UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
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- Aparecida Abreu Pinho
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1 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DAS ÁREAS FUNCIONAIS DA LINGUAGEM RELACIONADAS À DISLEXIA POR LUCIANA JERONIMO LIMA ORIENTADORA: MARTA PIRES RELVAS RIO DE JANEIRO JANEIRO / 2011
2 UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU NEUROCIÊNCIA PEDAGÓGICA: UM ESTUDO DAS ÁREAS FUNCIONAIS DA LINGUAGEM RELACIONADAS À DISLEXIA OBJETIVOS: Esta publicação atende a complementação didático-pedagógica de metodologia de pesquisa e a produção e desenvolvimento de monografia para o curso de pósgraduação em Neurociências Pedagógica.
3 AGRADECIMENTOS 3 A Deus, em primeiro lugar, pela conclusão deste trabalho e de minha trajetória acadêmica; Aos meus familiares - Neusa, Ederson e Andreia por todo carinho, incentivo, amor e atenção; Aos amigos da Pós Graduação pela troca de experiências e aprendizados proporcionados nas aulas; Aos professores pelos incentivos e aprendizagens construídas.
4 DEDICATÓRIA 4 Dedico esta monografia a todos aqueles envolvidos com a educação e os seres humanos em formação. Acreditando que as crianças precisam ser amadas e orientadas para que se tornem adultos saudáveis e críticos. Que todos os bravos profissionais da escola, da saúde e os familiares, mesmo com dificuldades, mas com uma dose extra de persistência, não desistam do seu papel e colaborem com diferentes descobertas, valorizando e transformando nossa sociedade.
5 RESUMO 5 Esta obra refere-se às contribuições da neurociência pedagógica para a dislexia e apresenta a investigação das áreas funcionais da linguagem relacionadas à dislexia numa visão neuropedagógica. Para a elaboração deste trabalho, a metodologia compreendeu a pesquisa bibliográfica, voltada para a aprendizagem dos alunos disléxicos, onde as escolas devem estar comprometidas com a qualidade do ensino e também com a autonomia dos mesmos na sociedade. Os objetivos abordados foram: identificar e caracterizar a dislexia, explicar as descobertas da neurociência diante da dislexia e exemplificar ações neuropedagógicas que auxiliam os disléxicos. Com esta pesquisa foi possível perceber que a neurociência contribui para o bom desenvolvimento dos alunos disléxicos, uma vez que, compreende-se realmente o que é a dislexia e o que pode ser feito aos alunos por meio de um trabalho pedagógico eficiente do professor, melhorando sua ação pedagógica, alcançando assim, resultados satisfatórios com os alunos disléxicos.
6 6 SUMÁRIO Introdução...7 Capítulo I A importância da Neurociência um breve histórico Evolução Humana aspectos antropológicos Descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano Uma visão neurocientífica do Aprender...19 Capítulo II Colaborações da Neurociência na compreensão da Dislexia Áreas Funcionais da Linguagem Dislexia e Linguagem...28 Capítulo III - Ações Neuropedagógicas: pressupostos para uma Educação Inclusiva dos disléxicos Ações que fazem a diferença O papel da escola...47 Conclusão...51 Bibliografia...57
7 INTRODUÇÃO 7 O presente estudo é uma investigação das colaborações da neurociência para a compreensão da dislexia no processo de aprendizagem dos sujeitos em nosso meio educacional. A educação encontra-se na vida de todos os educandos, educadores, responsáveis, membros das áreas da saúde, quando de alguma forma, há o envolvimento com a ação educativa, mesmo sendo este relacionado às investigações de como o sujeito aprende. A educação, assim como a aquisição da leitura e da escrita se constitui como um processo que permite ao educador acompanhar o desenvolvimento de seus alunos, observando se os objetivos propostos de acordo com a faixa etária estão sendo alcançados e assim, perceber algum entrave que possa estar impedindo a obtenção da aprendizagem e de resultados satisfatórios, tendo a possibilidade de modificar a sua prática, orientado por um profissional da saúde e por conhecimentos hoje existentes com base neurocientíficas que ajudam na compreensão das dificuldades e nas possíveis ações que facilitam o trabalho educativo. A neurociência torna-se desse modo, uma das ferramentas que está a serviço do aprendizado, quando as pessoas envolvidas no processo de aprendizagem a utilizam para conquistar melhorias. Todavia em no cotidiano escolar ou familiar, nem sempre esses grupos sociais a que pertencem os sujeitos disléxicos têm uma visão neuropedagógica e por isso, muitas vezes, não sabendo lidar com a dislexia, tal realidade traz desconfortos e insatisfações, tornando-se, em muitos casos, difícil e complexo o processo educativo, para alunos e professores, principalmente na fase da alfabetização. Pensando nesta complexidade da dislexia, envolvendo a aquisição da leitura e da escrita, cabe então, investigar como a neurociência, voltando-se para as áreas da linguagem presentes no encéfalo, contribui na compreensão dos aspectos que envolvem a dislexia.
