REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE CONSTRUTIVISMO ENTRE ALFABETIZADORES: PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES



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Transcrição:

REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE CONSTRUTIVISMO ENTRE ALFABETIZADORES: PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES Laêda Bezerra Machado (Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação - Centro de Estudos Sociais Aplicados - UFRN (*) 1. Construtivismo e Alfabetização Desde o final da década de 70 e início dos anos 80 vem se difundindo pelo Brasil, como alternativa ao paradigma tradicional, a abordagem construtivista de alfabetização. O enfoque construtivista, conforme FERREIRO (1995), está fundamentado em dois princípios básicos: a) entender a evolução dos sistemas de idéias construídos pelas crianças sobre a natureza da língua enquanto objeto social; b) confirmar os pressupostos inerentes à teoria de Piaget em relação ao desenvolvimento da escrita, isto é, as crianças são sujeitos que possuem saberes e em relação à escrita elas agem como nos outros campos do conhecimento. Os resultados da pesquisa pioneira de Ferreiro e Teberosky sistematizada na obra clássica Psicogênese da Língua Escrita (1986), tiveram uma grande receptividade, no Brasil e demais países da América Latina, devido aos altos índices de fracasso durante o processo de escolaridade inicial nessa região. Sabe-se, conforme dados do MEC (1996) que a repetência na primeira série em 1981 alcançava a cifra dos 70%. Convém lembrar que Ferreiro e Teberosky direcionaram sua pesquisa à explicitação detalhada da gênese da escrita, sem entretanto oferecer sugestões metodológicas, ficando esta tarefa a cargo dos especialistas e professores da área. Assim, principalmente as décadas de oitenta e noventa foram marcadas por um duplo desafio para os alfabetizadores: apropriação desse legado construtivista e transposição dos princípios teóricos para a prática pedagógica. Nesse sentido percebe-se, pois, que a teoria construtivista vem há mais de duas décadas influenciando a redefinição e reorganização das políticas de formação (inicial e continuada) de professores no Brasil, essa presença do construtivismo tanto no nível teórico como prático.

2. A Representação Social como categoria de análise O fenômeno da apropriação dos conhecimentos pelo senso comum foi estudado por Moscovici em sua obra original La psycanalise son image et son public - apresentada em primeira edição em 1961. Moscovici inaugura uma nova postura epistemológica, ao afirmar que a absorção da ciência pelo senso comum não é, como geralmente se defendia, uma vulgarização do saber científico, mas ao contrário, trata-se de um outro tipo de conhecimento adaptado a outras necessidades, obedecendo a outros critérios e contextos específicos. Moscovici refere-se a Representação Social como teoria ou ciência coletiva destinada não só à interpretação do real, mas à intervenção neste, indo além do que é imediatamente dado na ciência ou na filosofia, da classificação de fatos e eventos. (p.47). Seriam teorias do senso comum que se elaboram coletivamente nas interações sociais, sujeito-sujeito e sujeito-instituição, num determinado tempo, numa cultura e num espaço próximo, na tentativa de tornar o estranho familiar e dar conta do real. É no processo de interação social que o sujeito elabora o conhecimento, vai se socializando, reconstruindo valores e idéias que circulam na sociedade. O referido autor afirma: [...] toda representação é de alguém tanto quanto de alguma coisa. É uma forma de conhecimento por meio da qual aquele que conhece se substitui no que é conhecido. (Moscovici, 1978.) As representações sociais são, então, resultado da interpretação de significados que as pessoas utilizam para entender o mundo; uma construção mental do objeto, elaboradas através da atividade simbólica do sujeito, dentro do processo de comunicação, na totalidade social. Estão presentes em todas as áreas do sistema social, pois trata-se de uma atividade cognitiva e simbólica do ser humano, que parte do individual para o social e está ligada a uma rede de conceitos que envolve diversos elementos do contexto sócio-cultural. São produtos de experiências acumuladas por um processo histórico dos fatos, os quais constituem os sistemas cognitivos das pessoas. Esta teoria vem oferecendo à pesquisa educacional novas possibilidades para lidar com a diversidade e complexidade da educação e do contexto escolar na sociedade moderna, constituindo-se como valioso suporte teórico. Sua contribuição reside, principalmente, na compreensão da formação e consolidação de conceitos socialmente construídos e veiculados pelos sujeitos.

