TEORIA DA JUSTIÇA RAWLS
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- Júlio da Conceição Neves
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1 TEORIA DA JUSTIÇA RAWLS NEWTON TEIXEIRA CARVALHO Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Doutorando em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG. Juiz de Direito da 1ª Vara de Família da Comarca de Belo Horizonte. Professor de Direito Processual Civil I, Direito Civil IV (Família) e Coordenador de Pesquisa da Escola Superior Dom Helder Câmara. 1 - INTRODUÇÃO Não é demais afirmar que a justiça é a primeira virtude das instituições sociais, como a verdade o é dos sistemas de pensamento. 4 Assim, leis e instituições, por mais eficientes e bem organizadas que sejam, devem ser reformadas ou abolidas se são injustas. Cada pessoa possui uma inviolabilidade fundada na justiça que nem mesmo o bem-estar da sociedade como um todo pode ignorar. Por essa razão, a justiça nega que a perda da liberdade de alguns se justifique por um bem maior partilhado por outros. RAWLS (2002), em seu livro, Uma Teoria de Justiça, pretendeu generalizar e elevar a uma ordem mais alta de abstração a teoria tradicional do contrato social representada por Locke, Rousseau e Kant. Através de sua teoria, RAWLS (2002) oferece uma explicação sistemática alternativa da justiça que pretende ser superior ao utilitarismo dominante da tradição. Na verdade, a teoria de RAWLS (2002) é, conforme ele próprio confessa, altamente Kantiana em sua natureza. Entretanto, não se pode desprezar que: É necessário usar o conhecimento clássico como base, ponto de partida, não como uma gaiola dogmática que engesse o crescimento no passado. A partir do conhecimento desses princípios, extrai-se o necessário para construir uma Ética que seja compatível com as necessidades do mundo de hoje, nutrida no passado, mas de forma alguma presa a ele. 1 RAWLS descreve o papel da justiça na cooperação social e apresenta uma breve explicação de seu objeto primário, a estrutura básica da sociedade para, logo em seguida, 1 Cunha, José Ricardo, O juiz e a ética. Fundação Getúlio Vargas. Direito Rio, apud RUSS, Jacqueline. Pensamento Ético Contemporâneo. São Paulo, 1999, pp.5-20.
2 apresentar a idéia da justiça como eqüidade. O pacto social é substituído por uma situação inicial que incorpora certas restrições de conduta baseada em razões destinadas a conduzir a um acordo inicial sobre os princípios da justiça. Os princípios antes aludidos são os que pessoas livres e racionais aceitariam numa condição inicial de igualdade. Nessa situação hipotética, que corresponde ao estado de natureza na teoria do contrato social, ninguém conhece seu lugar na sociedade, sua classe ou status social, sua sorte na distribuição de bens naturais e habilidades, sua inteligência, força e afins, ou até sua concepção de bem. Portanto, deliberando sob um véu de ignorância, os homens determinam seus direitos e deveres. A proposta de RAWLS, sem dúvida, é uma concepção alternativa de justiça, a contrapor o utilitarismo, dominante nos últimos dois séculos. Resta saber, porém, no desenvolvimento deste trabalho, se o discurso sobre a justiça é conclusivo, no momento presente, ou se construído no dia-a-dia de cada povo, sem desprezo à ética. Volvendo exclusivamente à função judiciária 2, não podemos nos olvidar de que o nosso ordenamento jurídico é aberto, incompleto e prospectivo e, por conseguinte, não há que se analisar o Direito dissociado de sua dinamicidade e, na colmatação de lacunas, ou na aplicação da lei, não podemos deixar que o injusto prevaleça. 2 Cunha, José Ricardo, O juiz e a ética. Fundação Getúlio Vargas. Direito Rio, apud RUSS, Jacqueline. Pensamento Ético Contemporâneo. São Paulo, 1999, pp
3 2- DESENVOLVIMENTO 2.1- Direitos e Deveres definidos pelas Instituições Sociais Não obstante uma sociedade seja um empreendimento cooperativo visando vantagens mútuas, ela é tipicamente marcada por conflitos como por identidade de interesses. A identidade de interesses surge porque a cooperação social possibilita que todos tenham uma vida melhor da que teria qualquer um dos membros se cada um dependesse de seus próprios esforços. Há um conflito de interesses porque as pessoas não são indiferentes no que se refere a como os benefícios maiores produzidos pela colaboração mútua são distribuídos, pois para perseguir seus fins cada um prefere uma participação maior a uma menor. Assim, é necessário, no entender de RAWLS (2002-5), de um conjunto de princípios para escolher entre várias