CIDADES MÉDIAS COMO INSTRUMENTO DE REORIENTAÇÃO URBANA NO BRASIL: aspectos preliminares

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Transcrição:

CIDADES MÉDIAS COMO INSTRUMENTO DE REORIENTAÇÃO URBANA NO BRASIL: aspectos preliminares Frednan Bezerra dos Santos 1 Cesar Augustus Labre Lemos de Freitas 2 Resumo: A partir da análise do processo de urbanização e da gênese das cidades, como materialidade da produção capitalista, buscamos entender o papel estratégico atribuído às cidades médias no Brasil às luzes da experiência francesa no planejamento territorial, especialmente no que tange à sua política de cidades médias. Entende-se a urbanização como processo e a cidade como forma material concreta deste processo que se situa na universalidade do sistema capitalista de produção que baliza a sociedade contemporânea. Palavras-chave: Cidades Médias, Urbanização, Capitalismo. Abstract: Based on the analysis of the urbanization process and the genesis of cities as materialness of capitalist production we seek to understand the strategic role assigned to the medium-sized cities in Brazil through the lights of the French experience in territorial planning, especially with regard to its policy of medium-sized cities. The urbanization is understood as process and the city as a concrete material form of this process lies in the universality of the capitalist system of production that marks contemporary society. Key-words: Middle Cities, Urbanization, Capitalism. 1 Estudante de Graduação. Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: Frednam.santos@yahoo.com.br 2 Doutor. Universidade Federal do Maranhão (UFMA). E-mail: cesarlabre@bol.com.br

1 INTRODUÇÃO Parte-se da análise do processo de urbanização engendrado pelo desenvolvimento da produção capitalista, em busca de entender o papel estratégico atribuído às cidades médias no Brasil (ANDRADE E SERRA 2001), às luzes da experiência francesa na década de 1960, bem como o desempenho econômico das cidades médias brasileiras e sua dinâmica no processo de reprodução da classe trabalhadora. Apreendendo a cidade como materialidade do processo de desenvolvimento das forças produtivas temos no Brasil um desenvolvimento urbano que não se distingue da generalidade capitalista, determinante das contradições que produzem o aprofundamento dos problemas sociais no espaço urbano e rural. Assim sendo, o sistema brasileiro de cidades, por sua complexidade, deve ser interpretado tendo em vista os vários subsistemas regionais engendrados pela escala e diversificação produtiva. Portanto, nossa análise tem como objetivo sintetizar o processo histórico que determinou a urbanização brasileira e a emergência das políticas de cidades médias. 2 AS CIDADES E O PROCESSO DE URBANIZAÇÃO: um ensaio de síntese A cidade que nos interessa constituiu-se ainda no período feudal com o florescimento do comercio impulsionado pela abertura de novas rotas comerciais para o oriente. Nesse contexto a demanda do comércio engendrou um processo cumulativo de avanço tecnológico e criação de excedentes. Segundo Santos (1988) no processo de transição do feudalismo para o capitalismo a cidade surge como espaço do trabalho livre. Ela surge, então, como uma semente de liberdade, gerando os principais elementos degenerativos do feudalismo. Portanto, o nascimento da cidade se dá com a ascensão da classe burguesa como produto das contradições que determinam a formação do capitalismo. Pode-se afirmar que a consolidação da sociedade capitalista (urbano industrial) e logo do progresso técnico-científico materializou-se na cidade como espaço de produção e reprodução do capital, porém, esse processo não pode ser entendido como um fenômeno autônomo às leis da acumulação capitalista, uma vez que a

tendência capitalista em aumentar a produtividade do trabalho se dar dentro do processo de socialização das condições gerais da produção da qual a urbanização faz parte (LOJKINE, 1981). 2.1 O papel do Estado no processo de urbanização De acordo com Lojkine (1981) o processo de urbanização é um fenômeno recente na historia ocidental engendrado pelo processo de desenvolvimento das forças produtivas a partir da Segunda Revolução Industrial, sendo tão importante quanto o aumento da produtividade do trabalho. Marx (1996) ao analisar o processo global de produção e circulação das mercadorias determinado pela grande indústria define as relações gerais que fazem parte do todo complexo que é o modo de produção capitalista: a revolução no modo de produção da indústria e da agricultura exige uma revolução nas condições gerais do processo de produção social, isto é, nos meios de comunicação e transporte. (MARX, 1996, p. 18). Segundo Lojkine (1981) quando Marx se refere a essas condições gerais ele abre espaço para ligação do fenômeno urbano ao processo de desenvolvimento das forças produtivas. Portanto, o modo de produção capitalista é dependente de um processo ininterrupto de modernização da produção com vistas ao aumento da produtividade do trabalho fator imprescindível ao desenvolvimento da acumulação capitalista, mas não elaborou um estudo sistemático a cerca da urbanização (LOJKINE, 1981). Para Lojkine (1981, p. 168) seria a intervenção estatal a forma mais elaborada, mais desenvolvida, da resposta capitalista à necessidade de socialização das forças produtivas, porém, não se deve resumir a intervenção estatal a um simples mecanismo adaptativo da estrutura de produção capitalista às contradições sociais engendradas por ela, uma vez que a natureza desse sistema está sublinhado pela valorização do capital. Dessa forma as políticas urbanas transparecem como uma reação do próprio modo de produção capitalista para regular e minimizar os efeitos negativos provocados por sua expansão. Portanto, bem distante de eliminar as contradições entre os meios de reprodução do capital, as políticas urbanas vão acentuá-las ainda mais com

