EMENDANDO RETALHOS, GERANDO RENDA - UMA ESTRATÉGIA PARA MELHORIA DA QUALIDADE DE VIDA DE AGRICULTORAS FAMILIARES NO SERTÃO DO PAJEÚ-PE



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Transcrição:

EMENDANDO RETALHOS, GERANDO RENDA - UMA ESTRATÉGIA PARA MELHORIA DA QUALIDADE DE VIDA DE AGRICULTORAS FAMILIARES NO SERTÃO DO PAJEÚ-PE Joseneide Maria Custodio de Andrade 1 RESUMO Este trabalho teve como objetivo contribuir para a melhoria da qualidade de vida das mulheres agricultoras de base familiar, com ações para geração de trabalho e renda por meio de atividades de artesanato com retalhos, visando o desenvolvimento local sustentável e a permanência de suas famílias na zona rural. A efetivação do trabalho possibilitou uma maior conscientização da importância da organização das mulheres como grupo produtivo. PALAVRAS-CHAVE: Gênero. Geração de renda. Desenvolvimento local. 1 INTRODUÇÃO Este trabalho apresenta a análise da experiência vivenciada durante o desenvolvimento do projeto Emendando Retalhos Produzindo Renda, com mulheres agricultoras de base familiar do Sítio Curral Velho no Município de Afogados da Ingazeira no Sertão do Pajeú-PE., através do Instituto Agronômico de Pernambuco - IPA. Teve como objetivo contribuir para a melhoria da qualidade de vida das famílias com ações para geração de trabalho e renda por meio de atividades de artesanato com retalhos, visando o desenvolvimento rural sustentável e a permanência dessas famílias na zona rural. No meio rural a proposta de desenvolvimento centrada no aumento da produtividade, nos anos 50, ocasionou além da degradação do meio ambiente, o êxodo rural. Essas migrações estão ligadas ao fato de que as mulheres têm uma carga de trabalho pesada e uma relação subordinada no interior das unidades de produção familiar, sem nenhuma perspectiva que indique que sua permanência no campo possa ser valorizada. É importante considerar a pluriatividade da zona rural como uma maneira de preservar a população no campo, que não consegue se sustentar unicamente da atividade agrícola. O apoio à agricultura familiar tem que ser pensado no seu aspecto integral e vinculado ao desenvolvimento local no que se refere aos aspectos econômicos, sociais e culturais. 1 Economista Doméstica, Extensionista Rural do IPA-PE neide.custodio@ig.com.br

Para refletir sobre a questão do desenvolvimento local tomamos por referência Carlos Milani ao afirmar que: O desenvolvimento local envolve fatores sociais, culturais e políticos que não se regulam exclusivamente pelo sistema de mercado. O crescimento econômico è uma variável, porém não suficiente para ensejar o desenvolvimento local. É fundamental pensar o desenvolvimento local enquanto projeto integrado no mercado, mas não somente: o desenvolvimento local é também fruto de relações de conflito, competição, cooperação e reciprocidade entre atores, interesses e projetos de natureza social, política e cultura. (Carlos Milani,2002). O artesanato é uma atividade que está inserida na sua grande maioria, no âmbito doméstico e familiar, praticada no interior das casas e quintais, seja nas realidades urbanas ou rurais. Vem sendo desenvolvido historicamente e culturalmente pelas mulheres, sempre ligado ao trabalho reprodutivo e pouco valorizado enquanto fonte potencial de renda da família. O trabalho da mulher é visto como uma extensão do seu papel de mãe/esposa/donade-casa, provedora das necessidades da família principalmente na horta e no quintal. Isso mostra o peso da divisão sexual do trabalho, no qual as mulheres precisam conciliar afazeres domésticos com atividades produtivas, sejam elas remuneradas ou não, destacando-se a sua responsabilidade com a reprodução da família. Na maioria das vezes, o artesanato é identificado como um complemento de renda das(os) trabalhadoras(es) ou como passatempo, o que contribui ainda mais para o processo de invisibilidade e desvalorização dessa produção que agrega um contingente significativo de mulheres. Vale salientar que essas mulheres são excluídas do acesso a capacitação profissional, ao crédito e a terra, o que as colocam na estatística da população incluída na linha de pobreza acentuada no nosso país. A valorização e aperfeiçoamento de técnicas da produção artesanal, perdidas pouco a pouco, precisa de investimento e reconhecimento, garantindo que esse saber seja respeitado e entendido como fonte de empoderamento cultural e econômico das mulheres que resistiram à industrialização e ao mercado. 2 REVISÃO DE LITERATURA Historicamente modelos de desenvolvimento rural têm contribuído para o aumento do número de pessoas deste meio que ficam na condição de desempregados/as ou com atividades complementares não remuneradas. Acerca disso Jorge Tavares et al destacam:

