Cidades do agronegócio na BR-163 matogrossense
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- Luiz Fernando Marreiro Ramalho
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1 Cidades do agronegócio na BR-163 matogrossense Israella Pires Alves Gabrig * Introdução A expansão do agronegócio no cerrado matogrossense ocorreu a partir dos anos 80, intensificou-se nos anos 90 e assumiu novas formas nos anos 2000, quando passou a ser agregado valor aos grãos para a produção de carnes, principalmente de aves e suínos, constituindo a BR-163 caso exemplar desta expansão. A partir dos anos 80, com a expansão da agricultur moderna, foram surgindo cidades planejadas e modernas nessa fronteira, com o objetivo de atender as necessidades do agronegócio. Neste contexto coloca-se como fundamental o estudo dessas cidades, mais especificamente de Sorriso, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum, bem como sua evolução até a fase atual, quando se instala a cadeia carne/grãos. Assim sendo, o objetivo deste trabalho consiste no conhecimento das cidades no agronegócio no que se refere à sua evolução, suas formas/conteúdo e funções, ou seja, suas especificidades. Para dar conta da proposta trabalhamos com as categorias técnica e espaço, utilizando leituras de Milton Santos e Julia Adão Bernardes, aprofundando o tema cidades do agronegócio com Denise Elias e Samuel Frederico. Os dados secundários utilizados envolvem sub temas como evolução da dinâmica populacional e o trabalho nos principais setores da economia, articulados com a criação de infraestrutura urbana. É importante identificar as atividades específicas do agronegócio, que dinamizam essas cidades, a exemplo das vendas de insumos e máquinas, assistência técnica, consultorias, organizações de classe existentes, etc. Em suma, o estudo das condições que tornaram essas cidades espaços luminosos pode oferecer uma primeira aproximação para a compreensão das cidades do agronegócio. * Bolsista de Apoio Técnico do CNPQ no projeto Novas fronteiras do biodiesel na Amazônia: limites e desafios da incorporação da pequena produção agrícola. 1
2 1. Abordagem teórica Neste item trabalharemos as categorias técnica e espaço segundo a abordagem de Milton Santos (1996), onde ele enfatiza que os sistemas técnicos envolvem formas de produzir energia, bens e serviços, formas de relações entre os homens, informação, discurso e interlocução, possibilitando o surgimento do meio técnico-científico-informacional, denominado também pelo autor como meio geográfico do período atual, onde os objetos mais proeminentes são elaborados a partir dos mandamentos da ciência e se servem de uma técnica informacional da qual lhes vem o alto coeficiente de intencionalidade com que servem às diversas modalidades e às diversas etapas da produção (Santos, 1996: ). Contudo, a implantação, difusão e êxito das técnicas em um determinado espaço produtivo dependem do nível e caráter do desenvolvimento das forças produtivas alcançado pela formação social, o que se vincula às condições históricas e econômicas existentes no momento da introdução, as quais, por sua vez, são consequência de desenvolvimentos técnicos anteriores ( Bernardes, 2007 p..). Para Sánchez (1991), Santos (1996) e Bernardes (2006), o espaço deve ser visto como uma instância junto com a econômica, a político-institucional e a ideológico-cultural, importante na explicação dos processos sociais, sendo condição geral de produção, organizado por uma fração da sociedade, para o exercício de uma forma particular de produção e que é expressão material das relações sociais (Lefébvre, 1976). No que se refere às cidades do agronegócio, Denise Elias (2006) constitui referência. Segundo a autora, se a cidade é a materialização das condições gerais de reprodução do capital, a cidade do agronegócio é aquela cujas funções de atendimento às demandas do agronegócio são hegemônicas sobre as demais funções. O processo de estruturação do espaço urbano na BR-163 matogrossense Sorriso e Nova Mutum surgiram no contexto de colonização privada, enquanto Lucas do Rio Verde teve seu início a partir do processo de colonização pública, com maioria absoluta de sua população oriunda do sul do Brasil, graças à abertura da BR-163. Lucas do Rio Verde merece atenção especial, por ter em seu passado como objetivo inicial, em 1981, ser um alternativa de assentamento dos sem-terra do Rio Grande do Sul. 2
