Módulo 7 Termodinâmica.



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Transcrição:

Física e Química Módulo 7 Termodinâmica. 1

TÉCNICO DE ELECTROTECNIA 2

1. Sistemas Termodinâmicos 1.1 O que é um Sistema Termodinâmico A Termodinâmica é uma área do conhecimento da Física que se iniciou por simples questões de engenharia. O seu nascimento remonta ao século XVIII, quando James Watt fabricou a primeira máquina a vapor. A partir desta altura muitos foram os desenvolvimentos que surgiram nesta área: primeiro com a procura, por parte das empresas, de máquinas com mais rendimento e mais eficientes; depois com a aplicação à astrofísica sob muitas formas. Nos dias de hoje, a termodinâmica de muitos materiais é estudada exaustivamente utilizando sempre, para isso, o auxílio da Física Estatística. Pode-se considerar que a Termodinâmica é a área do conhecimento da Física que trata das trocas de energia entre um determinado corpo com o meio à sua volta. Para definir estas trocas ou transferências de energia, o estudo termodinâmico necessita de definir um sistema. Assim, um sistema define-se como um corpo ou conjunto de corpos, com características próprias, que vai ser objecto de estudo. O meio à sua volta define-se como a vizinhança e, o sistema está separado desta pela fronteira. A soma do sistema com a vizinhança constitui o universo. Sistema + Vizinhança = Universo Fig. 1 Os sistemas são classificados de acordo com as suas interacções com a vizinhança. Podem ser: Abertos: se houver trocas de matéria e de energia (ex: um copo com água) Fechados: se houver trocas de energia mas não de matéria (ex: uma garrafa fechada) Isolados: se não houver trocas de matéria nem de energia (ex: uma garrafa termos ) O Universo é o exemplo máximo de um sistema isolado. Não existem trocas de energia nem de matéria entre o Universo e a sua vizinhança. As fronteiras também são classificadas de acordo com a sua permeabilidade a trocas de energia. Assim, as fronteiras podem ser: Permeáveis: são as fronteiras que existem num sistema aberto; Rígidas: são as fronteiras que existem num sistema fechado; Adiabáticas: são as fronteiras existentes num sistema isolado. 2. Energia Interna e Temperatura O sistema formado por uma só partícula é o mais simples de todos. Mas há sistemas formados por muitas partículas que não podem ser reduzidos a uma única partícula. Nesse caso, a energia cinética do sistema resulta de todas as energias cinéticas das partículas e a energia potencial do sistema resulta de todas as 3

energias potenciais. Tomemos, como exemplo, um gás contido num recipiente (por exemplo, uma garrafa de gás butano). Este sistema de muitas partículas tem uma energia interna que resulta, em última análise, das energias cinéticas e potenciais de todas as partículas que o constituem. A energia interna, que representamos por E int, não é, portanto, um novo tipo de energia. O gás contido num recipiente, que está representado esquematicamente na figura 2, tem uma certa energia interna. Fig. 2 Se todo o sistema se deslocar com velocidade v, como em (b), a sua energia não é só a energia interna tal como em (a), mas também a energia cinética do sistema como um todo, que é igual a 1 Mv 2, sendo M a massa total do sistema. Na situação (a), as partículas do gás têm energia cinética mas o conjunto não tem, pois o seu centro de massa está em repouso. Na situação (b), o centro de massa está em movimento. Por outro lado, se o sistema estiver sujeito a determinadas forças como a gravítica (nomeadamente se a altura do centro de massa variar), existe uma energia potencial do sistema associada a esta interacção com a vizinhança. Esta energia potencial externa também não está contida na energia interna. A energia total do sistema, E, é a soma da sua energia interna, de massa, E c, e da energia potencial do seu centro de massa, E p. 2 E int, da energia cinética do seu centro Energia total = Energia interna + Energia cinética do CM + Energia potencial do CM E Eint E c E p Se o centro de massa do sistema estiver em repouso e não tiver energia potencial, toda a energia do sistema será energia interna, E. Eint A energia interna de um sistema relaciona-se com a temperatura. A temperatura é uma propriedade dos sistemas, medida com um termómetro, que permite caracterizar de uma forma objectiva as sensações subjectivas de quente e frio. O estudo dos fenómenos térmicos, isto é, dos fenómenos onde entra a noção de temperatura, faz-se na Termodinâmica. As partículas constituintes de um sistema estão em permanente agitação, possuindo por isso energia cinética. Este movimento desordenado é designado por agitação térmica. Há uma relação directa entre a agitação dos corpúsculos constituintes de um sistema e a temperatura desse sistema: a temperatura do corpo será tanto maior quanto maior for a agitação das partículas. 4

