A condição da mulher na sociedade de classes: o machismo a serviço do capital Danielle Sampaio Albuquerque Niágara Vieira Soares Cunha O presente artigo tem como objetivo por em evidência a constituição do machismo no seio da sociedade capitalista, expresso na dupla jornada de trabalho feminina; na inserção precarizada no mercado de trabalho; na naturalização da função de reprodutora, mãe e consequentemente responsável pelo trabalho doméstico. Portanto, a nossa análise apresenta o machismo como um fenômeno material da sociedade do capital como elemento fundamental para extração ampliada da mais-valia. Para explicar nossa hipótese de que o machismo serve ao capital, apresentamos no presente artigo um breve histórico sobre a origem da opressão à mulher para chegarmos ao que é objeto do presente texto. À luz da teoria marxista, referencial que utilizamos neste trabalho, chegamos à conclusão que a luta cotidiana da mulher contra a opressão e a exploração deve ter um corte de classe, já que a luta contra o machismo é parte da luta contra a exploração dos trabalhadores. Por fim, apontamos que a emancipação da mulher só será possível em outro modo de sociedade, uma sociedade onde não existam classes sociais. SOBRE A ORIGEM DA OPRESSÃO DA MULHER Temos acompanhado com particular atenção à ênfase conferida por estudos em artigos, livros, jornais no que diz respeito ao problema da mulher como uma questão importante dentro das lutas da classe trabalhadora. Percebemos que a questão da mulher passou a ser chamada uma questão de gênero, ou seja, o termo gênero é utilizado hoje da mesma forma que é utilizado o termo cidadania, e que, no nosso entender esses discursos atuais cidadania e gênero não fazem uma reflexão marxista da realidade, no entanto, abandonou-se nos discursos de gênero. A tentativa de trazer de volta a questão da mulher como marco de classe, numa defesa do método marxista como o mais correto, faz-se necessário recorrermos a Marx e Friedrich Engels com a origem da família, da propriedade privada e do estado. Perante essa realidade, consideramos que o estudo proposto nesse artigo é de grande importância acadêmica e social, sendo pouco discutido no meio acadêmico, nas escolas, no nosso trabalho, em casa, com os amigos. Com o intuito de refletirmos sobre a problemática de pesquisa a ser investigada, torna-se necessário debruçarmos de forma breve na história da sociedade primitiva para nos localizarmos quanto ao contexto político atual da opressão feminina na sociedade capitalista. Portanto, o desenvolvimento da humanidade Engels (1884) nos explica através da classificação de Morgan: Estado selvagem Período em que predomina a apropriação de produtos da natureza, prontos para ser utilizados; as produções artificiais do homem são, sobretudo, destinadas a facilitar essa apropriação. Barbárie Período em que aparecem a criação de gado e a agricultura, e se aprende a incrementar a produção da natureza por meio do trabalho humano. Civilização Período em que o homem
continua aprendendo a elaborar os produtos naturais, período da indústria propriamente dita e da arte. Podemos perceber que no período do desenvolvimento da humanidade o homem transformou a natureza de acordo com as suas necessidades, para, então proceder à caça e a pesca para a sua alimentação até o período de produção das suas próprias vestimentas. Portanto, nas sociedades primitivas podemos afirmar que os papéis definidos por homens e mulheres no que diz respeito a fundamentos econômicos da sociedade, ou seja, o que é determinante em sua história obedece a lei da produção e reprodução da vida cotidiana. Segundo Aníbal (1986) na comunidade primitiva, a direção da economia doméstica, era entregue às mulheres, as crianças acompanhavam os adultos em todos os seus trabalhos, ajudavam-nos na medida de suas forças e, como recompensa, recebiam uma porção de alimentos como qualquer outro membro da sociedade. A criança adquiria a sua primeira educação sem que ninguém a dirigisse diretamente. Nesse momento, dá-se origem ao surgimento a partir desses três períodos estado selvagem, barbárie e a civilização que podemos chegar à história da origem da família. Para discorrer sobre tal assunto Engels (1884) afirma que os sistemas de parentesco e formas de família, a que nos referimos, difere dos de hoje no seguinte: cada filho tinha vários pais e mães. Portanto, nesse período existiram várias formas de família, a poliandria - mulheres que têm vários parceiros - e a poligamia - homens que têm várias parceiras. Porém, essas duas formas de matrimônio não se propagaram. A concepção tradicional que resultou e que se predomina hoje é a monogamia, que significa o casal solitário. O estudo da história primitiva revela-nos, ao invés disso, um estado de coisas em que os homens praticam a poligamia e suas mulheres a poliandria, e em que, por consequência, os filhos de uns e outros tinham que ser considerados comuns. É esse estado de coisas, por seu lado, que passando por uma série de transformações, resulta na monogamia. Essas modificações são de tal ordem que o círculo compreendido na união conjugal comum, e que era muito amplo em sua origem, se estreita pouco a pouco