LINGUAGEM E ENVELHECIMENTO: PROPOSTA DE INTERVENÇÃO EM GRUPOS DE IDOSOS ATIVOS Ana Maria Marcondes Pinto; Christiane Conrado; Mara Tuzzolo Quintanilha Barbosa; Márcia Regina de Almeida Rezende Ruiz. UBS Alto de Pinheiros, SMS/SP/Brasil RESUMO A linguagem nos permite partilhar informações, pensamentos, conceitos, interagir com o outro, lembrar do passado, poder entender o presente e, muitas vezes até prever o futuro. No ser humano, ela impregna pensamentos, sonhos, intermedia as relações e é responsável pela formação, transformação e transmissão do conhecimento. A literatura é farta ao apontar as dificuldades de linguagem inerentes ao processo do envelhecimento e os fatores importantes na determinação do discurso do idoso. Essa proposta tem como base a experiência de trabalho com grupos de idosos ativos, considerando a importância da linguagem e da comunicação na interação social. Em grupo são apresentadas atividades que estimulam habilidades cognitivas (desafios) com diferentes graus de complexidade, solicitando respostas e conclusões através da comunicação verbal (fala, canto ou escrita), ou da expressão corporal (mímica). São utilizados temas de interesse e muitas vezes do conhecimento dos idosos. Atividades que estimulam e impulsionam a necessidade e o desejo de comunicar algo a alguém, num ambiente permissivo e desafiador. Ao compartilhar experiências vividas, aceitar e procurar vencer desafios, somar conhecimentos, as relações são fortalecidas e a linguagem e o pensamento criativo se mostram com soluções e idéias novas, reflexões e observações sem perder a consciência do dinamismo do tempo, dos valores, contextos e mudanças sociais. Ao profissional cabe estimular e abrir espaços para que o sensível flua, o desafio aceito, observado, refletido e respondido numa complexa relação intra e interpessoal. Ao idoso cabe descobrir e valorizar a importância de suas vivências, de seus conhecimentos e de sua sabedoria.
Ao grupo cabe descobrir e fomentar vínculos, ampliando suas relações sociais. Palavras chave: linguagem, idoso e estimulação. Pela linguagem adquirimos conhecimento, arquivamos informações, organizamos o saber e o pensamento além de auxiliar na compreensão do mundo e do outro. Ela permite formular não só idéias já enumeradas, mas também traduzir em sinais diretamente comunicáveis e interpretar qualquer idéia nova. Economia e precisão, maleabilidade e eficácia, aptidão para traduzir todos os matizes do pensamento mesmo os mais imprevisíveis, são qualidades específicas da linguagem articulada humana. Entre os indivíduos em processo de envelhecimento normal, a linguagem frequentemente apresenta algumas alterações como dificuldade em lembrar nomes, em evocar a palavra adequada para nomear objetos, aumento dos episódios na ponta da língua. Essas dificuldades com vocabulário parecem mais um problema de execução do que de competência, pois o conhecimento conceitual não se deteriora, mas está sempre em evolução. Somente nas demências ocorrem alterações na semântica. Observam-se também problemas sintáticos na compreensão e produção de estruturas, mais complexas e ao relatar fatos ou histórias costuma perder o assunto central. São tantos os detalhes que surgem nas descrições, que acabam muitas vezes perdendo o fio da meada. Essas características da linguagem no envelhecimento são comuns, mas se manifestam de formas diferentes de indivíduo para indivíduo. Também do ponto de vista social há uma alteração nas relações, diminuem suas possibilidades de interação e de comunicação. Muitas vezes os idosos organizam sua vida em automatismos e rotinas, talvez como forma de amenizar e se adaptar às alterações sensoriais e motoras. A linguagem e a comunicação se restringem e se repetem assim como os interlocutores e os temas de conversa. Entendemos que vida saudável na velhice é possível, dependendo da manutenção da autonomia e independência. Idosos portadores de doenças crônicas, quando controladas e prevenidas as suas seqüelas e complicações, podem comandar sua
própria vida, definir projetos, estabelecer metas e caminhos para alcançá-los; julgamse indivíduos portadores de boa saúde, não por terem ausência de doenças, mas por serem capazes de decisão, comando e realização por seus próprios meios. Propiciar velhice saudável requer dos profissionais de saúde uma abordagem interdisciplinar abrangente e eficaz. Assim o trabalho em grupo vem sendo priorizado por favorecer as relações sociais e estimular atividades coletivas. Interação, participação, valorização das experiências, contemporaneidade promovem uma sensação de ser capaz e possibilita encontrar caminhos mais curtos e lógicos para respostas às questões apresentadas, no resgate de conhecimentos que se somam e vivências armazenadas. A comunicação é essencial para o ser humano. Possibilita ao indivíduo desenvolver e manter o senso de identidade, pois transmite e recebe informações que ajudam no auto cuidado. Tem um papel terapêutico, principalmente para o idoso auxiliando na diminuição da ansiedade e depressão. Também auxilia na compreensão e atuação sobre o meio físico e social e tem ainda papel importante no entretenimento e lazer. Vivendo em sociedade, o homem necessita da comunicação e quando aspectos importantes do desenvolvimento desse complexo processo apresentam-se alterados, dificultando a sua