8 8 É bem verdade que, segundo alguns profissionais da educação, estes se sentem despreparados para auxiliar nas escolas os alunos disléxicos, defendendo que as próprias escolas ainda precisam de meios para melhor atendê-los, na verdade não só a eles, mas a todos que, de certa forma, apresentam necessidades diferentes quanto à forma de aprender. Apesar desta realidade, pretende-se conquistar uma educação inclusiva e uma sociedade inclusiva de qualidade em nosso país, preocupada com o bem-estar sócio-cognitivo dos sujeitos, sejam quais forem suas diferenças. Com isto, tem-se como base a Declaração de Salamanca (1994), documento oficial da Confederação Mundial de Educação Especial, que pressupõe a educação inclusiva como o atendimento a todos, onde um mesmo currículo se apresente aberto às diferenças, garantindo o direito à construção de conhecimentos e valores. O que a torna um processo gradual e dinâmico, tomando-se o cuidado para que não se caia numa suposição falsa de inclusão que não colabora para a felicidade e desenvolvimento da cidadania dos sujeitos envolvidos nesta realidade. Com muita propriedade a UNESCO expressa sua posição quanto à educação inclusiva, afirmando em seus documentos, que a meta do processo de inclusão, ultrapassa o ambiente da sala de aula ou um segmento isolado, ela pretende, na verdade, alcançar e se organizar em todo o sistema educacional brasileiro, caminhando por uma via única, que possa oferecer uma educação que atenda às necessidades dos alunos. Para reforçar tal ideal de inclusão, utiliza-se as palavras da própria UNESCO, 1988 (citado por CARVALHO, 2000, p.19) que diz: Em termos da reforma do sistema escolar, cuja meta é a criação de uma escola comum que ofereça uma educação diferenciada a todos, em
9 9 função de suas necessidades e num marco único e coerente de planos de estudos. Diante da necessidade de uma reforma não só no sistema de ensino brasileiro, como também na postura social frente às diferenças para que aconteça uma inclusão de qualidade, tem-se um grande desafio, que precisa da colaboração da escola e da sociedade para alcançar seus objetivos na melhoria do sistema educacional, combatendo a exclusão e os preconceitos existentes diante das diferenças, priorizando ensinar aos diversos grupos sociais que, as diferenças devem ser respeitadas para proporcionar um ambiente de aprendizado agradável e acolhedor. Desse modo, cabe frisar que as diferenças humanas se constituem pelas singularidades que cada sujeito apresenta, assim o homem é um ser singular que precisa fazer parte do contato social para se desenvolver e que, sem as trocas as diversidades não seriam percebidas, nem compreendidas. Mesmo sendo um ser singular, o homem é um ser social e suas interações com o meio enriquecem seu processo de formação. Não se pode esquecer de suas singularidades e necessidades individuais. Assim, o desafio é oferecer a todos uma educação de qualidade que lhes proporcione oportunidades e mesmas possibilidades humanas e sociais inerentes a qualquer indivíduo, sejam eles disléxicos ou não. A cada ano o desafio é incluir e, além disso, desenvolver um trabalho de qualidade com as pessoas disléxicas, mas muitos educadores encontram dificuldades em realizar sua ação pedagógica, o que compromete também a aprendizagem nas escolas. Com esta situação surge a problemática deste estudo que pode ser expressa da seguinte maneira: como a Neurociência pode colaborar na compreensão da dislexia, abordando as áreas funcionais da linguagem, favorecendo o trabalho de todos aqueles envolvidos no processo de educar? Para responder a esta questão e realizar o objetivo deste trabalho, qual seja, investigar as contribuições que a Neurociência traz sobre a dislexia,
10 10 este estudo se deterá em três pontos específicos que são: explicar a evolução da espécie humana, as descobertas e avanços da Neurociência diante do funcionamento do cérebro e sua relação com a aprendizagem da linguagem aquisição da leitura e da escrita, identificar e caracterizar a dislexia; exemplificar ações neuropedagógicas que auxiliem os disléxicos. Buscando informações para a problemática abordada, é possível encontrar uma vasta bibliografia relacionada à aprendizagem e à dislexia, citando ainda estudos sobre a educação inclusiva, que vem se expandindo cada vez mais. Porém, quando se trata da Neurociência voltada para a dislexia com ações neuropedagógicas os estudos publicados ainda são recentes, por ser a Neurociência uma área nova. Daí a importância da continuidade de pesquisas empíricas relacionadas ao assunto. Desta forma, conceber tais ações com enfoque inclusivo que oriente os professores na sua prática docente e a família, deve ser um ideal que anseia por investigações e práticas contínuas para se obter respostas válidas e concretas que realmente colabore com a qualidade na aprendizagem dos disléxicos. Diante da situação desafiadora e a necessidade de uma prática neuropedagógica na educação, este estudo torna-se importante por refletir a atuação da Neurociência e sua contribuição com os aspectos pedagógicos e psicopedagógicos da educação. O estudo e a investigação do objeto as colaborações da Neurociência na compreensão da dislexia pretende oferecer subsídios aos educadores, familiares e todos aqueles envolvidos com a educação, no sentido de permitir um maior embasamento com relação às questões da dislexia, desejando que todos os sujeitos disléxicos ou não, sejam entendidos e respeitados com suas reais necessidades, pois são capazes e podem ser autônomos trazendo desenvolvimento à sociedade, oferecendo-lhes uma educação viva, ativa e de qualidade. Nesta perspectiva, com as novas contribuições da Neurociência, pretende-se alcançar mudanças e melhorias na educação brasileira, visando
11 11 uma aprendizagem de qualidade com o desenvolvimento de ações neuropedagógicas conscientes abertas às necessidades dos educandos, será possível considerar uma grande conquista no trabalho educativo e na vida dos sujeitos que convivem com a dislexia.
