Tendências recentes na área do desarmamento e da não-proliferação 8º Seminário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Ministério da Defesa 6 de outubro de 2011 Ricardo M. Ayrosa Chefe da Divisão de Desarmamento e Tecnologias Sensíveis Ministério das Relações Exteriores
Tendências recentes e perspectivas - Fim da Guerra Fria não trouxe o fim da ameaça nuclear e risco de aniquilação do planeta. - Ilusão de que vivemos em um mundo mais seguro ( armas nucleares em mãos responsáveis ). - Tem havido redução (ainda que lenta) nos arsenais dos EUA e Rússia (em função, inclusive, de razões financeiras). - Continua, porém, a haver modernização das armas nucleares ( proliferação vertical ).
- Expectativas criadas com PR Obama: retomada das reduções, visão de um mundo livre das armas nucleares. Logrou novo acordo START (2010). Porém, acenou com novos investimentos no setor nuclear, sob o pretexto de manter a confiabilidade do arsenal. - Dificuldade em cumprir promessa de ratificação do CTBT. Oposição dos republicanos. - Improváveis novas medidas com a Rússia no futuro próximo. Já consideram ter feito progressos significativos. Rússia ameaçou retirarse do START se EUA prosseguirem com defesas missilísticas na Europa, sem participação russa.
Modernização do arsenal nuclear dos EUA The US military is planning to replace the tail section of the B61 nuclear bomb with a new guided tail kit to increase the accuracy of the weapon. This will increase the targeting capability of the weapon and allow lower-yield strikes against targets that prev reviously required higher-yield weapons (Federation of American Scientists, 2011)
Aumento dos gastos com armas nucleares De 90 para 100 bilhões por ano (2010-2011) EUA responsáveis por cerca de 70%
- Descoberta de programas clandestinos do Iraque e da RPDC (e posteriormente do Irã) levaram a ainda maiores controles nas transferências de tecnologia e à discussão sobre fortalecimento das salvaguardas da AIEA. - Declaração do CSNU (1992): proliferação de ADMs como ameaça à paz e segurança internacional. - Contraste com o enfoque que provinha da I Sessão Especial da AGNU sobre Desarmamento (I-SSOD, 1978), que considerava a própria existência de ADMs como ameaça. - Programa 93+2 da AIEA: Protocolo Adicional (PA, 1997). Pressões desde então para tornar o PA o padrão internacional de verificação.
- Ataques terroristas de 9/set (2001) nos EUA acentuaram preocupação com proliferação não apenas de Estados, mas de atores não-estatais: da não-proliferação à contra-proliferação. - Lançamento da Proliferation Security Initiative (PSI, 2003): novo regime para ações de interdições aéreas, marítimas e terrestres de cargas suspeitas. Para além da vertente política, se acentua a vertente policial/militar. - Resolução 1540 do CSNU (2004): todos os Estados membros são obrigados a implementar controles de exportação e legislação penal interna. Tentativa dos EUA de legitimar a PSI e o conceito de contra-proliferação. - Sanções do CSNU contra RPDC (2003) e Irã (2006). Legitimação velada das ações da PSI.
- Resolução 1887 (2009) do CSNU: ênfase apenas na não-proliferação. Inclusão pelos P-5 de pontos de seu interesse, sobre os quais não há consenso no âmbito da AGNU, TNP e AIEA (p.ex., PA como condição de suprimento de tecnologias nucleares). - Contraponto positivo (2011) : Decisão do NSG de rever diretrizes para ampliar controles sobre a exportação de tecnologias de enriquecimento e reprocessamento. Brasil logrou que o Acordo Quadripartite/ABACC fosse considerado critério alternativo ao PA. - Terá, assim, facilitado (ou pelo menos evitado piorar) acesso a tecnologias nucleares. Contudo, cerco tecnológico aos programas nuclear e espacial do Brasil continua.