Reconhecendo o construtivismo como um conhecimento científico novo, do qual os professores vêm se apropriando, entende-se que a teoria das Representações Sociais apresenta-se como o instrumental teórico-metodológico próprio para investigação dessa temática. 3. Metodologia O presente artigo baseia-se nos resultados da primeira etapa da pesquisa, cuja finalidade foi delinear o campo das representações sociais de construtivismo para o que empregou-se a técnica de entrevistas exploratórias, na forma de uma conversa estruturada. Apelou-se para esse recurso por considerar que as conversações se veiculam saberes e que por meio delas o pesquisador pode se aproximar de objetos simbólicos, como as Representações Sociais. Moscovici (1995). A coleta dos dados foi realizada em escolas públicas da cidade de Recife e dela participaram trinta (30) professores com formação acadêmica diversificada, variando entre nível médio incompleto e pós-graduação latu sensu concluída. Antes de ir a campo elaborou-se uma lista de escolas com as quais manteve-se contato, observando o critério de possuir turmas de alfabetização e primeira série. Em seguida procedeu-se as visitas e os contatos com os professores a fim de agendar as sessões para realização da entrevista, já nesta primeira visita deixava-se claro que a conversa seria gravada em áudio e que a participação era voluntária. As sessões de entrevistas foram conduzidas seguindo três etapas: 1ª) apresentação da pesquisadora e do objetivo do trabalho; 2ª) conversa informal com o professor em que se procurava saber seu nome, formação acadêmica, instituição em que se formou e o seu tempo como professor alfabetizador; 3ª) realização da entrevista propriamente dita. A condução dessa conversa partiu da seguinte colocação da pesquisadora: fale tudo que você sabe ou que vem a sua mente sobre a palavra construtivismo. 4. Resultados Os dados das entrevistas foram analisados à luz da teoria da análise de conteúdo de BARDIN (1997). Dos depoimentos dos professores emergiram alguns pontos nodais como: o caráter positivo do construtivismo, valorização do saber e

realidade do aluno, bem como seu status de sujeito que constrói conhecimento; ênfase na interação e mediação dos agentes educativos. Esses pontos-chave delineiam uma teia de significados que constitui a Representação Social de Construtivismo daqueles sujeitos. O caráter positivo do construtivismo Embora exista no grupo pesquisado professores que reconhecem não dispor de elementos teóricos suficientes para definir construtivismo, os resultados apontam que a abordagem construtivista é conhecida por todos os professores. Nenhum dos profissionais entrevistados admitiu desconhecer a teoria e suas aplicações à prática pedagógica e, além disso, mesmo não sabendo explicar os conceitos, suas referências a essa abordagem são sempre positivas. Olha eu acho o trabalho de cons... construtivismo um trabalho muito bonito... Pra quem sabe trabalhar! Agora... quem não sabe trabalhar, se embaralha e no final num consegue nada.[...] Então você... você aprende até brincando. Você brinca com a criança e trabalha, então, através... Esse método, ele é muito bom... eu torno a dizer: ele é bom mais pra quem sabe trabalhar., [...].. só qui eu mermo num sô dez no construtivismo de jeito ninhum. Num vô mintir... (P15EPU 1ª et). Os professores, inclusive, utilizam uma série e qualificativos que ressaltam aspectos positivos da teoria, tais como: válida, boa, poderosa, melhor, renovada, interessante, bonita, entre outros. O depoimento abaixo ilustra essa atitude favorável para com essa abordagem: " [...] eu entendo de construtivismo, sem dúvida alguma é... uma metodologia vamos dizer muito interessante... muito enriquecedora em sala de aula... (P11EPU 1ª et). Valorização dos saberes/ conhecimentos e realidade do aluno Como se sabe a pedagogia tradicional, ainda valorizada por alguns professores, caracteriza-se pela supervalorização do professor e dos conteúdos a serem ensinados, enquanto que o aluno, com seus conhecimentos, situa-se numa