12 CAPÍTULO I 12 A IMPORTÂNCIA DA NEUROCIÊNCIA UM BREVE HISTÓRICO Este primeiro capítulo traz alguns aspectos relevantes referentes ao percurso histórico dos avanços da Neurociência, abordando a evolução dos estudos e descobertas sobre o cérebro, o que atualmente colabora com diversas áreas, inclusive a educação. Para compreender um pouco mais este processo histórico faz-se necessário abordar questões pertinentes à antropologia e a própria história da neurociência, o que ajuda a entender o fantástico funcionamento do cérebro humano. 1.1 Evolução Humana aspectos antropológicos O naturalista inglês Charles Darwin propôs sua famosa teoria da seleção natural, em 1860, o que permitiu aos especialistas dizer que a espécie humana moderna, o Homo Sapiens, evoluiu a partir de outras espécies, que o remete a um primata, o primeiro dos hominídeos. Ao longo do século XX, inúmeras descobertas paleoantropológicas demonstraram a existência de um grande número de espécies de hominídeos, como o Australopithecus, todas elas surgidas na África, em um período que cobre os últimos 5,5 milhões de anos. O crescimento gradativo da capacidade craniana e do volume do cérebro, o aparecimento da postura ereta permanente, o surgimento do uso de ferramentas e da cultura simbólica, o domínio de tecnologias como o fogo e a construção de abrigos e a caça, tudo isso é bastante evidente a partir do exame do registro arqueológico dos hominídeos, até o surgimento, 2 milhões de anos atrás, do Homo Habilis (homem habilidoso)
13 13 e do Homo Erectus (homem ereto), as primeiras espécies que podem ser consideradas "humanas", no seu sentido moderno, pois desenvolveram a linguagem falada complexa, a escrita, a construção de ferramentas, as vestimentas, o fogo e tiveram sua capacidade craniana aumentada de 500 para 1200 cm3. Todas essas características, diretas ou indiretamente, se relacionam ao desenvolvimento do nosso cérebro. O enorme cérebro desenvolvido principalmente no córtex cerebral dotou o ser humano de propriedades que não existem, ou existem de forma primitiva em outros animais. É no córtex que há os mais altos níveis de análise sintética. É lá que a visão do mundo é analisada, planejada e programada para executar uma ação. O grande desenvolvimento do cérebro, por sua vez, levou ao nascimento de símbolos verbais, objetos da realidade e conceitos abstratos. Além da capacidade verbal, desenvolve-se a habilidade de emitir sons de alta precisão o que permitiu a evolução cultural e a transmissão de símbolos de um ser humano a outro. Com isso desenvolveu-se o conhecimento, que é uma propriedade única do ser humano, tendo relação com o pensamento e a consciência (que certamente podem existir em outros primatas não humanos, mas que diferem em um grau muito amplo em relação à espécie humana). Quando o homem se tornou um animal tribal, desde que começou a andar ereto, mais de 4 milhões de anos atrás, passou a ser um caçador e guerreiro tribal, onde a cooperação social era um fator importante de sobrevivência. Todos os instintos sociais humanos se desenvolveram bem antes da esfera intelectual: instinto maternal, cooperação, curiosidade, criatividade, compaixão, altruísmo, e competitividade são comportamentos antigos, e podem ser vistos também em outros seres da natureza. Mas, o ser humano novamente se distingue dos outros primatas através de uma característica mental muito forte: o autocontrole, a capacidade de modificar qualquer comportamento social, mesmo que instintivo, de maneira
14 14 a torná-lo mais útil para a sobrevivência. Quanto mais disciplinado e capaz de autocontrole e de planejamento, mais humano pode ser considerado. Portanto, a espécie humana também tem o singular dom de dominar o cérebro emocional por meio do cérebro racional. Isto, acoplado à capacidade de planejar, gerou um animal capaz de vencer através da inteligência, usando para si aquelas espécies que são úteis para seu próprio benefício como: as bestas de carga, as cobaias de laboratório, transformando os outros animais em alimentos. Diante da evolução tanto de suas estruturas internas como da capacidade de se adaptar ao meio externo, atualmente já se conhece características fundamentais do funcionamento cerebral, permitindo classificar o cérebro em três tipos: a) Cérebro Primitivo - formado pelo tronco cerebral, pelo bulbo, pelo cerebelo, ponte e mesencéfalo, pelo globo pálido e os bulbos olfatórios, responsável pela manutenção da vida vegetativa, capaz de adaptar-se ao frio, ao calor, à fome e à sede. Pode comandar a maior ou a menor intensidade de multiplicação das partes e do todo; de corrigir os inúmeros desvios do processo de formação do ser; de identificar o perigo e comandar a resposta. É, enfim, a expressão maior da pulsão inicial da vida na cadeia evolutiva. É neste cérebro que ocorre a manifestação primeira da vida, que se encontram as informações de maior importância da experiência evolutiva do homem, desde a célula inicial até hoje. De alguma forma, nesta evolução, todas as experiências do homem, estão inscritas nas sinapses do cérebro primitivo. O cérebro humano ainda adquiriu três componentes que foram surgindo e se superpondo: a parte inferior, a mais primitiva, correspondendo ao cérebro dos répteis, é onde se encontram algumas estruturas como as do tronco cerebral, responsáveis pelas ações involuntárias e o controle de certas funções viscerais (cardíaca, pulmonar, intestinal, etc), indispensáveis à preservação da vida.
15 15 É nesta porção primitiva que são gerados os atos e comportamentos mais básicos para a sobrevivência e preservação da espécie (os mecanismos de agressão, de defesa, as posições hierárquicas no grupo e a delimitação de território). Apesar da impressionante dominância do neocórtex, até hoje muitos atos são conduzidos com base no cérebro primitivo, como os antepassados, há milhares de anos, pois possuíam e ainda possuem comportamentos ritualísticos, matam para comer, tendem a discriminar pessoas fora do mesmo grupo imediato (família, aldeia, raça) e defendem o espaço (domínio territorial). b) Cérebro Intermediário local onde se encontram as estruturas límbicas que têm como principal função coordenar as emoções. Corresponde ao cérebro dos mamíferos antigos. Muito se tem estudado e discutido quanto à localização e os caminhos que as emoções percorrem, tem-se observado que não há uma delimitação precisa da região onde se dão as emoções, pode-se apenas afirmar que a região que intermedeia as emoções localiza-se entre o cérebro primitivo e o neocórtex. c) Cérebro Superior - a mente é resultado da ação combinada e integrada de todas estas partes. O cérebro superior ou cérebro racional posiciona-se recobrindo todo o encéfalo. É composto pelos dois hemisférios cerebrais e de alguns conjuntos de neurônios subcorticais. É constituído por um tipo de tecido cortical de formação recente chamado neocórtex. Acima de tudo encontra-se o neocórtex, que funciona como a sede da consciência. No processo evolutivo do embrião humano, percebe-se que foi o último a ser formado. O homem, através do neocórtex, toma consciência de si mesmo e assume um papel dominante na escalada evolutiva do planeta. Foi através do neocórtex que ele se projetou no mundo da ciência, buscando conhecimento. O conhecimento gerado através desta estrutura de certa forma se tornou independente de sua origem. A tomada de consciência nada mais é do que uma experiência evolutiva que pode resultar em bem ou mal sucedida, de acordo com a aplicação dessa consciência. Se aplicada na perpetuação da pulsão de vida,