3 O projeto de colonização privada por pouco tempo foi levado a diante, já que a falta de chuva em um determinado período na região e de infraestrututa social e física acarretou uma grande queda da produção agrícola, tendo como consequência o acúmulo de dívidas a serem pagas, aumentando cada vez mais os juros, o que foi agravado pela retirada dos subsídios e crédito agrícola. Tal fato pressionou os assentados sem-terra a se retirarem das áreas ocupadas para darem lugar a novos donos com maior disponibilidade de capital, permanecendo apenas 18 das 200 famílias que iniciaram a colonização. As terras, quando não vendidas pelos sem-terra a preço muito abaixo do valor real, eram abandonadas e incorporadas ao INCRA, que passou a vender os lotes rurais para os grandes latifundiários e comerciantes do sul do país, o que acabou levando a uma grande concentração fundiária. Sendo assim, Lucas do Rio Verde acaba estruturando-se com os mesmos objetivos que Sorriso e Nova Mutum, tendo suas terras administradas por empresas colonizadoras, que até hoje controlam os estoques de terra rural e urbana. Cabe destacar que a venda de um lote rural na região implicava em doação ou compra de um lote urbano, estruturando-se o espaço agrícola ao mesmo tempo que o urbano. Embora a primeira produção em geral fosse de arroz, porque preparava o solo após o desmatamento, logo a soja entra como produto principal a ser cultivado nessas três cidades citadas, tornando-se o carro chefe do agronegócio, vinculado a elevado nível técnico, havendo um forte avanço da produção de grãos, tornando-se o eixo da BR-163 um dos maiores produtores de soja do cerrado matogrossense, contribuindo para que o estado alcançasse a posição de maior produtor do Brasil. Gráfico 1 3
4 Fonte: SIDRA IBGE. Como demonstra o gráfico, Sorriso desde 1990 até 2008 mantém a expansão de produção sempre superior aos demais municípios, tendo um expressivo crescimento em e mantendo-se na liderança no raking, sendo o município maior produtor de soja do mundo, com uma variação de 628,76 % entre 1990 e No caso de Nova Mutum, a expansão só se tornou mais expressiva em 2005, quando ultrapassou Lucas do Rio Verde, gerando uma variação de 756 % entre 1990 e Já Lucas do Rio Verde vem apresentando sempre um crescimento significativo, com uma variação de 564,20 % no período. Deve-se destacar que o estado registrou nesse período 461,62% de crescimento na produção de soja. Além da soja, outros cultivos revelam significativo crescimento no âmbito da agricultura moderna, a exemplo do algodão e do milho, participando da constituição do meio técnico-científico-informacional na região. Breve perfil das cidades do agronegócio no médio norte da BR-163 Simultaneamente à crescente modernização técnica do setor agrícola, ocorre o processo de estruturação urbana, crescendo e se reorganizando as cidades em função da produção de grãos e hoje também da produção de carnes, intensificando-se as relações campo/cidade. Podemos observar, na tabela 1, a expressividade atual da soja nos três municípios em análise. 4
5 Tabela 1 Área colhida, produção, rendimento e valor da produção em Sorriso, Lucas do Rio Verde e Nova Mutum Municípios Á r e a c o l h i d a (Hectares) Quantidade produz i da (Toneladas) Rendimento (kg/ha) Valor da produção ( M i l Reais) Lucas do Rio Verde , Nova Mutum , Sorriso , Total , Mato Grosso , Fonte: IBGE, Produção Agrícola Municipal Como mostra a tabela, em 2008 o conjunto dos três municípios apresentava ha de área colhida de soja, ou seja, 20,63% de Mato Grosso e toneladas, correspondendo a 21,11%, com um valor da produção equivalendo a 22,12% do valor total do estado, destacando-se Sorriso em todas essas variáveis. Vale ressaltar que a formação do meio técnico-científico-informacional na região está associado à aplicação de elevado nível técnico voltado para a obtenção de expressivo rendimento, que se situa em torno de 3.260kg/ha, superior à média do estado. Nesta variável Lucas do Rio Verde emerge com os maiores valores. Toda essa dinâmica da agricultura exige a presença de espaços urbanos em constante reorganização para gerir o campo moderno, significando o desenvolvimento de novas relações campo/cidade. Como afirma Elias (2006), isto se deve à crescente integração de atividades ao circuito da economia urbana. Atualmente novas atividades vêm se implantando na região, voltadas para a agregação de valor aos grãos, formando um novo complexo produtivo, ou seja, a cadeia carne/grãos, aproveitando os grãos para alimentar frangos, suínos e bovinos 5
