A presença das mulheres nas emissoras radiofônicas de Ponta Grossa entre as décadas de 1940 e 70 1

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1 A presença das mulheres nas emissoras radiofônicas de Ponta Grossa entre as décadas de 1940 e 70 1 GADINI, Sérgio Luiz Professor de Jornalismo UEPG. ALMEIDA, Amanda Milléo estudante de graduação de Comunicação Social/Jornalismo. Universidade Estadual de Ponta Grossa/Paraná RESUMO O rádio, além de entreter, serve de meio para retratar uma determinada época ou certo ambiente. Através do relato daqueles que produzem o conteúdo, é possível também perceber como este meio se mistura ao contexto da época e influencia a população. Tanto quanto os homens, as mulheres também tiveram sua participação na construção do imaginário pontagrossensse entre as décadas de 1940 e 70, seja pela criação de um novo penteado, uma nova maneira de rir ou até mesmo instigando a curiosidade de uma música proibida de tocar. PALAVRAS-CHAVE: Mulheres no rádio; História do Rádio; Radiodifusão em Ponta Grossa. Seja através de participações nas radionovelas, ou anunciando com sotaque caipira os pedidos de músicas famosas, ou ainda classificando e organizando toda a coleção de discos de uma emissora nova, o papel da mulher nas emissoras de rádio em Ponta Grossa teve grande relevância para a sociedade da época. As celebridades do rádio estavam presentes em diversos momentos do dia, apresentando programas de humor e entretenimento para as famílias que possuíam aparelhos de rádio em casa, aproximadamente pessoas em Ponta Grossa (QUAQUIO, 2005). No entanto, esta influência não se restringiu a apenas uma localidade (PG), atingia toda a região dos Campos Gerais. Alguns dos principais programas, como o Programa da Comadre Maria e o Gentilezas Caipiras recebiam cartas de diversas cidades do interior do estado, pedindo auxílio para vários problemas, desde roupas, calçados e remédios, até simpatias para casamento. Dentre os municípios que a programação atingia, estavam as cidades de Ipiranga, Imbituva, Piraí do Sul, Castro e Reserva, lembra Maria do Amparo Fernandez Diniz (2005). De acordo com o radialista Brasil Borba, o programa Gentilezas Caipiras também transmitia recados, como Atenção, Fazenda Tal, atenção morador de Ipiranga, 1 Trabalho apresentado no GT História da Mídia Sonora, componente do I Encontro Paraná/Santa Catarina de História da Mídia. 1

2 o seu primo quer entrar em contato com você. Atenção, a sua mãe está no hospital, mas está melhor. Era o elemento de recado, que naquele tempo funcionava muito bem (2005). Já os programas de auditório serviam de ponto de encontro dos cidadãos, bem como as praças de Ponta Grossa. Segundo a cantora Zemir Amélia Lermen, eram nos auditórios que os jovens, as famílias e os namorados se encontravam. Vários casais se conheceram e casaram através do programa de auditório. Inclusive, há o caso de um casal que se conheceu ali, se casaram e foram no auditório vestidos de noivos, relembra a cantora da dupla Gelson e Jane, (2005). Entre as décadas de 1940 e 70, diversas rainhas do rádio passaram pelas emissoras da cidade e fizeram parte da história de Ponta Grossa em diversas situações. Dentre as principais representantes femininas, Maria do Amparo Fernandez Diniz, Elizabeth Diniz, Maria Deolinda da Silva e Zemir Amélia Lermen, a qual fazia parte da dupla Gelson e Jane' (CARDOZO; LERMEN, 2005). As Mulheres no rádio e suas histórias O primeiro contato com este meio de comunicação foi bastante distinto entre as mulheres citadas. Maria do Amparo (2005) relata que, antes de iniciar sua carreira no rádio, ela nunca havia conhecido uma emissora. Após ser escolhida entre 25 mulheres para auxiliar a radialista Daisy Durski, no Programa da Comadre Daisy, Maria ficou mais de 20 anos trabalhando nas emissoras da cidade. Ela passou pela Rádio Clube PontaGrossensse, Rádio Difusora e Vila Velha AM. Os programas que apresentou tinham sempre a mesma linha. Segundo Maria, havia os mesmos recados, cartas, pedidos (2005). Desde simpatias a pedidos de casamento, os programas tinham por finalidade o entretenimento de uma sociedade pré-televisão, na qual o meio mais popular de divulgação de informações era o rádio. Para Maria Deolinda da Silva (2005), naqueles tempos a gente não tinha muita opção de lazer e divertimento. Havia vários programas de auditório nas emissoras, no sábado e no domingo. A história de Maria Deolinda com o rádio, ainda que rápida, marcou a sua vida e exemplifica como se davam os programas de auditório em Ponta Grossa. Convidada pelas amigas, a jovem foi assistir a um programa de auditório na Rádio Difusora. Na época, década de 1970, segundo ela, esta rádio, em determinados domingos, escolhia 2