Fig 3 A energia interna de um sistema depende da quantidade de matéria que o constitui. Se tivermos um recipiente com água a uma determinada temperatura e repartirmos a água por duas partes iguais, cada uma dessas partes fica com metade da energia interna inicial. Mas a temperatura é a mesma numa e na outra metade, sendo igual à temperatura inicial. A energia interna depende do número de partículas (ou, em geral, quantidade de matéria) que constituem o sistema. Mas a temperatura não depende. Fig 4 2.1 Equilíbrio térmico No caso de não existirem interacções com a vizinhança, mostra a experiência que os sistemas atingem e permanecem em estados de equilíbrio, isto é, as suas propriedades mantêm-se inalteradas. Diz-se que um sistema está em equilíbrio térmico quando a sua temperatura permanece constante em todas as partes do sistema. Já sabemos que a temperatura se relaciona com a agitação dos corpúsculos constituintes da matéria. Mas há também uma interpretação macroscópica da temperatura associada ao conceito de equilíbrio térmico. Sabe-se que as sensações de quente e frio são subjectivas, um esquimó poderá achar um dia de Inverno em Portugal quente e um brasileiro no mesmo dia acha que está frio. As noções tácteis de quente e frio adquirem, com a medição, um significado quantitativo. A temperatura é a grandeza física que permite estabelecer de forma rigorosa o que é o quente e o frio. Quando um corpo está mais quente do que outro, dizemos que está a uma temperatura mais elevada. O que se passa quando um corpo a temperatura mais elevada é colocado em contacto com um corpo a uma temperatura mais baixa? É claro que o corpo quente arrefece e o frio aquece. Mas, a certa altura, esse processo pára: nem um corpo aquece indefinidamente nem o outro arrefece indefinidamente. Dizemos, então, que se atingiu o equilíbrio térmico. Nesta situação, dois termómetros postos em contacto com cada um dos 5

corpos indicarão o mesmo valor. Se há equilíbrio térmico entre os dois corpos, eles estão à mesma temperatura. Quando se põem em contacto dois corpos a temperaturas diferentes, um absorve energia e o outro emite energia. A energia que passa do corpo quente para o corpo frio chama-se calor. Em resultado dessa transferência de energia o corpo que estava inicialmente a uma temperatura mais baixa aumenta a sua temperatura, ao passo que o outro a diminui. Os dois ficam, no fim, à mesma temperatura. T A = T B Fig. 5 Dois corpos estão à mesma temperatura se ficarem em equilíbrio térmico quando colocados em contacto um com o outro. 2.2 Lei Zero da Termodinâmica Segundo a Lei Zero da Termodinâmica, dois corpos em equilíbrio térmico com um terceiro corpo, devem ficar em equilíbrio térmico um com o outro. Consideremos os corpos A, B e C: Fig. 6 Se A e C estão em equilíbrio térmico entre si, a sua temperatura é igual: T A T C Por outro lado, se B e C estão em equilíbrio térmico entre si então: T B T C Logo, T A T B Isto é, A e B terão de estar em equilíbrio térmico. 6

A noção de temperatura fica agora mais clara: é a propriedade física comum a todos os corpos que estão em equilíbrio térmico entre si. 2.3. Escalas de Temperatura Para graduar um termómetro, é necessário fixar arbitrariamente dois pontos numa escala, atribuindo-lhe um valor numérico. 2.3.1 Escala de Celsius A escala de Celsius toma, para valores desses pontos, a temperatura de fusão do gelo e a temperatura de ebulição da água, à pressão normal. À temperatura de fusão coexistem, em equilíbrio, gelo (sólido) e água líquida. Convencionou-se atribuir a esta temperatura o valor zero da escala. À temperatura de ebulição, a água líquida e o vapor de água coexistem em equilíbrio. A esta temperatura foi atribuído o valor de 100 Fig. 7 da escala. Assinala-se estes dois pontos (0 ºC e 100 ºC) e divide-se a distância entre eles em 100 intervalos iguais. Cada uma destas divisões tem o valor de 1 ºC. 2.3.2 Escala de temperaturas absolutas (Escala da Kelvin) Qualquer gás a baixa pressão ocuparia o volume zero, se mantendo a pressão, a sua temperatura baixasse para -273,15 ºC, e exerceria pressão nula se, mantendo o volume, a sua temperatura baixasse para -273,15 ºC. Uma escala de temperaturas cujo zero seja a temperatura de -273,15 ºC, ou zero absoluto, chama-se escala de temperaturas absoluta ou escala de temperaturas do gás ideal. Em 1954, convencionou-se o uso do ponto triplo da água, única temperatura em que, o gelo, a água líquida e o vapor de água coexistem em equilíbrio térmico, como ponto de partida para calibrar um termómetro que usam esta escala. É impossível atingirmos a temperatura de zero absoluto. A unidade que se usa para quantificar temperaturas expressas nesta escala é o Kelvin. Nesta escala a temperatura é representada por T e a sua unidade por K (Kelvin). À temperatura do ponto triplo atribuiu-se, por convenção o valor 273,15 K, de modo a que houvesse 100 kelvin entre o ponto de fusão e o ponto de ebulição normais da água. Por outras palavras, o intervalo de temperatura de 1 ºC é igual ao intervalo de tempo de 1 K. Para converter uma temperatura expressa em graus Celsius, para temperatura absoluta utiliza-se a seguinte expressão: T C 273,15 7