o Estado servindo sempre como instrumento para a valorização do capital financiando os equipamentos urbanos necessários ao processo de urbanização. 3 A URBANIZAÇÃO E AS CIDADES MÉDIAS NO BRASIL Conforme Holanda (1995) o empreendimento colonial português na América teve um caráter estritamente comercial ao contrário dos espanhóis que soergueram grandes cidades a partir de um planejamento centralizado. Deste modo, a urbanização brasileira se deu de forma bem heterogênea e desigual. Iniciada ainda no período colonial nas regiões litorâneas e somente tardiamente expandida para o interior de forma sempre atrelada à expansão econômica e aos aparelhos administrativos do Estado. A cidade como instrumento decisivo de dominação somente se verificou no Brasil no pós Segunda Guerra Mundial como fenômeno atrelado ao forte crescimento demográfico, resultante da elevada taxa de natalidade concomitante com a redução da mortalidade, cujas causas essenciais estão vinculadas aos avanços da medicina e das políticas sanitárias concomitantes ao desenvolvimento da infraestrutura urbana viabilizada pela integração territorial, [...] quando as estradas de ferro até, então desconectadas na maior parte do País, são interligadas, constroem-se estradas de rodagem, pondo em contato as diversas regiões entre elas e com a região polar do país, empreende-se um ousado programa de investimentos em infra-estrutura (SANTOS, 2009, p. 38). De acordo com Santos (2009) o chamado processo de integração nacional além de impulsionado por investimentos estatais em infraestrutura de transportes também foi determinado pela absorção de diversos avanços tecnológicos que permitiram a comunicação entre as mais diversas regiões do país acelerando o crescimento das aglomerações urbanas e permitindo maior dinamismo nos grandes centros urbanos. Com a criação da infraestrutura urbana nos principais centros urbanos brasileiros a organização espacial ganhou grande complexidade criando o que Milton Santos classifica como uma verdadeira distinção entre um Brasil urbano (incluindo áreas agrícolas) e um Brasil agrícola (incluindo áreas urbanas). Nesse período a economia brasileira passa por importantes transformações, seja para atender ao mercado interno em veloz expansão, seja para absorver a demanda

exterior. O país se torna importante exportador de produtos agrícolas com crescentes ganhos de produtividade nesse setor. A população atinge taxas consideráveis de crescimento, ampliando a classe média (tradicional consumidora de bens manufaturados) e aumentando o poder de compra das classes pobres através de um sistema extensivo de crédito. Segundo Santos (2009) foi o período técnico-científico da humanidade, em outras palavras, a possibilidade de inventar a natureza, o avanço da biotecnologia, que permitiu em um espaço de tempo relativamente pequeno transformar o que parecia um deserto, como o cerrado, em uma área produtiva. O papel desempenhando pelo Estado foi fundamental no fomento à modernização do setor agropecuário, especialmente na atuação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa e concessão de crédito à produção. Mas, a urbanização brasileira não se caracteriza apenas como uma reorientação espacial do território nacional, nem como a personificação dos avanços técnico-científicos, ela está associada ao processo de êxodo rural e de pobreza urbana, sobretudo nas grandes aglomerações urbanas. Segundo Santos (2009) a urbanização brasileira não é um fenômeno isolado, portanto, está atrelado ao desenvolvimento das forças produtivas no campo e na cidade. No entanto, esse desenvolvimento se da com a expulsão do homem do campo pela agricultura moderna; com a modernização industrial, que devido à mecanização cria poucos postos de trabalho; e pela expansão do setor de serviços, que por seu caráter dinâmico e flexível transparece como a solução para o desemprego urbano e rural, mas, acaba produzindo a informalidade 3, devido ao baixo nível de remuneração que em geral oferece, tendo como sustentação o expressivo exército de reserva gerado pelo setor agrícola. A urbanização se insere dentro do debate contemporâneo do desenvolvimento socioeconômico brasileiro como fator determinante na leitura do sistema capitalista, ou seja, a infraestrutura urbana serve como referencial na acepção do desenvolvimento. A cidade como sede do aparato urbano ocupa o papel de prover as crescentes 3 O trabalho informal é o trabalho sem vínculos, precarizado, quando o trabalhador não dispõe dos benefícios dispostos pela legislação trabalhista.

