Comissão dos Assuntos Jurídicos COMUNICAÇÃO AOS MEMBROS (0047/2012)

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1 PARLAMENTO EUROPEU Comissão dos Assuntos Jurídicos COMUNICAÇÃO AOS MEMBROS (0047/2012) Assunto: Parecer fundamentado do Bundesrat alemão sobre a proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelas autoridades competentes para efeitos de prevenção, investigação, deteção e repressão de infrações penais ou de execução de sanções penais, e à livre circulação desses dados (COM(2012)0010) C7-0024/ /0010(COD)) Nos termos do artigo 6.º do Protocolo n.º 2 relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, podem os Parlamentos nacionais, no prazo de oito semanas a contar da data de transmissão de um projeto de ato legislativo, dirigir aos Presidentes do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão um parecer fundamentado expondo as razões por que consideram que o projeto não respeita o princípio da subsidiariedade. Ao abrigo do Regimento do Parlamento Europeu, a Comissão dos Assuntos Jurídicos é responsável pelo respeito do princípio da subsidiariedade. Figura em anexo, para informação, o parecer fundamentado do Bundesrat alemão sobre a proposta em epígrafe. CM\ doc PE v01-00 Unida na diversidade

2 ANEXO Parecer fundamentado do Bundesrat alemão O Bundesrat alemão, na sua 895.ª sessão, em 30 de março de 2012, emitiu, nos termos da alínea b) do artigo 12.º do TUE, o seguinte parecer: 1. O Bundesrat acolhe favoravelmente a proposta de diretiva, que visa facilitar a cooperação policial e judiciária em matéria penal, no respeito do direito fundamental à proteção dos dados pessoais. 2. A presente objeção, por não conformidade com o princípio da subsidiariedade, enunciado na alínea b) do artigo 12.º do TUE, abrange também a questão das competências da UE ver os pareceres do Bundesrat de 9 de novembro de 2007, Documento 390/07 (decisão), n.º 5, e de 26 março de 2010, Documento 43/10 (decisão), n.º 2, e de 16 de Dezembro de 2011, Documento 646/11 (decisão). O princípio da subsidiariedade é um princípio relativo ao exercício de competências. Pode verificar-se uma violação do princípio da subsidiariedade, mesmo quando a União não seja competente. Por conseguinte, no quadro do controlo da subsidiariedade, convém começar por examinar a base jurídica. 3. A presente proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais para efeitos de prevenção, investigação, deteção e repressão de infrações penais não se pode basear no artigo 16.º,. 2, do TFUE, na medida em que o âmbito de aplicação da diretiva abrange igualmente o tratamento de dados no quadro de processos nacionais. Assim sendo, a base jurídica indicada, o artigo 16.º, n. 2, do TFUE, não se aplica à proposta da Comissão, que abrange igualmente a circulação, a nível exclusivamente nacional, dos dados detidos pelas autoridades policiais. Em virtude do princípio da atribuição estabelecido no artigo 5.º, n.º 2, do TUE, a União atua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados-Membros lhe tenham atribuído nos Tratados para alcançar os objetivos fixados por estes últimos. O artigo 16.º, n.º 2, do TFUE apenas permite o estabelecimento de normas relativas à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais pelos Estados-Membros no exercício de atividades que se inserem no âmbito do domínio de aplicação do direito da União. Não obstante, os processos penais nacionais só de forma estritamente limitada são abrangidos pelo âmbito de aplicação do direito da União. O poder limitado de que a União dispõe para adotar diretivas aplicáveis PE v /6 CM\ doc