2.3.3 Escala Fahrenheit A escala Fahrenheit está dividida em 180 partes, entre os dois pontos fixos, valendo cada uma delas 1 grau Fahrenheit (ºF). O primeiro ponto fixo (graduação 0 ºF) corresponde ao estado térmico de uma mistura, em partes iguais, de cloreto de sódio, cloreto de amónio e gelo fundente. O segundo ponto fixo (100 ºF) corresponde à temperatura normal do corpo humano. A expressão que permite relacionar esta escala de temperaturas com a escala Celsius é a seguinte: F 9 5 C 32 3. Condução e Convecção figura 8. A energia entre dois corpos a temperaturas diferentes transfere-se por um fluxo de calor, como mostra a Fig. 8 A condução e a convecção são duas formas distintas dessa transferência. Quando seguramos na extremidade de um objecto metálico que é aquecido na outra extremidade sentimos um aumento gradual de temperatura. Depois de algum tempo, somos forçados a largar o objecto pois ele queima. Acontece que os corpúsculos (átomos, iões, moléculas) que constituem o objecto, ao receberem energia, agitam- -se mais, propagando-se a agitação aos outros corpúsculos ao longo do objecto até chegar ao sítio onde temos a mão. A este processo de transmissão de energia chama-se condução térmica. Fig. 9 O ar é um mau condutor térmico. Sabemos, porém, que nele ocorrem fluxos de calor com relativa facilidade: quando se liga um aquecedor numa sala, o ar aquece depressa. O processo de transmissão de energia que então ocorre designa-se por convecção térmica. Na condução térmica, os corpúsculos do meio material agitam-se mas afastam-se pouco das suas posições de equilíbrio. No caso da convecção, que ocorre nos líquidos e gases, a transferência da energia dáse por deslocamentos de partes do fluído de um lugar para outros, devido a diferenças de massas volúmicas entre partes do sistema. Quando se aquece água numa cafeteira, o líquido na parte de baixo aquece mais rapidamente e a sua massa volúmica diminui. Esta matéria menos densa eleva-se no líquido dando o seu lugar à matéria mais 8

densa que se encontra na parte superior. Quando a água mais quente sobe, vai arrefecendo, transferindo energia para as regiões vizinhas. Enquanto a água sobe e arrefece, a sua massa volúmica aumenta. Por isso, a certa altura volta a descer, repetindo-se o processo. Fig. 10 Os deslocamentos da água dentro de uma cafeteira, ou do ar de uma sala que está a ser aquecida, são chamados correntes de convecção. Fig. 11 A convecção térmica ocorre em muitas situações reais: 1. Num frigorífico, por exemplo, o congelador é colocado na parte superior (nos frigoríficos modernos o congelador é separado mas, nos modelos mais antigos e mesmo nos modelos actuais de uma só porta, tal não acontece). Desta maneira formam-se correntes de convecção: o ar mais quente sobe e o ar frio desce, arrefecendo-se assim o interior do frigorífico. Fig. 12 2. Um praticante de asa-delta ou de parapente que queira subir, tem de procurar correntes de ar quente ascensional, formadas devido ao aquecimento da Terra pelo Sol. 9

3. Uma outra situação em que as correntes de convecção são importantes, é na renovação do ar junto ao solo e a eventual dispersão de gases poluentes provenientes de veículos e de fábricas. Fig. 13 Como normalmente a temperatura junto ao solo é superior à temperatura do ar a maior altitude, formam-se correntes de convecção. Mas, por vezes, sucede o fenómeno de inversão térmica: o ar junto ao solo fica mais frio do que o ar das camadas superiores. Neste caso, não há correntes de ar verticais e os gases poluentes ficam aprisionados junto ao solo. Esta situação é potencialmente perigosa quando ocorre nas grandes cidades industriais. 3.1 Condutividade térmica dos materiais Várias experiências sobre a condução térmica dos materiais permitiram concluir que esta depende não só da natureza do material, mas também da sua geometria. Tomemos uma barra metálica de comprimento l e área da secção transversal A. As paredes da barra estão isoladas termicamente e as suas extremidades estão a temperaturas diferentes, sendo ΔT a diferença entre elas. Na fig 14, uma extremidade está à temperatura de 100 ºC e a outra à temperatura de 0 ºC. Fig. 14 Estas temperaturas são mantidas constantes apesar de haver transferência de energia de um sistema para outro por condução térmica através da barra. Define-se a corrente térmica, unidade de tempo, ou seja: (esta letra grega lê-se fi ), como a energia transferida por calor, por Q t onde Q é o calor e Δt o intervalo de tempo (não confundir com ΔT, que é uma diferença de temperaturas!). No Sistema Internacional, a corrente térmica exprime-se em joules por segundo (J s -1 ). A experiência mostra que a corrente térmica: - É directamente proporcional à diferença de temperatura, ΔT, entre as extremidades da barra. Quanto maior for a diferença de temperatura, mais rápida será a transmissão de energia por calor. 10

