Leonardo de Medeiros Garcia Coordenador da Coleção. Paula Sarno Braga
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- Fátima Cordeiro Mascarenhas
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1 Leonardo de Medeiros Garcia Coordenador da Coleção Paula Sarno Braga Professora de Direito Processual Civil da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA), da Faculdade Baiana de Direito e da Universidade Salvador (UNIFACS). Professora e Coordenadora do Curso de Especialização em Direito Processual Civil (JusPODIVM). Especialista em Direito Processual Civil (FJA/JusPODIVM). Mestre e Doutoranda (UFBA). Advogada. paulasarnobraga@lagoesarno.com.br COLEÇÃO SINOPSES PARA CONCURSOS DIREITO PROCESSUAL CIVIL TEORIA GERAL DO PROCESSO CIVIL 3ª edição 2014
2 Capítulo v Ação Sumário 1. Evolução do conceito de ação. Principais teorias: 1.1. Teoria Imanentista (Civilista ou Clássica); 1.2. Teorias autonomistas: Teoria do direito concreto de agir; Teoria do direito abstrato de agir; 1.3. Teoria Eclética; 1.4. Teoria da asserção; 1.5. Quadro sintético 2. Ação abstrata e concreta. Demanda 3. Elementos da demanda: 3.1. Noções iniciais; 3.2. Parte; 3.3. Pedido: Pedido imediato e mediato. As modalidades de tutela jurisdicional; Importância; 3.4. Causa de pedir: Conceito. Teoria adotada; Subdivisão. Causa de pedir próxima e remota 4. Condições da ação: 4.1. Noções iniciais; 4.2. Possibilidade jurídica; 4.3. Interesse de agir; 4.4. Legitimidade ad causam. 1. EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE AÇÃO. PRINCIPAIS TEORIAS O conceito de ação é tema polêmico e sem consenso doutrinário. Há inúmeras teorias, muitas delas superadas e que, hoje, possuem valor meramente histórico. Em uma evolução sintética, originariamente, parte-se de um conceito de ação que se confunde com o direito material. Ação = Direito Gradativamente, caminha-se para o extremo oposto, quando se defende a autonomia da ação, já desvinculada do direito material identificando-se, nela, um direito subjetivo processual (ARAGÃO, 2002, p. 09). Ação Direito Para, enfim, chegar-se a um meio-termo em que se reconhece que ação e direito são noções distintas, mas estão vinculadas entre 121
3 PAULA SARNO BRAGA si, afinal, o direito é exercido através da ação e a ação tem por conteúdo o direito. Ação Direito Em uma evolução analítica, interessante fazer breve exposição das principais teorias que marcaram o desenvolvimento histórico do conceito de ação Teoria Imanentista (Civilista ou Clássica) É a visão primitiva da ação. Identifica-se a ação com o direito subjetivo material. A ação é considerada o próprio direito material depois de violado, reagindo à violação, em movimento, já em sua fase ativa e agressiva (ARA- GÃO, 2002, p. 09), em estado de guerra e não mais em estado de paz. A ação é tida, enfim, como mera variante, suplemento, anexo, acessório, função, elemento integrante, aspecto ou momento do direito material (FREIRE, 2001, p. 47). Por exemplo, se o credor levasse o seu direito de crédito violado a juízo, o que se via, aí, era o próprio direito de crédito reagindo à sua violação, em movimento, e, não, um direito autônomo de acionar o Judiciário para sobre ele obter uma prestação jurisdicional. Logo, não há ação sem direito, nem direito sem ação. E a ação segue a natureza do direito (CINTRA, DINAMARCO, GRINOVER, 2009, p. 268). Formou-se, assim, a teoria civilista do direito de ação, consolidada com Savigny, e seguida pela generalidade dos juristas até meados do século XIX. Como esse assunto foi cobrado em concurso? No Concurso Público para provimento no cargo de Promotor de Justiça MPEAL de 2012, foi cobrada a seguinte questão: No que concerne à natureza jurídica da ação, as afirma tivas de que "não há ação sem direito", "não há direito sem ação" e de que "a ação segue a natureza do direito" são consequências do conceito formulado pela teoria 122
