AÍDA. Roteiro Pedagógico. O gênero ópera



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Transcrição:

AÍDA Roteiro Pedagógico O gênero ópera A ópera é um gênero músico-teatral que reúne várias artes em um único espetáculo. Além de apresentar música erudita, conta com elementos como orquestra, cantores líricos, coral, bailados, cenografia e figurinos. Oficialmente o gênero nasceu em Florença, na Itália, no ano de 1600, com a apresentação de Eurídice (música de Jacopo Peri e Giulio Caccini, com libreto de Ottavio Rinuccini). Há exemplos anteriores em que o teatro e a música mesclavam-se em espetáculos, mas a grande novidade, segundo seus criadores, estava no fato de as obras serem inteiramente cantadas com novos recursos musicais. A ópera surgiu como entretenimento nobre das cortes europeias e era encenada em casamentos, coroações e comemorações de batalhas vencidas. No entanto, a partir de 1637, em Veneza, as óperas passaram a ser apresentadas em teatros, acessíveis a quem pudesse pagar o ingresso, o que contribuiu para a consolidação do gênero no gosto de um público mais amplo. O gênero espalhou-se por várias regiões da Europa, tanto em língua italiana como naquelas dos diversos lugares em que esse tipo de espetáculo começou a ser apresentado. Uma obra cantada do começo ao fim, que também conta com música instrumental, de imediato apresenta o problema da verossimilhança. Como justificar que personagens cantem o tempo todo, ao falar de todos os assuntos, ao executar as mais diversas ações? Ou ainda, como entender o que está sendo cantado, quando dois ou mais personagens cantam ao mesmo tempo coisas diferentes? Mesmo com uma eventual referência ao fato de que as tragédias antigas poderiam ter sido inteiramente cantadas, os artistas envolvidos na criação de óperas sempre tiveram de enfrentar essas questões. O importante é compreender que ópera e teatro recitado são dois gêneros diferentes, e os compositores de óperas precisaram privilegiar cenas em que a presença da música, de algum modo, fizesse sentido. Assim, os personagens cantam porque há situações em que a ação pode ser de algum modo suspensa, e eles podem, através da música, amplificar aquilo que experimentam em seu íntimo. Nós, espectadores, sabemos de quase tudo o que acontece (antes, durante e depois da ação propriamente dita), enquanto os personagens veem-se envolvidos nos mais variados tipos de conflitos que são expressos musicalmente. Deve haver, por consequência, uma negociação entre o público e o espetáculo e, a partir do momento em que se dá a aceitação das convenções próprias da ópera, pode surgir o encantamento diante daquilo que é apresentado. 1

Desde o início de sua história, as óperas usaram temas mitológicos, históricos ou aqueles criados para um espetáculo específico, mas muitas das tramas, pelo menos as chamadas óperas sérias, giram em torno de conflitos insolúveis: o mais comum deles é certamente aquele entre as obrigações morais, civis, religiosas ou familiares e os compromissos com a pessoa amada. É justamente a partir desse confronto que surgem as mais variadas tramas, que podem acontecer nos mais diversos lugares e podem complicar-se mais e mais, dependendo do número de personagens. Além disso, situações em que a comunidade fala (o coro), ou em que a própria música é representada em cena (as paradas, as marchas, as festas, as cerimônias, as danças), são muito usadas nos espetáculos. A ópera é um gênero com uma série de convenções que foram sendo adotadas ao longo do tempo. Por exemplo, os libretos eram escritos, até o final do século XIX, em versos e não em prosa. Pode-se evocar aqui a íntima relação entre poesia e música, tão importante em diversas culturas. Mas a escrita de versos para os libretos de ópera transforma-se em um ofício específico, que também segue várias outras convenções, de modo a tornar o texto apropriado para a música. Com relação à própria música, alguns elementos se consolidam: o uso de uma abertura instrumental, ou ouverture, a distinção entre trechos mais próximos da fala (os recitativos) e aqueles mais propriamente musicais (as árias), os duetos e também cenas com mais de dois cantores (trios, quartetos etc.), uso de coros, de algumas partes exclusivamente instrumentais etc. Outro elemento central é, sem dúvida, a importância dos cantores: com o tempo eles se tornam o polo em torno do qual são construídos os espetáculos. Há também determinadas qualidades sonoras, certas características vocais que são esperadas de cantores de ópera: um tipo específico de emissão vocal, com grande controle da respiração, um domínio que permita certo volume e também a compreensão do que se canta. É importante lembrar igualmente que nem sempre, na história da ópera, a idade e o sexo do cantor coincidem com o personagem que está sendo representado. Também aqui há convenções, que se transformam ao longo do tempo: no século XVIII, por exemplo, um castrato (homem com voz "feminina") podia desempenhar tanto um papel masculino quanto um feminino. Os espetáculos de ópera quase sempre tiveram grande sucesso junto ao público; desde os teatros de corte até os teatros públicos, a ópera parece ter despertado o interesse e as emoções das pessoas. Em contrapartida, os espetáculos também provocaram a desconfiança de teóricos, críticos e censores morais e religiosos. Desde muito cedo, um grande debate sobre a ópera se instaura, envolvendo os mais variados pontos de vista e criando diversas polêmicas. De um lado, o sucesso era inegável; de outro, a dificuldade teórica com um espetáculo híbrido, sem regras baseadas nas poéticas clássicas, levou a uma série de propostas de "reformas" que nem sempre se concretizaram. Tais polêmicas revelam igualmente que a ópera é um gênero em constante transformação, que acompanha não somente as mudanças nas composições musicais, nos dramas e comédias, na dança, nos cenários, na própria arquitetura dos teatros, nas condições de produção dos espetáculos, no gosto, nos cantores, nos instrumentos musicais, nas orquestras, mas também as diversas mudanças na sociedade, no papel das artes dentro dela e na vida nas cidades. Fazer uma ópera foi, desde o início, algo muito custoso e sempre dependeu de algum tipo de financiamento, mesmo contando com um público pagante. 2

