fls. 1 ACÓRDÃO Registro: 2014.0000130476 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0195036-54.2012.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante TANIA MARIA SIMÕES BRAZ (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado ATLÂNTICO FUNDO DE INVESTIMENTO EM DIREITOS CREDITÓRIOS NÃO PADRONIZADOS. ACORDAM, em 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores NEVES AMORIM (Presidente) e JOSÉ JOAQUIM DOS SANTOS. São Paulo, 11 de março de 2014. José Carlos Ferreira Alves RELATOR Assinatura Eletrônica
fls. 2 Apelação Cível nº 0195036-54.2012.8.26.0100 Apelante: Tania Maria Simões Braz Apelado: Atlântico Fundo de Investimento em Direitos Creditórios não padronizados Comarca: São Paulo MMª. Juíza de 1ª Instância: Raquel Machado Carleial de Andrade RELATÓRIO. VOTO nº 17323 EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL indenização Inadmissibilidade da autora Ação declaratória c.c. Sentença de improcedência Negativação indevida do nome Cessionária de crédito que não comprova a origem do débito apontado nos cadastros de inadimplentes Ausência de notificação prevista pelo art. 290 do CC moral configurado Dano Indenização arbitrada em valor equivalente a 20 salários-mínimos Recurso provido. 1. Trata-se de recurso de apelação interposto por Tania Maria Simões Braz contra a r. sentença de fls. 76/78, cujo relatório se adota, que julgou improcedente a ação declaratória c.c. indenização ajuizada em face de Atlântico Página 2 de 10
fls. 3 Fundo de Investimento em Direitos Creditórios não padronizados e condenou a autora por litigância de má-fé ao pagamento de multa de 1% sobre o valor atualizado da causa. 2. Inconformada, insurge-se a apelante (fls. 81/83) alegando, em resumo, que não há nos autos prova a respeito da cessão de crédito da dívida. Diz que não foi notificada da cessão de crédito. Aduz que o débito apontado não teve sua origem comprovada. Sustenta que a condenação por litigância de má-fé não se justifica. 3. Recurso recebido em ambos os efeitos (fls. 87). 4. Contrarrazões (fls. 89/98). 5. Inicialmente o recurso foi distribuído ao Des. Eduardo Siqueira, integrante da 38ª Câmara de Direito Privado, que não conheceu do recurso e representou ao Presidente da Seção de Direito Privado (fls. 102/104). Determinou-se, então, a redistribuição do recurso a uma das Câmaras da Seção de Direito Privado I (fls. 109). FUNDAMENTOS. 6. O recurso merece provimento. Página 3 de 10
fls. 4 7. Trata-se de ação declaratória c.c. indenização, na qual a autora alega que seu nome foi indevidamente negativado pela ré, o que lhe causou danos morais. 8. A r. sentença de Primeiro Grau julgou improcedente o pedido e condenou a autora por litigância de má-fé. 9. Merece, porém, reforma. 10. Em que pese a apelada tenha comprovado ser cessionária de crédito em face da autora, não comprovou a respectiva origem. 11. Não há nos autos qualquer documento que demonstre a origem do débito apontado em nome da autora. 12. Outrossim, não comprovou também a apelada ter notificado a apelante a respeito da cessão, nos termos do art. 290 do Código Civil. 13. Assim, a negativação se mostra indevida. 14. Nesse sentido, há diversos julgamentos desta Corte, como se vê das seguintes ementas: DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE CRÉDITO. Apontamento indevido do nome do autor no rol Página 4 de 10
fls. 5 de inadimplentes. Cessão do crédito. Valores e número do contrato contraditórios. Ausência de prova da contratação originária. Ônus do qual não se desincumbiu a instituição financeira (Art. 333, II, CPC c.c. art. 6º, VIII, CDC). Inexigibilidade declarada. Indenização fixada em R$9.000,00, de acordo com os princípios da razoabilidade e proporcionalidade. Sentença reformada. Recurso provido em parte (Apelação nº 0181806-76.2011.8.26.0100, Rel. Des. Milton Carvalho, 4ª Câmara de Direito Privado, julgado em 12.12.2013). DANO MORAL - Inscrição indevida em órgão de proteção ao crédito - Cessão de crédito - Improcedência da ação e da reconvenção da ré, cessionária - Irresignação da autora - Cabimento em parte - Falta de notificação da cessão à devedora - Inexigibilidade do crédito - Inteligência do art. 290 do Código Civil - Ineficácia da cessão de crédito em face da devedora que implica a inexistência de relação jurídica entre as partes e a consequente ilegitimidade da ré para a negativação do nome da requerente - Indenização devida - Dano in re ipsa - Montante indenizatório fixado em R$10.000,00 - Correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ) e juros moratórios contados da negativação (Súmula 54 do STJ) - Recurso provido em parte (Apelação nº 0013092-83.2011.8.26.0576, Rel. Des. Walter Página 5 de 10
