Parecer. Por comunicação escrita dirigida ao Senhor Bastonário em (...) de 2018, a Exm.ª Senhora Dr.ª (...), solicita a emissão de parecer, porquanto:
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1 Processo n.º 35/PP/2018-G Requerente: (...) Relatora: Dra. Isabel Malheiro Almeida Parecer Por comunicação escrita dirigida ao Senhor Bastonário em (...) de 2018, a Exm.ª Senhora Dr.ª (...), solicita a emissão de parecer, porquanto: 1.- À Senhora Dr.ª (...) foi outorgada procuração forense por uma Senhora, com vista a tratar da resolução extrajudicial de um litígio com (...), tendo procedido ao envio da referida procuração por e por carta. 2.- Após ser informada da não recepção da referida procuração pel(...), a Senhora Advogada deslocou-se pessoalmente à sede da referida sociedade tendo procedido à entrega da procuração em mão. 3.- É depois surpreendida com um d(...) que refere que a documentação recebida será dada como inválida, uma vez que não se encontra autenticada e não faz menção ao número do documento de identificação do Procurador. Uma Procuração que não faça menção aos dados identificativos do Procurador ou que refira apenas os dados da Cédula Profissional não cumpre com os requisitos de prevenção de branqueamento de capitais, pelo que deverá sempre ser anexo à Procuração Cópia de Documento identificativo do Cliente e Procurador. 4.- Mais refere (...) que, deverá V. exa. enviar a seguinte documentação, para a morada (...): Procuração Original ou Cópia com poderes específicos ao (...) com Termo de Autenticação do Cartório/Notário; Cópia dos documentos identificativos do Procurador e Cliente. 5.- Entende a Senhora Advogada que o conteúdo do é abusivo e impeditivo do exercício da advocacia. 1
2 Cumpre nos dizer: Primeiramente importa referir que o Mandato é o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais actos jurídicos por conta da outra, como o refere o art.º 1157.º, do Código Civil. O contrato de mandato não está, por regra, sujeito a forma escrita, ao contrário do que sucede com a outorga de procuração a conferir poderes de representação ao mandatário, a qual de acordo com o disposto no art.º 262.º, n.º 2, do Código Civil, reveste a forma exigida para o negócio que o procurador deva realizar. O contrato de mandato forense é um contrato de mandato atípico que tem por objecto o exercício do patrocínio judiciário e que se consubstancia na prática pelo mandatário de actos jurídicos por conta e em nome do mandante. No entanto, importa realçar que este contrato não se esgota nos interesses do mandante e do mandatário, tutelando de igual modo um interesse de ordem pública, uma vez que é o modo de assegurar aos cidadãos uma assistência técnico- jurídica prestada por alguém qualificado, o que se demonstra essencial à boa administração da justiça, conforme preceituado pelo art.º 208.º da Constituição da República Portuguesa. E o exercício do mandato forense regese pelas normas do Estatuto da Ordem dos Advogados, nomeadamente pelo disposto nos art.ºs 97.º a 107.º., não se exigindo qualquer formalidade na concretização do mandato. Aliás, dispõe o art.º 43.º do Código de Processo Civil que, o mandato judicial pode ser conferido por instrumento público ou por documento particular, nos termos do Código do Notariado e da legislação especial, ou por declaração verbal da parte no auto de qualquer diligência que se pratique no processo. Depois, importa atentar no disposto no Decreto-Lei nº. 267/92, de 28 de Novembro, que no seu artigo único, preceitua que as procurações passadas a advogados para a prática de actos que envolvam o exercício do patrocínio judiciário, ainda que com poderes especiais, não carecem de intervenção notarial, devendo o mandatário certificar-se da existência, por parte do mandante, dos poderes para o acto. 2