- Conferência do TNP de 2010: sucesso relativo: novo programa de ação em desarmamento (medidas de transparência, p.ex.). Menos ambicioso que o de 2000 (postura restritiva, em particular de Rússia e França). - Pontos positivos: - PA como instrumento voluntário; - PA indispensável apenas quando a eliminação dos arsenais nucleares for alcançada; - Conferência de 2012 sobre Zona Livre de ADMs no Oriente Médio. Resultado incerto, porém importante para denunciar os dois pesos e duas medidas do regime de não-proliferação.
- Armas biológicas: negociação sobre protocolo de verificação da CPAB foi interrompida, por oposição dos EUA (Governo Bush). Poucas possibilidades de retomada. Foco recai apenas sobre medidas de fomento da confiança. - Armas químicas. Regime-modelo da OPAQ é praticamente universal. EUA e Rússia ainda não completaram destruição de arsenais. Prazo de 2012 terá de ser prorrogado. - Mísseis: apenas controles da proliferação: Regime de Controle de Mísseis (MTCR) e Código de Conduta da Haia (HCoC). Possibilidade de afetar programas espaciais. Defesas antimísseis ameaçam desarmamento nuclear.
- Armas convencionais:principal instrumento: Convenção sobre Certas Armas Convencionais (CCAC, 1980): procura equilíbrio entre razões humanitárias e necessidade de defesa. 5 protocolos (fragmentos não-detectáveis por raio-x; minas e armadilhas; armas incendiárias; armas cegantes a laser; remanescentes explosivos de guerra). - Convenção de Ottawa (1997): proibição das minas antipessoal. Motivação humanitária prevaleceu. - Convenção de Oslo (2008): proibição da maioria das munições cluster. Deficiências: (i) permite munições sofisticadas de países desenvolvidos; (ii) interoperabilidade: permite uso com Estados não Partes (p.ex. operações da OTAN). Brasil não assinou. - Brasil está engajado na negociação de um 6º. Protocolo da CCAC para tratar das munições cluster. Permitirá espectro maior de munições autorizadas e dará prazos para adaptação.
- Brasil:posição geral sobre o tema. Princípios: - Não-proliferação e desarmamento devem ser vistos como processos interdependentes; - Assimetrias do TNP só podem resolver-se com desarmamento nuclear (Art. VI); - Reduções episódicas entre EUA e Rússia não garantem processo seguro e irreversível; - Desarmamento nuclear precisaria ocorrer dentro de horizonte previsível, seguindo série de medidas bilaterais, regionais e globais; - Modelo de desarmamento: OPAQ. Regime não-discriminatório: compromissos iguais para todos. Verificáveis. Reforço do multilateralismo.
- Algumas metas e desafios para o Brasil: - articular-se com outros países de perfil assemelhado na defesa do desarmamento nuclear, como tema-chave para uma agenda de reforma da governança global em matéria de segurança. Consciência de que os avanços são incrementais e mais lentos que em outras áreas; - conter, tanto quanto possível, usurpação de competências da AGNU e de outras instâncias multilaterais legítimas (AIEA, OPAQ); - enfatizar a relação entre segurança, paz e desenvolvimento: gastos com armas nucleares e outras ADMs revertidos para fins econômicos e sociais; manutenção dos gastos em níveis estritamente necessários à defesa nacional;
- Fortalecer a parceria com a Argentina (ABACC), como exemplo para outras regiões (O. Médio, Ásia Meridional e Coréias); - Manter a América do Sul como região de paz, consolidar o Conselho Sul-Americano de Defesa; - Assegurar capacidade mínima de dissuasão para conter ameaças a recursos nacionais: negar acesso ao território e à Amazônia azul. - Importância do domínio autóctone das tecnologias sensíveis para projetos estratégicos (submarino à propulsão nuclear e VLS), compatíveis com os compromissos internacionais e a vocação do Brasil para a paz.
ricardo.ayrosa@itamaraty.gov.br