16 16 pode ser uma experiência positiva, porém, se aplicada de forma desastrosa, age contrariamente à pulsão de vida, como se vem fazendo, daí a importância do uso deste cérebro racional em observações e pesquisas significativas que ajudem a espécie humana a compreender melhor sua evolução, seu organismo biológico, suas dificuldades, possíveis distúrbios e problemas que afetem a sua rotina saudável de vida, caminhando em busca de respostas e soluções que amenizem as dores e os sofrimentos humanos. 1.2 Descobertas sobre o funcionamento do cérebro humano Pode-se dizer que desde a antiguidade ocorreram participações significativas neste processo de busca pelo entendimento das estruturas do encéfalo, permeando estudos e descobertas, muitas vezes, pertinentes nesta compreensão o que ajudou o homem no combate a prejuízos à sua saúde. Sendo assim, pode-se citar vários exemplos de contribuições que ajudaram a chegar naquilo que se sabe atualmente. A começar pelos gregos, pois acreditavam que os ventrículos cerebrais eram órgãos sede dos humores e da capacidade intelectual do homem, tal ideia deste povo aguçou a curiosidade de vários estudiosos e pesquisadores, como Galeno, por exemplo (177 d. c), mas no século XVI Andrea Versalius comparou a ideia da capacidade intelectual estar nos ventrículos com o exemplo dos asnos, refutando esta crença, pois os asnos possuem ventrículos e não tem capacidade intelectual. O Período Clássico abordou duas correntes: Hipocrática, a qual localizava a mente no cérebro e Aristotélica, a mente tinha sua sede no coração, ao cérebro cabia somente esfriar o sangue. Para Aristóteles a psique era uma entidade (não material) que governava o comportamento, visão esta também adotada pelo cristianismo em todo o Ocidente. Na Era Moderna (1649) Descartes se opõe ao pensamento aristotélico, localizando a mente no cérebro. Além de localizá-la no cérebro, ele a ligou ao
17 17 corpo, via a mente e o corpo como coisas separadas que se interligavam. Os nervos eram ocos, por onde circulava o espírito animal e que a sede da mente estava na glândula pineal. Ele ainda utilizou seus conhecimentos de dispositivos mecânicos para explicar que as funções do corpo tinham princípios semelhantes. Também propôs a ideia de arco reflexo, identificando seus componentes, como: a sensação de dor, a condução da mesma pelos nervos que levam ao sistema nervoso central, os nervos motores sendo excitados e finalmente os músculos que são responsáveis pela ação. Gall ( ) foi o primeiro médico e neuroanatomista a defender a ideia de que diferentes funções do córtex se localizam em diferentes regiões. Explicou em seus estudos três ideias radicais: 1) Todo comportamento emana do cérebro; 2) Determinadas regiões do córtex controlam funções específicas, não agindo como um órgão único, dividido pelo menos em 27 órgãos; 3) Sem comprovação científica, seria de que o centro de cada função cresceria com o uso, o crânio incharia nas regiões mais desenvolvidas. Diferente de Gall, Johann Spurzheim o dividiu em mais de 35 órgãos. Em 1815 Thomas Foster chamou o trabalho de Gall e Spurzheim de Frenologia (phrenos do grego = mente). Com o passar do tempo a frenologia foi atacada pela ciência oficial, porém os estudos de Gall contribuíram para a realização em laboratórios de experimentos por meio de lesões em animais para analisar suas consequências, dando origem a Neurociência Experimental. A partir daí, várias pesquisas sérias seguiram os estudos de Gall referentes ao localizacionismo cerebral. Cita-se ainda, Luigi Rolando que descobriu uma fissura no cérebro que recebeu seu nome, sendo o responsável pela primeira estimulação de um nervo no tecido cerebelar em 1809; pesquisando em cérebros de pombos Pierre Flourens ( ) foi considerado o pai da pesquisa experimental cerebelar e Phineas Gage (1848) atingido em uma explosão por uma barra de ferro na parte frontal do cérebro, apesar de ter vivido muitos anos depois deste incidente, teve seu comportamento totalmente transformado.
18 18 Entre Pierre Broca descobre a área do cérebro relacionada à expressão da fala, em seus estudos sobre afasia, com base em dados anatômicos, situou o centro da imagem motora das palavras na terceira circunvolução frontal, no hemisfério cerebral esquerdo, ao observar que este hemisfério era sede desta função simbólica e cognitiva que é a linguagem. Alguns anos depois, Carl Wernicke (1874) estudou uma área do cérebro relacionada a um tipo de afasia, compreensão da linguagem (área auditiva da linguagem), mais à frente, estas áreas serão abordadas de forma detalhada diante das questões da dislexia. Os progressos conquistados nas correlações das funções do cérebro com determinadas áreas, só foi possível com as descobertas de Luigi Galvani abordando a Eletricidade Animal, utilizando rãs que o levou a dedicar-se a eletrofisiologia a contração muscular só acontece por meio de estímulos elétricos. Assim, a eletricidade quebrava o paradigma da mecânica, sendo a principal responsável pelo funcionamento do sistema nervoso. Luigi Galvani, médico e anatomista italiano, foi um dos primeiros a investigar experimentalmente o fenômeno chamado bioeletricidade. Em uma série de experimentos descobriu que a corrente elétrica liberada por um jarro de Leyden ou um gerador eletrostático rotatório causava a contração dos músculos na perna de um sapo e de muitos outros animais, tanto ao aplicar a carga no músculo ou no nervo. Para ele a contração muscular era uma prova de que os músculos do sapo estavam gerando eletricidade por si próprios, como um tipo de energia vital similar, mas diferente da eletricidade natural gerada por máquina ou raios. Os experimentos de Galvani estabeleceram as bases para o estudo biológico da neurofisiologia e neurologia. Com isso, a mudança de paradigma se consolidou - os nervos não eram tubos de água ou canais, como Descartes e seus contemporâneos pensavam, mas condutores elétricos. A informação no sistema nervoso era transmitida pela eletricidade gerada diretamente pelo tecido orgânico.
