Dez contos sobre garotas de programa

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1 Dez contos sobre garotas de programa

2 2 CLODOALDO TURCATO DEZ CONTOS SOBRE GAROTAS DE PROGRAMAS Primeira Edição Editora do Livre Pensador Recife, Pernambuco

3 3 Titulo Original Dez contos sobre garotas de programa Primeira Edição 2012 by Clodoaldo Turcato Copyright da 2012 Editora do Livre Pensador Avenida Presidente Kennedy, 4834 Candeias Jaboatão dos Guararapes PE Telefone (081) / (081) Site: editoradolivrepensador@editoradolivrepensador.com Todos os direitos reservados. A reprodução não autorizada desta publicação, no todo ou em parte, constitui violação dos direitos autorais. (Lei 9.610/98). Capa: Instituto do Livre Pensador Ilustração de capa: Clodoaldo Turcato 3

4 4 INDICE Dedicatória Prefácio por mim mesmo A boneca Na hora do vamos ver Diário da família perfeita...26 Do tamanho da tristeza O código O bingo A nova namorada do Jessé...43 A herança O cafetão Eu que sonhava com ela

5 5 Dedico a todas as mulheres que fazem de seu corpo motivo pra serem amadas, odiadas, compradas e vendidas, e às vezes onde a único direito que lhes restam é chorar num canto escuro de qualquer lugar, bem rápido, pois precisam logo em frente acalentar a solidão de outros tantos com um belo sorriso no rosto. 5

6 6 Prefácio por mim mesmo Este livro é fruto de histórias verdadeiras. Algumas alterações de nomes foram necessárias para preservar as pessoas, ademais segue sempre original. São passagens que ouvi de Garotas de Programa e Clientes, usuários e prestadoras deste serviço milenar: a prostituição. A boneca ouvi de um alemão fracote no Bar Savóy no centro de Recife. Ao ver um travesti passar, desses que parecem demais com uma mulher, teve um acesso de fúria, atirando toda sorte de impropérios, causando um incidente grave que nos levou a todos para a Delegacia. Contido por seu colega e com uns 6

7 7 uísques a mais confessou seu infortúnio, que tentei transcrever do que pude ouvir já que estava na mesa ao lado. Furtei este conto, confesso. Na hora do vamos ver ouvi de um amigo em Boa Viagem numa sexta-feira, quando discutíamos sobre classificados de acompanhantes. Ele confessou que tinha sérias reservas quanto a veracidade da propaganda. Após alguma discussão esquentada por uísque oito anos, ele narrou a estória, para deleite nosso. Diário de uma família perfeita foi dito por Sirana, uma menina que fazia ponto em frente do Bradesco em Boa Viagem. Numa 7

8 8 dessas noites sem sono fui andar um pouco e dei com ela. Convidei-a para uma cerveja e ela inesperadamente topou. Quando soube que eu escrevia disse que sua vida dava um livro triste. Relatou como era sua casa e o fato de seu filho estar doente, o que a preocupava demais. Escrevi sem autorização dela, mas acredito sinceramente que fui fiel e ela aceitaria sem medidas a publicação de um dia na sua vida. Do tamanho da tristeza ouvi no motel Eros na Cidade Universitária de uma garota de programa que saí (lógico que eu usei dos serviços também). Em determinado momento comentou sobre meu pênis, grosso e curto (ruim 8

9 9 essa). Então perguntei se tinha visto maiores (piada, né!).ela confessou que sim, muitos e nesse foco me contou sobre o dia que correu da raia. Humor macabro que ela tirou de letra, embora não conseguisse esconder o fato de estar realmente decepcionada com aquela lembrança. O mais enigmático conto foi narrado por uma garota de programa no dia de Nossa Senhora da Salete na Igreja do Carmo. Era 19 de novembro, vi uma bela garota acendendo uma vela para a santa e me aproximei. Perguntei se ela era devota como eu. Disse-me que sim, sua santinha faltara com ela apenas uma vez e deu 9

10 10 tudo errado. Com astúcia arranquei esta narrativa dela e saiu O código. O bingo é o conto mais divertido de todos e aconteceu na cidade de Lucas do Rio Verde, Estado de Mato Grosso. Transportei para Recife, o que foi uma meia verdade, porém os fatos foram muito parecidos.como não quis sair do ambiente daqui preferi refazê-lo com nossos ares. A nova namorada do Jessé ouvi de um Tenente da Policia Militar que esnobava de um vizinho na Madalena onde morava. Contou com tamanha riqueza de detalhes que bastou transcrever com ajustes e personagens ao meio, 10

11 11 muito em conta do comportamento das pessoas que moravam naquele bairro. É um dos que mais gostei, divertido e realista. E ele encerrou a história sem concluir se Jessé ficou ou não com a Santa não se continha de tanto rir. A herança ouvi dentro do Presídio Professor Aníbal Bruno de um Agente Penitenciário que se referia a um detido que estava na fila de identificação. Era suspeito de matar a filha e a mulher, além de usá-las como prostitutas. Semanas depois a irmã do desventurado confirmou a estória da prostituição, mas negou que ele tivesse matado as duas com se matar fosse apenas pegar uma 11

12 12 arma e executar: elas tinham morrido em vida ainda. O cafetão foi o conto mais difícil de escrever, pois vivenciei esta história quando iniciei um namoro com uma morena que fazia programa no Presídio Professor Aníbal Bruno. Esta menina com vinte e dois anos narrou seu infortúnio e por que trabalhava lá dentro. Meses depois de ser solto encontrei-a na cidade fazendo ponto próximo da Siqueira Campos. Bebemos alguns drinques juntos e soube que seu pai tinha saído e morto. Contou com nojo dele e do enterro quando cuspiu no caixão. Nunca mais 12

13 13 saiu da vida de prostituta, às vezes a vejo por lá ainda. Eu que sonhava com ela aconteceu comigo. Foi daquele jeito mesmo, sem mais nem menos. O que me intrigou aqui foi o fato da oriental ser filha de classe média e a total falta de valores morais destas adolescentes. Não sei se eu estou velho demais ou elas pra frente, acima de minha compreensão. Bom, foi e aqui está - a confissão de minha perdição. Em vários cantos temos boas narrativas. Neste trabalho ingênuo captei a rua e suas mazelas cotidianas. Enquanto você lê estas linhas coisas estão acontecendo a sua volta. Cada 13

14 14 instante e cada pessoa tem uma história, que nem sempre é singela, na dura luta pra fugir da fome e da solidão. Não se trata de um livro pra aprofundamentos, afinal todos nós convivemos diariamente com tantas mazelas e tantos problemas que nos esquecemos de tão pequeno que somos diante da miserável forma de vida das prostitutas, que a sociedade até hoje não conseguiu solucionar. De tudo que temos e vemos ou acumulamos durante nossa vida, nada nos conforta se não tivermos alguém, mesmo fingindo ou pagando pra isso, que nos faça 14

15 15 sentirmos alguém no mundo. Da miséria de corpos belos explorados surge a esperança, renascem as forças e um pouco da solidão vai embora. De um lado a comida, do outro o afeto: dois motores para esse mundo continuar. 15