4 AÇÃO a) do direito subjetivo instrumental. b) do direito autônomo e concreto. c) do direito autônomo e abstrato. d) clássica ou imanentista. e) do direito de fazer agir o Estado e não do direito de agir. Nos termos do gabarito oficial, a resposta certa é a constante na letra e. Mas ainda há resquícios seus em nosso ordenamento. Deu origem ao art. 75 do CC/1916 ( a todo direito corresponde a uma ação que o assegura ) e ainda se reflete, de certa forma, no CC/2002, como se extrai dos arts. 80, I, 83, II e III, dentre outros. Mas a teoria não tardou a ser criticada, sobretudo por não explicar a ação improcedente, que nega o direito afinal seria um caso de ação sem direito ou como não se reconheceu o direito não teria havido ação? (ASSIS, 2002, p. 56). E, na mesma linha de raciocínio, por não explicar a ação declaratória negativa procedente (negativa do direito). Essa teoria imanentista começou a ser superada com a famosa polêmica Windscheid x Mütter, ocorrida em meados do século XIX, sobre a correta compreensão da actio romana: i. para Windscheid a actio romana era a pretensão material dirigida contra o réu. Defendia que o direito material faz nascer uma propensão do seu titular de fazer prevalecer o interesse próprio, sujeitando o interesse alheio, que é a chamada pretensão (Anspruch); ii. para Mütter a actio romana era o direito público de demandar dirigido contra o Estado (Klagerecht); iii. Windscheid não abre mão de sua tese (actio romana = pretensão), mas não nega mais a existência de direito público de demandar contra Estado. E, ao fim, a única conclusão possível é que os autores chegam a uma distinção entre a pretensão material (Anspruch) e o direito de ação (Klagerecht), sendo este último o direito de provocar exercício de jurisdição. 123
5 PAULA SARNO BRAGA Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso para provimento no cargo de promotor público SC/ 2010 MPE SC, é reconhecida a superação das teorias que vinculam a existência do direito de ação à existência do direito material, tomando-se como incorreta a assertiva de que: A não demonstração do direito substancial invocado para a movimentação da máquina judicial culmina na ausência do direito de ação, porquanto interdependem o direito subjetivo substancial e o direito subjetivo processual Teorias autonomistas Foi assim que, a partir de meados do século XIX, começaram a surgir teorias defendendo a autonomia do direito de ação em relação ao direito material, reconhecendo, a princípio, seu caráter de direito público e subjetivo (CINTRA, DINAMARCO, GRINOVER, 2009, p. 268). Mas tais teorias acabaram se bifurcando em duas visões antagônicas: a concretista e a abstrativista Teoria do direito concreto de agir A teoria do direito concreto de ação foi concebida por Adolf Wach, na Alemanha, e seguida por nomes como Goldschimidt, Hellwig, Pohle, Chiovenda e, no Brasil, José Inácio Botelho de Mesquita. Trata- -se de teoria, hoje, praticamente descartada, sendo raros os autores que a defendem em sua forma pura, mais ainda é relevante para compreensão da visão atual da ação. Foi pioneira na idéia do direito de ação como um direito autônomo, definindo-o como o direito subjetivo a uma sentença favorável do Estado, estando a parte adversária sujeita a isso. Seria direito dirigido não só contra o Estado (do qual se exige prestação favorável) como também contra o adversário (do qual se exige sujeição). Entretanto, o direito de ação só existiria quando a sentença fosse favorável e, pois, o direito material fosse reconhecido. Assim, a ação seria direito público, autônomo (relativamente, ao menos), porém concreto, por só existir quando existisse o direito material (CINTRA, DINAMARCO, GRINOVER, 2009, p. 269). Naturalmente, a teoria foi alvo de duas grandes críticas, quais sejam: 124
6 AÇÃO i) não explica a hipótese de sentença desfavorável (que nega direito material), furtando-se em esclarecer se, aí, não teria havido ação, nem processo (ASSIS, 2002, p ). Isto é, se a ação é um direito autônomo, como afirmar que o autor não possui este direito diante de uma sentença que conclui pela não existência do direito material afirmado pelo autor em juízo? E como explicar os atos praticados até a sentença que julgou improcedente o pedido do autor? (FREIRE, 2001, p.50); ii) além disso, segundo Chiovenda, seria duvidosa e inexata a idéia de que o sujeito passivo deste direito seja o Estado. Se aceita a premissa de que o sujeito passivo é o Estado, sustenta, impõe-se a conclusão de que não se trata de um direito à sentença favorável, mas, sim, à sentença pura e simples, favorável ou desfavorável. Assim, para o autor, ação não se trata de um direito cujo sujeito passivo seja o Estado (cf. ASSIS, Araken, 2002, p. 59 e 60). Essa foi a dissidência doutrinária que deu origem à chamada teoria do direito potestativo de agir concebida por Giuseppe Chiovenda, que defende que a ação seria um direito potestativo cujo sujeito passivo é o réu, que estaria em estado de simples sujeição à sentença favorável, e à atuação da vontade concreta da lei (cf. CHIO- VENDA, V. I, 1969, p. 24; ASSIS, Araken, 2002, p. 59 e 60). Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova III Concurso para provimento do Cargo de Juiz Substituto do TRF3, exigiu-se que o concursando soubesse que a teoria da ação como direito potestativo é creditada a Giuseppe Chiovenda e, não, à Adolf Wach, Carnelluti ou Calamandrei. Além disso, no Concurso Público para Juiz Federal do TRF/4ª Região de Janeiro/2008, mais uma vez, exige-se que o candidato saiba que: Atribui-se a Chiovenda a primazia de ter afirmado, na Itália, a autonomia da ação, enquanto direito potestativo conferido ao autor, de obter, em face do adversário, uma atuação concreta da lei. No Concurso Público para provimento no cargo de Procurador da Fazenda Nacional de 2012, foi cobrada a seguinte questão: O direito de ação sempre foi um dos mais polêmicos temas da ciência processual, proliferando-se, ao longo da história, inúmeras teorias para explicá-lo. Sua importância se destaca, em especial, pois corresponde a um iniludível ponto de contato entre a relação jurídica material e a relação jurídica processual, sobretudo quando analisado sob a ótica do 125
7 PAULA SARNO BRAGA ato que dá início ao processo e delimita seu objeto litigioso. No Brasil, o direito positivo sofreu nítida influência da doutrina de Enrico Tullio Liebman, que, com sua teoria eclética da ação, propôs a categoria das condições da ação, alocadas entre os pressupostos processuais e o mérito da demanda. Sobre o tema, identifique a opção correta. a) O direito de ação pode ser atualmente identifica do como um direito público subjetivo, abstrato, autônomo da relação jurídica material, cuja exis tência dependerá da procedência da demanda proposta em juízo. b) Friedrich Carl Von Savigny, notável jurista alemão que se dedicou ao estudo profundo do direito romano, é citado pela doutrina como um adepto da teoria abstrativista, em decorrência da concepção de que se opera uma metamorfose no direito material quando lesado, transformando- se, assim, na actio. c) É da famosa polêmica entre Windscheid e Muther que percebemos significativo avanço na ciência processual. Associou-se a ideia da actio romana com a da pretensão de direito material, o que definiu a autonomia entre o direito material e o direito de ação, consubstanciando, assim, definitiva passagem da teoria concreta para a teoria abstrata da ação. d) Enrico Tullio Liebman propôs a categoria das condições da ação, afirmando que, se não fossem preenchidas as três condições inicialmente formuladas, o autor seria carecedor do direito de ação. Para Liebman, essa ideia deveria ser interpretada à luz da teoria da asserção, segundo a qual as condições da ação são examinadas a partir das alegações do autor (in status assertionem). Caso fosse necessária a dilação probatória para aferir a presença das condições da ação, estaríamos diante de um julgamento de mérito e não mais de pura carência de ação. e) Um dos maiores expoentes da teoria do direito concreto de agir foi Adolf Wach, desenvolvendo suas ideias a partir da teorização da ação declaratória. Para nosso autor, o direito de ação efetivamente é autônomo em relação ao direito material, porém só existirá se a sentença ao final for de procedência. Nos termos do gabarito oficial, a resposta certa é a constante na letra e Teoria do direito abstrato de agir Surge, em posição diametralmente oposta, a teoria do direito abstrato de ação, concebida por Heinrich Degenkolb em 1877 (alemão) e Alexander Plósz (húngaro) e perfilhada por autores como Alfredo Rocco e Kohler. 126