formas de ordenação social que determinam essa divisão de vantagens e para selar um acordo sobre as partes distributivas adequadas. Esses princípios são os princípios da justiça social: eles fornecem um modo de atribuição de direitos e deveres nas instituições básicas da sociedade e definem a distribuição apropriada dos benefícios e encargos da cooperação social. Para RAWLS (2002-7), o objeto primário da justiça é a estrutura básica da sociedade, ou mais exatamente, a maneira pelas quais as instituições sociais mais importantes distribuem direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão de vantagens provenientes da cooperação social. As instituições mais importantes para RAWLS (2002-8) é a constituição política e os principais acordos econômicos e sociais (proteção legal da liberdade de pensamento e de consciência, os mercados competitivos, a propriedade particular no âmbito dos meios de produção e a família). Tomadas em conjunto como um único esquema, as instituições sociais mais importantes definem os direitos e deveres dos homens e influenciam seus projetos de vida, o que eles podem esperar vir a ser e o bem-estar econômico que podem almejar. A estrutura básica é o objeto primário da justiça porque seus efeitos são profundos e estão presentes desde o começo. 6
4 2.2- Princípios da Justiça Social Porém, os princípios da justiça social devem ser aplicados em primeiro lugar, em razão das desigualdades, inevitáveis na estrutura básica de qualquer sociedade. Assim, esses princípios regulam a escolha de uma constituição política e os elementos principais do sistema econômico e social. A justiça de um esquema social depende essencialmente de como se atribuem direitos e deveres fundamentais e das oportunidades econômicas e condições sociais que existem nos vários setores da sociedade. Assim, para RAWLS ( ), o conceito de justiça se define pela atuação de seus princípios na atribuição de direitos e deveres e na definição da divisão apropriada de vantagens sociais. Uma concepção de justiça, para ele, é uma interpretação dessa atuação. Para RAWLS ( ), a idéia norteadora é que os princípios da justiça para a estrutura básica da sociedade é o objeto do consenso original. São esses princípios que pessoas livres e racionais, preocupadas em promover seus próprios interesses, aceitariam numa posição inicial de igualdade como definidores dos termos fundamentais de sua associação. Esses princípios devem regular todos os acordos subseqüentes; especificam os tipos de cooperação social que se podem assumir e as formas de governo que se podem estabelecer. A essa maneira de considerar os princípios da justiça é que RAWLS chama de justiça como eqüidade Justiça como Eqüidade Na justiça como eqüidade a posição original de igualdade corresponde ao estado de natureza na teoria tradicional do contrato social. É entendida como uma situação puramente hipotética caracterizada de modo a conduzir a certa concepção de justiça. Os princípios da justiça são escolhidos sob um véu de ignorância. Isso garante que ninguém é favorecido ou desfavorecido na escolha dos princípios pelo resultado do acaso natural ou pela contingência de circunstâncias sociais. Uma vez que todos estão numa situação semelhante e ninguém pode designar princípios para favorecer sua condição particular, os princípios da justiça são resultados de um consenso ou ajuste eqüitativo. 7
5 Portanto, depois de haver escolhido uma concepção de justiça, as pessoas deverão escolher uma constituição e uma legislatura para elaborar leis, e assim por diante, tudo em consonância com os princípios da justiça inicialmente acordados. Nossa situação social será justa se for tal que, por essa seqüência de consensos hipotéticos, nos tivermos vinculado por um sistema de regras que a definem. O reconhecimento geral fornece a base para a aceitação pública dos princípios correspondentes da justiça. Assim, na teoria da justiça de RAWLS, a sociedade que satisfaça os princípios da justiça como eqüidade aproxima-se o máximo possível de ser um sistema voluntário, porque vai ao encontro dos princípios que pessoas livres e iguais aceitariam em circunstâncias eqüitativas. Portanto, os membros dessa sociedade são autônomos e as obrigações que eles reconhecem são auto-impostas. Porém, a esta altura a dúvida que persiste é, na concepção da justiça como eqüidade, como determinar que princípios da justiça fossem escolhidos na posição original. Para RAWLS ( ) a força dessa justiça deriva de duas coisas: a exigência de que todas as desigualdades sejam