necessidades humanas, mas, se ineficiente na observância dessa função ela se torna o palco das principais mazelas do sistema capitalista. 3.1. O nascimento das cidades médias como instrumento de reorientação urbana As cidades médias como instrumento de políticas de planejamento urbano regional ganham espaço conforme se verifica a insustentabilidade das grandes aglomerações no que tange à reprodução da classe trabalhadora. Segundo Andrade e Serra (2001) a aceleração da urbanização no pós Segunda Grande Guerra, sobretudo a partir da década de 1970, se torna o principal alvo dos planejadores e gestores públicos: [...] na década de 70 os temas das médias e pequenas cidades, bem como os dos espaços reurbanizados e rurais propriamente ditos, inserem-se na tendência (e na necessidade) maior de se promoverem uma descentralização e uma desconcentração das grandes massas humanas, de suas atividades e, evidentemente, uma diminuição de seus problemas. (ANDRADE E SERRA, 2001, p. 5). A partir desse momento a questão dos problemas urbanos passou a tomar cada vez mais a pauta de debates no âmbito socioeconômico e geográfico trazendo à tona o tema das médias e pequenas cidades como solução para o agravamento dos problemas sociais bem como da acelerada queda na qualidade de vida nas grandes aglomerações urbanas. No inicio da década de 1950 surgiu na França à necessidade de uma nova forma de planificação que foi chamada de: o aménagement du territoire (o planejamento do território), este, sistematizado desde 1952, resulta de um reflexão sobre a busca de uma distribuição mais equilibrada das atividades econômicas, das riquezas e da população dentro do espaço nacional e/ou regional. Nascendo em 1963 a ideia das metrópoles de equilíbrio que em síntese seria um elo capaz de proporcionar uma maior harmonia entre as diversas regiões que formam o espaço francês, até então excessivamente centralizado por Paris. No entanto, seria necessária a existência de certo número de cidades que exercessem a função de interruptor entre as metrópoles de equilíbrio, as pequenas cidades e o mundo rural para o desencadeamento de um processo de integração mais completo e equilibrado. De acordo com Andrade e Serra (2001) a política das cidades médias na França, mesmo não sendo uma solução para todos os problemas espaciais, representa

uma etapa importante no processo do aménagement du territoire. A experiência francesa mostrou uma alternativa para aqueles países e regiões nos quais os problemas de desequilíbrio urbano regional e interurbano se apresentam mais agudos. 3.2 Caracterização das cidades médias Sem maiores considerações aceitamos a definição utilizada por Andrade e Serra (2001) que delimita as cidades médias ao conjunto de centros urbanos não metropolitanos e não capitais com população entre 100 mil e 500 mil habitantes, segundo o Censo Demográfico de 1991. Mas, chamamos atenção para uma passagem de Santos (2009) que aponta que um dos principais problemas nas ciências humanas é o uso e interpretação das séries estatísticas, [...] pois o número, em momentos distintos, possui significado diferente. Nesse sentido, as séries estatísticas são miragens. O que chamávamos de cidades médias em 1940/1950, naturalmente não é a cidade média dos anos 1970/1980. [...] No entanto, isso não invalida o uso de quadros estatísticos, mas sugere cautela em sua interpretação (SANTOS, 2009, p. 77-78). Portanto, as cidades médias estão sujeitas a inúmeras conceituações, segundo a época e os objetivos analíticos, sua classificação não é algo imutável, nem regra absoluta. Segundo Andrade e Serra (2001) com base na experiência que se acumulou até a década de 1970 sobre as cidades médias, sobretudo as francesas, o papel conferido à cidade média se resume em: manter interações constantes e duradouras tanto com seu espaço regional subordinado quanto com aglomerações de hierarquia superior, desempenhando papel central no crescimento econômico da sua área de influência oferecendo um leque bastante largo de bens e serviços e funcionando como ponto de interrupção do movimento migratório direcionado às grandes cidades. Tais atributos balizam as motivações que colocaram as cidades médias como propulsoras do equilíbrio interurbano e urbano-regional necessário para obstrução do fluxo migratório na direção das grandes cidades e metrópoles e na busca de maior eficiência para alguns ramos produtivos. No Brasil, segundo Pereira (2003), as cidades médias possuem uma segmentação típica do desenvolvimento desigual de uma economia capitalista subdesenvolvida em que se combina um desenvolvimento urbano vigoroso pautado em