19 19 No século XIX já era possível o uso de técnicas sofisticadas em animais e em humanos, ferramentas capazes de construir mapas detalhados das funções cerebrais. Em 1902, Fedor Krauze publica 142 casos em humanos, e também é publicada a citoarquitetura do córtex, com 47 áreas. Os estudos de pesquisas na área de bioeletricidade e do localizacionismo cerebral se incrementaram com os avanços técnicos, com a descoberta de novos aparelhos: como Eletrômetros, Galvanômetros, Comutadores e Indutores e também com avanços na microscopia. No final do século XIX o conceito de localização cerebral foi estabelecido nas Neurociências. Atualmente, a informação de que determinadas funções cerebrais são desempenhadas por algumas estruturas e não por outras, é de conhecimento da grande maioria das pessoas, graças aos estudos persistentes de longos anos, destes vários pesquisadores que de forma tímida ou mais evidente, trouxeram marcantes e preciosas informações aos dias atuais. Comprova-se assim, a doutrina do localizacionismo cerebral com a ajuda dos mais sofisticados exames de imagens como ressonância magnética funcional (FMRI), tomografia por emissão de positron (PET), dentre outros que permite com precisão, visualizar as funções cerebrais no momento em que as mesmas estão sendo realizadas pelo cérebro. Tal desenvolvimento das ciências e da tecnologia foi um marco no auxílio à humanidade, sendo utilizado com o intuito de trazer respostas não só a doenças, lesões e distúrbios, como é o caso da dislexia, mas colaborar, inclusive, com a própria aprendizagem humana. 1.3 Uma visão neurocientífica do Aprender Como se aprende sempre despertou a curiosidade daqueles interessados nas capacidades cerebrais, por este motivo, muito se pesquisou e se descobriu diante da arte do aprendizado, afinal abordar todo o
20 20 processamento neuronal que envolve a aprendizagem pode ser considerado uma verdadeira obra-prima, até mesmo do ponto de vista educacional. Assim, a necessidade de melhor conhecer o Sistema Nervoso Central e o crescimento de investigações sobre o seu funcionamento nas últimas décadas, levou a Organização Mundial de Saúde a eleger a década de 90 como a Década do Cérebro. Deste modo, não se poderia simplesmente relatar as questões da dislexia sem primeiramente compreender com a ajuda destas investigações onde se dá a aprendizagem. RIESGO (2006, p. 21) aborda que... o processo de aprendizagem se dá do Sistema Nervoso Central que é uma estrutura complexa. Quando chega ao SNC uma informação conhecida, ela gera uma lembrança, que nada mais é do que uma memória; quando chega ao SNC uma informação inteiramente nova, ela nada evoca e sim produz uma mudança isso é aprendizado, do ponto de vista estritamente neurobiológico. Entende-se dessa forma que, o cérebro tem uma ampla capacidade de aprender e de sofrer modificações do que se pensava até anos atrás, uma vez que, cada cérebro apresenta cerca de cem bilhões de neurônios e o sistema nervoso tem duas funções básicas: a manutenção da homeostase do organismo e a emissão de comportamentos, resultados da interação dos fatores genéticos com o ambiente externo, sofrendo modificações constantes, a partir desta relação entre meio externo e interno a aprendizagem começa a ser definida. Com a chegada das informações captadas pelos órgãos dos sentidos no cérebro, por meio dos neurônios, as áreas de processamento dessas informações
21 21 são ativadas, depois de interpretadas e compreendidas, são enviadas para a amígdala que é uma estrutura subcortical situada no lobo temporal, decidindo quais experiências foram importantes o bastante para armazenar. Essa seleção depende, é claro, do significado emocional, ou seja, se um fato não marca suficientemente o indivíduo para ser arquivado, a amígdala não exerce seu papel. Caso ocorra o contrário, um fato chocante demais, ela ficará hiperativa, provocando o cancelamento da memória. Tal função confere a amígdala uma posição extremamente importante na aprendizagem, pois sendo significativa ficará retida na memória. O próximo passo das informações é chegar ao hipocampo, onde serão fixadas por segundos ou dias, na memória de curta duração, sendo depois, distribuídas para as outras áreas do cérebro onde ficarão arquivadas. Com a ajuda de processos bioquímicos e estruturais muitas conexões entre células de diferentes regiões cerebrais são ativadas, formando redes neurais de combinações infinitas, permitindo, o armazenamento da memória. Após a consolidação destas informações, inicia-se a próxima etapa caracterizada pela evocação das mesmas, entrando em ação o córtex frontal para comparar informações novas e antigas, colaborando na resolução de problemas e planejamento. Entende-se desse modo que, as capacidades de linguagem, percepção, compreensão, fala, escrita e resolução de problemas requerem o armazenamento de informações, pois aprender nada mais é do que a formação de uma rede de conexões das unidades neuronais, em que a aprendizagem se dá pela modificação e consolidação dessas conexões, após experiências vividas, retenção de hábitos ou aquisição de novas informações. O sistema nervoso codifica a linguagem, coordena sua emissão e recepção e a decodifica. Para a emissão, trabalham os órgãos relacionados ao aparelho fonador e os músculos da escrita. Na recepção da linguagem trabalham principalmente as orelhas e os olhos. Quanto aos aspectos neurais, a emissão abrange, basicamente, o cerebelo, o córtex motor do cérebro (situado na porção posterior do lobo frontal), a área de Broca (também localizada na porção posterior do lobo frontal esquerdo) e os nervos motores.
22 22 Há diferentes pontos do córtex motor que geram os movimentos da laringe, da mandíbula, da língua e dos lábios, como também pontos que comandam a habilidade das mãos para vários movimentos, inclusive a escrita. O Sistema Nervoso Central recebe os estímulos do meio também pela área auditiva situada no lobo temporal e pela visual localizada com predominância no lobo occipital. Tem-se ainda, a área de Wernicke localizada na parte posterior do lobo temporal esquerdo, nervos sensitivos e as áreas motoras, relacionadas com os movimentos oculares e a rotação da cabeça, movimentos presentes durante a leitura. Uma lesão na área de Wernicke impede a pessoa de entender as palavras que ouve, embora reconhecendo os sons e emitindo palavras com significado claro. A decodificação da linguagem escrita acontece no giro angular, situado na junção dos lobos parietal, temporal e occipital, integrando as informações sensoriais, auditivas e visuais. Estas informações são processadas respectivamente em cada uma dessas regiões. Outra área importante é o giro angular esquerdo, fundamental para a leitura e a escrita por ocupar uma posição central, lesões nesta área impedem a pessoa de compreender o que lê, embora não tenha comprometimento na fala. Sendo assim, foi possível perceber as áreas cerebrais que apresentam uma valiosa participação e importância nas questões relacionadas à aprendizagem de uma forma global e como as descobertas de especialistas, neurocientistas e pesquisadores trouxeram a oportunidade de maior compreensão e entendimento frente ao funcionamento do nosso organismo, sua atuação com o meio, nesta interdependência. Esta trajetória de descobertas possibilita sair um pouco do desconhecido e pensar a aprendizagem e possíveis dificuldades em uma ótica biológica e não somente filosófica ou teórica, permite compreender que as áreas cerebrais precisam estar em sintonia, uma com a outra, para que efetivamente as conexões neurais se estabeleçam e a aprendizagem aconteça.