justificadas para os menos favorecidos e a prioridade da liberdade. Essas duas limitações a distinguem do institucionismo e das teorias teleológicas e levam à formulação dos seguintes princípios: Primeiro Princípio: Cada pessoa deve ter um direito igual ao mais abrangente sistema total de liberdades básicas iguais que seja compatível com um sistema semelhante de liberdades para todos. Regra de Prioridade: Os princípios da justiça devem ser classificados em ordem lexical e, portanto a liberdade só pode ser restringida em nome da liberdade. Existem dois casos: a) uma redução da liberdade deve reforçar o sistema total de liberdades partilhadas por todos, e b) uma liberdade menor deve ser considerada aceitável para aqueles cidadãos com a liberdade menor. 8
6 Assim, na teoria da justiça com eqüidade, RAWLS exige que os princípios sejam inseridos em ordem serial ou lexical (opção do autor, já que o termo correto, lexicográfico, é considerado por ele muito desajeitado). Através deste método, o primeiro princípio da ordenação deve ser satisfeito antes de podermos passar para o segundo, o segundo antes de considerarmos o terceiro e assim por diante. Um determinado princípio não será considerado até que aqueles que o precedem sejam plenamente aplicados ou se constate que não se aplicam ao caso. Uma ordenação serial evita, portanto, que sequer precisemos ponderar princípios; os que vêm antes na ordenação têm um peso absoluto, por assim dizer, em relação aos que vêm depois, e valem sem exceção. Para definir as prioridades de liberdade, RAWLS ( ) socorre-se de Aristóteles, já que este grande filósofo observa que uma das peculiaridades dos homens é que eles possuem um senso do justo e do injusto, e que o fato de partilharem um entendimento comum da justiça cria a polis. Depois, a teoria da justiça repousa sobre pressupostos pouco exigentes e amplamente acatados. Assim, poderá ela conseguir uma aceitação geral. As nossas liberdades estão mais firmemente embasadas quando derivam de princípios com o quais as pessoas, situadas eqüitativamente umas em relação às outras, podem concordar. Ao falar da prioridade da liberdade, RAWLS ( ) se refere à precedência do princípio da liberdade igual em relação ao segundo princípio da justiça. Os dois princípios, acima descritos e conforme vistos, estão em ordem lexical. Portanto, as reivindicações da liberdade devem ser satisfeitas primeiramente. Até se conseguir isso, nenhum outro princípio pode ser observado. Assim, a precedência da liberdade significa que a liberdade pode ser limitada apenas em nome da própria liberdade. Há dois tipos de casos. As liberdades básicas podem ser ou menos amplas, mesmo permanecendo iguais, ou podem ser desiguais. Se a liberdade for menos ampla, o cidadão representativo, ao fazer o balanço da situação, deve julgar esse fato como um ganho para a sua liberdade; e se a liberdade for desigual, a liberdade dos que têm uma liberdade menor deve ter maiores garantias. Nos dois casos a justificativa decorre do sistema global das liberdades iguais. 9
7 2.4- Desprezo ao Princípio da Utilidade A teoria de RAWLS ( ) afasta o princípio da utilidade, uma vez que os princípios de justiça como eqüidade são considerados como conseqüência de um consenso original numa situação de igualdade. Assim, é pouco provável que pessoas que se vêem como iguais, com direito a fazer exigências mútuas, concordariam com um princípio que pode exigir para alguns expectativas de vida inferiores, simplesmente por causa de uma soma maior de vantagens desfrutadas por outros. Portanto, o princípio da utilidade é incompatível com a concepção da cooperação social entre iguais para a vantagem mútua. É inconsistente com a idéia de reciprocidade implícita na noção de uma sociedade bem ordenada. Para RAWLS ( ), as pessoas na situação inicial escolheriam dois princípios bastante diferentes: o primeiro exige a igualdade na atribuição de deveres e direitos básicos, enquanto o segundo afirma que desigualdades econômicas e sociais, por exemplo, desigualdades de riqueza e autoridade, são justas apenas se resultam em benefícios compensatórios para cada um, e particularmente para os membros menos favorecidos da sociedade. Os princípios antes aludidos excluem instituições que se justificam com base no argumento de que as privações de alguns são compensadas por um bem maior do todo. Pode ser conveniente, mas não é justo que alguns tenham menos para que outros possam prosperar. Porém, não há injustiça nos benefícios maiores conseguidos por uns poucos desde que