Apesar de todas as dificuldades e percalços, ainda parece ser um tipo de espetáculo capaz de mover o público e de fascinar os espectadores. Giuseppe Verdi e a ópera Aída O italiano Giuseppe Verdi (1813-1901) é um dos mais importantes compositores no mundo da música e da ópera. Em sua extensa lista de obras, encontramos vários títulos que permanecem no grande repertório e no gosto do público: podemos destacar, na ordem em que foram compostas, Nabucco, Ernani, Macbeth, Rigoletto, Il Trovatore, La Traviata, Un Ballo in Maschera, La Forza del Destino, Don Carlo, Aída, Otello e Falstaff. As suas óperas são lembradas não apenas por sua força dramática, mas também por árias, duetos, grupos e coros que se tornaram favoritos do grande público. Dada a importância de Verdi no cenário musical, muitos estudos já foram realizados sobre o compositor e sua obra e, por isso, é possível conhecer muito do que o próprio Verdi pensava sobre a composição de óperas, sobre a importância dos libretos e sobre a relação entre os diversos criadores do espetáculo com música. No conjunto de sua produção, Aída é uma obra que vem após uma sequência de sucessos importantes e mostra um Verdi maduro e pronto para realizar novas experiências. Como se sabe, a ópera foi escrita para ser apresentada no teatro de óperas do Cairo. O libreto em italiano foi escrito por Antonio Ghislanzoni, a partir de um roteiro do arqueólogo egípcio Auguste Ferdinand Mariette e de um texto inicial em francês de Camille du Locle, sob a supervisão do próprio Verdi. O texto apresenta tanto situações solenes e grandiosas, quanto cenas íntimas e alguns diálogos mais ágeis, para os quais Verdi procurou compor uma música que escapasse de determinadas convenções. Contudo, Aída é uma ópera em que prevalecem os momentos solenes e tradicionais, e a própria montagem da ópera, com tema egípcio e grandioso, carrega sempre consigo um grau de espetacularidade que muitas vezes tende a ofuscar o drama. Certamente é uma das favoritas do público, pela grandiosidade das encenações e pelas situações extremas a que os personagens estão sujeitos. Propostas de Atividades Nas sugestões de atividades do roteiro pedagógico, parece-nos muito interessante começar aproximando o gênero ópera do universo cultural dos alunos, mostrando a eles como a ópera, que muitas vezes parece algo tão distante, está presente em manifestações que eles reconhecem tão próximas. Por isso, sugerimos trabalhar com desfile de escolas de samba, rap e cinema. 1) Talvez a manifestação cultural do nosso contexto que mais se aproxime de um espetáculo de ópera seja o desfile de escola de samba no carnaval brasileiro. Para além da grandiosidade dos dois espetáculos, ópera e desfile de escola de samba, podemos estabelecer inúmeros paralelos entre eles: o libreto, na ópera, e o samba-enredo, na escola 3