3 aos processos penais (artigo 82.º, n.º 2, do TFUE) circunscreve, por conseguinte, as suas competências em matéria de proteção de dados. Esta limitação constitui um obstáculo, nos processos penais, à harmonização do tratamento de dados a nível estritamente nacional. O tratamento de dados pessoais é um elemento central do processo penal. Assim sendo, a proposta de diretiva traduz-se em importantes ingerências no direito processual penal, que não é indispensável, nem para facilitar o reconhecimento mútuo das decisões, nem para melhorar a cooperação transfronteiriça em matéria penal. Assim, a proposta contém disposições que impõem aos Estados-Membros importantes obrigações em matéria de condução dos atos processuais (artigos 5.º e 6.º), nas investigações que utilizam categorias especiais de dados pessoais (artigo 8.º), bem como na comunicação e no exercício do direito de acesso (artigos 11.º-14.º). A exposição de motivos da proposta de diretiva faz valer, para justificar a extensão ao tratamento de dados a nível nacional, que as autoridades nacionais não estão em condições de distinguir facilmente entre o tratamento de dados a nível nacional e o tratamento transfronteiriço, nem de prever se certos dados pessoais constituirão posteriormente objeto de intercâmbio transfronteiriço. Este elemento não poderia, porém, justificar a necessidade de alargar o âmbito de aplicação da diretiva. As autoridades competentes estão, à luz da regulamentação aplicável, em condições de fazer facilmente um juízo sobre a transmissão transfronteiriça de dados anteriormente recolhidos com base nas disposições do direito do processual penal nacional. É sempre possível rever as regulamentações setoriais se, no quadro da cooperação policial e judiciária, surgirem lacunas jurídicas no contexto da transmissão de dados. Em contrapartida, as dificuldades práticas invocadas pela Comissão no que se refere à distinção prática entre tratamento de dados a nível nacional e intercâmbio transfronteiriço de dados pessoais não podem justificar uma extensão das atuais competências. Estas observações aplicam-se mutatis mutandis ao tratamento, pela polícia, de dados pessoais no quadro do direito aplicável na matéria. 4. No que respeita à polícia, o quadro de competências previsto no artigo 16.º, n.º 2, do TFUE ("Âmbito de aplicação do direito da União") é concretizado, nos termos do artigo 6.º, n.º 2, do TFUE, no artigo 87.º do referido Tratado. Este artigo apenas rege a cooperação entre as autoridades policiais e os serviços repressivos dos Estados-Membros. Assim, o artigo 87º, n.º 1, do TFUE não confere qualquer competência em matéria de regulamentação dos elementos de facto que dizem exclusivamente respeito à atividade desses serviços a nível nacional, não abrangendo, por conseguinte, qualquer forma de cooperação entre os Estados-Membros. A competência regulamentar em matéria de intercâmbio de informações policiais, prevista no artigo 87.º, n.º 2, alínea a), do TFUE, na medida em que remete para os objetivos do artigo 87.º, n.º 1, tem o mesmo alcance que o CM\ doc 3/6 PE v01-00

4 âmbito de competências definido para a cooperação das autoridades dos Estados-Membros. Por conseguinte, também em matéria de proteção de dados, o intercâmbio de informações de natureza policial apenas se insere no âmbito de competências da União quando releve da cooperação entre os serviços repressivos dos Estados-Membros no âmbito de competências da UE. Por outro lado, nos termos do artigo 51.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o seu artigo 8.º aplica-se apenas às atividades dos Estados-Membros quando estes apliquem o direito da União; o artigo 51.º, n.º 2, da Carta também não cria quaisquer novas competências. Ao interpretar o artigo 8.º da Carta e o artigo 16.º, n.º 2, do TFUE sem ter em conta as especificidades das disposições relativas ao espaço de liberdade, de segurança e de justiça, a proposta de diretiva alarga o âmbito de aplicação do direito primário e cria, assim, em termos constitucionais, uma grave tensão, descrita no acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional Federal alemão, em de 30 de Junho de 2009 (acórdãos 2 BvE 2/08, i. a.) entre o princípio da atribuição e a responsabilidade constitucional dos diferentes Estados-Membros em matéria de integração, que não deixa de afetar a garantia concreta da segurança e da ordem pública. A formulação puramente estereotipada do artigo 2.º, n.º 3, alínea a), da proposta de diretiva não é de molde a evitar a extensão da competência material, penalizando, nomeadamente, as autoridades policiais dos Estados federados. 5. O Bundesrat considera igualmente que a UE não dispõe de qualquer competência para regulamentar o direito de prevenir uma ameaça não relacionada com um ato de natureza penal. É absolutamente legítimo pensar que, também neste domínio, a União completa e alarga, no fundo, sem derrogação explicativa pertinente, a competência em matéria de proteção dos dados visada no artigo 16.º do TFUE, em detrimento do poder de que dispõem, na aceção do acórdão proferido 30 de junho de 2009 pelo Tribunal Constitucional Federal alemão (acórdão 2 BvE 2/08 i. a.), os Estados-Membros no quadro da prevenção de ameaças relacionadas com um ato de natureza não penal. Também neste aspeto, a formulação estereotipada do artigo 2.º, n.º 3. alínea a), da proposta de diretiva não é de molde a evitar a transferência de competências assim prevista nas diferentes disposições. 6. A proposta de diretiva é igualmente contrária ao princípio da subsidiariedade stricto sensu consagrado no artigo 5., n.º 3, do TUE, na medida em que contém disposições aplicáveis à recolha e tratamento de dados a nível estritamente nacional. Nestas condições, não é possível reconhecer a mais-valia das disposições europeias uniformes previstas. Pelo contrário, os próprios Estados-Membros estão em condições de regulamentar suficientemente o tratamento de dados exclusivamente nacional (recolha, armazenamento PE v /6 CM\ doc