a situação dos menos afortunados seja com isso melhorada. A idéia intuitiva 3 é a de que, pelo fato de o bem-estar de todos depender de um sistema de cooperação sem o qual ninguém pode ter uma vida satisfatória, a divisão de vantagens deveria acontecer de modo a suscitar a cooperação voluntária de todos os participantes, incluindo-se os menos bem situados. É certo que o utilitarismo clássico tenta, naturalmente, evitar o apelo sistemático à intuição. É uma concepção de um único princípio com um único critério decisivo; o ajuste dos pesos é, pelos menos em teoria, estabelecido pela referência ao princípio da utilidade. Porém e como observa RAWLS, ( ), não há nada necessariamente irracional no apelo à 3 A intuição é realidade que se adjetiva: intuição sensível, intuição espiritual material emocional ou dos valores, intuição das evidências, etc. Vide, a respeito, DINIZ, Maria Helena. As lacunas no direito, cit., p.115., a quem rendemos, neste momento, a nossa homenagem e refutamos qualquer preconceito acadêmico. 10
8 intuição para resolver questões de prioridades. Devemos reconhecer a possibilidade de não haver nenhum jeito de eliminar a pluralidade de princípios. Portanto, qualquer concepção de Justiça deverá até certo ponto depender da intuição. Porém, na justiça como eqüidade, o papel da intuição está limitado de várias maneiras, posto que os princípios da justiça são os que seriam escolhidos na posição original. São, pois, resultados de uma certa situação de escolha. Sendo racionais, as pessoas na posição original reconhecem que deveriam considerar a prioridade desses princípios. Assim, na posição original as partes tentarão alcançar algum consenso acerca do modo como os princípios de justiça devem ser avaliados entre eles. Portanto, os princípios não são concebidos como evidentes, mas têm sua justificação na sua escolha hipotética. É por tal razão que a teoria da justiça como eqüidade foi considerada por RAWLS como contratualista, por transmitir a idéia de que princípios da justiça podem ser concebidos como princípios que seriam escolhidos por pessoas racionais e que assim as concepções da justiça podem ser explicadas e justificadas. A palavra contrato sugere que a divisão apropriada de benefícios aconteça de acordo com princípios aceitáveis pelas partes. Ora, se os princípios são resultados de um consenso, os cidadãos têm conhecimento dos princípios que os outros seguem 4. É típico das teorias contratualistas ressaltarem a publicidade dos princípios políticos. Porém, ressalta RAWLS ( ) que a justiça como eqüidade não é uma teoria completamente contratualista, eis que está claro que a idéia contratualista pode ser estendida à escolha de um sistema ético mais ou menos completo, isto é, um sistema que inclua princípios para todas as virtudes e não apenas para a justiça. Na sua teoria, RAWLS considera apenas os princípios da justiça e outros estritamente relacionados com eles. Afirma RAWLS ( ) que a posição original é o status quo inicial apropriado para assegurar que os consensos básicos nele estabelecidos sejam eqüitativos. Esse fato delimita o conceito de justiça como eqüidade. Assim, na teoria de RAWL existe um amplo consenso de que os princípios da justiça devem ser escolhidos em condições determinadas e ninguém deve ser favorecido ou desfavorecido pela sorte natural ou por circunstâncias sociais em decorrência da escolha de princípios. 4 Nota-se a importância dos princípios, mesmos que apenas pressupostos, na teoria de Rawls. NELE, os princípios deixam de ser meramente decorativos e descritivos. Vide, Cunha José Ricardo, O Juiz e a Ética, Fundação Getúlio Vargas Direito Rio, pág. 45: Princípios, para os positivistas, são meramente decorativos! Prescrevem um estado de coisas, mas não obrigam, e, um dia, tendo sorte, poderão, se forem especificados através de uma regra, alcançar concretude.. 11
9 Também os princípios não podem ser adaptados às condições de um caso pessoal. As inclinações e as inspirações particulares e concepções individuais sobre o bem não afetarão os princípios adotados. O objetivo é excluir aqueles princípios cuja aceitação de um ponto de vista racional só se poderia propor, por menor que fosse sua possibilidade de êxito, se fossem conhecidos certos fatos que do ponto de vista da justiça são irrelevantes. As partes, na posição original, são iguais. Isto é, todas têm os mesmos direitos no processo da escolha dos princípios; cada uma pode fazer proposta, apresentar razões para a sua aceitação e assim por diante. Nestas condições e juntamente com o véu de ignorância são definidos os princípios da justiça como sendo aqueles que pessoas racionais preocupadas em promover seus interesses consensualmente aceitariam em condições de igualdade nas quais ninguém é consciente de ser favorecido ou desfavorecido por contingências sociais e naturais. 12