de samba; o maestro e o mestre da bateria e puxadores do samba-enredo; a orquestra e a bateria; os atos e as alas; os cenários e os carros alegóricos; o coro e os milhares de integrantes cantando o samba-enredo; os figurinos e as coreografias, que mantêm as mesmas denominações nos dois casos. Estimule os alunos a identificar e enumerar eles mesmos esses paralelos entre os dois tipos de espetáculos. Em seguida, proponha-lhes uma pesquisa sobre como o erudito e o popular podem se complementar. Um ótimo ponto de partida pode ser a releitura de "A morte do cisne" (uma das mais belas coreografias de balé de todos os tempos, executada originalmente pela bailarina Anna Pávlova) realizada por um jovem brasileiro de forma maravilhosa (disponível em http://www.youtube.com/watch?v=rm2aio9mvne). Depois de realizada a pesquisa, abra a discussão do assunto com a turma. 2) Para tornar o trabalho ainda mais interessante, peça aos alunos que, em pequenos grupos, dividam a história de Aída (utilizando a versão em quadrinhos) em "blocos", contendo as principais ações da ópera, e tentem imaginar como seria se a ópera fosse "entrar na avenida". Proponha que deem nome às alas, pensem no cenário/carros alegóricos e no figurino, em quem seriam os destaques etc. Programe um dia especial para que possam apresentar o resultado para toda a classe. 3) Exiba para os alunos trechos em vídeo de alguma montagem da ópera Aída e proponha a eles linkar esses trechos com os quadrinhos. Para isso, leve-os a identificar como as cenas dos quadrinhos acontecem na ópera, se a música representa um momento calmo, tranquilo, ou um momento enérgico, romântico etc., e a notar a expressão/interpretação dos cantores. Ao assistir ao vídeo, é interessante também observar os elementos que compõem uma ópera, como o que são árias, duetos, solos, a participação do coro, conversas cantadas (recitativo) etc. 4) A passagem da fala dramática (teatral) para a voz cantada (como na ópera), como que oscilando entre o recitativo e a ária, pode ser comparada com expressões mais próximas do nosso dia a dia que fazem esta mesma trajetória (da fala para o canto), embora com mensagens e contextos culturais muito diversos. É isso, por exemplo, que acontece com o rap (ritmo e poesia), que, ao ouvirmos, podemos facilmente reconhecer como oscila entre o canto e a nossa fala cotidiana. O recitativo, um tipo de canto declamado, entoado por um solista, com ou sem acompanhamento, surgiu no início do século XVII na Europa e foi desenvolvido por compositores de ópera para narrar uma história ou para avançar a ação. O rap, arte de rimar em cima de batidas e samplers criados pelos disc-jóqueis (DJs) e recitado por um MC (mestre de cerimônia) ou rapper, com ou sem acompanhamento, surgiu no século XX na periferia de Nova York, e é caracterizado por uma batida rápida e acelerada, embalada pelas letras em forma de discursos sobre questões cotidianas das comunidades. Como representantes nacionais do rap, podemos citar Racionais Mc's, Negra Li, Thaíde, Xis e RZO. Observadas as distâncias históricas, culturais e sociais entre o recitativo e o rap, é possível identificar semelhanças interessantes, como a fala rítmica, a rima e as frases repetidas. Proponha aos alunos que escolham uma frase da ópera Aída em quadrinhos. Cada um deverá recitar para a turma a frase selecionada no estilo recitativo e no estilo rap. Em 4