3 algumas pessoas para participarem do concurso Rainha do Ano. Como poucas moças haviam subido ao palco no momento da chamada, alguns funcionários foram até o auditório e escolheram outras jovens. Maria Deolinda estava entre elas. Após desfile e aplausos, Maria recebeu o título de Rainha do Ano (SILVA, 2005). Maria Deolinda conta que os programas de auditório eram muito comuns, especialmente nos sábados e domingos devido à falta de opção para o lazer na cidade. Juntamente com esses programas, havia os shows. Eu lembro que assisti a uns dois shows. Era show comum, com músicas caipiras. Com calouros, eu não tenho lembrança, relembra a Rainha do Ano. Duplas sertanejas já existiam nesta época. Em 1965 surge o programa Festa na Estância, apresentado pela dupla Gelson e Jane, ou Valdemiro Cardozo e Zemir Amélia Lermen. Este foi o primeiro contato de Zemir com o rádio. Durante o programa, que era de auditório, havia apresentações de duplas sertanejas, músicas caipiras e distribuição de presentes ao público. A dupla cantava músicas românticas no estilo gaúcho, sertanejo e boleros. Como era raro quem tivesse telefone em casa na época, era através de cartas que a população da cidade demonstrava a popularidade que o programa, bem como a dupla de cantores, tinha em Ponta Grossa e região. Outro programa apresentado pela dupla foi o Rodeio dos Pampas, o qual seguia a mesma linha que o anterior. Éramos reconhecidos onde a gente passava. Daquela praça ali do terminal central, que não existia ali naquele lugar na época, até o Ponto Azul a gente parava umas dez vezes, explica a cantora. Zemir, ou Jane, também mostra como a presença feminina nos programas radiofônicos influenciava a sociedade da época. A maneira de falar, de se portar, de dar risada e até mesmo o jeito de se vestir era pautada pelas figuras do rádio. Zemir relata que as mulheres de Ponta Grossa buscavam nos salões de beleza penteados como o que ela usava. Segundo ela, as jovens tentavam copiar a nossa risada, porque eu sempre tive uma gargalhada marcante. A cantora fazia outros trabalhos envolvendo o rádio na época. Ela relata que, toda manhã, às 5 horas, abria a programação da rádio Sant Anna. Mas, com o passar do tempo, a cantora e radialista foi se afastando das suas atividades. Atualmente faz 30 anos que ela se afastou do rádio. Até porque, segundo Zemir, em Ponta Grossa é difícil ganhar dinheiro no rádio (2005). A radialista Maria do Amparo também possui a mesma visão. Segundo ela, o dinheiro que vinha do rádio era através dos anúncios publicitários. 3

4 Quando o salário estava baixo, era preciso buscar alternativas, como o trabalho em campanhas eleitorais. As mulheres e a política da época Pela história narrada por Maria do Amparo, é possível perceber que as mulheres também participavam de questões sociais da época, como as próprias eleições. Outra radialista que também tem uma passagem atrelada às questões políticas de Ponta Grossa é a filha de Maria do Amparo, Elizabeth Diniz. Quando Elizabeth começou no rádio, em 1973, ela tinha apenas 18 anos e procurava um emprego que envolvesse a música. Trabalhou por 12 anos como discotecária. A sua relação com a ditadura militar teve início com as escolhas das músicas que podiam e as que não podiam ser tocadas nos programas. Segundo ela, Eu faço parte da geração da alienação da ditadura e cresci ouvindo a Jovem Guarda. Eu sabia da existência dos festivais, conhecia, mas não era bem aquilo que eu curtia na época. Não entendia nada. Imagine um adolescente criado na ditadura, onde existia uma disciplina chamada Educação Moral e Cívica na escola, onde dizia que tudo era proibido, censurado. Só que eu não sabia ler as entrelinhas. ( ) Mas com o tempo passei a ouvir, analisar e comparar com a Jovem Guarda, com os festivais da Record, onde começou Chico Buarque, a Nara Leão, o Tom Zé, o Taiguara, Geraldo Vandré e comecei a pôr na programação esse tipo de música (DINIZ, 2005). Elizabeth conta que quando os discos eram recolhidos e chegavam as cartas recomendando que a rádio parasse de tocar determinada música despertava certa curiosidade nos jovens em entender o que estava escondido nas letras e melodias. A discotecária conta que foi nesta época os princípios da pirataria, mas na época não havia tal denominação. Quando Elizabeth iniciou o programa Rádio Mulher, alguns colegas davam início à vida política. Neste período, a radialista aprendeu que não era possível falar certos nomes no microfone, como recitar poesias escritas pelos amigos. A rádio em que Elizabeth trabalhava pertencia então ao atual prefeito de Ponta Grossa, Luiz Carlos Zuk. Certo dia, a prefeitura iria cortas as árvores em frente ao antigo Colégio São Luiz, atualmente Colégio Sant Anna, na Praça Barão do Rio Branco. Elizabeth e alguns amigos da universidade decidiram subir nas árvores e impedir o corte. Aí havia uma contradição, pois eu era funcionária da Rádio Clube, que era do prefeito e estava protestando contra uma atitude de sua administração. No momento do fato, eu já fui 4