10 3- CONCLUSÃO Na verdade, a teoria da justiça como eqüidade de RAWLS é uma interpretação Kantiana eis que, agindo de acordo com os princípios explicitados por ele, as pessoas expressam sua natureza de seres racionais iguais e livres, sujeitos às condições gerais da vida humana. Os princípios da justiça também se apresentam como análogos aos imperativos categóricos, ou seja, princípio de conduta que se aplica a uma pessoa em virtude de sua natureza de ser racional, igual e livre. Agir com base nos princípios da justiça é agir com base em imperativos categóricos, no sentido de que eles se aplicam a nós, quaisquer sejam os nossos objetivos particulares. Depois, em alguns aspectos a teoria de RAWLS é um tanto quanto confusa, com inúmeros gráficos, com fórmulas matemáticas, e como se o discurso sobre a justiça, a partir de então, estivesse perfeito. Como se, a partir de então, estivéssemos com uma teoria acabada, pronta, inquestionável. Porém não é bem assim! A justiça é construída em cada situação e principalmente considerando o seu principal ingrediente, nós, pessoas imperfeitas e imprevisíveis, em recuperação e reparação dos erros do passado (consciência histórica). Vêm a calhar, neste momento, os ensinamentos do Professor Marcelo Campos Galuppo 5, a demonstrar que, sem ética não se alcança justiça: Só o homem cuja disposição foi moldada pelas demais virtudes, éticas e dianoéticas, pode exercer adequadamente a justiça. E somente com justiça podemos indicar qual virtude é indicada, ou seja, justa, para uma situação. Permite-nos também dizer que talvez o discurso sobre a justiça seja sempre inconcluso, porque o que se espera dos homens que sabem o que seja a justiça, quer dizer, dos homens justos, é que ajam justamente, e não que falem sobre ela.. Afinal, o destinatário da justiça é o ser humano. Através dela (Justiça) busca-se uma sociedade solidária, livre e justa. A atividade jurisdicional não pode estar desatenta ao fato de que o sentido da vida humana não se orienta em criar riqueza, mas fraternidade; o 5 GALUPPO, Marcelo Campos. A virtude da justiça. Disponível em < 13
11 sentido da vida humana assenta-se não no ter, mas no ser solidário e compassivo para com todos os seres da criação.. 6 e, A ética é da ordem, da prática e não da teoria. Por isso são importantes as figuras exemplares que testemunharam em suas vidas a realização de uma ética coerente. Somente exemplos luminosos são realmente convincentes. A ética se transfigura, então, em mística, experiência abissal do Ser. Assim como uma estrela não brilha sem aura, assim também uma ética não ganha vigência em sua visão mística e encantada do mundo, onde a Terra e o Céu e todos os elementos que surgem do casamento entre eles brilham, se transformam em valor, em sinal de um mundo de bondade, possível aos filhos e filhas da Mãe Terra, que São Francisco nos ensinou a amar como irmã e mãe. 7. Sejamos exemplos de condutas em nossa missão de julgadores, busquemos em nossas decisões a afirmação, sempre, de uma sociedade livre, justa e fraterna. Assim, ao distribuirmos Justiça, estamos também agindo eticamente. 6 BOFF, Leonardo. São Francisco de Assis Ternura e vigor. 6. ed., Petrópolis: Vozes, 1996, p CUNHA, José Ricardo. O Juiz e a Ética. Fundação Getúlio Vargas, p
12 3. BIBLIOGRAFIA ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, BOFF, Leonardo. São Francisco de Assis Ternura e vigor. 6. ed., Petrópolis, DINIZ, Maria Helena. As Lacunas no Direito. São Paulo: Revista dos Tribunais, DWORKIN, Ronald. Uma Questão de Princípio. São Paulo: Martins Fontes, GALUPPO, Marcelo Campos. A virtude da justiça Disponível em: < Acesso em: 15 jul GALUPPO, Marcelo Campos. Igualdade e Diferença. Belo Horizonte: Mandamentos, RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. São Paulo: Martins Fontes, RUSS, Jacqueline. Pensamento Ético Contemporâneo. São Paulo: Paulus, SANTANA, Jair Eduardo. Limites da Decisão Judicial na Colmatação de Lacunas.Belo Horizonte:Del Rey, VAZ, Henrique Carlos de Lima. Escritos de Filosofia II: Ética e Cultura. São Paulo: Loyola, APOSTILA DE REFERÊNCIA: CUNHA, JOSÉ RICARDO. O Juiz e a Ética. Fundação Getúlio Vargas Direito Rio. 15
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