DESMAME E INTERRUPÇÃO DA ECMO/ ECLS

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Transcrição:

AULA 23 DESMAME E INTERRUPÇÃO DA ECMO/ ECLS A redução progressiva do suporte oferecido pela ECMO, habitualmente denominada desmame na gíria hospitalar é uma das fases mais delicadas e críticas do procedimento. A denominação é bastante adequada para significar a redução lenta e progressiva do suporte extracorpóreo, enquanto, ao mesmo tempo, verificamos o grau de recuperação da função pulmonar (na ECMO para assistência respiratória), da função cardíaca (na ECMO para assistência cardíaca) ou da função cardiopulmonar (na ECMO para suporte das funções cardíacas e pulmonares). A decisão de iniciar o processo de desmame deve ser baseada em uma série de parâmetros que incluem a minuciosa avaliação clínica do paciente e dos exames complementares, aliados à experiência da equipe. A remoção da ECMO, usualmente, é feita durante a curva de regressão da doença básica. Devido ao fato de que a ECMO tem as suas próprias complicações e riscos, o ideal, no estado atual da tecnologia, é utilizá-la pelo menor período de tempo possível. Isso inclui o a- companhamento da evolução até o momento em que o paciente começa a apresentar melhoras. À partir desse ponto, a curva da melhora do paciente deve ser o indicador mais preciso do momento de iniciar o desmame, para que a remoção da ECMO seja bem tolerada e a melhora do paciente continue sua progressão rumo à Página 328

cura da doença básica, pela continuação das medidas de terapia intensiva indicadas. Quando a ECMO é empregada como suporte ventilatório, ou seja, apenas para realizar as trocas gasosas, oxigenação do sangue e eliminação de CO 2, a modalidade veno-venosa desfruta da preferência de muitas equipes nos dias atuais, desde que a função cardíaca se tenha mantido estável e sem necessidade do uso de agentes inotrópicos em doses elevadas. Ao contrário, se a função cardíaca está deprimida, com ou sem concomitante insuficiência respiratória, a modalidade de ECMO apropriada é a veno-arterial que, como vimos, é a única capaz de oferecer o suporte duplo, cardíaco e pulmonar. O tempo de duração do suporte não serve como parâmetro de avaliação para a necessidade ou a oportunidade de iniciar o processo de desmame. De um maneira geral e bastante simplificada a retirada progressiva do suporte cardiopulmonar extracorpóreo deve ser iniciada quando a função pulmonar e a função cardíaca apresentam sinais de melhoras. Após uma sequência de avaliações, é necessário um período de remoção total da ECMO, durante o qual o desempenho cardiopulmonar é cuidadosamente observado e, sendo mantido em condições satisfatórias, pode-se, então, iniciar a remoção definitiva do suporte que termina com a remoção das cânulas intravasculares ou, eventualmente, intra-cardíacas, nos casos em que a ECMO é utilizada para a assistência cardiopulmonar imediatamente após um procedimento de cirurgia cardíaca. Antes de descrever o processo de desmame e remoção da ECMO nos pacientes que são beneficiados por um período de suporte cardiopulmonar, vamos descre- Página 329

ver algumas situações em que a melhor opção é, simplesmente, interromper os esforços para a recuperação do paciente. INTERRUPÇÃO DO SUPORTE PELA ECMO Apesar de todos os esforços das equipes de ECMO e dos recursos terapêuticos disponíveis nas modernas unidades de terapia intensiva, há um grupo de pacientes nos quais a deterioração das funções pulmonares ou cardíacas mantém-se progressiva, sem resposta aos numerosos recursos utilizados. Esses casos constituem a maioria dos óbitos das diversas séries de pacientes já realizadas. A relação das indicações para a interrupção dos esforços dispendidos com a continuação da ECMO é extraída da experiência mundial. Contudo, em certos casos que podem ser denominados limítrofes há margem para uma decisão centrada na experiência e nas expectativas da equipe responsável pelo paciente. De um modo geral, a ECMO é interrompida pela maioria das equipes especializadas nessa modalidade de suporte cardiopulmonar nas seguintes condições: Quando se identifica a presença de qualquer condição letal, como por exemplo, destruição extensa do tecido cerebral e/ou morte cerebral. Piora progressiva das condições clínicas do paciente, evidentemente exacerbadas pela introdução da ECMO, como por exemplo: Hemorragias intracranianas Coagulação intravascular disseminada incontrolável ou hemorragias severas. Página 330