fls. 6 Barone, 7ª Câmara de Direito Privado, j. em 11.12.2013). RESPONSABILIDADE CIVIL - Inclusão indevida no SPC/Serasa - Cessão de Crédito - Ausência de comprovação que a cessão de crédito abrangeu a totalidade do débito do autor junto ao banco - Ausência de notificação da cessão do crédito - Dano moral configurado - Valor arbitrado majorado - Recurso da ré não provido, recurso do autor parcialmente provido (Apelação nº 9070072-15.2007.8.26.0000, Rel. Des. Luís Francisco Aguilar Cortez, 2ª Câmara de Direito Privado, j. em 17.4.2012). 15. Ressalto que a inscrição do nome do devedor nos cadastros dos órgãos competentes, por si só, não faz surgir o dever de reparar. Contudo, quando se inclui nome daquele que nada deve, a inscrição se transforma em ato ilícito, suscetível de indenização por dano moral. 16. A este propósito, confira-se julgado do E. STJ: Apelação Processo Civil e Civil Ação de reparação de danos morais e materiais Empresas de telefonia de curta e longa distância Pedida de linha feito através de telefone por terceira pessoa utilizando-se do nome e dos dados da autora Ausência de cautela na Página 6 de 10
fls. 7 conferência dos dados pessoais e por ocasião da instalação no local Negativação indevida do nome do consumidor em rol de maus pagadores Danos morais caracterizados Quantum majorado Danos materiais não provados Risco da atividade comercial das fornecedoras Responsabilidade objetiva e solidária das empresas Dever de indenizar Sucumbência recíproca reconhecida Sentença parcialmente reformada (Resp. 867.129, rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 09.12.08). 17. No mesmo sentido, esta E. Corte, ao julgar as Apelações de nº 994.09.347820-3, Des. Rel. Enio Zuliani, j. 8.4.2010 e 1.348.064-5, Des. Rel. Álvaro Torres Junior, j. em 8.4.08. 18. Friso que, segundo forte orientação doutrinária e jurisprudencial, não se discute o cabimento de dano moral em casos de inscrição indevida de consumidores nos órgãos que cadastram os inadimplentes. 19. O crédito, elemento vital para a convivência e sobrevivência digna do sujeito em sociedade, quando restringido, gera consequências nefastas em sua vida. Com efeito, as chances de a pessoa ter acesso a compras, cheques, cartões, etc., diminuem consideravelmente, a ponto de fazer com que ela passe por situações embaraçosas e, Página 7 de 10
fls. 8 porque não dizer, humilhantes. 20. A este propósito, FÁBIO ULHOA COELHO anota que as pessoas cumpridoras de suas obrigações, que nunca emitiram cheques sem fundos podem, por força deles, ver seus nomes inscritos nesses bancos de dados. É injusto e causa considerável dor moral. Cabe indenização compensatória dela, sem prejuízo da dos danos patrimoniais que venham eventualmente ocorrer (RT, 806/274; 803/407) (Curso de Direito Civil, Saraiva, vol. 2, 2004, p. 426). 21. Também é essa a orientação da jurisprudência do E. STJ (REsp. 631.629 RS, DJ 02.08.2004, Ministra NANCY ANDRIGHI, REsp. 639.969/PE e 690.230/PE, Rel. Min. Eliana Calmon, REsp. 915593/RS, Min. Castro Meira, DJ 23.04.2007). 22. Inafastável, pois, a responsabilidade da ré pela negativação indevida do nome da autora, sendo indenizável o dano moral causado. 23. Com relação ao valor da indenização, cediço que, na fixação do dano moral, além do princípio da proporcionalidade, deve-se levar em conta as funções ressarcitória e punitiva da indenização. Página 8 de 10
fls. 9 24. Na função ressarcitória, olha-se para a vítima, para a gravidade objetiva do dano que ela padeceu. Na função punitiva, ou de desestímulo do dano moral, olha-se para o lesante, de tal modo que a indenização represente advertência, sinal de que a sociedade não aceita seu comportamento. 25. Da congruência entre as duas funções é que se extrai o valor da reparação. 26. Assim, e considerando o que tem decido esta Corte em casos análogos, entendo ser adequado o valor de R$ 14.480,00 (catorze mil quatrocentos e oitenta reais), equivalente a 20 salários-mínimos atualmente vigentes. 27. O valor deverá ser corrigido a partir do arbitramento, de acordo com a Tabela publicada por este Tribunal (Súmula nº 362 do STJ), e acrescido de juros moratórios desde a data do evento, por se tratar de responsabilidade civil extracontratual (Súmula nº 54 do STJ). 28. Pelo meu voto, pois, DOU PROVIMENTO ao recurso, para reformar a r. sentença, julgando procedente o pedido para declarar a inexigibilidade do débito com relação à autora e Página 9 de 10
fls. 10 condenar a ré a pagar à autora indenização por danos morais no valor de R$ 14.480,00 (catorze mil quatrocentos e oitenta reais), equivalente a 20 salários-mínimos atualmente vigentes, que deverá ser corrigido a partir do arbitramento, de acordo com a Tabela publicada por este Tribunal, e acrescido de juros moratórios desde a data do evento, por se tratar de responsabilidade civil extracontratual. Em razão da sucumbência, a ré deverá arcar com as custas e despesas processuais, bem como honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor atualizado da condenação. JOSÉ CARLOS FERREIRA ALVES RELATOR Página 10 de 10