8 AÇÃO A ação, aqui, é vista como um direito público, subjetivo e abstrato a um pronunciamento do Estado-juiz, por uma sentença favorável ou desfavorável. Assim, pouco importa se existe ou não, in concreto, o direito material. Seria direito conferido a todos (sujeito ativo), indiscriminadamente (universal e genérico), e dirigido somente contra o Estado (sujeito passivo) a quem incumbe prestar o serviço jurisdicional, proferindo uma decisão judicial qualquer, independente do seu conteúdo. A teoria é seguida, com variação de fundamentos, pela maior parte dos estudiosos contemporâneos do processo, com um ou outro desvio do que foi dito por Plósz e Degenkolb. Nesse contexto, observa-se que, para muitos dos seus defensores, o direito de ação é incondicionado, não se admitindo a existência de nenhum requisito para sua existência senão, na pior das hipóteses, requisitos para seu exercício. Rejeitam, assim, a idéia do direito de ação como direito ao julgamento do mérito, condicionado à presença de requisitos, no caso, as chamadas condições da ação (legitimidade, interesse e possibilidade). Consideram, inclusive, que o seu preenchimento (das condições da ação) seria aferido, em concreto, à luz do direito material em jogo o que se afasta do abstrativismo propugnado para a ação, por pressupor que se verifique: i. se a parte é titular do direto material ou tem poder para defendê- -lo (exigência de legitimidade); ii. se é necessária e útil a tutela do direito material (exigência de interesse); iii. se é juridicamente possível a pretendida tutela do direito material (exigência de possibilidade jurídica). Não reconhecem as condições da ação, muito menos que sua ausência conduz ao fenômeno da carência de ação e conseqüente extinção do processo sem exame do mérito. As condições da ação, dizem, confundem-se com o mérito, por já haver, na sua aferição, de alguma forma, análise da própria pretensão de tutela do direito material (sua titularidade, necessidade, utilidade e possibilidade). E 127
9 PAULA SARNO BRAGA a carência de ação confunde-se, pois, com a improcedência da ação, conduzindo à extinção do processo com exame do mérito. E esse entendimento gera repercussões de duas ordens: i. teórica, pois se considera inexplicável o fenômeno que teria ocorrido no caso da chamada carência de ação. Se o autor é carecedor de ação e não houve julgamento de mérito, não teria havido ação? Não teria havido processo? E o que teria ocorrido até o momento da prolação da sentença? ii. prática, pois se a sentença de carência de ação (em verdade, improcedência macroscópica da ação) é de mérito, e não está mais sujeita a recurso, tem aptidão para fazer coisa julgada material, na forma dos art. 467 e 468, CPC, impedindo a repropositura da mesma demanda (cf. SILVA; GOMES, 1997, p. 117, 118, 125 e 129; PASSOS, 1960, p ; MARINONI, 2006, p. 181; DIDIER, 2011, P. 204; MITIDIERO, 2005, p. 109). A par dessas teorias, aos poucos foram surgindo posições intermediárias, a exemplo da teoria eclética e da asserção Teoria Eclética É usual a lição de que a teoria eclética é a própria teoria abstrativista, embora com o tempero que lhe foi ministrado pelo Enrico Tullio Liebman (ARAGÃO, 2002, p ). Mas, na verdade, essa nomenclatura se deve ao fato de ser uma tentativa de conjugar, conformar, as teorias concreta e abstrata, chegando-se a um meio-termo (MITI- DIERO, 2005, p. 104). E Alfredo Buzaid, ao elaborar o Código de Processo Civil de 1973, optou por adotar esta terceira teoria (art. 3.º e 267, VI, CPC), que seria a síntese de um exercício dialético em torno das duas (autonomistas) anteriores. Atenção! O Projeto do NCPC (n.º 8046/2010), art. 3., parece adotar teoria abstrata da ação, mas o art. 472, mantém o temperamento da teoria eclética, excluindo, contudo, do rol de condições da ação a possibilidade jurídica, nos seguintes termos: Art. 3.º Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito, ressalvados os litígios voluntariamente submetidos à solução arbitral, na forma da lei. 128
10 AÇÃO Art O juiz proferirá sentença sem resolução de mérito quando: (...) VI o juiz verificar ausência de legitimidade ou de interesse processual. Para a teoria eclética de Liebman, o direito de ação é considerado autônomo e independente, mas não universal (genérico) e incondicionado. Isso porque só é considerado seu titular o autor que, em concreto, tem direito a um julgamento de mérito, o que só ocorrerá se preenchidas as chamadas condições da ação (legitimidade, interesse e possibilidade). Seus adeptos sustentam que o direito de ação é o direito a uma prestação jurisdicional do Estado com um provimento sobre o mérito. É direito ao julgamento do mérito da causa, de forma favorável ou desfavorável. Daí dizer-se que o direito de ação não pressupõe a existência