Persistência das condições patológicas iniciais, sem sinais de melhora, após um determinado período. Não há um limite de tempo universalmente recomendado ou aceito. A possibilidade de haver recuperação e a presença de complicações extremamente difíceis de reverter devem ser consideradas pela equipe para a decisão de interromper a EC- MO. Para servir de complemento ao processo de decisão, três fatores devem sempre ser considerados: Quais são os riscos de continuar a ECMO apesar do estado atual do paciente? Quais são os riscos de interromper a ECMO e que medidas de suporte e níveis de pressões ventilatórias do respirador mecânico serão necessários para manter o paciente? Qual o grau de suporte de terapia intensiva a equipe de ECMO está disposta a aceitar para remover o paciente da assistência cardiopulmonar extracorpórea? DESMAME E FINALIZAÇÃO DO SUPORTE PELA ECMO Existe um momento em que a melhora demonstrada pelos pacientes em suporte pela ECMO sugere que há condições de continuar o tratamento dos pacientes a- penas com o emprego das medidas convencionais da terapia intensiva, sem que seja necessário continuar o suporte extracorpóreo da ventilação ou da função cardíaca. Esse momento é crucial para determinar o início do desmame da ECMO. O processo de desmame tem duração variável, de acordo com as condições de cada paciente. Habitualmente, o desmame dura 12 a 24 horas. Excepcionalmente, po- Página 331

de exigir um tempo menor ou maior, ainda em obediência às condições dos pacientes. Vejamos um exemplo dessa situação: Um adolescente de 16 anos foi admitido na unidade de emergência com vômitos e diarréia. Dentre as medicações prescritas havia a administração endovenosa de duas ampolas de um medicamento antiespasmódico associado a um analgésico. Equivocadamente, diversas ampolas de cloreto de potássio concentrado estavam misturadas às drogas antiespasmódicas. O paciente recebeu duas ampolas de cloreto de potássio a 20% em injeção venosa rápida e apresentou parada cardíaca imediata. Os esforços com a aplicação das manobras de ressuscitação cardiopulmonar foram ineficazes e, após aproximadamente 50 a 60 minutos optou-se por colocar o paciente em ECMO, mediante a canulação dos vasos femorais, artéria e veia. Após o início da ECMO, o paciente recebeu soluções eletrolíticas sem potássio e doses seguidas de diuréticos que produziram boa resposta. Aproximadamente 12 horas após a instalação da ECMO, o paciente havia recuperado a função cardíaca, o ritmo cardíaco era sinusal, a curva de pressão arterial mostrava bom fluxo pulsátil e a gasometria mostrava valores adequados para a P a O 2 e a P a CO 2 e o potássio sérico estava em 4,6 meq/l. Decidiu-se que o paciente poderia, desse momento em diante, ser tratado com o respirador mecânico e o processo de desmame e remoção da ECMO foi concluído em apenas duas horas. As cânulas dos vasos femorais foram removidas e o efeito residual da heparina foi neutralizado com uma pequena dose de sulfato de protamina. Após 6 horas de ventilação assistida, o paciente mostrou-se alerta e orientado, sem déficits neurológicos identificáveis ao exame pela equipe da terapia intensiva e pode ser extubado sem dificuldades. O restante da terapia dirigido ao problema digestivo teve continuidade. Em casos esporádicos, como o caso relatado acima, de pacientes sem alterações Página 332

