Estado de Mato Grosso do Sul Poder Judiciário Campo Grande 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos

Transcrição

1 Autos: Ação: Ação Civil Pública Requerente: Município de /MS Requeridos: Nelson Trad Filho e outros Vistos. O Município de /MS ajuizou a presente Ação Civil Pública de Ressarcimento ao Erário em desfavor de Alert Serviços de Licenciamento de Sistemas de Informática para Saúde Ltda, Carlos Alberto Andrade Jurgielewicz, Casemiro Ney Rocha de Alencar Filho, Cristiane Pina Pedroso Amorim, Empresa Avansys Tecnologia Ltda, Estrela Marinha Informática Ltda, Geralda Verônica Benites Albuquerque, Gislayne Budib Poleto, Humberto Kawahata Barreto, João Mitumaça Yamaura, Leandro Mazina Martins, Luciano de Barros Mandetta, Luiz Fernando Dias Corazza, Luiz Henrique Mandetta, Luzia Seveino da Silva Alencar, Maria Cristina Abrao Nachif, Maria Flordelici Ferreira, Naim Alfredo Beydoun, Nelson Trad Filho, Rogério Amado Berzellay e Telemídia & Technology International Comércio e Serviços de Tecnologia Ltda, sob a alegação de que ocorreu dano ao erário por ação ou omissão das partes. A não implantação do Sistema GISA foi objeto de sindicância feita pelo Município de e inspeção da Corregedoria-Geral da União, atestando prejuízo milionário em decorrência da inoperância do sistema de tecnologia de informação e informática contratado para a implantação do sistema, que buscava atender a Rede Municipal de Saúde. Tal sistema visava gerenciar de forma mais célere os serviços de saúde pública da capital. Dispõe que em 2008, o Município de firmou o Convênio n. 1051/2008 (Siafi n ) com a União Federal e o Ministério fls

2 da Saúde a fim de implantar o sistema GISA. Consequentemente, em 2009, o município abriu a Concorrência n. 025/2009, na modalidade técnica e preço, através do procedimento administrativo / O Consórcio CONTISIS venceu o processo licitatório, sendo integrado pelas empresas Telemídia & Technology International Comércio e Serviços de Informática Ltda, Estrela Marinha Informática Ltda. e Avansys Tecnologia Ltda., tendo sido celebrado o Contrato n. 305-A, no valor de R$ ,40 (nove milhões, novecentos e oitenta mil reais e quarenta centavos). Durante a execução do contrato, o Ministério da Saúde repassou a quantia de R$ 8.166,364,00 (oito milhões, cento e sessenta e seis mil, trezentos e sessenta e quatro reais), enquanto que o Município integralizou valor de R$ ,80 (um milhão, oitocentos e dezesseis mil, seiscentos e trinta e seis reais e oitenta centavos). Apesar dos diversos pagamentos realizados ao Consórcio CONTISIS, os serviços contratados e pagos não foram recebidos para a implementação total do sistema GISA. Assevera que no projeto estavam previstas seis etapas de execução, cada uma com valor estimado a ser pago. Porém, de acordo com o autor. os pagamentos eram realizados mesmo não tendo sido o sistema efetivamente instalado nas unidades de saúde. Dos doze módulos previstos, revela que a auditoria da CGU constatou que apenas os módulos I, II, V e XI foram implantados no servidor central. O autor também expõe a irregularidade na subcontratação da empresa Alert Serviços de Licenciamento de Sistemas de Informática para a Saúde Ltda., que ocorreu após transcorrido cerca de dois anos do início da vigência contratual. Segundo aponta, tal ato contraria as normas previstas no Contrato Administrativo n. 305-A/2009 e nas demais normatizações aplicáveis à espécie. Diante do alegado, requereu a concessão de tutela cautelar para fls