do direito material (autonomia), mas, isso sim, do preenchimento de dados requisitos (condições da ação), que tornam possível o julgamento, em concreto, do mérito. As condições da ação não se confundiriam, portanto, com o mérito, sendo estranhas e preliminares a ele requisitos de admissibilidade do seu exame, diz-se. Assim, ausente uma condição da ação, seria caso de carência de ação e extinção do processo sem exame do mérito, decisão esta que, por não ser de mérito, não faz coisa julgada material, e, a teor do art. 268, CPC, não impediria a repropositura da mesma demanda. Atenção! A Corte Especial do STJ considerou inadmissível a repropositura de demanda extinta por carência de ação (ilegitimidade), sem que se corrija o equívoco, preenchendo-se a condição da ação faltante (STJ, Corte Especial, Embargos de Divergência em REsp n.º SP, rel. p/ acórdão Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j , publicado no DPJ ; também assim, REsp n.º SP, 4.ª T, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j , DJ e REsp n.º SP, 3.ª T, rel. Min. Nilson Naves, j , DJ , por exemplo). Mas a doutrina alerta que, para preencher a condição da ação ausente, é necessário alterar um dos elementos da ação, o que não é, exatamente, repropor a mesma demanda. É propor nova demanda! (cf. FABRÍ- CIO, 2002, p. 393) 129
11 PAULA SARNO BRAGA A despeito da crítica, é o que se adota no Projeto de NCPC (n.º 8046/2010), art. 473, 1. : 1º No caso de ilegitimidade ou falta de interesse processual, a propositura da nova ação depende da correção do vício. É dada tanta relevância à categoria das condições da ação, que são consideradas matéria de ordem pública (art. 267, 3.º, CPC), cujo preenchimento pode ser averiguado a qualquer tempo e grau de jurisdição. Assim, é perfeitamente possível perda ou preenchimento superveniente de condição da ação. Segundo Liebman, é suficiente que as condições da ação, eventualmente inexistentes no momento da propositura desta, sobrevenham no curso do processo e estejam presentes no momento em que a causa é decidida (LIEBMAN, 2005, p. 204). Pelo mesmo motivo, seria indiferente que elas estivessem satisfeitas no momento da propositura da demanda se, no curso dela, vieram a faltar. Atenção! Nesse sentido, encontram-se julgados do STJ admitindo perda ou preenchimento superveniente de condições da ação, como, por exemplo: i. (...) Se a pretensão deduzida tinha por objeto a substituição de membro eleito para o conselho fiscal, a expiração do mandato para o exercício do cargo, antes do julgamento da causa, acarreta a superveniente perda do interesse de agir. (REsp n.º PR, 3.ª T., rel. Min. Nancy Andrighi, DJ ). ii. Perda da condição de proprietário pelo locador. (...) Ilegitimidade ativa superveniente. Revogação da dação em pagamento por decisão judicial, não constitui alienação de coisa litigiosa a título particular. (...) Destituído da propriedade do imóvel, o ex-locador não podia permanecer na lide vindicando indenização que, a rigor, não lhe é devida. (REsp n.º SP, 2.ª T, Rel. Min. Peçanha Martins, publicado no DPJ de ) iii. Reconhecendo possibilidade jurídica superveniente, também se disse que: A Lei nº 7.841/89 revogou, expressamente, o art. 358 do Código Civil, que vedava o pedido de investigação de paternidade pelo filho dito adulterino, com o que deu ensanchas a que fosse revisto o despacho que considerou, quando do ajuizamento da ação, não existir possibilidade jurídica (REsp n.º PR, 3.ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j , publicado no DPJ de ) 130
12 AÇÃO Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova do concurso público para provimento do Cargo de Juiz do TRT2, de 2009, considerou-se correta a afirmativa de que As condições da ação são consequentes e não antecedentes, ou seja, devem ser verificadas pelo juiz no momento em que a sentença será proferida. Assim, é possível, por exemplo, que o autor tivesse interesse de agir ao propor a ação e já não tenha mais quando do momento em que for julgada esta ação, quando, então, o juiz deverá extinguir o feito sem resolução do mérito. Afirma-se, ainda no contexto dessa teoria, que o direito constitucional e incondicionado de ação (com sua extrema abstração e generalidade) não tem nenhuma relevância para o processo, sendo um simples pressuposto (mero direito de agir, peticionar) em que se baseia a ação concreta e exercida (MARINONI, 2006, p. 168 e 169; CIN- TRA, DINAMARCO, GRINOVER, 2009, p. 271). E mais, para Liebman, a ação seria um poder correlato com a sujeição estatal e instrumentalmente conexo com uma pretensão material; não seria um simples direito, por não haver dever do Estado correspondente, vez que Estado também teria interesse na solução do conflito (CINTRA, DINAMARCO, GRINOVER, 2009, p. 271). Atenção! Hoje não há quem discuta que a Constituição Federal, ao consagrar a inafastabilidade da jurisdição (art. 5.