- É directamente proporcional à área da secção recta da barra, A. Quanto mais grossa for a barra, mais depressa se dará a transmissão de energia por calor. - É inversamente proporcional ao comprimento da barra, l. Quanto mais longa for a barra, mais lenta será a transmissão de energia por calor. - Depende de uma constante, k, chamada condutividade térmica, que é uma característica do material. Resumidamente, escrevemos a chamada lei de Fourier: k A unidade da condutividade térmica no Sistema Internacional é o joule por segundo por metro por Kelvin (J.s -1.m -1.K -1 ). Como uma variação de temperatura em graus Celsius (ºC) é igual a uma variação de temperatura em Kelvins (K), escreve-se por vezes ºC -1 em vez de K -1 na unidade de k. A l T 3.2 Bons e maus condutores de calor Materiais diferentes com a mesma forma conduzem de modo diferente e têm, portanto, condutividades térmicas diferentes. Existem inúmeras aplicações práticas do fenómeno da condução térmica. Por vezes é desejável rapidez na condução de energia por calor (como no fundo das panelas, por exemplo). Outras vezes é desejável o isolamento térmico (como nas pegas das panelas, por exemplo). Os chamados bons condutores térmicos caracterizam-se por valores de condutividade térmica elevados. Os maus condutores térmicos apresentam valores de condutividade térmica baixos. A tabela 1 mostra as condutividades térmicas de alguns materiais. Material k / J s -1 m -1 K -1 Prata 427 Cobre 397 Alumínio 238 Ferro 80 Vidro 0,8 Cimento 0,8 Água 0,6 Borracha 0,19 Madeira 0,08 Cortiça 0,06 Lã pura 0,04 Ar 0,023 Tabela 1 Dizer que a condutividade térmica do ferro é 80 joules por segundo, metro e kelvin significa que se transferem 80 joules em cada segundo de uma extremidade para outra de uma barra de ferro com um metro de comprimento, se a diferença de temperatura entre as duas extremidades for de 1 kelvin. Muitas vezes, dois corpos parecem não estar a temperaturas iguais, mas de facto estão. Se colocarmos, por exemplo, a mão numa chapa metálica e num bocado de madeira, que estão à mesma temperatura (temperatura ambiente, por exemplo), a chapa parece estar mais fria. A explicação está relacionada com a transferência de energia como calor por condução. Como a nossa mão está mais quente, ao tocarmos os objectos transfere-se energia da nossa mão para estes. Essa 11

transferência é muito mais rápida no caso do metal (que tem uma grande condutividade térmica) do que na madeira (que tem uma pequena condutividade térmica) ou, em geral, nos materiais de baixa condutividade térmica. É a grande quantidade de energia que sai da nossa mão num pequeno intervalo de tempo que causa a sensação de o metal estar a uma menor temperatura. Curiosidades Novos materiais com baixa condutividade térmica A indústria moderna dispõe de cerca de 50 mil novos materiais que se classificam em cinco grandes grupos: metais, cerâmicas, polímeros, semicondutores e compósitos. No que toca ao comportamento térmico, desenvolveram-se telhas refractárias feitas à base de fibras de sílica. Estes materiais são aplicados para revestir a fuselagem dos vaivéns espaciais. A desintegração do vaivém Columbia em 2003 deveu-se, provavelmente, a uma falha na protecção da fuselagem. Aproximadamente 93% do volume das telhas refractárias é vazio e a condutividade térmica é tão baixa que podem ser seguras com as mãos nuas, por alguns segundos, após terem sido retirados de ambientes a temperaturas superiores a mais de 1000 ºC. Outros materiais, como os metais reforçados por fibras cerâmicas (alumínio mais fibras de carbono), têm uma grande resistência à tracção. A dureza dos metais pode também ser muito aumentada pela dispersão de partículas cerâmicas insolúveis, o que aumenta também a sua resistência ao desgaste abrasivo e erosivo, bem como, a sua resistência à condução de calor. Já indicámos a interpretação microscópica da condução térmica. O grau de mobilidade dos corpúsculos constituintes de uma substância depende do seu estado físico. Fig. 15 Nos materiais onde as forças entre os corpúsculos vizinhos são fracas (como nos gases, nos líquidos e também em materiais como a madeira, cortiça, etc.), a condução térmica também é fraca. Estes materiais os isoladores térmicos são caracterizados por não terem uma estrutura cristalina. Pelo contrário, os iões dos metais ocupam as posições de uma rede cristalina, e as suas oscilações transmitem-se com grande facilidade aos seus vizinhos. A onda que assim se gera propaga-se rapidamente neste material que é, portanto, um bom condutor térmico. 12

3.3 Capacidade térmica mássica e calor de transformação mássico Cada material comporta-se de modo diferente quando é sujeito a aquecimento. A grandeza física que exprime as características térmicas de cada material é a capacidade térmica mássica, que se representa por c e exprime-se em joules por quilograma por grau Celsius (J kg -1 ºC -1 ). A experiência mostra que, quando se aquece um objecto a pressão constante (por exemplo, à pressão atmosférica), a energia fornecida, E (calor, neste caso, mas a energia pode ser fornecida por outros modos), é proporcional à variação de temperatura do corpo, ΔT: E mc T E energia fornecida sob a forma de calor m massa do corpo c capacidade térmica mássica do material que constitui o corpo T variação de temperatura do corpo A equação E mc T não se verifica rigorosamente para todos os materiais e para todas as condições de pressão e temperatura, pelo que ela apenas descreve aproximadamente a realidade. A capacidade térmica mássica da água líquida é c água 4,18 J g -1 º C -1 4,18 10 3 J kg -1 º C -1. Este valor significa que são necessários 4,18 joules para elevar de 1 grau Celsius a temperatura de 1 grama de água. Esta energia, que foi medida no século XIX, ficou conhecida por caloria (símbolo cal): 1 cal = 4,18 J. A capacidade térmica mássica do gelo água no estado sólido é c gelo 2,1J g -1 º C -1, ou seja, cerca de metade do valor da água líquida. Se se fornecer a 100 g de gelo a energia de 1000 J, o aumento de temperatura é o dobro do que se verifica se a mesma energia for fornecida à mesma massa de água líquida. A tabela 2 mostra as capacidades térmicas mássicas de alguns materiais: Substância C / J kg -1 ºC -1 Água líquida 4180 Álcool etílico 2400 Cobre 390 Ferro 440 Alumínio 900 Tabela 2 Quando se fornece energia a uma substância, mantendo-se a pressão constante, nem sempre há aumento de temperatura. É este o caso, por exemplo, numa mudança de estado ou de fase. Suponhamos um bloco de gelo, inicialmente à temperatura de -5 ºC, que é aquecido, como na questão anterior. À medida que se fornece energia ao gelo a sua temperatura sobe, aumentando a agitação corpuscular, até que se atinge a temperatura de 0 ºC, à qual se dá a fusão (passagem de sólido para líquido). Mas este processo de fusão não 13