23 CAPÍTULO II 23 COLABORAÇÕES DA NEUROCIÊNCIA NA COMPREENSÃO DA DISLEXIA O interesse crescente dos estudiosos ligados às neurociências tanto na área da saúde como da educação tem contribuído de forma significativa para o conhecimento da das áreas responsáveis pela linguagem, que é de fundamental importância na comunicação interpessoal e para este estudo no sentido de compreender a dislexia. Como já foi abordado no capítulo anterior, com as descobertas da neurociência, hoje já é possível ver o cérebro de alguém em funcionamento. Estudos sofisticados com imagens do cérebro de uma pessoa que está lendo permite aos pesquisadores rastrear o registro da palavra impressa (a leitura pelo lobo occipital) quando ela é percebida visualmente, sendo depois transformada em som da linguagem (área de Broca) e logo após ativa seu significado (área de Wernicke). Sabe-se então, que a comunicação humana (fala e linguagem) depende diretamente dos processos que ocorrem no sistema nervoso, quando o funcionamento ou desenvolvimento deste processo não está acontecendo como deveria, algumas dificuldades podem surgir, com isso é necessário estar atento. Muitas vezes, no início do desenvolvimento, quem percebe a dificuldade na aquisição da linguagem é a família ou uma pessoa mais próxima da criança, comparando-a com outras crianças de mesma idade ou o profissional da saúde, um pediatra, por exemplo, que a acompanha. Por isso, este profissional deve possuir um bom entendimento da definição, da natureza e das causas dos distúrbios e das dificuldades para contribuir no processo de diagnóstico, visando uma intervenção precoce e intensiva, pois quanto antes isso acontecer melhor será para a criança.
24 24 Com isso, cabe ressaltar que um distúrbio refere-se a uma questão que compromete um normal desenvolvimento de alguns aspectos no sujeito, trazendo um prejuízo ao convívio e bem-estar social do mesmo, todavia, compreende-se que uma pessoa com algum tipo de distúrbio da linguagem tende a sentir-se desvalorizada ou incapaz diante das dificuldades que apresenta, atingindo diretamente sua comunicação e causando prejuízos em seu relacionamento com os outros indivíduos e na sua autoestima. 2.1 Áreas Funcionais da Linguagem Entende-se que a linguagem é uma capacidade peculiar de se comunicar por meio de um código simbólico adquirido (fala, gestos ou escrita), o que permite transmitir pensamentos, ideias, emoções e sentimentos aos semelhantes. No primeiro capítulo já foram abordadas as contribuições de Broca e Wernicke com suas descobertas relacionadas à linguagem, mas vale retomar estes estudiosos referindo-se de forma mais aprofundada sobre suas colaborações. A partir dos estudos de Broca, afirmando que a fala acontece no hemisfério esquerdo, deu-se início a ideia de assimetria hemisférica, observando-se uma mão dominante, geralmente, a direita e a lateralização das atividades com a mão, o pé e o olho, dando a este hemisfério as características de dominância para os três seguimentos. Com estas contribuições, sabe-se atualmente que o hemisfério esquerdo é, na maioria das vezes, o responsável pelo controle da sequência temporal do ato de falar, sendo sua função mais lógica com uma análise sequencial da informação, tendo esta área relação com a articulação da fala. Mais tarde Wernicke estudando pacientes afásicos, encontrou mais dificuldades na compreensão do que na expressão, ficando claro que, a área de Wernicke no hemisfério esquerdo está relacionada ao significado da palavra
25 25 e sua relação com as outras palavras da frase. Já esta região na parte temporal no hemisfério direito relaciona-se a compreensão da emoção contida no ato de falar, ou seja, a compreensão da afetividade na linguagem. Os avanços dos estudos relacionados às áreas da linguagem mostram que as áreas anatômicas da linguagem são mais complexas e constam de: a) área de Broca (área 44) e parte da área de Brodmann (área 45) localizada no pé da circunvolução frontal ascendente, responsável pelo planejamento motor da linguagem oral; b) área de Wernicke (área 42 de Brodmann) nas porções mediana e superior do lobo temporal, responsável pela percepção auditiva envolvida na linguagem; c) fascículo arqueado que liga as duas áreas anteriores; d) circunvolução angular ou prega curva, que corresponde à área 39 de Brodmann responsável pela integração do lobos parietal, occipital, frontal e temporal, situada no entroncamento parietotemporoccipital, mas tem ligações com as áreas motoras da fala e da escrita; e) circunvolução supramarginal, localizada no lobo parietal inferior; f) fibras de associação como o corpo caloso, que constitui a principal estrutura integradora inter-hemisférica; g) áreas subcorticais que constituem o quadrilátero de Pierre Marie, acrescido do tálamo; h) área frontomesial anterior, nos dois hemisférios, sendo predominante no esquerdo, responsável pela intenção e vontade de usar a linguagem; i) hemisfério não dominante responsável pela prosódia e pelo pragmatismo. Compreende-se melhor as áreas relacionadas à linguagem nas figuras abaixo de acordo com SHAYWITZ (2006, p.62 e 71)
26 26 Vale ressaltar que nas crianças tais áreas ainda não estão bem estabelecidas e as desordens aferenciais, sensoriais e motoras podem transtornar a organização da linguagem, mesmo sem uma lesão cerebral, pois