º, XXXV), confere a todos um direito fundamental, público, subjetivo, abstrato e incondicionado de exigir do Estado a prestação jurisdicional. Ao lado da ação condicionada de Liebman, não há quem negue a ação abstrata, incondicionada e constitucional, que, para essa doutrina dominante, seria não um poder, mas um direito subjetivo a uma prestação jurisdicional. A configuração de conflito de interesse jamais poderá ser tida como essencial para a noção de obrigação do Estado de prestar a jurisdição. O obrigado pode ter o interesse em cumprir a obrigação e nem por isso ficará dela isento. Por isso, é comum falar-se em ação sob duas perspectivas: abstrata (incondicionada) e concreta/processual (condicionada), como adiante se verá. 131
13 PAULA SARNO BRAGA Como esse assunto foi cobrado em concurso? Na prova do concurso público para provimento do Cargo de Defensor da DPE/SP, de 2007 (FCC), foi cobrada questão sobre a visão eclética de Liebman, abaixo transcrita. Segundo Liebman, somente poderemos falar em ação quando o processo terminar com um provimento sobre o caso concreto, ainda que desfavorável ao autor. Essa asserção prende-se à qual teoria conceitual do direito de ação? a) Concretista relativa. b) Instrumental da ação. c) Abstrata pura. d) Concretista do direito de ação. e) Privatista do direito de ação. Considerando que teoria liebmaniana é usualmente considerada publicista e abstrata com temperamentos, foi considerada correta a letra b, tendo em vista ser a ação considerada um poder instrumentalmente conexo à pretensão material. Por outro lado, considerando as críticas dos abstrativistas puros à teoria eclética, no Concurso para provimento no cargo de Técnico Judiciário do TRT5, de 2008, considerou se correta a assertiva de que: Segundo os postulados da teoria eclética (Liebmam), adotada pelo CPC brasileiro, o direito de ação não está vinculado a uma sentença favorável, mas também não está completamente independente do direito material. Na prova do concurso público para provimento do Cargo de Promotor de Justiça do MP/GO, de 2009, constou questão sobre a natureza do direito de ação, abaixo transcrita. Das teorias sobre a natureza jurídica da ação é correto afirmar: a) A teoria civilista de Savigny considera que o direito de ação tem autonomia em relação ao direito material. b) A teoria do direito concreto (Bullow e Wach) não reconhece a autonomia do direito processual em relação ao direito material, de maneira que para a mesma tais direitos se identificam no exercitamento da pretensão. c) Para Enrico Tulio Liebman (teoria eclética), o direito de ação tem dois aspectos, o direito de demanda ou de acesso ou petição (incondicionado) e o direito de ação propriamente dito, que exige o preenchimento de condições a viabilizar o julgamento efetivo da pretensão deduzida. 132
14 AÇÃO d) A teoria do direito abstrato (Degenkolb e Plósz) preconiza que somente terá havido o exercício da ação se a tutela jurisdicional invocada for concedida. Pelo gabarito oficial, a resposta correta é a letra c, considerando a exposição das teorias mencionadas feita nesse item Teoria da asserção Tendo em vista o acirramento de ânimos entre abstrativistas puros e ecléticos na forma como deve ser visto o direito de ação e o seu condicionamento legal pela exigência de legitimidade, possibilidade e interesse (arts. 3.º e 267, VI, CPC), mais recentemente, surgiu e tem se difundido uma teoria de espírito conformador: a chamada teoria da asserção (ou prospecção) (vide MARINONI, 2006, p. 181 e 182; CÂMARA, 2002, p. 127; STJ, REsp n.º MG, 3ª T., Rel. Min. Nancy Andrighi, j , DJ , e REsp n.º MG, 2ª T., Rel. Min. Humberto Martins, j , DJ ; STJ, REsp n RS, 3.