cardiopulmonares prévias que, por erros médicos ou acidentes sofrem parada cardiorespiratória de difícil reversão pelas manobras habituais de ressuscitação cardiopulmonar, a ECMO pode ser empregada por períodos de apenas algumas horas, sem dificuldades de manutenção, desmame e remoção do suporte. Nos casos habituais de suporte pela ECMO, contudo, o desmame apenas se inicia quando há evidências claras de melhora do quadro clínico do paciente. FATORES QUE INDICAM MELHORA CLÍNICA DE UM PACIENTE EM ECMO Evolução dos padrões observados nas radiografias de tórax. Retorno da aeração pulmonar em substituição às imagens de opacificações difusas ou compactas. Balanço hídrico equilibrado ou, pelo menos, aceitável. Evidências de volume corrente e complacência pulmonar adequados com aceitáveis parâmetros do respirador mecânico. Tolerância a baixos fluxos de perfusão. Manutenção dos parâmetros do equilíbrio ácido-base em faixa normal. Manutenção de adequadas saturação venosa e arterial de oxigênio e da pressão parcial de oxigênio (P a O2). Melhora nos resultados dos testes de hiperóxia: Uma vez ao dia uma gasometria é analisada com a FiO 2 do respirador mecânico aumentada para 100% (FiO 2 = 1). A PaO 2 obtida é comparada com a PaO 2 obtida na gasometria anterior em que a FiO 2 é tipicamente mantida em 30%. Página 333

Esse teste é uma medida do shunt direita-esquerda intrapulmonar e extrapulmonar. A maioria dos problemas relacionados ao desequilibro ventilação perfusão pode ser resolvida pela ventilação com oxigênio a 100% (FiO 2 = 1); a PaO 2 deverá se elevar acima de 275 mmhg. A interpretação desse teste durante a ECMO pode ser difícil porque a cânula da artéria carótida está injetando sangue com uma PaO 2 > 300 mmhg diretamente na aorta. O valor mais baixo da PaO 2 na aorta durante a ECMO habitualmente oscila entre 60 e 100 mmhg, dependendo do fluxo da bomba, do débito cardíaco e da função pulmonar. À medida que os fluxos da bomba propulsora são reduzidos o teste da hiperóxia pode se tornar um excelente indicador da função pulmonar. Se o paciente não consegue elevar a PaO 2 acompanhando a melhora radiológica do padrão pulmonar há evidências de que um shunt direita-esquerda intrapulmonar ou extrapulmonar ainda está presente. Esse teste não é útil em pacientes com fisiologia de ventrículo único devido à mistura intracardíaca do sangue. PO 2 do sangue venoso misto (PvO 2 ) 1. Reflete bem as funções cardíacas e as funções pulmonares 2. Tipicamente mantida na faixa acima de 32 mmhg mediante alterações do fluxo da bomba. 3. A inabilidade de manter a PvO 2 32 mmhg com fluxos da bomba inferiores a 100 ml/min indica que o lactente pode não tolerar a retirada da ECMO sem aumentar acentuadamente os parâmetros do respirador ou o débito cardíaco. Página 334

DESMAME DA ECMO VENO-ARTERIAL O fluxo da ECMO é gradualmente reduzido à medida que a resposta do paciente é avaliada. O fluxo da ECMO deve ser reduzido gradualmente, diminuindo-se entre 20 e 50 ml/hora. O desmame, frequentemente, varia de acordo com as condições apresentadas pelos pacientes e é influenciado pela tolerância do paciente e pela presença de complicações. Os parâmetros do respirador são aumentados gradualmente e a gasometria é avaliada mais frequentemente. O manuseio global do paciente deve ser reavaliado e ajustado conforme as necessidades individuais. As infusões venosas devem ser movidas do circuito da ECMO para uma veia do paciente. As necessidades de eletrólitos mudam após a ECMO e, portanto, a composição das soluções administradas deve ser reajustada. Pode ser necessário um período de suporte com vasopressores. Duante o processo de desmame, o fluxo mínimo é determinado pelo calibre do circuito. O fluxo mínimo para neonatos é de 20 ml/kg/min. Durante o processo de desmame o TCA pode ser elevado acima de 200 segundos, quando o fluxo da bomba for inferior a 100 ml/min. Se o desmame for tolerado, conforme indicado por um estado hemodinâmico estável e gasometrias adequadas durante algumas horas, com parâmetros do respirador aceitáveis, providenciar a remoção das cânulas. Página 335