é instantâneo. É necessário continuar a fornecer energia durante algum tempo para que toda a água passe da fase sólida para a fase líquida. Fig. 16 Durante o processo de mudança de fase, como o que se mostra na figura 16, a temperatura não aumenta: a energia fornecida serve apenas para quebrar as ligações entre as moléculas de água e não para aumentar a agitação corpuscular dessas moléculas. A transição sólido-líquido é a passagem de um estado de agregação como o que está à esquerda da figura 15 para o estado de agregação que se mostra no centro da mesma figura. O sistema só volta a aumentar a sua temperatura depois de todas as ligações moleculares estarem quebradas. Tem, portanto, de ser fornecida uma certa energia a um sistema para que ele passe da fase sólida à fase líquida. Essa energia por unidade de massa (por quilograma de substância) é designada por calor de transformação mássico (calor de fusão) e representa-se por L. Assim, a energia que é necessária para que uma certa massa m de gelo a 0 ºC passe a água líquida, ainda a 0 ºC, é: E m L onde L = 3,34 10 5 J kg -1 é o calor de fusão da água. Para que um quilograma de gelo a 0 ºC passe a água líquida à mesma temperatura, são necessários 334 kj. Retomamos a descrição do aquecimento da água: fornecendo mais energia atinge-se o chamado ponto de ebulição, que é a temperatura a que se dá a mudança de líquido para vapor. Tal como para a fusão, a temperatura não varia durante a conversão líquido-vapor. A energia fornecida apenas serve para quebrar as ligações entre as moléculas de água no líquido ficando estas com muito mais mobilidade. Depois de toda a água estar vaporizada, a energia fornecida volta a provocar um aumento de temperatura do sistema. Analogamente ao calor de fusão há também agora um calor de vaporização, que é a energia que é necessário fornecer por unidade de massa para que a água a 100 ºC se converta integralmente em vapor a essa temperatura. A figura 17 mostra a variação de temperatura da água em função da energia que lhe é fornecida. Os dois patamares correspondem às duas transições de fase (ou mudanças de estado) referidas. Fig. 17 14

4. Primeira Lei da Termodinâmica A energia interna de um sistema pode variar devido à interacção do sistema com a respectiva vizinhança. Essa energia varia se entrar ou sair energia através da fronteira do sistema como trabalho, calor ou radiação. Note-se que a energia interna está nos sistemas. Faz sentido afirmar: este sistema tem uma energia interna de 1000 J. Mas nem o calor, nem a radiação, nem o trabalho estão no sistema. Não são propriedades que se possam associar a estados de equilíbrio de um sistema. Estão sim, associados a transformações ou processos realizados em sistemas quando passam de um estado para outro estado. Como tal, não faz sentido afirmar: este sistema tem 1000 J de calor mas já se pode dizer este sistema recebeu (ou cedeu) 1000 J sob a forma de calor. Tal como o calor, também o trabalho e a radiação dizem respeito a processos termodinâmicos. Não são propriedades do sistema. A energia não se ganha nem se perde, mas pode transferir-se de um sistema para outro. Esta afirmação traduz a lei da conservação da energia. No caso dos sistemas termodinâmicos, esta lei chama-se Primeira Lei da Termodinâmica. A Primeira Lei relaciona as energias que transitam de (ou para) um sistema, através da sua fronteira, e a consequente variação de energia interna do sistema. nula. A energia interna, E int, de um sistema isolado é uma constante, pelo que a variação de energia interna é E int 0(sistema isolado) Mas muitos sistemas não são isolados. Entre eles e a sua vizinhança pode haver transferências de energia por trabalho, calor ou radiação. E int W Q R (sistema não isolado) No primeiro membro da equação anterior, Eint é a variação de energia interna e, no segundo membro, W, Q e R são energias transferidas respectivamente como trabalho, calor ou radiação, como se esquematiza na figura 18. Fig. 18 Quando escrevemos a Primeira Lei da Termodinâmica na forma E int W Q R estamos a admitir uma convenção de sinais: - Quando entra energia no sistema, seja por trabalho, por calor ou por radiação, estes são positivos pois fazem aumentar a energia interna do sistema E int 0. - Quando sai energia do sistema, então Q, R ou W são negativos e E int 0. 15