fatores de atração econômica, estrutura produtiva, em cidades classificadas como centros urbanos, cidades economicamente consolidadas, com um desenvolvimento vicioso de fatores de atração fundamentados na reprodução da pobreza e desqualificação do mercado de trabalho local com claras características de economia urbana subdesenvolvida. Portanto, cidade média, onde tantas necessidades emergem sem as devidas respostas apresenta-se tanto como novo palco de conflitos sociais como lugar geográfico e político de novas soluções. 4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O PAPEL ESTRATÉGICO ATRIBUÍDO ÀS CIDADES MÉDIAS NO BRASIL Andrade e Serra (2001) argumentam que o elevado crescimento da economia brasileira na década de 1970 foi essencialmente concentrador levando à explosão das metrópoles nacionais e induzindo o crescimento de outros importantes centros urbanos. Esse fenômeno fez surgir o termo macrocefalia urbana, que denuncia a insustentabilidade do processo de concentração espacial das atividades econômicas e da população, que para além de prejudicar o processo produtivo com as crescentes deseconomias de escala (também chamadas de deseconomias de aglomeração) coloca em risco as condições de vida nesses centros. Assim, o desenvolvimento das cidades brasileiras, na década de 1970, ocorria a custos econômicos e sociais crescentes, já que a população e os setores produtivos estavam excessivamente concentrados, sobretudo nas grandes cidades. Nesse contexto a política de cidades médias emerge como modelo alternativo por tentar reverte à dinâmica espacial de crescimento urbano com a reelaboração de um projeto de integração do território nacional de forma à revitalização da capacidade do Estado em prover os equipamentos e serviços urbanos evitando a queda da produtividade das atividades econômicas e preservando o meio ambiente. Mas, de acordo com Andrade e Serra (2001) a não priorização de uma política de reforma agrária paralela à política de cidades médias transparece como fator principal para o fracasso dessa política, levando em conta a não materialidade dos objetivos de solucionar os grandes problemas das regiões metropolitanas.

No entanto, Santos (2009) qualifica que independentemente de seus resultados, o Programa Nacional de Cidades de Porte Médio, iniciado em 1976, registrou a existência de explícita preocupação governamental com as cidades médias, preocupação que perdeu espaço nas décadas de 1980 e 90, mas que recentemente volta à pauta do dia nos debates da sociedade com a nova ordem econômica caracterizada pelo processo de globalização. Mas, apesar de ser verdade que as razões que motivaram o interesse pela política de cidades médias na década de 1960/70 se manterem atuais, novas características 4 propulsoras do ressurgimento do interesse por essa temática. atribuídas às cidades médias hoje são as O novo papel reservado às cidades médias no contexto das mudanças de paradigmas do início da década de 1990 esta atrelado umbilicalmente às novas formas de organização do processo produtivo e organizacional. Segundo Santos (2009, p. 11) a cidade, onde tantas necessidades emergentes não podem ter resposta, está desse modo fadada a ser tanto o teatro de conflitos crescentes como o lugar geográfico e político da possibilidade de soluções. Portanto, a cidade é palco exemplar do estágio do desenvolvimento das forças produtivas sociais sendo a sua interpretação necessária à elaboração de políticas públicas de reorientação espacial do espaço urbano com vista ao equilíbrio hierárquico das redes urbanas. REFERÊNCIAS ANDRADE, Thompson; SERRA, Rodrigo. Crescimento Econômico nas Cidades Médias Brasileiras. In: ANDRADE, Thompson; SERRA, Rodrigo (org.). Cidades Médias Brasileiras. Rio de Janeiro: IPEA, 2001. COSTA, Lucemeire. A GÊNESE E EVOLUÇÃO DO URBANISMO MODERNO E A PRODUÇÃO DA CIDADE: algumas reflexões, 2001. Revista Caminhos de Geografia, Uberlândia, v. 2, n. 4. 2001. Disponível em: <http://www.seer.ufu.br/index.php/caminhosdegeografia/article/view/15264/856.> Acessado em 02 de março de 2013. HOLANDA, Sergio Buarque de. Raízes do Brasil. 26 ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. LOJKINE, Jean. O Estado Capitalista e a Questão Urbana. São Paulo, Martins Fontes, 1981. 4 A possibilidade de boa qualidade de vida, de resgate da identidade cultural e reorientação dos fluxos migratórios.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política, livro primeiro, O Processo de Produção do Capital. v. 2. São Paulo: Nova Cultural, 1996. PEREIRA, Fabiano; LEMOS, Mauro. CIDADES MÉDIAS BRASILEIRAS: características e dinâmicas urbano-industriais. Revista Pesquisa e Planejamento Econômico, v. 33, n. 1, p. 127-165, 2003. SANTOS, Milton. Metamorfoses do espaço habitado, fundamentos Teórico e metodológico da geografia. Hucitec. São Paulo 1988. SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. 5 ed. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2009.