3 Tudo isto por uma questão de celeridade e de necessidade de eliminar formalismos desnecessários, bem como a fé de que gozam os actos praticados por advogado, como o preâmbulo do diploma o refere. E bem continua o referido preâmbulo quando refere que, sendo o advogado um elemento essencial à aplicação da justiça, a sua actividade não se compagina com a existência de formalismos susceptíveis de porem em causa a razão pela qual lhe é conferido o patrocínio do cidadão em nome de quem a justiça é administrada. Ora, se para o mandato judicial está o Advogado dispensado de formalidades, por maioria de razão também está dispensado de formalidades qualquer mandato forense, uma vez que o mandato judicial mais não é do que o mandato forense. Aliás, preceitua o art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa, no seu n.º 2, que, todos têm direito, nos termos da lei, à informação e consulta jurídicas, ao patrocínio judiciário e a fazer-se acompanhar por advogado perante qualquer autoridade. (s.n.n.). Uma vez mais, e a propósito, chamamos à colação o prolatado no Parecer 32/PP/2017-G deste Conselho Geral, de 29 de Setembro, que muito bem refere que, numa sociedade cada vez mais complexa e em que os direitos e deveres dos cidadãos resultam das mais diversas fontes, a participação destes de forma eficaz e verdadeiramente capaz apenas pode acontecer caso exista a possibilidade de se ser assessorado por alguém apto a entender a complexidade técnico -jurídica da situação, nas suas mais variadas vertentes. Quem melhor do que o advogado para o fazer? Depois, o art.º 69.º do E.O.A., preceitua que, sem prejuízo do disposto no n.º 4 do artigo 66.º, que os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor não podem ser impedidos, por qualquer autoridade pública ou privada, de praticar atos próprios da advocacia. E acresce que, o art.º 72.º, n.º 1 do mesmo Estatuto, preceitua que, os magistrados, agentes de autoridade e trabalhadores em funções públicas devem assegurar aos advogados, aquando do exercício da sua profissão, tratamento compatível com a dignidade da advocacia e condições adequadas para o cabal desempenho do mandato, o que se encontra reforçado pelo art.º 12.º, n.º 1, da Lei orgânica do Sistema 3
4 Judiciário, que prescreve que, o patrocínio forense por advogado constitui um elemento essencial na administração da justiça e é admissível em qualquer processo, não podendo ser impedido perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada. Dúvidas não restam pois de que não pode (...) exigir à Senhora Advogada qualquer autenticação da procuração forense ou quaisquer cópias de documentos identificativos do Mandante ou do Mandatário, adoptando assim procedimentos contra legem. Mas mesmo que assim não fosse, no que apenas por mera hipótese académica se concebe, acrescentamos ainda que improcederia o artifício utilizado como fundamento para a obtenção de cópias dos documentos de identificação de Mandante e Mandatário, alicerçados nos requisitos de prevenção de branqueamento de capitais. As obrigações das instituições financeiras destinadas a assegurar a prevenção, entre outras realidades, do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo estão preceituados na Lei 83/2017, de 18 de Agosto e no que respeita ao dever de identificação, preceituam os art.ºs 23.º e 42.º que, devem as entidades obrigadas observar procedimentos de identificação e diligência relativamente aos clientes, aos respectivos representantes e aos beneficiários efectivos, quando: a) Estabeleçam relações de negócio; b) Efetuem transações ocasionais: de montante igual ou superior a euros (independentemente de a transação ser realizada através de uma única operação ou de várias operações aparentemente relacionadas entre si); que constituam uma transferência de fundos de montante superior a euros; de montante igual ou superior a euros (independentemente de a transação ser realizada através de uma única operação ou de várias operações aparentemente relacionadas entre si), no caso específico dos (i) concessionários de exploração de jogo em casinos, (ii) concessionários de exploração de salas de jogo do bingo, (iii) entidades pagadoras de prémios de apostas e lotarias e (iv) entidades abrangidas pelo Regime Jurídico dos Jogos e Apostas Online, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 66/2015, de 29 de abril; 4