5 mandada embora, explica. Outro fato curioso narrado por Elizabeth foi quando agentes da polícia irromperam uma emissora da cidade, simulando uma invasão de quartel para procurar cidadãos contra o sistema político vigente. Segundo a radialista, aqueles soldados invadiram a emissora armados, a gente não sabia de nada e muito menos o que estava acontecendo. Você sabe que, na época, com raras exceções, crescíamos alienados. Não sabíamos direito o que acontecia na vida política do país (2005). Após a Rádio Clube, a radialista foi trabalhar na rádio Sant Anna, na qual fazia a mesma função de discotecária e apresentava programas de variedades. Enquanto estava na graduação, Elizabeth divulgava intensamente os eventos da universidade. Depois de formada, virou professora e abandonou a carreira de radialista. As Radionovelas de Ponta Grossa Outra característica do rádio na época, apontado pela Rainha do Ano, Maria Deolinda, eram as radionovelas. Segundo ela, os enredos das novelas eram muito parecidos, mas sempre mexiam com o imaginário dos ouvintes. Eu vejo por mim, porque quando eu escutava o vozeirão do locutor ( ). Eu acredito que muitas jovens, até mesmo senhoras sentiram muitas emoções ouvindo esses vozeirões, explica Maria Deolinda (2005). Entre os vozeirões da época estavam a radialista Daisy Durski e sua irmã, Viviane Durski, as quais participavam das radionovelas. Mesmo sem patrocínio para custear a produção, as radionovelas iam ao ar, duas a três vezes por semana, entre as 21 e 22 horas (BORBA, 2005). Os efeitos desenvolvidos para as produções encantavam até mesmo quem era do ramo, como a Maria do Amparo, ou a Comadre Maria, que auxiliava a Comadre Daisy em seu programa. Segundo Maria do Amparo, os efeitos sonoros eram uma delícia ver (2005). Ela ainda relembra que, mesmo com as grandes produções do Rio de Janeiro e São Paulo, por exemplo, a trama O Sheik de Agadir, as radionovelas apresentadas na cidade eram escritas por radialistas pontagrossensses, como Brasil Borba e Oscar Puppini. Muitas das vozes femininas nas radionovelas eram funcionárias da recepção das próprias rádios, relata Maria do Amparo (2005). Segundo o radialista Aldo Mikaeli (2004), a Rádio Clube foi a pioneira na produção de radionovela e, devido a dificuldade em se conseguir uma equipe boa para as apresentações, só foram feitas duas histórias. 5

6 Os programas de auditório Ao longo da programação do programa de auditório, Festa na Estância, apresentado pela dupla Gelson e Jane, a cantora Zemir Amélia Lermen, também conhecida por Jane relata que eram sorteados brindes aos presentes. Estes agrados eram fornecidos pelo comércio da região, como pacotes de café, jogos de chá, aparelhos de jantar, entre outros. E, aqueles que fossem sorteados, recebiam também um castigo. A gente dava risada juntos no auditório, porque quando o pessoal ganhava o brinde, a gente perguntava: Vai beijar? e poderia beijar o Gelson, o próprio colega, o companheiro ou quem estivesse junto. O auditório vibrava: Beija! Beija!, explica a cantora (2005). De acordo com Zemir, ou Jane, os programas de auditório sempre agrupavam um grande número de pessoas. Algumas ficavam sentadas no próprio palco. Era preciso fechar a porta para que ninguém mais entrasse e, mesmo assim, havia quem ficasse na escada de acesso à emissora. A rádio em que o programa que a dupla Gelson e Jane se apresentava era a PRJ2, e no seu auditório cabiam aproximadamente 500 pessoas (CARDOZO; LERMEN, 2005). REFERÊNCIAS: GADINI, S.L. "A Rede de Alto Falantes como espaço de prestaçao de serviço publico". In: WOITOWICZ, K.J. (rog). Recortes da midia alternativa: Historias & memorias da comunicação no Brasil. Ponta Grossa: Editora UEPG, Pp: QUAQUIO, J. Informação e Entretenimento nas ruas. Memórias de uma época em que as notícias e o lazer circulavam na praça ou logo ali na esquina. Texto de Projeto PIBIC/UEPG, realizado em 2005, sob orientação do professor Sérgio Luiz Gadini. Woitowicz, Karina Janz. Recortes da mídia alternativa Histórias & memórias da comunicação no Brasil. Ponta Grossa: Editora UEPG, Entrevistas: Aldo Mikaelli. Entrevista realizada em Ponta Grossa, em 8 de dezembro de

7 Brasil Borba. Entrevista realizada em Ponta Grossa, em 1 de abril de Maria do Amparo Fernandez Diniz & Elizabeth Diniz. Entrevista realizada em Ponta Grossa, em 30 de julho de Maria Deolinda da Silva. Entrevista realizada em Ponta Grossa, em 24 de junho de Valdemiro Cardozo e Zemir Amélia Lermen. Entrevista realizada em Ponta Grossa, em 31 de julho de