3 decretar a indisponibilidade de bens dos requeridos até o montante estimado de R$ ,45 (dezesseis milhões, seiscentos e setenta e três mil, oitocentos e oitenta e três reais e quarenta e cinco centavos), tendo em vista os prejuízos causados à esta administração por conta da não entrega da totalidade do objeto pactuado. Decido quanto ao pedido efetuado em sede de liminar. Inicialmente, convém salientar que em decorrência da plausibilidade das alegações apresentadas pelo Município de Campo Grande/MS, há fortes indícios de ocorrência de ato de improbidade administrativa, eis que a conduta dos requeridos, ao que parece, causou dano ao erário. Consta dos autos que as empresas Alert Serviços de Licenciamento de Sistemas de Informática para a Saúde Ltda., Avansys Tecnologia Informática, Estrela Marinha Informática Ltda. e Telemídia & Technology International Comércio e Serviços de Informática Ltda., integrantes do Consórcio CONTISIS foram as vencedoras da licitação para a elaboração e implementação de um sistema de saúde informatizado a ser utilizado em /MS denominado GISA (Sistema Gestão em Saúde), o que não ocorreu. No caso, vislumbra-se, em primeira análise, que o projeto orçado em cerca de R$ ,45 (dezesseis milhões, seiscentos e setenta e três mil, oitocentos e oitenta e três reais e quarenta e cinco centavos) despendeu grande montante dos cofres públicos, caso este que se agrava ao considerarmos que o sistema sequer foi integralmente entregue. Portanto, é evidente o prejuízo ao erário. Respondem, solidariamente, os responsáveis pela ocorrência de tal fls

4 irregularidade, sendo perceptível a anuência e participação direta dos requeridos citados nestes autos. Nelson Trad Filho era, à época, Prefeito de /MS. Luiz Henrique Mandetta e Leandro Mazina Martins foram Secretários Municipais de Sáude, tendo ambos autorizados pagamentos às empresas. João Mitumaça Yamaura, então presidente do IMTI, e Leandro Mazina Martins, Secretário de Saúde Municipal, foram os responsáveis pela subcontratação da empresa ALERT, em desconformidade com o Contrato Administrativo n. 305-A/2009. Os servidores responsáveis pelo acompanhamentos do Contrato n. 305-A/2009 eram os requeridos Gyslayne Budib Poleto, Cristiane Pina Pedroso Amorim, Maria Flordelici Ferreira e Geralda Verônica Benites Albuquerque, que foram designados para emitirem nota fiscal comprobatória do correto recebimento das parcelas pactuadas no objeto licitado. Dentro do Grupo Gestor Gisa estão os seguintes requeridos: Maria Cristina Abraão Nachif, responsável pela coordenação do Grupo Gestor, Luciano de Barros Mandetta, responsável pela gerência administrativa do sistema GISA, Luzia Severino da Silva Alencar, responsável pela informática dentro do grupo, Humberto Kawahata Barreto, responsável pelas atribuições do IMTI dentro do grupo. Rogério Barzelai e Casemiro Ney Rocha de Alencar Filho foram representantes do consórcio CONTISIS, enquanto Luiz Corazza e Carlos Alberto Andrade Jurgielewicz foram responsáveis pelas definições do sistema. É certo que para a concessão de medida liminar, devem estar fls

5 presentes os requisitos da plausibilidade do direito invocado (fumus boni iuris) e a probabilidade de haver danos (periculum in mora). No caso em apreço, a fumaça do bom direito (fumus boni iuris) se verifica pelas provas acostadas à inicial, que demonstram, prima facie, as irregularidades nos serviços prestados pelas empresas que compõe o polo passivo. Já o periculum in mora, além de estar implícito no próprio comando legal (art. 37, 4º, da Constituição Federal) e ser presumido em razão da gravidade dos fatos e do interesse público e da existência de prejuízos ao erário, emerge do fato de que o prejuízo ao patrimônio público não pode continuar ocorrendo até que haja o deslinde definitivo desta lide. Saliente-se que há o entendimento do STJ de que o decreto de indisponibilidade de bens em ação civil pública por ato de improbidade administrativa constitui tutela de evidência e dispensa a comprovação de dilapidação iminente ou efetiva do patrimônio do legitimado passivo, uma vez que o "periculum in mora" está implícito no art. 7º da Lei nº 8.429/92. "PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 7º DA LEI N /92. PERICULUM IN MORA PRESUMIDO. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. ORIENTAÇÃO FIRMADA PELO STJ SOB A SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. DESPROVIMENTO. (...) 2. A Primeira Seção desta Corte de Justiça, no julgamento do REsp /BA, solucionado sob a sistemática dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), consolidou o entendimento de que o decreto de indisponibilidade de bens em ação civil pública por ato de improbidade administrativa constitui tutela de evidência, dispensando a comprovação de periculum in mora. É suficiente para o fls