ª T., rel. Min. Nancy Andrighi, j , publicado no DJe de , dentre outros). Preservando a opção legislativa, reconhecem as condições da ação como categoria estranha e preliminar ao mérito, diferenciando a carência da ação (extinção da ação sem exame do mérito) da improcedência da ação (extinção da ação com exame do mérito), tal como consta em lei. Entretanto, enxergam as dificuldades doutrinárias existentes para extremar as condições da ação do mérito da causa, bem como a carência da improcedência, e explicar as repercussões práticas e teóricas dessa visão. Por conseguinte, propõem uma leitura diferenciada da lei, nos seguintes termos: i. Se as condições da ação forem aferidas no início do processo, à luz das primeiras afirmações do autor (in statu assertionis), em sua petição inicial, tomando-as como abstratamente verdadeiras, devem enquadrar-se como matéria estranha ao mérito, e, uma vez ausentes, conduzir à carência de ação e extinção do processo sem exame do mérito. Insista-se que a aferição pro- 133
15 PAULA SARNO BRAGA posta é em abstrato, sob pena de reconduzir-se a uma visão concretista da ação. ii. Se as condições da ação forem aferidas no curso do processo, sobretudo depois da produção de provas sobre o alegado, quando já investigada concretamente sua veracidade, devem enquadrar-se como matéria de mérito, e, uma vez ausentes, conduzir à improcedência de ação e extinção do processo com exame do mérito, por decisão agora apta a fazer coisa julgada. O enquadramento da legitimidade, possibilidade e interesse como condição da ação ou como mérito é algo que depende, para todos, do modo como são aferidas (em abstrato ou em concreto) e do momento em que são aferidas (existência ou não de dilação probatória) e, para alguns, do grau de cognição do juiz (superficial ou profundo). Para estes últimos, quando a cognição judicial é sumária e superficial, recaindo sobre o quanto afirmado em tese pelo autor, enquadram-se como condições da ação; quando sua cognição é mais aprofundada, recaindo sobre afirmações cuja veracidade já fora verificada mediante produção de provas, a análise já é de mérito (conferir visão crítica de DIDIER, 2011, p. 204). Para seus adeptos, a teoria da asserção tem o valor de revelar a verdadeira função das condições da ação, enquanto matéria estranha ao mérito, que é rejeitar o exercício manifestamente infundado da ação, evitando-se atividade processual inútil, em franco prestígio ao princípio da economia processual. Parece-nos, contudo, uma tentativa bem intencionada de preservar um instituto que não se sustenta. Independentemente de como e quando são analisadas, as condições se confundem com o mérito. Como esse assunto foi cobrado em concurso? No concurso público para provimento no cargo de Juiz do Trabalho Substituto 1ª Região, de 2010 (CESPE), exigiu-se conhecimento das teorias da ação, em especial, da asserção, na questão a seguir: 134
16 AÇÃO O réu de ação de cobrança alegou que não era devedor, pois não tinha com o autor relação de cunho negocial capaz de justificar a demanda. Ao analisar a defesa, o juiz afastou a preliminar sob o argumento de que, conforme narrativa do autor, era possível entender que o réu fosse, em tese, devedor. Além disso, o juiz considerou que o exame detido do tema demandava dilação probatória e que, portanto, seria atinente ao mérito. Com base na situação descrita, é correto afirmar que o juiz aplicou a teoria a) abstrata da ação. b) do direito potestativo de agir. c) concreta da ação. d) imanentista. e) da asserção. Foi considerada correta a letra e. No Concurso Público para provimento no cargo de Procurador da Fazenda Nacional de 2012 (ESAF), constou a questão abaixo. O direito de ação sempre foi um dos mais polêmicos temas da ciência processual, proliferando-se, ao longo da história, inúmeras teorias para explicá-lo. Sua importância se destaca, em especial, pois corresponde a um iniludível ponto de contato entre a relação jurídica material e a relação jurídica processual, sobretudo quando analisado sob a ótica do ato que dá início ao processo e delimita seu objeto litigioso. No Brasil, o direito positivo sofreu nítida influência da doutrina de Enrico Tullio Liebman, que, com sua teoria eclética da ação, propôs a categoria das condições da ação, alocadas entre os pressupostos processuais e o mérito da demanda. Sobre o tema, identifique a opção correta. a) O direito de ação pode ser atualmente identifica do como um direito público subjetivo, abstrato, autônomo da relação jurídica material, cuja exis tência dependerá da procedência da demanda proposta em juízo. b) Friedrich Carl Von Savigny, notável jurista alemão que se dedicou ao estudo profundo do direito romano, é citado pela doutrina como um adepto da teoria abstrativista, em decorrência da concepção de que se opera uma metamorfose no direito material quando lesado, transformando- se, assim, na actio. c) É da famosa polêmica entre Windscheid e Muther que percebemos significativo avanço na ciência processual. Associou-se a ideia da 135