No primeiro caso, a energia interna aumenta, qualquer que seja a forma de energia que entra. No segundo caso, a energia interna diminui, qualquer que seja a forma de energia que sai. Pode acontecer que um sistema não esteja isolado e que o calor recebido seja igual ao trabalho realizado. Se não houver radiação e se Q W, então E 0. Não é pois necessário que um sistema esteja int isolado para que a variação de energia interna seja nula. Ela é sempre nula se o sistema estiver isolado, mas pode também ser nula quando o sistema permite trocas de energia com o exterior. Para tal, basta que receba e forneça a mesma quantidade de energia, como o planeta Terra. A equação Eint W Q R governa todos os balanços energéticos de um sistema. Para dar um exemplo de um balanço energético voltemos à água aquecida numa chaleira. Enquanto recebe energia da chama ou disco eléctrico, a chaleira emite energia por radiação. Neste caso, não se realiza trabalho e a variação da energia interna é o resultado do balanço energético entre o calor, que é positivo pois entra no sistema, e a radiação, que é negativa pois sai do sistema. 4.1 Calor, trabalho, radiação e variações de energia interna Vamos ver alguns exemplos que ilustram a variação de energia interna de um sistema devido a trabalho, calor e radiação. Por ser mais simples vamos considerar um mesmo processo termodinâmico: gás contido num recipiente cilíndrico. Fig. 19 4.1.1 Radiação Supomos que a tampa do cilindro está fixa e que o recipiente é feito de um material isolador térmico. A parede lateral é transparente. Fig 20 Faz-se incidir luz, proveniente de uma fonte laser, no sistema, como mostra a figura 20. Toda a luz é absorvida pelas moléculas do gás que ficam com maior energia cinética, o que se traduz por um aumento da energia interna do sistema (fácil de verificar pelo aumento da temperatura). Não houve realização de trabalho 16

nem ocorreram fluxos de calor, pelo que o aumento de energia interna se ficou a dever totalmente à radiação absorvida. Como Q 0 ew 0, a Primeira Lei reduz-se, neste caso: E int Um exemplo muito comum de aumento de energia interna por radiação é o aquecimento de alimentos num forno microondas. As microondas usadas nos fornos das cozinhas são facilmente absorvidas pelas moléculas que entram na constituição dos alimentos (sobretudo as moléculas de água). Como consequência dessa absorção, as moléculas adquirem movimentos de rotação e vibração que conduzem ao aumento de energia interna. R 4.1.2 Trabalho O trabalho termodinâmico pode ser de dois tipos: trabalho de configuração e trabalho dissipativo. A diferença ficará clara após os dois exemplos que se vão apresentar. Fig 21 1 Suponhamos que o gás contido no recipiente cilíndrico está isolado termicamente e que a tampa do recipiente se pode deslocar para cima e para baixo (uma tampa dessas chama-se êmbolo). O que acontece quando pressionamos o êmbolo? O volume que o gás ocupa diminui. Sempre que varia o volume de um sistema este realiza trabalho sobre a vizinhança ou a vizinhança realiza trabalho sobre o sistema. Essa forma de trabalho termodinâmico chama-se trabalho de configuração. 2 Vejamos agora um gás encerrado no cilindro, isolado termicamente, sem poder receber radiação ou radiar para o exterior. Além disso, as paredes são rígidas o que impede quaisquer variações de volume e, portanto, não pode haver trabalho de configuração. Uma garrafa termo contendo um líquido é um outro exemplo de um sistema nas condições que estamos a indicar. Será possível, neste caso, variar a energia interna do sistema? Sim! Basta agitar o sistema. No caso da garrafa termo, o líquido lá dentro aquece se a agitarmos. Aquece pouco, é certo, mas se o movimento for intenso e prolongado, a elevação de temperatura pode Fig. 22 ser detectada com um termómetro. Claro que não é a maneira mais prática de aquecer um líquido mas funciona! Este processo de transferir energia para o sistema chama-se trabalho dissipativo. Ainda é trabalho porque há força e há movimento. 17

O trabalho dissipativo pode ser medido experimentalmente. Foi Joule quem primeiro realizou a experiência que a seguir se vai descrever. Dentro de um vaso calorimétrico, que é um recipiente cujas paredes são isoladoras térmicas, contendo água, monta-se um conjunto de pás que podem girar juntamente com um eixo ao qual estão ligadas. O conjunto gira dentro do recipiente quando o corpo cai preso a um fio. Fig. 23 À medida que o corpo cai, a água exerce forças sobre as pás que rodam. Enquanto as pás rodam, estas forças realizam trabalho dissipativo. A água vai aquecendo dentro do vaso calorimétrico conforme se pode ver no termómetro. O aumento de energia interna é igual ao trabalho dissipativo. Esta famosa experiência permitiu estabelecer a equivalência entre o calor e o trabalho: para aquecer o líquido dentro do recipiente tanto se podia usar calor como trabalho. Ambos os processos conduziam ao aumento da energia interna. Há outros tipos de trabalho dissipativo. Um outro exemplo, é o trabalho eléctrico responsável pelo aquecimento de uma resistência eléctrica quando é atravessada por uma corrente eléctrica. O aumento da temperatura de uma resistência eléctrica por acção da corrente eléctrica é o chamado efeito Joule. 4.1.3 Calor Outra forma de variar a energia interna consiste em permitir um fluxo de calor da vizinhança para o sistema (ou do sistema para a vizinhança). Coloquemos o gás contido num recipiente cilíndrico em contacto com um outro sistema (a que vamos chamar fonte térmica ) a uma temperatura superior. Fig. 24 A base do recipiente contendo o gás é condutora térmica, o que, recordamos, significa que o calor flui facilmente por ela. A tampa do recipiente está fixa e, portanto, a variação de energia interna do gás é exclusivamente devida ao calor. Neste caso, a expressão da Primeira Lei fica: E int Q Se a fonte estivesse mais fria do que o sistema, o calor fluiria deste para a fonte e a energia interna diminuiria. 18