5 e transferência), sendo que a legislação alemã em vigor aplicável à proteção de dados já regulamenta suficientemente esta matéria. 7. Por outro lado, a justificação, tanto da extensão do texto à circulação de informações de natureza policial a nível estritamente nacional, como da conformidade dessa extensão com o princípio da subsidiariedade, é contrária às disposições do artigo 5.º do Protocolo N.º 2 ao Tratado de Lisboa, que a Comissão deve observar e a que está vinculada por força do artigo 51.º do TUE. O ponto 3.2 da exposição de motivos da proposta de diretiva limita-se a alegar que o texto é conforme ao princípio da subsidiariedade, sem explicitação dos indicadores quantitativos e qualitativos requeridos nos termos do artigo 5.º do Protocolo. O documento SEC (2012) 73, que acompanha a proposta, apenas se refere, na sua página 3, a um eventual entrave ao intercâmbio de informações entre as autoridades competentes dos Estados-Membros. Como referido no documento de avaliação de impacto SEC (2012), 72, página 34, alínea d), esta suposição assenta, porém, exclusivamente num estudo privado levado a efeito por um instituto de orientação especializado em políticas de migração. Assim sendo, as bases do estudo levado a efeito por um instituto não especializado no domínio em apreço não são nem verificáveis, nem suscetíveis de ser devidamente apreendidas, pelo que não são apropriadas. Faltam outros dados apropriados. 8. O diploma em apreço afeta, por outro lado, a reserva de competência prevista no artigo 72.º do TFUE. O artigo 72.º do TFUE completa, em matéria policial, o artigo 5.º, n.º 3, do TUE. O exame particularmente judicioso do critério de necessidade que, nos termos do artigo 72.º do TFUE, neste caso se impõe para as intervenções não é mencionado, nem na proposta de diretiva propriamente dita, nem nos documentos que a acompanham. As restrições propostas à circulação de informações de natureza policial a nível estritamente nacional, bem como as possibilidades abertas pelo artigo 27.º da proposta de diretiva de regulamentação vinculativa dos critérios de aplicação de procedimentos e sistemas informáticos em território nacional e, por conseguinte, da admissibilidade em termos de proteção de dados, afeta a responsabilidade e a capacidade da polícia no que diz respeito à manutenção da ordem pública e à garantia da segurança interna, em conformidade com o previsto no artigo 72.º do TFUE. Se determinados procedimentos e sistemas informáticos fossem declarados não admissíveis em termos de proteção de dados, deixariam de poder ser utilizados, pelo que o exercício concreto das missões de polícia poderia, em certos casos, ser consideravelmente restringido. 9. A obrigação, visada no artigo 60.º da proposta de diretiva, de alterar os tratados bilaterais ou multilaterais concluídos no domínio da cooperação policial afeta as disposições da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, bem como a competência dos CM\ doc 5/6 PE v01-00

6 Estados-Membros em matéria de política externa. O artigo 351.º do TFUE apenas prevê que os Estados-Membros recorrerão a todos os meios adequados para eliminar eventuais incompatibilidades entre as convenções concluídas e os Tratados UE. A formulação rígida do artigo 60.º da proposta de diretiva é, por conseguinte, encarada criticamente. Conviria examinar a possibilidade de uma cláusula de revisão ("sunset-clause"). 10. Não é evidente que os Estados-Membros não tenham capacidade para assegurar uma suficiente proteção de dados a nível interno mercê de uma descrição das missões e atividades que incumbem às autoridades nacionais de proteção de dados. Ademais, a proposta de diretiva não demonstra que as múltiplas disposições previstas no artigo 30.º e seguintes garantam uma proteção oficial dos dados melhor do que determinadas regulamentações nacionais já existentes, razão pela qual o princípio da subsidiariedade é também violado. 11 A título supletivo, o Bundesrat remete para o seu parecer sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Uma abordagem global da proteção de dados pessoais na União Europeia, COM(2010) 609 final; Documento do Bundesrat 707/10 (decisão), n.º 8. PE v /6 CM\ doc