interação social, ele apresenta-se fragilizado, inseguro, isolado, dependente e doente. Do ponto de vista afetivo, os idosos só poderão ter a noção de que as informações que dispõem são preciosas, se o seu meio social se interessar por elas, ou seja, se as acolhes como interessantes ou úteis. Eles só terão noção de que suas informações são únicas porque foram guardadas na sua memória individual, se tiverem a oportunidade de partilhá-las com outros detentores de lembranças dos mesmos fatos e épocas. A linguagem e a comunicação dialógica contribuem para promover a saúde integral e um envelhecimento salutar, permitindo ao sujeito significar a si e ao mundo; processo que não se interrompe com a chegada da velhice, mas continua até o último dia de vida. Em grupos de idosos, aproveitando espaços cedidos pela comunidade os profissionais planejam e apresentam semanalmente atividades variadas, sobre temas de interesse
comum, executadas de acordo com sua capacidade, estimulando o pensamento criativo, a consciência corporal, a interação, o bem estar,a convivência e a troca de experiências. Inicialmente preparamos o corpo executando movimentos de alongamento e exercícios respiratórios. Abrimos nossos canais receptivos, nos preparando para um jogo de atenção e criatividade. Estimulamos a atenção e concentração com a reprodução de movimentos corporais isolados ou seqüenciais, com emissão de sons. As tradições, cultura social passada oralmente por gerações, são enfocadas nos primeiros encontros. Buscamos evocar, entender os provérbios, ditos populares, simpatias, comidas que já não se fazem mais..., adivinhações, o que é o que é?.. charadas e pegadinhas. Músicas e poesias com versos completados, títulos, autores, épocas e temas são relembrados. Práticas em grupo, sistemáticas e freqüentes, favorecendo as relações sociais e estimulando atividades coletivas, revelam potenciais que suspeitavam não mais possuir. Eu não imaginava que sabia tanta coisa. Como é gostoso poder compartilhar, a gente se sente bem. (M. 74 anos). Os tempos mudaram, nós também mudamos. A sabedoria dos provérbios interessou muito e relembrá-los foi muito bom, nem me lembrava mais. (Â.M. 71 anos) Ao compartilhar experiências vividas, vencer desafios em grupo, somar conhecimentos, os participantes vão construindo novos vínculos, fortalecendo a interação e a troca de experiências. A experiência de vida dos idosos, a sabedoria acumulada é uma conquista do envelhecer, o desafio apresentado leva-os a observar, tomar decisões, sair da rotina e deixar o pensamento criativo fluir. O idoso quer se informar, não quer ficar para trás, as crianças nos cobram. (E. 69 anos)
As atividades desafiam a mente, queremos sair dessa de Estou velha e tão esquecida... (I. 81 anos). Como fui me lembrar de tudo isso? Faz tanto tempo que não penso nessas coisas. (W. 70 anos) Comentário de um idoso após relembrar as parlendas propostas. Tardes agradáveis, espaço lindo, bem arborizado, amizades. (C. 89 anos). Saúde, coragem, amor palavras descrevendo a avaliação de um participante. (C. 89 anos). Dona Ana saiu como outra pessoa. (J. 68 anos) Comentário de uma participante ao final dos trabalhos sobre as mudanças evidentes de sua amiga que naquele dia chegou muito triste e queixosa. Viemos para casa muito contentes. Felizes por termos passado uma tarde de aprendizado e que passou tão rápida de tão boa que estava. (W. 70 anos) A cada encontro que temos com os idosos participamos de uma rica troca, cada indivíduo é único, traz histórias e a sabedoria circula, se complementa. Os participantes referem-se ao bem-estar, à sensação de ser capaz e destacam o convívio e a participação. Ao profissional cabe, como facilitador e estimulador, a sensação de aprender, de descobrir potencialidades, a satisfação de atingir objetivos e também de pertencer ao grupo e não só dirigi-lo. O grupo, com o desenvolver dos trabalhos de forma sistemática e frequente, vai se identificando, formando vínculos e até mesmo buscando outros espaços de convivência. Uma proposta de trabalho que a todos gratifica e que gera benefícios à saúde evidentes e percebidos por todos. BIBLIOGRAFIA Rabadán, Onésimo (1998) J. Lenguaje y envejecimiento. Bases para La intervención. Ediciones Masson S.A., Barcelona. Martínez, Mari Carmem & Gracia, Juan B (1998) Saber Envejecer. Ediciones Oria, Bilbao
Limongi, Fernanda P. (2004) Manual Papaterra de habilidades cognitivas. Pancast Editora, São Paulo. Ana Maria Marcondes Pinto Fonoaudióloga da PMSP com pós-graduação em Gerontologia; Saúde Pública. Coordenadora na UBS Alto de Pinheiros/SMS/Regional Centro-Oeste (2005-2008) anamariamarcondes2@bol.com.br Christiane Conrado Fonoaudióloga clínica com especialização em motricidade oral (CEFAC) Fonoaudióloga da P.M.S.P. Curso de pós-graduação em Gerontologia / Coordenadoria de Saúde de Pinheiros christianeconrado@hotmail.com Mara Tuzzolo Quintanilha Barbosa Terapeuta Ocupacional da PMSP com especialização em Saúde mental (UNIFESP) Coordenadora da UBS Alto de Pinheiros/SMS/Regional Centro-Oeste (desde Nov/2008) marabarbosa@terra.com.br Márcia Regina de Almeida Rezende Ruiz Fisioterapeuta com especialização em neurologia (FMUSP), RPG (P. Souchard), Cadeias musculares GDS (Bélgica) Fisioterapeuta da PMSP com ênfase no estudo e trabalho sobre o envelhecimento. marciarezenderuiz@gmail.com