posição assimétrica, de passividade frente a essa prática. Em geral, há pouca articulação dos conteúdos trabalhados na sala de aula com a realidade em que o aluno está inserido e considera-se a memorização como uma das estratégias mais eficazes de aprendizagem. Esse modelo de educação foi hegemônico na educação no Brasil até o início dos anos oitenta. No entanto, acompanhando a história da educação brasileira, observa-se que no contexto do movimento pela redemocratização do país, na década de 80, surgem os primeiros questionamentos e discussões em torno da função da educação na nossa sociedade, cujas reflexões giram em torno das concepções e práticas vigentes no país. Daquele período registrou-se uma insatisfação quase que generalizada em relação à prática educativa vigente, definida como mera reprodutora da ideologia capitalista. Difundiuse com muita intensidade as teorias da reprodução - de Bourdieu e Passeron, e dos aparelhos ideológicos do Estado - de Althusser. No bojo das discussões em torno da função social da escola na sociedade capitalista, há uma grande ênfase na necessidade de redefinição dos papéis de aluno e professor no processo ensinoaprendizagem. A pedagogia tradicional e seu caráter reprodutor das desigualdades do sistema capitalista passa a ser objeto de questionamento e discussão nos meios acadêmicos. Como afirma Gadotti (1990) a liteteratura educacional produzida a partir deste período tem a marca da criticidade, e reivindica a efetivação de uma pedagogia progressista. Nesse contexto de abertura, também as concepções e práticas de alfabetização tornam-se objetos de discussão, passando a buscar novos referenciais, especialmente devido à alta seletividade e fracasso escolar. Data desse período a adesão à abordagem construtivista, cujo pressuposto fundamental é o deslocamento da preocupação do como se ensina para o como se aprende, enfatizando o papel ativo do aluno na construção do conhecimento. Nossas análises apontam para uma representação social de construtivismo centrada no novo papel do aluno, no contexto do processo de ensino-aprendizagem, especialmente na atribuição de um valor significativo a seus conhecimentos, saberes e realidade social. Boa parte dos professores deixa entrever em seus depoimentos que o significado do construtivismo para suas praticas é a possibilidade que essa nova proposta apresenta no sentido de se aproveitar o conhecimento do aluno, tomando-o como ponto de partida para as novas aprendizagens.

"Porque o construtivismo ele... ele... ele... busca tudo isso. Formar pessoas conscientes e sempre trabalhando em cima da realidade dele, do seu dia a dia. É trabalhar sempre assim contextualizando, buscando sempre... assim... também que o aluno ele... sem... ele...traz uma bagagem pra escola. Ele num chega zerado, né? Você vai buscar, né? Você vai buscar ali trabalhar o dia a dia. E sempre tirando do aluno. Tá certo?" (P8EPU- 1ª et) A importância de se valorizar os conhecimentos dos alunos também se justifica, de acordo com os professores, porque os alunos, quando são reconhecidos em sua realidade social e lhes são oferecidas oportunidades para refletir e expressar seus conhecimentos sobre ela, eles revelam mais motivação e interesse para aprender. "Através do... do... construtivismo. Eu acho esse método bom purque a criança tem mais... Como é qui si diz? Tem mais vontade de aprender... Num é qui no ôto num aprendia... aprendia... mas Era com mais dificuldade, a criança tem... tinha priguiça de aprender, viu? [...] eu já trabalhei no construtivismo, na primeira série, achei que é bom. Ele tem mais interesse, a criança tem mais interesse, qui... ela com material concreto, ela pegando, manuseando, ela vai... tendo mais interesse" (P18EPU- 1ª et) Ênfase na interação e mediação dos agentes educativos Conforme os pressupostos da abordagem construtivista, o papel do professor deve ser o de mediador e equilibrador de situações de aprendizagem, bem como de conflitos que ocorrem em sala de aula. Comparada a postura do professor numa perspectiva tradicional, cabe a esse professor aceitar que também o aluno possui um repertório de conhecimentos e, ao entrar na escola, prossegue nessa construção. Assim, não cabe ao professor somente transmitir o que ele sabe ou a que já se encontra sistematizado, e sim compreender conceitos e vivências reveladas pelos alunos a partir de seu universo sócio-cultural. Em seus depoimentos os professores deixaram entrever uma mudança nas relações dos atores envolvidos no processo ensino-aprendizagem, destacando, por