até que, por fim, abrange exclusivamente o casal isolado, que predomina hoje (ENGELS, 1884, p. 28). A mulher, na comunidade primitiva, desempenhava um papel de igualdade com os homens, não era vista apenas como mera reprodutora era livre e muito considerada. Os bens materiais eram coletivos, como não existia a propriedade privada também não existia as classes sociais. Logo, o que determinou a opressão e exploração da mulher nessa comunidade foi à passagem do matriarcado para o patriarcado. Com base no direito materno, isso é, enquanto a linha feminina herdava o direito à herança do seu parente falecido, de acordo com a primitiva lei, seus bens deveriam ficar dentro da linha materna. Com o passar do tempo, os filhos de um homem falecido não teriam direito a herança, pois se um proprietário de rebanho, por exemplo, falecesse, esse passavam a herança em primeiro lugar aos seus irmãos e irmãs, e os seus filhos viam-se desamparados. Dessa forma, na medida em que as riquezas iam aumentando, davam uma posição mais importante ao homem que a da mulher na família, com isso, faziam que nascesse no homem a ideia de levar vantagem, em proveito de seus filhos, a ordem de herança instalada. Conforme Engels (1884), dessa maneira, aconteceu o desmoronamento do direito materno, a grande derrota histórica do sexo feminino em todo o mundo. O homem apoderou-se também da direção da casa; a mulher viu-se degradada, convertida em servidora, em escrava da luxúria do homem, em simples instrumento de reprodução.
Contudo, a capacidade que a mulher tem de procriar passou a ser vista como sinal de fragilidade, de impotência, servindo a um crescimento da exploração do trabalho feminino e do controle sobre a reprodução. A comunidade familiar surge com o poder supremo do homem, o que caracteriza esses indivíduos, livres e não livres, é uma família submetida ao poder paterno. Portanto, o conceito de família significa: Famulus quer dizer escravo doméstico e família é o conjunto dos escravos pertencentes a um mesmo homem. De acordo com as diferenças existentes entre os sexos, a execução de determinadas tarefas na comunidade, deu lugar a um precoce começo de divisão do trabalho. Segundo Engels (1884), de acordo com a divisão do trabalho na família, o homem passou a procurar a alimentação e a criar novos meios de trabalho, consequentemente se considerava por direito o proprietário dos referidos instrumentos, em caso de separação levava-os consigo. Enquanto a mulher conservava apenas os seus utensílios domésticos. De acordo com Aníbal Ponce (1986; p.26), com o desaparecimento dos interesses comuns a todos os membros iguais de um grupo e a sua substituição por interesses distintos, pouco a pouco antagônicos, o processo educativo, que até então era único, sofreu uma participação: a desigualdade econômica entre os organizadores cada vez mais exploradores e os executores cada vez mais explorados trouxe, necessariamente, a desigualdade das educações respectivas. Como podemos perceber, a mulher sofre opressão pelo simples fato de ser mulher, a mulher é vista como um ser inferior ao homem. Pois, a posição do homem como dominador do lar predomina no seio da família, e segundo Engels (1884) na família, o homem é o burguês e a mulher representa o proletariado. Com isso a opressão e exploração sofrida pela mulher não faz senão aumentar o machismo na sociedade dividida em classes sociais. A partir desses elementos e nos modos de produção seguintes: o escravismo, feudalismo e o capitalismo, a história da mulher foi marcada pela opressão e pela exploração e pelo aprofundamento do machismo. A mulher passa a condição de submissa ao homem, tornando- se uma escrava do lar e objeto sexual. Compreendemos que a opressão contra a mulher é anterior ao capitalismo, no entanto, com o surgimento da produção social a mulher foi excluída do trabalho social, no qual, fazer parte da indústria social era impossível com as obrigações do lar. Contudo, de igual maneira, o caráter particular do predomínio do homem sobre a mulher na família moderna, assim como a necessidade e o modo de estabelecer uma igualdade social efetiva entre ambos, não se manifestarão com toda a nitidez senão quando homem e mulher tiverem, por lei, direitos absolutamente iguais (Engels, 1884). Portanto, vimos como o desenvolvimento da produção mercantil, ainda que primitivo, foi um elemento essencial para uma nova forma de civilização. Uma vez que, o homem que detém somente sua força de trabalho foi fundamental para produzir mais do que era preciso para a manutenção do produtor e com essa fase de transformação da sociedade nascerá a divisão do trabalho e a troca entre indivíduos. Foi nessa concepção da divisão do trabalho que dividiu a sociedade em classes o que gerou antagonismos de classes. Mas para que esses antagonismos, essas classes com interesses econômicos colidentes não se devorassem e não consumissem a sociedade numa luta estéril, faz-se necessário um poder colocado aparentemente por cima da sociedade, chamado a amortecer o choque e a mantê-lo dentro dos limites da ordem. Este poder, nascido da sociedade, mas posto acima dela se distanciando cada vez mais, é o Estado (ENGELS, 1884).
