O brincar hoje: da colaboração ao individualismo



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Transcrição:

O brincar hoje: da colaboração ao individualismo Profa. Dra. Maria Angela Barbato Carneiro Campo Grande/ Simpósio Internacional da OMEP Jul/ 2012 Este trabalho tem por objetivo discutir sobre o brincar da criança, bem como seu valor e sua transformação dentro da sociedade atual, partindo de um processo histórico até refletir um pouco mais sobre sua relevância em um mundo globalizado onde existe uma tendência dseaumento no uso das tecnologias, uma diminuição da diversidade cultural, a adultização precoce e a falta de espaços públicos para brincar. Em uma perspectiva histórica é interessante observar que o brincar sempre esteve presente entre os diferentes grupos e que, segundo Huizinga (1968), é uma atividade repleta de sentido, portanto, uma ocupação vital. Para o autor, brincar implica em interessar-se pelo desconhecido, encantar-se com o aleatório e deslumbrar-se com a liberdade. Envolve, também, uma série de atividades físicas, mentais sociais, comunicativas e emocionais, fundamentais para o desenvolvimento humano. Em uma retrospectiva histórica podemos observar que muitas brincadeiras são produtos da maneira de ser e de viver de diferentes culturas, caracterizando-se pela realização de ritos religiosos ou de passagem, pela aprendizagem de papéis, pelas atividades de representação ou pelo desenvolvimento de habilidades. A brincadeira relacionava-se muitas vezes com as estações do ano, com as atividades econômicas, com as crenças e com o treinamento físico, entre outras coisas. Brincar era acima de tudo a integração dos mais jovens na vida adulta. Dessa forma é que as brincadeiras realizadas nem sempre só pelas crianças, foram passadas de geração em geração. Brincar era acima de tudo predomínio da colaboração sobre a competição e o individualismo. As atividades grupais permitiam que as relações se concretizassem e se ampliassem, deixando pouco espaço para o isolamento. As transformações ocorridas neste último século em grande parte das sociedades contemporâneas, produto das mudanças sociais e

econômicas, influenciaram na maneira de vida das diferentes populações e, evidentemente, as atividades lúdicas. O consumo, o isolamento e a falta de espaços, entre outras coisas, têm mostrado que o brincar vem sofrendo transformações e em alguns lugares até desaparecendo. Os brinquedos não estão sendo feitos mais para alegrar as crianças como antigamente, mas para fomentar o consumo e, por vezes, para aumentar o isolamento dos pequenos. Dodge e Carneiro (2007) mostraram que, hoje, grande número de casais tem apenas um filho, o que tem contribuído para o isolamento dos pequenos. Nesse mesmo estudo as atividades lúdicas preferidas pelas crianças consistiam em assistir TV, brincar com um animal de estimação e brincar de pega. Logo, o trabalho mostrou como as brincadeiras conjuntas foram se modificando e se transformando em atividades individuais em virtude da diminuição dos espaços, tempos e pares para brincar. Houve um aumento significativo do uso de equipamentos tecnológicos, especialmente entre as classes sociais mais favorecidas, o que tem contribuído para diminuir as relações pessoais e presenciais caracterizadas pelo movimento corporal, pelo uso da linguagem falada, pela exploração dos sentidos e das emoções e até mesmo pelo prazer de descobrir e de criar. É importante perceber as contribuições interessantes trazidas pelos estudos históricos sobre a criança e a infância e, particularmente, sobre o brincar. Apesar das poucas evidências sobre o assunto o tema tem sido objeto de pesquisa de inúmeros estudiosos que têm reunido informações de diversas áreas do conhecimento, contribuindo para um aprofundamento maior sobre a cultura infantil, de modo especial sobre a brincadeira. Tais estudos mostram que as crianças sempre existiram e, de alguma forma, tiveram a atenção dos adultos, portanto o amor aos pequenos não é uma invenção moderna.. Não obstante, talvez não tivessem tanta relevância para as gerações futuras, dado o alto índice de mortalidade infantil e as condições adversas que esses grupos viviam. Em sociedades primitivas, por exemplo, cuja economia envolvia a caça, a pesca e a coleta, as crianças se inseriam no mundo dos adultos, participando das atividades possíveis e representando papéis sociais. Tal inserção fazia-se por um processo de imitação das atividades dos