27 27 não há centros pré-formados e sim, pré-formas de organização que aos poucos vão adquirindo forma à medida que a comunicação vai se estabelecendo. A maturação acontece primeiro nas áreas posteriores occipitotemporais e depois nas anteriores frontais e pré-frontais, por isso a maturação da assimetria hemisférica no nascimento apresenta-se nos dois hemisférios cerebrais, contudo, diante da herança genética já se pode observar em recém-nascidos leve assimetria na parte temporal do hemisfério esquerdo, o que ocorre devido a rápida maturação e maior plasticidade cerebral nos dois primeiros anos de vida. A partir desta idade, o lado esquerdo do cérebro apresenta a região temporal, responsável pela linguagem, mais desenvolvida no hemisfério esquerdo do que no direito. Quando chega a fase adulta, a linguagem é controlada, na maioria das vezes, pelo hemisfério esquerdo. A percepção da fala é conduzida para a área de Wernicke, no lobo temporal esquerdo pelo nervo auditivo (VIII nervo craniano), onde a mensagem é decodificada. A informação é transmitida pelo fascículo arqueado para a área de Broca, também no hemisfério esquerdo, local de elaboração da resposta motora, sendo assim, entende-se que o hemisfério esquerdo é dominante para a linguagem no adulto, mas não na criança bem pequena. Nesse caminho que a informação faz em nosso cérebro para chegar à aquisição da linguagem, não se pode desconsiderar os estímulos do meio, compreendidos pelos sentidos que também fazem parte de todo o processo e assim, a linguagem acontece em etapas dependentes entre si, que podem ser classificadas em: 1) Sensação capacidade de sentir o som; 2) Percepção capacidade em que se reconhece o som; 3) Elaboração capacidade de reflexão sobre os sons percebidos; 4) Programação ou organização das respostas e articulação capacidade de permitir a emissão sonora que depende da articulação da fala.
28 28 Este panorama sobre os processos cerebrais que envolvem a linguagem facilita a compreensão frente ao trabalho do cérebro e as vias de acesso que possui para que tal capacidade de comunicação seja eficiente. 2.2 Dislexia e linguagem Para uma melhor noção da complexidade do universo que envolve a dislexia e sua relação com a linguagem, deve-se entender a definição de leitura que, para muitos em um sentido amplo, é como a interpretação de sinais gráficos, levando o pensamento a imaginar uma outra situação além daquela vivida no momento real. Fazendo uma análise de forma restrita, a leitura é vista como a interpretação de sinais gráficos, que uma comunidade convencionou utilizar para substituir os sinais linguísticos da fala, em se tratando de substituir, mentalmente ou pela fala, as palavras ou ainda dizer que a leitura é a capacidade de levantar hipóteses e conclusões diante das informações coletadas no texto, criando novas ideias. Sendo assim, ao perceber que a leitura apresenta um enredamento relacionado à aprendizagem simbólica, pois uma pequena mudança em uma palavra já altera seu sentido e pronúncia, convém explicar que ler envolve atenção, habilidade motora, vários tipos de memória, organização de texto e imagem mental. Neste aspecto também é preciso levar em consideração a subjetividade, a idade, o sexo, hereditariedade, prática e motivação do indivíduo. Para tanto, a linguagem como a leitura são atividades que, apesar de simples para muitos, podem para alguns ser sinônimo de entraves e dificuldades, principalmente no caso dos disléxicos. Sabe-se que a aquisição da leitura é um processo muito importante em nossa sociedade, principalmente na fase da alfabetização, contudo alguns sujeitos a partir deste período começam a apresentar significativas dificuldades no que se refere à leitura e a escrita. É bem verdade que nem todos os casos de dificuldades de aprendizagem, em se tratando da leitura e da escrita, deve
29 29 ser entendido como dislexia, por isso a necessidade de ter o cuidado em não generalizar e buscar um diagnóstico sério e preciso, pois afeta uma minoria de sujeitos. No Brasil, como em muitos outros países foi adotado atualmente o termo dislexia para denominar um distúrbio específico na aquisição da leitura e da escrita, tal nomenclatura foi dada pelo fato de etimologicamente, ao desmembrar a palavra dislexia termos: dis = distúrbio, dificuldade; lexia = leitura (do latim) e /ou linguagem (do grego), então, temos dislexia = distúrbio da linguagem. Este termo foi usado pela primeira vez por Berlin, em 1872, ressurgiu em 1917 com Hinshelwood que atendeu um paciente com inteligência normal, mas apresentava dificuldades na leitura e na escrita. Foram observadas distorções perceptivas em crianças que não conseguiam reconhecer e compreender palavras impressas, concluiu-se na época que a causa mais provável seria um defeito no cérebro, afetando a memória visual de palavras e letras, por isso os oftalmologistas foram os primeiros profissionais a auxiliarem no reconhecimento da dislexia, suas contribuições ocorreram no sentido de mostrar que a dificuldade apresentada não estava relacionada a um problema nos olhos, e sim, no funcionamento de áreas responsáveis pela linguagem no cérebro. A primeira definição mais esclarecedora sobre dislexia é do neurologista americano, Dr. Samuel T. Orton, que foi homenageado tendo seu nome na primeira instituição para pesquisas e estudos sobre a dislexia, a Orton Dislexia Society, a atual International Dyslexia Association, cuja definição foi citada por IANHEZ e NICO (2002, p. 21) È uma dificuldade que ocorre no processo de leitura, escrita, soletração e ortografia, não é uma doença, mas um distúrbio com uma série de características. Torna-se evidente na época da
30 30 alfabetização, embora alguns sintomas já estejam presentes nas fases anteriores. Apesar da instrução convencional, adequada inteligência e oportunidade sociocultural e ausência de distúrbios cognitivos fundamentais, a criança falha no processo de aquisição da linguagem. A dislexia independe de causas intelectuais, emocionais e culturais. É hereditária e a maior incidência é em meninos na proporção de três para um (ou seja, a cada três meninos que nascem com dislexia, apenas uma menina nasce disléxica). Com base nas descobertas do dr. Orton e outros pesquisadores que se dedicaram ao tema, a partir da década de 60 intensificou-se a busca na tentativa de encontrar uma definição para o termo dislexia, considerando-a um distúrbio que se manifesta pela dificuldade na aprendizagem da leitura, mesmo com um bom nível de inteligência e um ambiente sociocultural adequado. A definição mais aceita atualmente é a que segue abaixo, encontrada nas pesquisas de neuroanatomia e neuropsicologia e adotada pela Associação Brasileira de Dislexia, elaborada no Comitê de Abril de 1994, citada por IANHEZ e NICO (2002, p. 23) A dislexia é um dos distúrbios de aprendizagem. É um distúrbio específico de linguagem, de origem constitucional caracterizado pela dificuldade em decodificar palavras simples. Mostra uma insuficiência no processo fonológico. Essas dificuldades em relação às palavras simples não são esperadas em relação à idade. Apesar de