5. Rendimento de processos termodinâmicos As máquinas térmicas convertem uma certa quantidade de calor em trabalho. Esse trabalho é energia útil, energia que pode ser aproveitada para, por exemplo, mover um veículo, accionar uma máquina industrial ou produzir electricidade. Uma das primeiras aplicações do trabalho de uma máquina térmica foi na máquina a vapor, que esteve na origem da Revolução Industrial dos séculos XVIII e XIX. Muitos inventores perseguiram o sonho de construir máquinas de movimento perpétuo, ou seja, máquinas que realizassem trabalho sem consumir energia. Mas tal não foi nem será possível! Sempre que uma máquina produz trabalho, ela tem de ir buscar energia a algum lado. A figura 25 mostra um sistema termodinâmico em interacção com duas fontes térmicas. O sistema realiza processos termodinâmicos cíclicos e, em cada ciclo, recebe da fonte quente uma certa energia Q 1 (calor). Durante o ciclo, o sistema realiza sobre o exterior o trabalho W, mas cede à fonte fria o calor Q 2. Fig. 25 Um dos objectivos dos físicos e engenheiros tem sido o de melhorar o rendimento das máquinas. O rendimento da máquina térmica define-se como a razão entre o trabalho produzido (energia útil) e o calor fornecido pela fonte quente: ou, resumidamente, rendimento da máquina térmica trabalho realizado calor fornecido pela fonte quente W Q 1 O trabalho realizado, W, é igual à diferença entre a energia que entra como calor, Q 1, e a energia que sai como calor, Q 2. O primeiro destes calores é positivo (entra) e o segundo negativo (sai). Tomando os módulos (valores absolutos) do trabalho e dos dois calores, podemos escrever W Q 1 Q e a equação anterior vem: Q1 Q Q 1 2 1 Q Q 2 1 2 O rendimento da máquina é sempre inferior a 1, uma vez que há sempre energia que sai como calor ( Q 2 0 ). Este calor é a energia desperdiçada. Muitas vezes o rendimento é expresso em percentagem. Dizer 19

que o rendimento de uma máquina térmica é de 50% significa que metade da energia que entra no sistema é convertida em energia útil. A outra metade é desperdiçada (flui para a fonte fria sob a forma de calor). Além das máquinas térmicas há um outro tipo de máquina as máquinas frigoríficas, das quais os frigoríficos ou as arcas congeladoras são exemplos. O objectivo das máquinas frigoríficas é manter fria a fonte fria. No caso do frigorífico, a fonte fria é o seu interior. O sistema termodinâmico é um fluido sobre o qual se realiza trabalho por acção de um motor eléctrico. Numa máquina frigorífica fornece-se energia como trabalho e há energia transferida como calor da fonte fria (interior do frigorífico) para a fonte quente (a cozinha onde o frigorifico está instalado). Portanto, para manter os alimentos frios, o frigorífico tem de aquecer a cozinha! Também um aparelho de ar condicionado, que arrefece uma sala, gera um fluxo de calor para o exterior, que aquece. A figura 26 mostra os fluxos de energia numa máquina frigorífica. Fig. 26 Para as máquinas frigoríficas, não se fala em rendimento, mas sim em eficiência. A eficiência define-se como a razão entre a energia retirada à fonte fria como calor (é o que queremos obter da máquina) e o trabalho que tem de se realizar: eficiência da máquina frigorífic a energia retirada da fonte fria como calor trabalho realizado 6. Segunda Lei da Termodinâmica Dois corpos estão a temperaturas diferentes. Já vimos antes e toda a gente sabe que, quando são postos em contacto um com o outro, o mais quente arrefece e o mais frio aquece. O primeiro cede energia (na forma de calor) e o segundo recebe energia. E se fosse ao contrário, isto é, se fosse o corpo mais frio a ceder ao mais quente uma certa energia? Nesse caso, o corpo mais frio arrefeceria ainda mais e o corpo mais quente aqueceria ainda mais. Este processo não contraria a Primeira Lei, nem contraria o princípio geral da conservação da energia. Mas, apesar de não contrariar a Primeira Lei, não ocorre espontaneamente. Nunca ninguém viu um fenómeno desses! Como este, podemos imaginar outros processos que, estando em total acordo com a Primeira Lei da Termodinâmica, não ocorrem de facto na Natureza. Parece que estão proibidos Já referimos a impossibilidade de uma máquina converter em trabalho, num processo cíclico, toda a energia que recebe 20

