O QUE DISTINGUE A GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DOS SERVIDORES PÚBLICOS MILITARES NA VISÃO DO E. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
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- Ângela Nunes Peralta
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1 O QUE DISTINGUE A GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DOS SERVIDORES PÚBLICOS MILITARES NA VISÃO DO E. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. A RECENTE DECISÃO MONOCRÁTICA NA RECLAMAÇÃO Nº Gina Copola (fevereiro de 2.015) 1. Brevíssima introdução ao tema: A Excelentíssima Ministra CÁRMEN LÚCIA, do e. Supremo Tribunal Federal, decidiu muito recentemente em decisão monocrática proferida nos autos da Reclamação nº que a posição que vem sendo adotada pela egrégia Suprema Corte com relação à greve dos servidores públicos civis sobretudo nos tão decantados Mandados de Injunção nº 670 e nº não se aplica aos militares. Isso porque, segundo a Ministra CÁRMEN LÚCIA, para os militares existe vedação expressa de realização de greve preconizada no art. 142, 3º, inc. IV, da Constituição Federal, que reza: Art. 142 (...) Advogada militante em Direito Administrativo. Pós-graduada em Direito Administrativo pela FMU. Professora de Direito Administrativo na FMU. Autora dos livros Elementos de Direito Ambiental, Rio de Janeiro: Temas e Idéias, 2.003; Desestatização e terceirização, São Paulo: NDJ Nova Dimensão Jurídica, 2.006; A lei dos crimes ambientais comentada artigo por artigo, Minas Gerais: Editora Fórum, 2.008, e 2ª edição em 2.012, e A improbidade administrativa no Direito Brasileiro, Minas Gerais: Editora Fórum, 2.011, e, ainda, autora de diversos artigos sobre temas de direito administrativo e ambiental, todos publicados em periódicos especializados. 1 O egrégio Supremo Tribunal Federal decidiu nos Mandados de Injunção nº 670 e nº 708, decidiu de forma cristalina que devem ser aplicadas as Leis nº 7.701/1988 e nº 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis.
2 3º Os membros das Forças Armadas são denominados militares, aplicando-se-lhes, além das que vierem a ser fixadas em lei, as seguintes disposições: (...) IV ao militar são proibidas a sindicalização e a greve; (Grifamos) Com todo efeito, com fulcro no dispositivo constitucional supratranscrito a Exa. Ministra conclui que a greve de servidor civil não é estendida a militares, e, com isso, decretou a improcedência da Reclamação interposta pela Associação Representativa dos Subtenentes e Sargentos Ativos e Inativos da PM e do CBM do Distrito Federal, entendimento com o qual concordamos desde já O direito de greve dos servidores públicos civis conforme o entendimento do egrégio Supremo Tribunal Federal: A Constituição Federal, em seu art. 37, inc. VII, com a redação que lhe foi dada pela Emenda Complementar nº 19, de 4 de junho de 1.998, dispõe sobre o direito de greve no serviço público, e reza que Art. 37 (...) VII o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Grifamos) Denota-se, portanto, que a norma constitucional do art. 37, VII, da Magna Carta, é de eficácia limitada, porque depende de lei específica que a regulamente para sua perfeita aplicação. Tal lei específica, porém, e que é necessária para dar plena eficácia ao indigitado dispositivo constitucional, não foi editada até hoje mês de fevereiro de
3 Ocorre, porém, que diante da omissão legislativa que se verifica, a greve no serviço público tem sido perfeitamente admitida pela jurisprudência pátria, com fulcro na Lei federal nº 7.783, de 1.989, que a seu turno, disciplina a greve para os trabalhadores em geral. Nesse exato diapasão, já decidiu o e. Supremo Tribunal Federal, em Mandado de Injunção nº 708-Distrito Federal, rel. Ministro GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/2007, com o seguinte excerto da ementa: 4.2 Considerada a omissão legislativa alegada na espécie, seria o caso de se acolher a pretensão, tão-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos civis (CF, art. 37, VII). (...) 6.6. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis. No mesmo sentido, decidiu o e. STF, no Mandado de Injunção nº 670-Espírito Santo, rel. Ministro MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 25/10/