Portanto, o Estado arcaico foi, sobretudo o estado dos senhores donos de escravos, que os mantinham em seu domínio; o Estado feudal foi órgão de poder da nobreza, donos da ordem e do direito sobre os servos e camponeses; e o estado moderno que representava os proprietários que explorava os trabalhadores assalariados. A CONDIÇÃO DA MULHER NO CAPITALISMO Compreendemos que a mulher na sua luta cotidiana contra a opressão e exploração devem ter em mente esse corte de classe. A mulher muito vagamente se dá conta que a submissão caminha paralelamente com a exploração dos trabalhadores, e com a discriminação praticadas contra os negros, homossexuais, e as mulheres. Porém, as mulheres trabalhadoras são oprimidas pelas mulheres burguesas, ou seja, não é a união de todas as mulheres, sejam elas pobres, ricas, negras ou brancas, que vão superar a lógica machista exploradora e opressora do capitalismo e trazer a libertação feminina. Portanto, a questão feminina não afeta um grupo minoritário, mas as mulheres representam a metade da espécie humana, pois segundo dados publicados em 2010 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) as mulheres estão incluídas em uma estatística de 52% da população brasileira, como também são elas as que mais estudam hoje. Dentro da classe trabalhadora a mulher negra é a que sofre o mais alto grau de opressão: por ser negra, mulher e trabalhadora. Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) (IBGE 2010), publicados em setembro, nos relata que as mulheres representam cerca de 46% do mercado de trabalho, é a maioria dos empregados na informalidade, representam mais da metade 53% daqueles que ganham até um salário-mínimo e estão entre os mais pobres, representando 70% das estatísticas. De uma maneira geral, as mulheres têm remuneração média de até 30% a menos que os homens para exercerem uma mesma função, que varia de função para função. Os dados estatísticos nos mostram que a mulher na sociedade capitalista além de ganhar menos do que os homens apesar de ocupar o mesmo cargo, são submetidas a uma dupla e até tripla jornada de trabalho. Pois, essa tripla jornada de trabalho se caracterizava devido a maioria das trabalhadoras, após seu dia exaustivo de trabalho, ao chegar em casa, ainda tem que se deparar com os afazeres domésticos, e o cuidado com a família. A dupla condição da mulher de reprodutora do capital e de força de trabalho é agravada com o neoliberalismo, a globalização da economia e a reestruturação produtiva (Toledo, 2008). A existência de tanta discriminação social, cultural e econômico é resultado de um sistema que se assenta na desigualdade e divisão de classes sociais, ao qual o sistema econômico domina e explora milhões e milhões de trabalhadores. Compreendendo esse contexto social, que perpassa não apenas as mulheres, mas os homens também, onde, a opressão é cultural e social; gera situação de discriminação, atinge mulheres de diversas classes sociais e pode ter efeitos econômicos de maior ou menor peso. A exploração é um fato econômico e dá origem a divisão da sociedade em classes (Toledo, 2008).
PRIMEIRAS CONCLUSÕES A luta da mulher contra sua opressão e exploração é a luta contra as bases materiais da sociedade capitalista, criar uma nova sociedade, uma nova vida na qual os trabalhadores homens e mulheres rompam as amarras que a sociedade burguesa os prende, com seus valores sórdidos e cruéis para ambos. Uma sociedade onde não existam diferenças culturais, econômicas e sociais, uma sociedade onde o grau de emancipação da mulher é o mais importante indicativo do grau de desenvolvimento de uma sociedade. Desse modo, compreendemos que a luta da mulher contra todo o tipo de opressão, a luta, em suma, por sua emancipação, se dá no mesmo campo da luta dos trabalhadores. É no palco da luta de classes que se trava sua tarefa maior. Apoiando-nos na teoria marxista, apontamos que sua completa emancipação só será possível em outro modo de produção, o qual já defendemos aqui, o Socialismo.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS FRIEDRICH, Engels. A origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado. Coleção Grande Obras do Pensamento Universal. Editora Escala, S/D. REED, Evelyn. Sexo contra sexo ou classe contra classe. São Paulo: Editora Instituto José Luís e Rosa Sundermann, 2008. Censo do IBGE, Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/condicaodevida/indicadoresminimos /sinteseindicsociais2010/sis_2010.pdf Acesso em: 20.08.2012. PNAD (IBGE), Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=171 7&id_pagina=1 Acesso em: 20.08.2012. TOLEDO, Cecília. Mulheres: o gênero nos une, a classe nos divide. In. Marxismo Vivo, nº 2. São Paulo. Sundermann, 2001. PONCE, Aníbal. Educação e luta de classes. Coleção Educação Contemporânea. Editora Cortez,1986.