como calor, caso em que não haveria energia desperdiçada e o seu rendimento seria 100%. Ora tanto o aquecimento espontâneo de um corpo quente quando em contacto com um corpo frio, como a conversão completa de calor em trabalho numa máquina violariam uma outra lei da Termodinâmica, que é tão importante como a Primeira Lei: violariam a Segunda Lei da Termodinâmica. Esta lei enuncia-se, portanto, assim: Um corpo quente em contacto com um corpo frio não pode aquecer. Ou ainda (pode mostrar-se que é equivalente): Uma máquina não pode converter em trabalho todo o calor que recebe de uma fonte. A Primeira Lei da Termodinâmica chama-se Lei da Conservação da Energia. A Segunda Lei chama-se Lei da Não-diminuição de Entropia, porque há uma outra forma equivalente às anteriores de exprimir a Segunda Lei da Termodinâmica, na qual aparece a palavra entropia: A entropia de um sistema isolado nunca pode diminuir. Aumenta nos chamados processos irreversíveis e mantém-se nos chamados processos reversíveis. Todos os sistemas possuem entropia, assim como têm energia. A palavra entropia foi criada no século XIX pelo alemão Rudolph Clausius, à semelhança da palavra energia, e significa em transformação. Ao contrário da energia, a entropia não se conserva, em geral, mas cresce sempre que há uma transformação irreversível, isto é, uma transformação que só pode ocorrer num sentido (que não pode voltar atrás). A entropia é uma medida da desordem e a Segunda Lei diz que os sistemas isolados evoluem no sentido da maior desordem. Voltemos aos dois exemplos anteriores e vejamos que neles há um aumento de entropia. Os processos proibidos que não se observam na natureza correspondiam a uma diminuição de entropia. 1 No caso da experiência dos dois corpos em contacto, figura 24, o sistema tem uma certa entropia inicial, que é a soma das entropias de um e do outro (a entropia do sistema total é a soma das entropias dos dois subsistemas, tal como a energia do sistema total é a soma da energia dos dois subsistemas). Quando os dois corpos são postos em contacto térmico, estando o conjunto isolado da vizinhança, atingem a mesma temperatura ao fim de algum tempo. Neste caso, a entropia do sistema no estado final é maior do que no estado inicial. Porquê? Porque a desordem do sistema é maior: a agitação térmica era maior no corpo quente e menor no corpo frio, mas na situação final de equilíbrio essa agitação será a mesma em qualquer parte dos dois corpos. No fim, uma vez atingido o equilíbrio térmico, os dois corpos ficam em equilíbrio à mesma temperatura. Se o corpo quente, colocado em contacto com o corpo frio, aquecesse, teríamos a agitação térmica cada vez mais localizada num dos lados e teríamos, assim, uma desordem menor no sistema. A entropia final seria menor do que a inicial, violando o último enunciado da Segunda Lei. O processo que leva ao equilíbrio térmico não pode ser invertido, é irreversível. 2 Vejamos agora o caso de uma máquina que funcionasse (realizasse trabalho) devido, simplesmente, à acção de uma fonte de calor. Estudámos a experiência de Joule em que um peso em queda faz aquecer a água de um recipiente (figura 23). Será possível arrefecer a água, fazendo subir o peso? Claramente não! Já alguém viu esse fenómeno? Acontece que a água contém energia interna que se traduz em agitação térmica, isto é, movimento desordenado das partículas. Mas a subida do peso seria um movimento ordenado. Ora esta passagem de desordem a ordem não se faz espontaneamente. A entropia, depois do peso ter caído e a água ter aquecido, é maior do que quando o peso estava em cima e a água fria. Também este processo é irreversível. 21

Vejamos outra experiência que ajuda a compreender o conceito de entropia. A figura 27 mostra um recipiente dividido ao meio: de um lado está um gás e do outro o vazio. O sistema está isolado do exterior. A certa altura retira-se a parede separadora. Esperando algum tempo, o sistema acaba por atingir um novo estado de equilíbrio, caracterizado por uma distribuição uniforme do gás por todo o recipiente. Fig. 27 É impossível (ou pelo menos, altamente improvável), sem o separador, que alguma vez o gás se venha a acumular em metade do recipiente. A situação final está mais desordenada do que a inicial, em que o gás está arrumado no lado esquerdo. Dizemos que o estado final com o mesmo gás a ocupar todo o volume do recipiente tem mais entropia do que quando o gás ocupa apenas metade. O sistema evolui espontaneamente no sentido do aumento de entropia. Estamos de novo perante um fenómeno irreversível. Todas as experiências anteriores mostram-nos que a desordem não dá naturalmente lugar à ordem ou, dito de uma forma melhor, os sistemas isolados evoluem no sentido da desordem: - No caso da experiência do contacto térmico dos dois corpos, há uma ordem inicial: o corpo quente de um lado e o corpo frio do outro. Na situação final deixou de haver corpo quente e corpo frio pois os dois estão à mesma temperatura. - No caso da experiência de Joule, é óbvio que quando o peso cai a água fica com maior agitação térmica, com maior desordem. - No caso da experiência com gás de um lado e vazio do outro, acontece algo de semelhante à experiência dos blocos: no estado inicial há mais ordem do que no estado final. No início sabe-se onde está o gás e onde há vazio, mas, na situação final, o gás está por todo o lado. À irreversibilidade dos fenómenos está associada uma diminuição da ordem, ou, um aumento da entropia. A entropia só tem obrigatoriamente de aumentar ou de se manter em sistemas isolados. Para pôr ordem num sistema desordenado, ou seja, para baixar a entropia num sistema com muita entropia, é necessário fornecer-lhe energia. Um sistema assim deixa de ser isolado. A Segunda Lei da Termodinâmica nada diz sobre a variação de entropia em sistemas não isolados. Nestes sistemas, tudo pode acontecer: a entropia pode manter-se, diminuir ou até aumentar. Mas uma coisa é certa: a entropia do Universo, formado pelo sistema e pela sua vizinhança, não pode diminuir porque o Universo é um sistema isolado! Pode mesmo enunciar-se a Segunda Lei dizendo: a entropia do Universo nunca diminui. 22