4 E o mesmo e. STF, em Mandado de Injunção nº 485-Mato Grosso, rel. Ministro Maurício Corrêa, Tribunal Pleno, já decidiu anteriormente em 25/04/2002 que: EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO LEGISLATIVA. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. 1. Servidor público. Exercício do direito público subjetivo de greve. Necessidade de integralização da norma prevista no artigo 37, VII, da Constituição Federal, mediante edição de lei complementar, para definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público. Precedentes. 2. Observância às disposições da Lei 7.783/89, ante a ausência de lei complementar, para regular o exercício do direito de greve dos serviços públicos. Aplicação dos métodos de integração da norma, em face da lacuna legislativa. Impossibilidade. A hipótese não é de existência de lei omissa, mas de ausência de norma reguladora específica. Mandado de injunção conhecido em parte e, nessa parte, deferido, para declarar a omissão legislativa. Entendimento diverso, porém, é o proferido por MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO 2, para quem a Lei nº 7.783/89 não pode ser aplicada aos servidores públicos. Vejamos: Já com relação ao direito de greve, a situação é outra, porque o artigo 37, VII, exige expressamente lei específica que lhe defina os limites. O direito de greve do trabalhador, 4 2 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo, 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2.000, p. 441.
5 referido no artigo 9º da Constituição, foi disciplinado pela Lei nº 7.783, de , cujo artigo 16 estabelece que, para os fins previstos no artigo 37, inciso II, da Constituição, lei complementar definirá os termos e os limites em que o direito de greve poderá ser exercido ; quis o legislador deixar bem claro que as disposições dessa lei não se aplicam aos servidores públicos. Ocorre, por outro lado, que a omissão legislativa não pode furtar dos servidores públicos o direito de greve, garantido pela Constituição Federal, conforme bem ensina o professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO 3 : A Constituição reconhece aos servidores públicos direito à livre associação sindical (art. 37, VI), e direito de greve a ser exercida nos termos e limites definidos em lei específica (art. 37, VII). O STF considera que o inciso VII ou seja, o que cogita do direito de greve é norma de eficácia limitada; logo, não eficaz até que sobrevenha a lei infraconstitucional. Reputamos errônea esta intelecção. Entendemos que tal direito existe desde a promulgação da Constituição. Deveras, mesmo à falta da lei, não se lhes pode subtrair um direito constitucionalmente previsto, sob pena de se admitir que o Legislativo ordinário tem o poder de, com sua inércia até o presente, paralisar a aplicação da Lei Maior, sendo, pois, mais forte do que ela. Entretanto, é claro que, para não decair da legitimidade da greve, os paredistas terão que organizar plantão para atender a determinadas situações: as de urgência ou que, de todo modo, não possam ser 5 3 MELLO, Celso Antônio Bandeira de, Curso de Direito Administrativo, 19ª ed. São Paulo: Malheiros, 2005, pp. 262/263.
6 genérica e irrestritamente subtraídas à coletividade sem acarretar danos muito graves ou irreparáveis. De fato, a atual Constituição não é individualista, e expressamente prestigiou os chamados direitos coletivos e difusos, como muito bem disse Lúcia Valle Figueiredo em reforço à sua correta e oportuna observação de que o direito de greve não pode esgarçar os direitos coletivos, sobretudo relegando serviços que ponham em perigo a saúde, a liberdade ou a vida da população. (Grifos originais) 6 3. Serviços essenciais e princípio da continuidade do serviço público: Observa-se, portanto, que a mais autorizada doutrina admite perfeitamente a greve no serviço público, desde que, porém, tal paralisação não prejudique os serviços essenciais, acarretando, com isso, danos muito graves ou irreparáveis à população. Os serviços essenciais são aqueles definidos pelo art. 10, da Lei federal nº 7.783, de 28 de junho de São eles: a) tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; b) assistência médica e hospitalar; c) distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; d) funerários; e) transporte coletivo; f) captação e tratamento de esgoto e lixo; g) telecomunicações; h) guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; i) processamento de dados ligados a serviços essenciais; j) controle de tráfego aéreo, e k) compensação bancária. Com todo efeito, é de império que seja observada a continuidade dos serviços públicos, ou seja, o serviço público não pode ser paralisado, salvo em situação de emergência.
