar o mural da sala de aula e da biblioteca, divulgar obras do acervo, fazer campanhas para agregar novos leitores, expor livros no tempo recreio e convidar colegas para ler, programar recitais de poesia; distribuir o jornal escolar nas classes, divulgar produções das turmas e de escritores na rádio escolar, acompanhar as práticas de pesquisa dos menos experientes. Por fim, chegaríamos ao trabalho socialmente necessário com práticas mais aproximadas a uma concepção de trabalho emancipado como: produção de livros, panfletos, jornais para serem distribuídos na comunidade a fim de esclarecer sobre determinado tema ou aspecto das culturas, ler para os mais velhos ou para os analfabetos da comunidade, ouvir dos camponeses mais velhos e experientes as práticas de cultivo e manejo das plantas e animais para produzir registros, escrever para jornais locais sobre a conjuntura, contribuir na resolução de cálculos junto aos agricultores da cooperativa, entre outras práticas de trabalho na BET. O espaço-tempo de trabalho, na BET, e as relações de cooperação ali estabelecidas são o laboratório vivo de leitura, não mais de usuários da biblioteca, mas de intelectuais orgânicos da escola e da cultura, que buscam nesse espaço, a pesquisa, a informação e o conhecimento, mediado pela leitura. A BET assume o 12271

4 4 conjunto de funções definidas para uma BE e, amplia, transforma e transgride essa função, forjando sua ação na perspectiva do trabalho. O princípio do trabalho na BET coloca em diálogo o trabalho escolar, o autosserviço e o trabalho socialmente necessário, compreendendo o valor educativo dos três na constituição de uma pedagogia de leitura (SILVA, 1996), rompendo, segundo o autor com as práticas que instituem o dia da leitura na biblioteca; a hora da leitura como padrão de ação; a hora do conto, o controle com a prévia seleção dos livros para a criança ler, entre outras práticas. Autores como Silva (1998), Moraes (1983), Maroto (2009) defendem, ainda, que a biblioteca e a leitura não podem ser uma doação ao povo, pelo Estado Educador (GRAMSCI, 1991), um estado capitalista que tende a impor a sua leitura e o seu acervo. No caso em estudo observa-se a imposição pela negação, ausência ou precarização do acervo em bibliotecas da beira, as bibliotecas nas Escolas do Campo mesmo com aprovação de legislação especificas para a área (BRASIL, 2010; 2011). Considerações Finais A análise desenvolvida permite constatar e compreender que a BET, na Escola do Campo, na contradição e desassistida pelo Estado, pode forjar práticas transgressoras de leitura, pesquisa e intervenção na realidade. Para isso, demanda pesquisa, investimento público para constituição do espaço e acervo e a formação dos seus intelectuais orgânicos, que ocupam esse espaço de informação, comunicação, e conhecimento desde o trabalho enquanto principio formativo do ser humano. Explicita a concepção de trabalho na escola e na biblioteca quando apresenta o trabalho escolar, o auto-serviço e o trabalho socialmente necessário enquanto fundamento das práticas de trabalho na biblioteca. A pesquisa indica para a escola e as BET, a necessidade de estruturar, pela práxis, um projeto de leitura e escrita, articulando a escolarização e a vida, em que os intelectuais orgânicos da escola e comunidade possam produzir acervo. Consideramos, por fim, que as instituições de ensino superior precisam intencionalizar a formação dos licenciados para o trabalho pedagógico em BE, especialmente, quando situadas em contextos menos privilegiados

5 5 Referências BRASIL. Lei n.º : Dispõe sobre a universalização das bibliotecas nas instituições de ensino do País. Brasília: Congresso Nacional, BRASIL. Resolução n 40. Dispõem sobre o Programa Nacional do Livro Didático do Campo (PNLD Campo) para as escolas do Campo. Brasília, BRITO, L. P. L. Contra o consenso: cultura, escrita, educação e participação. Campinas, SP: Mercado das Letras, CALDART, R. S. (Org.). Dicionário da educação do campo. Rio de Janeiro, São Paulo: Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio; Expressão Popular, CAMPELLO, B. S. et al. A biblioteca escolar: temas para uma prática pedagógica. Belo Horizonte: Autêntica, FREIRE, P. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 8. ed. São Paulo: Cortez, FREIRE, P. Ação cultural para liberdade e outros escritos. 9 ed. São Paulo: Paz e Terra, GEHRKE, M. Contribuições da práxis para a constituição da biblioteca escolar do trabalho a partir da Educação do Campo. Tese (Doutorado em educação) - Universidade Federal do Paraná, Curitiba, GRAMSCI, A. Os intelectuais e a organização da cultura. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, MAROTO, L. H. Biblioteca escolar, eis a questão: do espaço do castigo ao centro do fazer educativo. Belo Horizonte: Autêntica, MARX, K; ENGELS, F. A ideologia Alemã. 5. ed. São Paulo: Hucitec, MILANESI. L. O que é biblioteca. São Paulo: Brasiliense, MILANESI. L. Ordenar para desordenar: centros de cultura e biblioteca pública. São Paulo: Brasiliense, MORAES, R. B. de. O problema das bibliotecas brasileiras. Brasília: ABDF, PISTRAK. Fundamentos da escola do trabalho. Brasiliense, PISTRAK, M.M. (Org.). A Escola-Comuna. São Paulo: Expressão Popular, SHULGIN, V. N. Rumo ao politecnismo: artigos e conferências. São Paulo: Expressão Popular, SILVA, E. T. da. Leitura na escola e na biblioteca. Campinas, SP: Papírus, SILVA, E. T. da. Elementos de pedagogia da leitura. São Paulo: Martins e Fontes, SILVA, W. C. da. Miséria da biblioteca escolar. São Paulo: Cortez, SOUZA, R. J. Biblioteca escolar e práticas educativas: o mediador em formação. Campinas, SP: Mercado das Letras,