17 PAULA SARNO BRAGA actio romana com a da pretensão de direito material, o que definiu a autonomia entre o direito material e o direito de ação, consubstanciando, assim, definitiva passagem da teoria concreta para a teoria abstrata da ação. d) Enrico TullioLiebman propôs a categoria das condições da ação, afirmando que, se não fossem preenchidas as três condições inicialmente formuladas, o autor seria carecedor do direito de ação. Para Liebman, essa ideia deveria ser interpretada à luz da teoria da asserção, segundo a qual as condições da ação são examinadas a partir das alegações do autor (in status assertionem). Caso fosse necessária a dilação probatória para aferir a presença das condições da ação, estaríamos diante de um julgamento de mérito e não mais de pura carência de ação. e) Um dos maiores expoentes da teoria do direito concreto de agir foi Adolf Wach, desenvolvendo suas ideias a partir da teorização da ação declaratória. Para nosso autor, o direito de ação efetivamente é autônomo em relação ao direito material, porém só existirá se a sentença ao final for de procedência. Segundo o gabarito oficial, a resposta correta consta na letra e. Atenção! Há quem distinga: a) Teoria da Apresentação, segundo a qual se a ausência de condições da ação for aferida no curso do processo (sobretudo depois da produção de provas), a decisão do juiz deve ser de carência da ação. Defende-se que a presença das condições da ação deve ser demonstrada, inclusive com provas. Confunde-se com a Teoria Eclética e com o previsto em lei. b) Teoria da Prospectação, segundo a qual se a ausência de condições da ação for aferida no curso do processo (sobretudo depois da produção de provas), a decisão deve ser de mérito. Tem prevalecido, e é representada por grandes nomes como Marinoni e Bedaque, Kazuo Watanabe. (CINTRA; DINAMARCO; GRINOVER, 2009, p. 279). Confunde-se com a Teoria da Asserção Quadro sintético Considerando as três últimas teorias, mais abordadas na atualidade, é possível fazer o seguinte quadro sintético de suas divergências: 136
18 AÇÃO Teoria abstrata Teoria eclética Teoria da asserção Conceito de ação Direito incondicionado a uma decisão Direito condicionado a uma decisão de mérito Direito condicionado a uma decisão de mérito Condições da ação Matéria de mérito (para alguns) Matéria estranha ao mérito Depende: i) Se aferidas no início do processo, matéria estranha ao mérito. ii) Se no curso do processo, mérito. Consequência para sua ausência Improcedência da ação (extinção com exame de mérito), para alguns Carência de ação (extinção sem exame de mérito) Depende: i) Se aferidas no início do processo, carência de ação. ii) Se no curso do processo, improcedência da ação. Imutabilidade Faz coisa julgada (para alguns) Não faz coisa julgada Faz coisa julgada se dada, no curso do processo, decisão de improcedência 2. AÇÃO ABSTRATA E CONCRETA. DEMANDA É possível falar, em nosso ordenamento, na ação sob uma perspectiva abstrata e sob uma perspectiva concreta. A ação abstratamente considerada é direito fundamental, autônomo, abstrato, público, subjetivo, incondicionado e universal (genérico), de provocar o exercício da jurisdição. A Constituição Federal, quando garante o acesso à justiça (inafastabilidade da jurisdição), no art. 5 o, XXXV, assegura a todos esse direito de exigir do Estado uma prestação jurisdicional, em qualquer situação. E a ação, enquanto direito, reveste-se de certa: i) complexidade, por assegurar o exercício jurisdição, através de um processo devido (democrático, equilibrado, leal, efetivo, tempestivo, adequado) não sendo, pois, garantia formal, mas, sim, qualificada; e 137
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