Clampeamento das Cânulas para as Tentativas de Desmame Remover do suporte (ECMO) sem remover as cânulas. As medicações necessárias devem ser infundidas diretamente ao paciente. A solução contendo a heparina deve ser infundida diretamente no paciente de modo a administrar a dose de heparina necessária para manter o TCA no nível desejado até o momento da descanulação. O paciente é removido da ECMO mediante o clampeamento da linha venosa, remoção do clamp do shunt e clampeamento da linha arterial. Ambas as linhas devem ser clampeadas acima do shunt para permitir a separação entre o paciente e o circuito da ECMO. Manter um fluxo de 100 a 200 ml/min através do shunt. Não é recomendável ultrapassar os 200 ml/min porque fluxos mais elevados podem gerar pressão negativa em excesso no circuito e, eventualmente, impedir o fluxo sanguíneo. Desligar o gás injetado no oxigenador para evitar a supersaturação do sangue no circuito. Monitorizar a gasometria com frequência. Gasometrias arterial e venosa permitem avaliar o gradiente artério-venoso de CO 2 e, desse modo, estimar indiretamente a função cardíaca. À medida que o gradiente entre o CO 2 venoso e o CO 2 arterial (PvCO 2 PaCO 2 ) aumenta o débito cardíaco se reduz. Os parâmetros do respirador são ajustados pelo menos 30 minutos antes do clampeamento das linhas venosa e arterial. Pode ser necessário o aumento do fornecimento de glicose e do suporte por vasopressores. Página 336

Durante as tentativas de descontinuar a ECMO o paciente deve receber um pequeno suporte intermitente (30 a 60 segundos) a cada 15 ou 30 minutos ou se houver deposição de hemácias nos tubos do circuito conectados às cânulas. As tentativas de descontinuar a ECMO devem durar no máximo duas horas, para evitar a formação de coágulos no circuito. Sempre que se retornar ao suporte infundir a heparina no circuito ao invés de infundir no paciente. Uma vez demonstrado que o paciente pode sustentar as funções cardiopulmonares, as cânulas são removidas pelo cirurgião. Toda a medicação necessária já deverá estar sendo administrada diretamente ao paciente. Caso seja desejável manter as cânulas por um tempo mais prolongado, o paciente deve ser mantido heparinizado. Após a remoção das cânulas, os vasos são ligados. Algumas equipes procuram reconstruir a artéria carótida quando isso parece viável. Entretanto, há um percentual significativo de tromboses e, algumas vezes, embolia cerebral. Estas últimas constumam deixar sequelas que podem ser permanentes. É recomendável, portanto, seguir a conduta classicamente aceita e ligar os vasos cervicais que foram utilizados para a ECMO. Não há necessidade de neutralizar o efeito da heparina, exceto quando alguma circunstância especial estiver presente ou quando a ECMO for interrompida em razão de hemorragias de difícil controle. A admnistração de protamina tem seus riscos próprios. Além disso, durante a ECMO, a superprodução de fatores de coa- Página 337

gulação pode criar um estado de hipercoagulabilidade. Esses riscos recomendam deixar a heparina ser metabolizada e eliminada do organismo e aceitar o gradual desaparecimento do efeito anticoagulante. O procedimento de desmame e descanulação da ECMO venovenosa é bastante semelhante ao que foi descrito para a ECMO venoarterial e deve ser sistematizado e seguido do mesmo modo. É de grande importância a remoção das cânulas apenas quando houver o maior número de indícios clínicos e laboratoriais de que não será necessário voltar ao suporte. Assim, é uma boa norma apenas iniciar os procedimentos de desmame quando a melhora oferecida pelo suporte extracorpóreo for significativa e o paciente tiver condições próprias para sustentar as trocas gasosas e a oxigenação dos tecidos com os órgãos nativos. Página 338