6 Como resultado para atender melhor as novas necessidades instalam-se indústrias, tais como: fábrica de esmagamento da soja, fábricas de rações para alimentação dos bovinos, aves e suínos, abatedouros para as carnes, frigoríficos, entre outras indústrias complementares, reorganizando o território. Além disso, as cidades fornecem suporte técnico, bancário, consultorias, venda de produtos para a agricultura, mão de obra qualificada vinda do sul e sudeste do país e mão de obra menos qualificada oriunda principalmente do nordeste, bem como todos os serviços necessários, exigindo reorganização da cidade. Dados do IBGE, de 2007, apontam elevadas taxas de urbanização para Sorriso, (89,84%), Nova Mutum (75,28%) e Lucas do Rio Verde (91,13%). Com a vinda de novas atividades, da criação de infraestrutura e da oferta de trabalho ocorre naturalmente o crescimento populacional e da população ocupada. Entre 2000 e 2007 a população residente dos três municípios aumentou 58,08%, obtendo Nova Mutum os maiores incrementos (64,45%), seguido por Lucas do Rio Verde (59,15%), vindo por último Sorriso (54,85%), enquanto a população ocupada cresceu 213,81% no período, cabendo os maiores destaques a Nova Mutum (336,01%) e a Lucas do Rio Verde (285,14%). A tabela 2 apresenta a distribuição da população ocupada nos principais setores da economia. Tabela 2 Número de trabalhadores formais nos grandes Setores da Economia por municípios da cadeia carne/grãos, BR-163, MT (2008) Municípios Lucas do Rio Verde Indústria Construção civil Comércio Serv. e Adm. Pública Agropecuária, extrativismo vegetal, caça e pesca Nova Mutum Sorriso TOTAL Fonte: Rais/Caged/TEM (2008). Elaboração: Nivea Muniz vieira. 6
7 Observa-se que o setor que mais absorve mão de obra é o comércio, localizando-se os maiores valores em Sorriso e Lucas do Rio Verde, atendendo esse setor prioritariamente o consumo consuptivo e o atendimento de vendas à agropecuária. O segundo setor que mais emprega é o de serviços e administração pública, também apresentando os maiores incrementos em Sorriso e Lucas do Rio Verde, estando seu crescimento vinculado ao crescimento da demanda por serviços públicos como educação, saúde, administração municipal e infraestrutura em geral. É interessante observar os valores expressivos do trabalho formal na indústria, setor que cresceu consideravelmente nos últimos anos, principalmente em Lucas do Rio Verde, bem como na agropecuária, setores associados à presença da cadeia carne/grãos na região. Considerações finais O trabalho apresentou um rápido cenário da evolução de algumas cidades do agronegócio na BR-163 matogrossense, sua importância fundamental para o desenvolvimento da agricultura moderna, que necessita de cidades equipadas para atendê-la, resultando em forte interdependência entre campo e cidade. No caso das cidades analisadas, um dos problemas de maior gravidade é o fato do crescimento populacional e da população ocupada terem crescido muito além da infraestrutura disponível, problemática que deverá ser desenvolvida nos próximos trabalhos, após realização de trabalho de campo. Bibliografia BERNARDES, Julia Adão. Circuitos espaicias da produção na fronteira agrícola moderna; BR-163 mato-grossense. In: BERNARDES, Julia Adão; FREIRE FILHO, Osni de Luna. Geografias da Soja - BR-163; fronteiras em mutação. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, BERNARDES, Julia Adão. Mudança técnica e spaço: uma proposta de investigação. In: CASTRO, I.; GOMES, P. C.; CORREA, R. L. Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, CORREA, Roberto Lobato. Espaço: um conceito-chave da geografia. In: CASTRO, I.; GOMES, P. C.; CORREA, R. L. Geografia: conceitos e temas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
8 ELIAS, Denise. Agronegócio e desigualdade sócio-espaciais. In: ELIAS, Denise; PEQUENO, Renato. (org.) Difusão do agronegócio e novas dinâmicas sócio-espaciais. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, LEFÉBVRE. H. Espacio y política. Barcelona: Ediciones Península, SÁNCHEZ, Joan-Eugeni. Espacio, economía y sociedad. Madrid: Siglo Veintuno de España editores S.A., SANTOS, Milton. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Ed. Hucitec,
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