mais velhos. A maioria dos pequenos ajudava as mulheres na coleta de frutos e sementes. Numericamente, porém, eles eram poucos uma vez que era difícil sobreviver durante os grandes deslocamentos, de encontrar comida, além dos problemas de saúde. A infância era a época de brincar e de realizar um trabalho auxiliar, mas o estágio adulto chegava cedo, criando-se para isso muitos rituais de passagem para etapas mais avançadas da vida. Assim, a educação e a inserção das crianças em seus contextos sociais e culturais ocorriam através das brincadeiras, havendo poucos objetos para a realização de tais atividades. Com a substituição das atividades de caça, de pesca e de coleta pela agricultura muitas alterações se processaram na sociedade com reflexos no campo da infância. As sociedades agrícolas mais sedentárias se constituíram por famílias mais numerosas onde, muitas, vezes, as crianças colaboravam na plantação e na coleta. As relações entre elas tornaram-se mais ricas influenciando a realização das brincadeiras.. Era muito comum, ainda, a existência das aprendizagens realizadas juntos aos avós com quem os pequenos ficavam durante as atividades dos pais. Portanto, múltiplas possibilidades de contato entre as próprias crianças e entre elas e seus progenitores enriquecia a aprendizagem das brincadeiras. Além disso, como não havia escolas, tais práticas incentivavam a colaboração, o uso de grandes espaços e a educação do grupo. Os estudos históricos mostraram, também, que na passagem das sociedades agrícolas para as antigas civilizações e para as civilizações clássicas, surgiram em alguns locais tanto as obrigações infantis, quanto a prática de algumas brincadeiras. Entre egípcios, gregos e romanos, por exemplo, encontraram-se brinquedos, construídos de materiais diversos, especialmente barro, madeira e osso. Através deles podiam se identificar as classes sociais de seus proprietários. seu usuário. Muitas dessas atividades puderam ser conhecidas porque foram enterradas em túmulos de crianças ou de seus mestres. Também durante a Idade Média poucos registros existem das atividades infantis, porque as crianças não eram levadas em consideração devido aos altos índices de mortalidade.

A partir dos séculos XVI, XVII e XVIII existem mais informações sobre as brincadeiras infantis, muitas delas representadas nas obras de grandes pintores como as de Goya, por exemplo, autor de uma série de quadros realizados para o quarto dos príncipes espanhóis. Mas o que significa brincar? Qual sua relevância para a cultura da infância? Brincar é um termo da Língua Portuguesa que teve sua origem no vocábulo latino vinculum que significa vínculo ou laço. Ele é peculiar mesmo porque em outras línguas emprega-se jogo para designar todas as atividades lúdicas. Alguns autores acabaram denominando de brincar a atividade simbólica, também chamada de faz-de-conta. Vimos, anteriormente, neste artigo que o brincar é uma atividade cultural e que depende do contexto social e econômico, portanto do modo de viver de diferentes grupos. Vimos ainda que as atividades foram se transformando em função dos tempos, dos espaços e das formas de ação. Assim, o brincar enquanto uma atividade cultural, depende de componentes importantes para favorecer a cultura da infância. Quais são, então, os componentes importantes necessários às brincadeiras? Consideraremos, neste artigo seis os elementos fundamentais para a ação de brincar, os aspectos físicos, os aspectos institucionais, os aspectos convencionais, os aspectos relacionais, os aspectos de conduta e os aspectos relacionados aos conceitos, às ideias e aos valores associados à atividade. Os aspectos físicos estão constituídos pela arquitetura, pelos brinquedos, pelos diferentes espaços oferecidos às crianças para a realização da atividade. Os aspectos institucionais referem-se às políticas adotadas pela diferentes instituições voltadas para o atendimento da criança e que permitem e estimulam a prática da brincadeira como uma atividade fundamental ao desenvolvimento das crianças. Em uma perspectiva dos aspectos convencionais devemos considerar a cultura, o folclore, as festas populares e as tradições que fazem parte de um determinado grupo.