6 cabimento da medida, portanto, a demonstração, numa cognição sumária, de que o ato de improbidade causou lesão ao patrimônio público ou ensejou enriquecimento ilícito, o que ocorreu na espécie. 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ, AgRg no AREsp /SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/04/2015, DJe 06/05/2015)". Ademais, também há o entendimento que não há necessidade de demonstração que os requeridos estejam dilapidando o seu patrimônio, conforme julgados do STJ e do TJMS: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. MEDIDA CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS. CONFIGURAÇÃO DO PERICULUM IN MORA. ENTENDIMENTO FIRMADO NO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO N /BA. CONSTRIÇÃO. PROPORCIONALIDADE. PRETENSÃO RECURSAL QUE ENCONTRA ÓBICE NA SÚMULA N. 7 DO STJ. 1. A Primeira Seção desta Corte, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n /BA, Relator p/ acórdão Min. Og Fernandes, publicado em , firmou o entendimento de que há periculum in mora nos casos de decretação da medida cautelar de indisponibilidade de bens, não estando condicionado à comprovação de que o réu esteja dilapidando seu patrimônio ou na iminência de fazê-lo, sendo possível a sua decretação quando presentes fortes indícios da prática de atos de improbidade administrativa. (...) 4. Agravo regimental não provido. (STJ, AgRg no AREsp /PR, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 09/06/2015, DJe 17/06/2015)". AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO CIVIL POR IMPROBIDADE fls

7 ADMINISTRATIVA LIMINAR INDISPONIBILIDADE DE BENS E VALORES ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA RISCO DE DILAPIDAÇÃO DOS BENS DESNECESSIDADE PRECEDENTES DO STJ DECISÃO MANTIDA AGRAVO IMPROVIDO. Considerando que para os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública há previsão de sanções relacionadas ao ressarcimento dos danos porventura existentes e ao pagamento de multa (art. 12, III, da LIA), deve-se concluir que também pode ser decretada a indisponibilidade de bens para garantir o ressarcimento ao erário. Estando presentes fortes indícios quanto à prática do ato de improbidade, consubstanciado na alienação de bem pertencente ao Município, por preço muito inferior ao de mercado, resta caracterizado o fumus boni iuris, requisito que autoriza a medida liminar de indisponibilidade de bens. O periculum in mora pode ser deduzido da gravidade do atos de improbidade e da necessidade de resguardar o patrimônio público, não sendo necessária a comprovação de que os agravantes esteja dilapidando seu patrimônio ou tenha intenção de fazê-lo. (TJMS - 4ª Câmara Cível - Agravo de Instrumento - Nº Três Lagoas - Relator Des. Claudionor Miguel Abss Duarte - J. 9 de junho de 2015). Saliente-se que, neste momento, não há necessidade de prova cabal da prática dos atos de improbidade e do prejuízo ao erário municipal, pois se trata de medida acautelatória, onde é suficiente o indício que isto tenha ocorrido. Assim, por mais extrema que possa ser a medida, deve ser ressaltado que a indisponibilidade de bens é o modo mais eficaz para garantir o ressarcimento aos cofres públicos. Por tais motivos, verifica-se que a indisponibilidade de bens na fls

8 forma pleiteada na inicial é a melhor medida para resguardar o bem público, o que se faz visando a garantia de futura indenização ao erário. Diz o 4º do art. 37, da Constituição Federal: Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. Por sua vez, o art. 7º da Lei 8.429/92, dispõe que: Quando o ato de improbidade causar lesão ao patrimônio público ou ensejar enriquecimento ilícito, caberá à autoridade administrativa responsável pelo inquérito representar ao Ministério Público, para a indisponibilidade dos bens do indiciado. Parágrafo único. A indisponibilidade a que se refere o caput deste artigo recairá sobre bens que assegurem o integral ressarcimento do dano, ou sobre o acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito. Logo, diante da fundada suspeita de improbidade administrativa e da consequente malversação do dinheiro público, deve ser decretada a indisponibilidade patrimonial de bens dos requeridos, eis que presentes seus requisitos autorizadores. Deste modo, presentes os requisitos "fumus boni iuris" e o "periculum in mora" da tutela assecuratória, a indisponibilidade de bens é medida de rigor, até porque, eventual raciocínio inverso, iria contra a razão de ser do art. 37, 4º, da Constituição Federal, bem como dos arts. 7º e 16 da Lei nº 8.429/1992, que limitam o exercício do direito de propriedade do agente ímprobo. fls