31 31 instrução convencional, adequada inteligência, oportunidade sociocultural e ausência de distúrbios cognitivos e sensoriais fundamentais, a criança falha no processo da aquisição da linguagem com frequência, incluídos aí os problemas de leitura, aquisição e capacidade de escrever e soletrar. Convém ainda expressar que, ao menor sinal de dificuldade na linguagem, não podemos identificar um indivíduo como disléxico. Para um diagnóstico preciso é necessário investigar e observar várias causas com caráter multidisciplinar e de exclusão, a observação de alguns sintomas deve ser incluído em um quadro de risco, ou seja, apresentar algumas características que podem confirmar a dislexia, mas isso precisa ser aprovado com uma avaliação adequada. Em todas as idades os leitores que apresentam uma leitura consistente e fluente ao lerem ativam fortemente a parte posterior do cérebro, com menor ativação na parte frontal, os disléxicos apresentam mudanças com o passar da idade nas ativações cerebrais, tal ativação nas crianças disléxicas mais velhas é maior nas regiões frontais, de forma que, quando adolescentes acontece uma superativação na área de Broca, ou seja, passam a usar mais frequentemente as regiões frontais para a leitura e então, precisam usar sistemas da parte frontal do cérebro para compensar o problema da parte posterior, esta é uma maneira de tentar equilibrar a dificuldade de leitura, como vemos na figura a seguir SHAYWITZ (2006, p. 74)
32 32 Por conta disso, os disléxicos utilizam sistemas de leitura compensatórios, além de dependerem mais da área de Broca, eles usam outros caminhos secundários, fazendo uma diferente rota de leitura, localizado no lado direito na parte anterior do cérebro, mas que não é automático, impedindo o reconhecimento rápido das palavras, o desenvolvimento da parte anterior e do lado direito, permite uma leitura precisa, mas ainda muito lenta. Também é importante frisar que durante muito tempo não havia um consenso com relação às características mais aparentes da dislexia, mas atualmente especialistas abordam que os sintomas mais comuns da dislexia são: Desempenho inconstante; Demora na aquisição da leitura e da escrita; Lentidão nas tarefas de leitura e escrita, mas não nas orais; Dificuldade com os sons das palavras e, consequentemente, com a soletração; Escrita incorreta com trocas, omissões, junções e aglutinações de fonemas;
33 Dificuldade em associar o som ao símbolo; 33 Dificuldade com rima (sons iguais no final das palavras) e aliteração (sons iguais no início das palavras); Discrepância entre as realizações acadêmicas, as habilidades linguísticas e o potencial cognitivo; Dificuldade em associações, por exemplo, associar um rótulo ao seu respectivo produto; Dificuldade na organização sequencial, por exemplo, ordenar as letras do alfabeto, os meses do ano, tabuada, etc; Dificuldade em nomear objetos, tarefas, etc; Dificuldade em organizar-se com o tempo (hora), no espaço (antes e depois) e direção (direita e esquerda); Dificuldade em nomear números de telefone, mensagens, fazer anotações ou fazer alguma tarefa que sobrecarregue a memória imediata; Dificuldade em organizar tarefas e realizar cálculos mentais; Desconforto em tomar notas e /ou relutância para escrever; Persistência no mesmo erro, embora conte com ajuda profissional. Segundo o dr. Norman Geschwind, diretor da unidade de Neurologia do Beth Israel Hospital em Boston, citado por IANHEZ e NICO (2002, p. 27) O que pode ser dito é que os conhecimentos de vários aspectos da dislexia podem ser enriquecidos se forem vistos por um enfoque biológico e
34 34 sociológico. Temos de entender sua relação com o talento muito desenvolvido e também com as condições sociais que fazem dele um distúrbio. Temos de entender também as outras formas de distúrbio de aprendizagem, uma vez que estas podem nos ajudar a perceber aspectos da dislexia que, de outra forma, nos poderiam ter escapado. Quanto mais amplo o contexto em que observamos a dislexia, mais poderemos entender suas causas e isso, por sua vez, poderá contribuir para o refinamento do diagnóstico e também para o tratamento mais eficaz. Em se tratando da dislexia ou de qualquer outro distúrbio, um diagnóstico correto, feito no momento adequado, logo que as dificuldades tenham surgido ou as tenham observado, é de suma importância para a criança e para a família, liberando-os de um outro diagnóstico ou das dúvidas sobre o que realmente aquela criança apresenta. O diagnóstico da dislexia é de exclusão e por isso, deve ser feito por uma equipe multidisciplinar, formada por: psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo e quando necessário, deve ser feito um encaminhamento ao neurologista e outros profissionais, como: oftalmologista, pediatra, otorrinolaringologista, para se determinar se realmente existem fatores que possam estar comprometendo o processo de aprendizagem ou mesmo comprovar a dislexia. Por isso um diagnóstico multidisciplinar, pois todos os profissionais devem trocar informações para confirmar o distúrbio, ao grupo de profissionais também deve estar atrelado ainda a família e a escola, dois grupos aos quais a criança faz parte que sem nenhuma dúvida podem colaborar com informações e práticas valiosas nesse processo de investigação. A dislexia é um problema persistente até a vida adulta, o disléxico tem dificuldades em automatizar as operações relacionadas ao reconhecimento de
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