7 Sobre o princípio da continuidade dos serviços públicos, ensina ALINE PAOLA CORREA BRAGA CÂMARA DE ALMEIDA 4 : A continuidade revela o serviço prestado de forma permanente, sem qualquer interrupção e tem origem no princípio da obrigatoriedade do desempenho da atividade pública. Vincula-se, outrossim, à dignidade da pessoa humana, na medida em que sua interrupção impede o acesso a atividades consideradas essenciais. A única ilação possível, portanto, é no sentido de que o serviço deve ser prestado de forma contínua, sem interrupção, em atendimento ao princípio da dignidade da pessoa humana, já que a coletividade tem direito aos serviços públicos, e tal direito se sobrepõe a qualquer direito individualizado ou de um determinado grupo de servidores públicos de realizar movimentos de greve ou paralisação de serviços públicos. LEONARDO MOTTA ESPÍRITO SANTO 5, a seu turno, entende que a prestação das atividades do Estado não pode ser paralisada em função de greve, conforme se lê de excerto por ele produzido. Vejamos: Entende-se que a prestação das atividades do Estado não pode ser paralisada em função do exercício do direito de greve, admitindo-se apenas uma redução na prestação dos serviços, com ampla divulgação da mesma à coletividade e que não seja obstruída a fruição da prestação dos serviços, sem prejuízo aos particulares. 7 4 ALMEIDA, Aline Paola Correa Braga Câmara de, As tarifas e as demais formas de remuneração dos serviços públicos, Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2.009, pp. 134/ SANTO, Leonardo Motta Espírito, Curso prático de Direito Administrativo (co-autor), 2ª ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 44.
8 E o nobre advogado traz à colação jurisprudência exatamente no sentido de que defende. Leia-se: Administrativo. Processual civil. CND. Greve dos fiscais da Receita Federal. Direito assegurado pela Constituição. Honorários. 1. O direito a certidão em repartições públicas é assegurado constitucionalmente. Não pode o contribuinte sofrer prejuízos em razão de greve dos Fiscais da Receita Federal. Correta a sentença a quo que manteve a liminar deferida no sentido da concessão da CND (TRF da 1ª Região, Relator Juiz Hilton Queiroz, DJ de 4/6/1999). Greve. Funcionários do Ministério da Economia e da Fazenda. Certificado. Ausência. O particular não pode ser prejudicado pela paralisação dos serviços públicos. Se não há a realização de vistoria para o desembaraço de mercadorias em decorrência de greve dos servidores, devem as mesmas ser liberadas para que o particular não sofre prejuízos. (STJ, REsp /SP, 1ª Turma, Relator Ministro Garcia Vieira, DJ 2/3/1998). Observa-se, portanto, que a greve no serviço público, apesar de garantida pela jurisprudência do e. Supremo Tribunal Federal, não pode causar prejuízos à coletividade, ou a particulares que dependam da realização do serviço para a consecução de seus objetivos e necessidades. Ainda sobre a conciliação do direito de greve com o princípio da continuidade dos serviços públicos, ensina ODETE MEDAUAR, citada por 8
9 9 LEONARDO MOTTA ESPÍRITO SANTO e MARIA DE LOURDES FLECHA DE LIMA XAVIER CANÇADO 6 : em geral, a conciliação do direito de greve com o princípio da continuidade se realiza pela observância de antecedência mínima na comunicação do início da greve e pela manutenção de um percentual de funcionamento das atividades. Sim, porque a greve tem que ser anunciada antes à população avisada através dos meios de comunicação e os grevistas precisam manter um percentual de servidores trabalhando para o fim de que os serviços não sejam paralisados, em decorrência do princípio da continuidade dos serviços públicos. 