Os aspectos relacionais dizem respeito às relações estabelecidas entre adultos e crianças, onde os adultos (familiares ou docentes) e as próprias crianças são mediadoras no processo de aprendizagem. Quanto aos aspectos de conduta eles estão relacionados ao desenvolvimento de hábitos, de atitudes, de atividades motoras, de exploração, de descoberta e, principalmente, da linguagem. Finalmente, no que tange à questão das ideias, é importante perceber o que se entende pelo conceito de brincar, quais as reflexões realizadas em torno dele, quais os interesses e valores que a ele se associam, até que ponto permite o desenvolvimento da imaginação e da criatividade. Nesse sentido, a imaginação é um dos elementos principais da brincadeira e é ela que permite a relação entre as diversas linguagens da criança e o brincar entre elas. Para brincar, portanto, não é preciso de objetos caros como os que são consumidos hoje pelas crianças. É necessário, sim, ter um pouco de imaginação e isso se pode observar nas obras de pintores famosos como Goya (1746-1828) Crianças na Charrete, ou como Portinari (1903-1962) com sua famosa obra Brincadeira de criança/cambalhota. A sociedade moderna, caracteriza-se por uma série de transformações; a diversidade cultural cede espaço ao processo de globalização, a colaboração vem sendo substituída pela competição e pelo individualismo, o espaço público destinado ao lazer vem desaparecendo, há um incentivo cada vez maior ao consumo, as atividades grupais vem sendo substituídas, muitas vezes, pelo isolamento e as brincadeiras tradicionais deixam de ser praticadas devido à expansão das novas tecnologias. Na realidade não se trata de uma questão de desvalorizar as brincadeiras tradicionais e supervalorizar as novas tecnologias, mas trata-se de pensá-las e utilizá-las de forma complementar em benefício do desenvolvimento da criança. É necessário pensar que a escola é sim um lugar de brincar, talvez o único espaço para a realização da brincadeira coletiva. No entanto, devemos pressionar as autoridades governamentais para que se crie uma cultura do brincar, através da construção de espaços públicos adequados e com qualidade para a realização da atividade pelas crianças.

É necessário que os profissionais observem, discutam e reflitam sobre as atividades realizadas por suas crianças e auxiliem as famílias nesse sentido. Tal atitude é fundamental para alertá-las sobre os males do consumo excessivo e mostrar-lhes que o brincar não precisa de muitos aparatos. Criança precisa brincar e quando brinca prepara-se para tornar-se um adulto feliz, mais criativo e mais humano. É importante considerar que : precisamos de mais estudos que determinem como podemos ajudar as crianças a irem adiante da experiência passiva de pensamento contínuo em relação à reflexão e ao controle efetivo de suas exposições à realidade virtual. com a adequada orientação de adultos, acreditamos que tal exposição possa estimular a capacidade do cérebro de despertar o grande milagre humano da imaginação, por meio dada qual concebemos possibilidades e geramos originalidade em nossos pensamentos e ações. (Singer e Singer, 2007: p179). Certamente a civilização do século XXI mudou muito e com ela as formas de brincar. No entanto, não podemos esquecer que a criança subverte a ordem das coisas quando brinca, imitando o contexto que está em seu entorno e a isto precisamos estar atentos. Referências bibliográficas Carneiro, M. A.B. e Dodge, J. A descoberta do brincar. São Paulo: melhoramentos/ Boa Companhia, 2007. Huizinga, J. Homo Ludens. Buenos Aires: Emecé,1968. Singer, D. e Singer, J. Imaginação e jogos na era da informática. Porto Alegre: Arrtmed, 2007.