seguida, deverão formar duplas, escolher um diálogo da história em quadrinhos e recitá-lo em ambos os estilos. Se você desejar ampliar esse trabalho, é interessante fazer algumas correlações do rap com os repentistas nordestinos, com as emboladas, e propor um desafio com jogos de palavras rimadas. 5) Você pode ainda propor aos alunos, em continuidade à atividade anterior, que montem uma encenação simples de um café da manhã com toda a turma em tom de ópera. Será permitido apenas cantar, imitando uma ópera mesmo. Com certeza será bem divertido. 6) Exiba para a classe a cena do primeiro ato em que tem início a desconfiança de Amneris com relação a Aída e peça que localizem a mesma cena na história em quadrinhos. Direcione um bate-papo sobre alguns elementos, relacionando a ópera com a HQ. Tentando descobrir quem é sua rival, Amneris pensa consigo mesma: "Aida! A me rivale... / forse saria costei?". Na ópera, o pensamento de Amneris é cantado e todo o público ouve; porém, para a ação que ocorre no palco, os outros personagens não sabem o que está sendo dito: é o que chamamos de a parte. As HQs têm o recurso do balão de pensamento, com as bolinhas, como podemos perceber na versão de Aída em quadrinhos. Contudo, na ópera há ainda outro recurso, que é uma espécie de comentário que a orquestra faz daquilo que está sendo dito. Criam-se alguns "climas" musicais que introduzem, comentam ou dão suporte para aquilo que está sendo dito. Agora coloque somente o áudio do diálogo entre Aída e Amneris no início do segundo ato para os alunos ouvirem. Estimule-os a perceber como a orquestra acompanha esse diálogo. Também é importante notar que a compreensão do que acontece na música não é exatamente linear. Neste exemplo, mas também em tantos outros, vários personagens cantam ao mesmo tempo falas diferentes. A leitura, mesmo nos quadrinhos, tende a ser linear e com certas pausas, enquanto na ópera, em vários momentos, ouvimos tudo ao mesmo tempo. Como então se dá a comunicação? Para quem cantam os personagens nesses momentos? Proponha aos alunos que tentem identificar no áudio da ópera os momentos em que os personagens cantam ao mesmo tempo e pergunte se conseguem compreender alguma palavra. Em seguida, mostre-lhes o texto (com a sua tradução) para que identifiquem aquilo que é mais importante naquele contexto: Quais sentimentos estão sendo expressos? Eles são contraditórios ou concordantes? Pergunte aos alunos se, na opinião deles, é necessário compreender todas as palavras pronunciadas por cada um dos personagens, ou se a música consegue expressar, no conjunto, a complexidade dos sentimentos. Vale também sempre a pena comparar como essas situações são representadas nos quadrinhos. 7) Aída é uma ópera com tema egípcio e acontece num passado remotíssimo. Julgamos importante refletir sobre como os temas são representados nas obras de arte; assim, é interessante chamar a atenção dos alunos para o fato de que todos os personagens de Aída (egípcios, etíopes, reis, guerreiros ou escravos) cantam em italiano. Seria possível que cantassem em outras línguas? Em que língua falam os personagens da história em quadrinhos? O que fazer com a preocupação arqueológica que tentava recuperar e às vezes reconstituir uma verdade histórica? Proponha aos alunos uma pesquisa sobre a tradição da língua italiana nas óperas. Peça que recolham material sobre o assunto para discussão e também para montar cartazes, que poderão ser expostos para toda a escola. 5

Para ampliar o debate, levante a seguinte questão: as roupas, os cenários, os próprios instrumentos musicais e os cantos religiosos que aparecem na ópera têm alguma relação com as práticas do Egito antigo? E o desenho dos quadrinhos? É sempre possível fazer comparações com obras que de algum modo representam também esse passado distante: o antigo Egito do filme A Múmia até o filme Troia, em que todos os personagens falam inglês (muitas vezes com um sotaque britânico). Você pode programar "sessões de cinema" com a turma para exibir os filmes e abrir uma discussão. Sugestões de leitura e referências: BIANCONI, Lorenzo; PESTELLI, Giorgio (Org.). Storia dell'opera italiana. Turim: EDT, 1987. COELHO, Lauro Machado. A ópera romântica italiana. São Paulo: Perspectiva, 2002. JOHN, Nicholas (Org.). Aida. Giuseppe Verdi. Londres: John Calder/Nova York: Riverrun Press, 1986. MILA, Massimo. L'Arte di Verdi. Turim: G. Einaudi, c1980. PEREIRA, Vinicius. Giuseppe Verdi e o Nacionalismo Italiano. http://www.historia.uff.br/nec/sites/default/files/giuseppe_verdi.pdf. Acesso em 29 ago 2011. PRICE, Leontyne. Aída. Baseada na ópera de Giuseppe Verdi. São Paulo: Ática, 2001. SADIE, Stanley (Org.). The New Grove Dictionary of Opera. Londres: Macmillan, 1997. Sites Site oficial sobre o compositor Giuseppe Verdi: http://www.giuseppeverdi.it/. Acesso em 29 ago 2011. Para a Eurídice de Peri e Caccini, alguns exemplos no youtube: http://www.youtube.com/watch?v=6qk47uaf0hy. Acesso em 29 ago 2011. Releitura de "A morte do cisne" por um jovem brasileiro: http://www.youtube.com/watch?v=rm2aio9mvne. Acesso em 29 ago 2011. Texto: Paulo M. Kühl Colaboração: Maria Cristina M. Pereira Bucci Agradecimentos: Samuel Kerr 6