4. O desconto dos dias parados: Existe, ainda, outra relevante questão que merece também destaque, que é a relativa ao desconto dos dias parados do servidor que participa de greve. Pergunta-se: se a greve no serviço público depende ainda de regulamentação através de lei específica ainda não editada, então o servidor grevista deve ter os dias parados descontados de seu vencimento? A jurisprudência já decretou que não. É o que se lê do r. acórdão proferido pelo e. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em Agravo de Instrumento nº SE, rel. Desembargador federal Luiz Alberto Gurgel de Faria, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 29/6/2004, com a seguinte ementa 7 : Greve. Desconto dos dias parados. Impossibilidade. Constitucional e administrativo. Serviço público. 6 SANTO, Leonardo Motta Espírito, CANÇADO, Maria de Lourdes Flecha de Lima Xavier, Curso prático de Direito Administrativo (co-autores), 2ªed. Belo Horizonte: Del Rey, 2.004, p BDA Boletim de Direito Administrativo, ed. NDJ, nov./05, p
10 1. Não tendo sido apreciada pelo Juízo a quo, a questão acerca da inadequação da via eleita não merece conhecimento, sob pena de supressão de instância. Preliminar não conhecida. 2. O recurso apresenta-se tempestivo, pois a intimação se deu em , enquanto que a agravante interpôs o agravo em , portanto, dentro do prazo previsto na legislação processual (arts. 522 c/c 188 do CPC). Preliminar rejeitada. 3. O inc. VII do art. 37 da Constituição Federal, que estabelece o exercício do direito de greve pelos servidores públicos, nos termos e limites definidos em lei específica, encerra uma norma de eficácia limitada. 4. Nada obstante, o longo período já transcorrido sem a regulamentação desse direito não pode inviabilizar, por completo, o seu exercício, de modo que os dias parados não devem ser descontados da remuneração do servidor. 10 (Grifos originais) 5. Agravo de instrumento improvido. 5. Brevíssima conclusão: Conclui-se, portanto, ante todo o aqui exposto, que a Constituição Federal garante o direito de greve ao servidor público civil, conforme se lê do art. 37, inc. VII, da Magna Carta. Ocorre, entretanto, que o mencionado dispositivo constitucional prevê a necessidade de edição de lei específica que regulamente a greve
11 no serviço público, e tal lei, contudo, ainda não foi editada, motivo pelo qual não existe legislação que regule de modo claro e definitivo a greve no serviço público brasileiro, nem tampouco que delimite seus contornos. Tem-se, ainda, que diante dessa omissão legislativa, a jurisprudência superior tem entendido que a greve do servidor público é regulada pela Lei federal nº 7.783/89, que, por sua vez, trata do movimento de greve para os trabalhadores em geral. Observa-se, assim sendo, que a greve no serviço público civil tem sido admitida pela jurisprudência brasileira, porém não pode paralisar por completo serviços essenciais, nem tampouco furtar a coletividade da prestação de serviços públicos de modo a lhes causar danos irreparáveis. Quanto aos servidores públicos militares, o e. Supremo Tribunal Federal, por decisão monocrática da Ministra CÁRMEN LÚCIA, proferida em 2 de fevereiro de 2.015, e publicada em 11 de fevereiro de 2.015, entende que a greve é vedada por força do art. 142, 3º, inc. IV, da Constituição Federal, e, que de tal sorte, as decisões do colendo STF sobre greve do servidor público civil não são estendidas aos militares. Concordamos com tal abalizado entendimento com arrimo no dispositivo constitucional invocado. 11
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Superior Tribunal de Justiça
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