exemplo, a importância da troca de experiências entre professores e alunos. É o caso dessa professora que afirma: " [...] O construtivismo se falou muito, mas eu num achei qui ficou claro... qui se sabe mermo o qui é... A idéia qui eu tenho e mais assim... uma questão das cabeça. A pessoa pensar qui num é mais aquele professor que sabe tudo e qui ele vai, a cada dia qui ele faz tudo na vida, ele vai aprendendo. Ele vai trocando e qui... construir, é construir com ele... com o aluno... com os outros" Além dos pontos já mencionados, chama atenção nas falas dos professores a presença de certas ambivalências e contradições ao se referirem à transposição do que pensam ou apreenderam sobre construtivismo para seu fazer pedagógico cotidiano. Reconhecem: [...] Olhe eu misturo a técnica velha com a nova, o construtivismo, qui juntando um cum o outro dá uma coisa milhor, sabe? Cum... cum... cum... a técnica qui a gente tem com essa nova técnica, técnica... aí misturado dá uma coisa milhor tá intendeno? Ai... quem já tem uma boa técnica do... do... passado e com essa õta nois misturano uma cum a ôta dá uma milhor. É isso qui eu faço. Aí eu continuo... eu consigo alfabetizar bem mesmo(p7epu- 1ª et) [...] No construtivismo a gente não pode perder aquilo qui era o bom do antigamente, porque nós temos qui somar, nunca desprezar [...]Porque quando a gente pensa qui só no construtivismo a gente consegue coisas boas, isso é errado. Certo? Some, não perca nunca o que é... Eu sou uma professora mêa antiga. Mas, eu num perco, eu somo as coisas que eu tô aprendendo agora, eu junto com o qui eu já sabia pra ajudar a minha turminha que eu tô alfabetizando, ou que eu tô ajudando nessa construção pra vida qui tá surgino agora, né?. Conforme Moscovici (1978), as representações sociais não somente guiam as ações, mas também remodelam e reconstituem os elementos do meio ambiente em que tais ações têm lugar, integrando-as numa rede de relações em que está vinculado o objeto, fornecendo as noções teóricas e os fundos de observação que tornam essas relações estáveis e eficazes.

Os resultados revelam uma Representação Social de construtivismo como algo favorável à prática pedagógica, centrada basicamente em dois aspectos: respeito ao universo sócio-cultural do aluno e mudança no papel do professor frente ao processo ensino aprendizagem, ao qual atribuem o papel de mediador. Contudo, esse é um discurso apenas ancorado, as práticas em seu cerne não se transformaram. A necessidade de misturar, dosar, mesclar ou unir o construtivismo com o tradicional é apontada como solução para obter êxito no processo de ensinoaprendizagem. Os resultados aqui apresentados, sinalizam a necessidade de um repensar dos processos de formação de docentes no país. Não se pode mais admitir dos formadores uma visão e uma prática que desconsidera as representações sociais desses professores. Assiste-se na atualidade ao crescente desenvolvimento de uma literatura voltada para um repensar dos professores como profissionais pesquisadores e reflexivos. Essa nova tendência procura requalificar os docentes do ponto de vista social e profissional, podendo sinalizar como um caminho para uma maior valorização das Representações Sociais dos professores, tomando-as como ponto de partida para o desenvolvimento de políticas e programas de formação docente, tanto inicial como continuada. Referências Bibliográficas Bardin, (1997) L Analise de conteúdo. Edições 70.. 2. 25 p Brasil, Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Introdução. Brasília. MEC. 1997. Brasil. Ministério da Educação e do Desporto. Dep. de Estatísticas Educacionais. Estatísticas da educação no Brasil. 1996. 20p. Farr, R. M. Representações sociais: a teoria e sua história. In: Guareschi, P. & Jovchelovitch, S. Textos em representações sociais. Petrópolis. Vozes. 5ª edição. 1998. Ferreiro, E. & Teberosky, (1986) A. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre. Artes Médicas. 1986. Ferreiro, E. (1990) Reflexões sobre alfabetização. São Paulo. Cortez. 1990. 103p. Coleção polêmicas do nosso tempo (17). Gadotti, M. (1990) O pensamento pedagógico brasileiro. Atica.

Jodelet, D. Representação sociais um domínio em expansão. In: Jodelet, D. (Ed.) Les représentations sociales. Paris. PUF. 1989. (p. 31-61) (texto digitado, tradução livre de grupo de alunos PROGEDI/UFRN). MoscovicI, S. A representação social da psicanálise. Tradução de Álvaro Cabral. Rio de Janeiro. Zahar Editores. 1978. 291p Notas 1. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação - Centro de Estudos Sociais Aplicados (UFRN) 2. São co-autores deste artigo a Profª. Maria do Rosário de Fátima Carvalho do Programa de Pós-Graduação em Educação - Centro de Estudos Sociais Aplicados (UFRN) e o Prof. Antonio Roazzi do Programa de Pós-graduação em Psicologia Cognitiva da Universidade Federal de Pernambuco 3. Na transcrição das fitas e no decorrer deste artigo os participantes desta pesquisa foram assim identificados: P (maiúsculo) indicando a palavra professor, seguido do número de ordem do protocolo e das iniciais da rede escolar em que atua e ordem da fase de coleta dos dados. Por exemplo P13EPU 1ªet, significa, professor nº 13 de escola pública, primeira etapa da coleta de dados.