5 c) Se suspeite que as operações, independentemente do seu valor e de qualquer exceção ou limiar, possam estar relacionadas com o branqueamento de capitais ou com o financiamento do terrorismo; d) Existam dúvidas sobre a veracidade ou a adequação dos dados de identificação dos clientes previamente obtidos. E se tais obrigações existissem ou se existiram, deveriam ser preocupações da instituição financeira a jusante e não apenas quando aparece o litígio. E procedimentos de identificação não são cópias de documentos de identificação. A identificação faz-se por norma por exibição do cartão do cidadão. Aliás, conforme e bem refere o n.º 2 do art.º 5 da Lei 7/2007, de 05 de Fevereiro, está interdita a reprodução do cartão de cidadão em fotocópia ou qualquer outro meio sem consentimento do titular, salvo nos casos expressamente previstos na lei ou mediante decisão de autoridade judiciária. Ao actuar como actua, (...) [a instituição financeira] solicita documentos que bem sabe que não pode licitamente obter ou deter, sob pena de se sujeitar à punição prevista no art.º 43.º do referido diploma legal. Em conclusão: 1.- O contrato de mandato forense é um contrato de mandato atípico que tem por objecto o exercício do patrocínio judiciário e que se consubstancia na prática pelo mandatário de actos jurídicos por conta e em nome do mandante. No entanto, importa realçar que este contrato não se esgota nos interesses do mandante e do mandatário, tutelando de igual modo um interesse de ordem pública, uma vez que é o modo de assegurar aos cidadãos uma assistência técnico- jurídica prestada por alguém qualificado, o que se demonstra essencial à boa administração da justiça, conforme preceituado pelo art.º 208.º da Constituição da República Portuguesa. 5
6 2.- As procurações outorgadas a advogados para a prática de actos que envolvam o exercício do patrocínio judiciário, ainda que com poderes especiais, não carecem de intervenção notarial, devendo o mandatário certificar-se da existência, por parte do mandante, dos poderes para o acto, conforme o preceitua o DL 267/92, de 28 de Novembro. 3.- Os advogados e advogados estagiários com inscrição em vigor não podem ser impedidos, por qualquer autoridade pública ou privada, de praticar atos próprios da advocacia, constituindo o patrocínio forense por advogado um elemento essencial na administração da justiça e é admissível em qualquer processo, não podendo ser impedido perante qualquer jurisdição, autoridade ou entidade pública ou privada, tudo conforme resulta do art.º 69.º do EOA e art.º 12.º n.º 1 da Lei Orgânica do Sistema Judiciário. 4.- Não pode (...) [a instituição financeira] exigir à Senhora Advogada qualquer autenticação da procuração forense ou quaisquer cópias de documentos identificativos do Mandante ou do Mandatário, pelo que adopta procedimentos contra legem. 5.- As obrigações das instituições financeiras destinadas a assegurar a prevenção, entre outras realidades, do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo estão preceituados na Lei 83/2017, de 18 de Agosto e no que respeita ao dever de identificação, preceituam os art.º 23.º e 42.º que, devem as entidades obrigadas observar procedimentos de identificação e diligência relativamente aos clientes, aos respectivos representantes e aos beneficiários efectivos em situações específicas que não as relatadas, sendo certo que se tais obrigações existissem ou se existiram, deveriam ser preocupações da instituição financeira a jusante e não apenas quando aparece o litígio. 6.- Procedimentos de identificação não são cópias de documentos de identificação. A identificação faz-se por norma por exibição do cartão do cidadão estando interdita a reprodução do cartão de cidadão em fotocópia ou qualquer outro meio sem consentimento do titular, salvo nos casos expressamente previstos na lei ou mediante decisão de autoridade judiciária 6
7 Proponho que seja dado conhecimento da actuação d(...) à Comissão Nacional de Protecção de Dados e ao Banco de Portugal. É este, s.m.o., o meu parecer. Isabel Malheiro Almeida. Parecer aprovado em sessão plenária do Conselho Geral da Ordem dos Advogados de 16 de Novembro de
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