9 Assim decidiu o TJMS: "AGRAVO DE INSTRUMENTO AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA MEDIDA CAUTELAR DE INDISPONIBILIDADE DE BENS PRIMADO DO INTERESSE PÚBLICO E CONJUGAÇÃO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES FUMUS BONI IURIS E PERICULUM IN MORA RECURSO NÃO PROVIDO. Presentes os requisitos fumus boni iuris e o periculum in mora da tutela assecuratória, a indisponibilidade de bens do réu da ação de improbidade administrativa é medida de rigor. Raciocínio inverso conspiraria contra a ratio essendi do artigo 37, 4º, da Constituição Federal, bem como dos artigos 7º e 16 da Lei n /1992, que limitam o exercício do direito de propriedade do agente improbo, assegurando o cumprimento da sentença da ação de improbidade. Precedentes STJ. (1ª Câmara Cível Agravo de Instrumento - Nº Pedro Gomes Relator Exmo. Sr. Des. Divoncir Schreiner Maran - J. 12 de maio de 2015)". Sabe-se, entretanto, que a indisponibilidade de bens deve ser limitada ao valor dos prejuízos causados aos cofres públicos até então apurado. Em relação ao valor do prejuízo ao erário, serão levados em conta aqueles apontados pelo Município de /MS que o prejuízo alcança pelo menos o valor de R$ ,45 (dezesseis milhões, seiscentos e setenta e três mil, oitocentos e oitenta e três reais e quarenta e cinco centavos). Diante do exposto e presentes os requisitos autorizadores acolho o pedido de liminar, para o fim de decretar a indisponibilidade dos bens dos requeridos Alert Serviços de Licenciamento de Sistemas de Informática fls

10 10 para Saúde Ltda, Carlos Alberto Andrade Jurgielewicz, Casemiro Ney Rocha de Alencar Filho, Cristiane Pina Pedroso Amorim, Empresa Avansys Tecnologia Ltda, Estrela Marinha Informática Ltda, Geralda Verônica Benites Albuquerque, Gislayne Budib Poleto, Humberto Kawahata Barreto, João Mitumaça Yamaura, Leandro Mazina Martins, Luciano de Barros Mandetta, Luiz Fernando Dias Corazza, Luiz Henrique Mandetta, Luzia Seveino da Silva Alencar, Maria Cristina Abrao Nachif, Maria Flordelici Ferreira, Naim Alfredo Beydoun, Nelson Trad Filho, Rogério Amado Berzellay e Telemídia & Technology International Comércio e Serviços de Tecnologia Ltda até o valor total de R$ ,45 (dezesseis milhões, seiscentos e setenta e três mil, oitocentos e oitenta e três reais e quarenta e cinco centavos). Para tanto, determino que seja realizado o cadastro da indisponibilidade ora decretada na Central Nacional de Indisponibilidade de Bens - CNIB, criado e regulamentado pelo Provimento nº 39/2014, da Corregedoria Nacional de Justiça, que tem por objetivo dar eficácia e efetividade às decisões de indisponibilidades de bens, divulgando-as para os Serviços de Notas e de Registro de Imóveis de todo o território nacional. Outrossim, promova-se a consulta ao sistema RENAJUD a fim de se verificar a existência de veículos em nome dos requeridos, efetivando-se o bloqueio judicial de indisponibilidade, em caso positivo, devendo ser certificado, se for o caso, eventual restrição existente sobre os veículos. Sem prejuízo disto e objetivando implementar a efetividade da atividade jurisdicional, realize-se, também, a indisponibilidade de ativos financeiros pelos sistema BACENJUD. Caso a indisponibilidade seja realizada e, em sendo verificado eventual excesso em relação ao valor descrito anteriormente, voltem para fls. 5317

11 11 análise e liberação do excedente, sem prejuízo disso ser alegado pelos requeridos, os quais poderão, até mesmo, solicitar eventual substituição dos bens tornados indisponíveis, se for o caso. Nos termos do art. 17, 7º, da Lei 8.429/92, notifiquem-se os requeridos para, querendo, apresentarem manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações, dentro do prazo de quinze dias. Ciência ao Ministério Público. Às providências e intimações necessárias. /MS, 02 de junho de (assinado por certificação digital) Marcelo Ivo de Oliveira Juiz de Direito em Subst. Legal fls. 5318