A idéia de extensão rural (ER) tem sido, historicamente, movida por um ideal de incremento do sistema produtivo nas áreas rurais via adoção de técnicas modernas de produção e de melhoria das condições de vida das pessoas ali envolvidas. Assim, o aumento da produção agrícola bem como a sustentação do homem no campo evitando o êxodo rural está no centro das preocupações. (TAVARES, et al 2003) Porém, outras atividades não tradicionais começam a ser realizadas como forma de garantir a sobrevivência. Entre estas, as atividades artesanais. (CAMPANHOLA E GRAZIANO DA SILVA, 1999) ressaltam que o espaço rural brasileiro não pode ser mais considerado como exclusivamente agrícola, pois há muitas atividades tipicamente urbanas que geram emprego e renda para a população rural, como por exemplo, aquelas que estão relacionadas com o turismo, o lazer e a moradia. Convém salientar que as atividades artesanais estão enquadradas no que se chama de novas ruralidades. Este termo refere-se ao conjunto de atividades que não são comumente desenvolvidas no espaço rural como fonte de trabalho e renda. São oportunidades que se apresentam como estratégias para superar ou minimizar as dificuldades de sobrevivência com as atividades tradicionais, de acordo com as potencialidades de cada local. Segundo Sérgio Blanco: As novas ruralidades aproveitam e expandem novas funções e atividades no campo, integrando e envolvendo as famílias rurais com o poder público e a iniciativa privada. É a conhecida pluriatividade ou multifuncionalidade do campo, como é classificado esse novo momento no meio rural brasileiro (BRANCO, 2003) O Projeto teve por finalidade a formação de grupos produtivos, mas, desde a sua concepção até a fase de execução, procuramos trabalhar todas as questões envolvidas com a formação de grupo. Ou seja, não se preocupou apenas em ensinar técnicas de produção da área têxtil, mas com o todo, quer seja o contexto de sua condição enquanto mulheres, como sua estruturação econômica e todo o complexo que envolve a formação de grupo. É sabido que outras experiências de trabalho com grupos não contemplam o reconhecimento das pessoas enquanto sujeitos. Sempre foi nossa preocupação desenvolver o projeto partindo do entendimento que estávamos vivenciando uma troca de saberes. Por diversas vezes, o fato da necessidade de adquirir uma renda em curto espaço de tempo, o impedimento por parte dos companheiros para que elas participassem do grupo, ou seja, expressões das relações de gênero, causavam desmotivação. Estes aspectos foram motivos para que perguntássemos se a proposta de intervenção iria atingir seu objetivo.

Gênero é uma categoria de análise e também o significado atribuído ao sexo social de homens e mulheres, que expressa relações de poder. Apesar do ingresso das mulheres na estrutura produtiva, ainda mantém-se a tradicional divisão sexual do trabalho, que as onera com carga de trabalho não remunerado. De acordo com Falquer, A divisão sexual do trabalho, o modelo de família e a cultura são questões profundamente interligadas, que se constituem como os pilares do sistema patriarcal de opressão, podendo-se supor que aí se concentra grande parte das dificuldades de transformação das relações de gênero no meio rural, no qual os sistemas de valores patriarcal são mais arraigados e, portanto, mais difíceis de serem transpostos. (FALQUER 2005): A desvalorização e a invisibilidade do trabalho feminino, bem como o papel das mulheres na agricultura familiar têm sido ressaltadas, em diferentes estudos, que enfocam as relações de gênero no meio rural. (BUARQUE 2002) afirma que a perspectiva contida nas proposições governamentais para o campo brasileiro carece, na sua origem, de uma abordagem includente, no que diz respeito às relações de gênero e a valorização da mulher como sujeito deste processo. Estudos sobre a condição feminina mostram o aumento do número de mulheres na condição de baixa renda e seu envolvimento nos movimentos e ações por condições dignas de sobrevivência. Sem desenvolvimento humano e social nenhum processo de desenvolvimento econômico será sustentável, porque desenvolvimento não é só desenvolvimento econômico. O desenvolvimento não deve, portanto, ser confundido com crescimento econômico. O desenvolvimento local sustentável deverá ser concebido em uma visão mais ampla, cuja finalidade será tornar acessível ao indivíduo o acesso a meios capazes de se descobrirem como participantes ativos do processo de transformação social. De acordo com Augusto de Franco, (1998) não basta crescer economicamente, é preciso aumentar os graus de acesso das pessoas não só à renda, mas à riqueza, ao conhecimento, e ao poder ou a capacidade de influir nas decisões públicas. 3 METODOLOGIA A escolha do trabalho com retalhos pelas mulheres aconteceu no primeiro momento em reunião, quando foi apresentado o projeto e discutidos conteúdos sobre artesanato,crédito rural, gênero, geração de trabalho e renda e comercialização. O curso foi realizado na sede da Associação dos Pequenos Produtores de Curral Velho, com 15 mulheres, com carga horária

de 40 (quarenta) horas, sendo realizado durante 04(quatro) dias por semana, com aulas de 04(quatro) horas por dia. Inicialmente foi discutida a importância de se trabalhar como grupo produtivo. Neste momento, foram realizadas técnicas de sensibilização e atividades lúdicas objetivando descontrair as mulheres e integrá-las melhor ao grupo. A capacitação foi ministrada através de aulas teóricas e práticas, nas aulas teóricas foram trabalhados conteúdos sobre fibras têxteis, cores e harmonia cromática, formas geométricas, modelagens, lavagem e conservação das peças, custo e comercialização. Além disso, foram promovidas discussões sobre gênero, crédito rural e PRONAF mulher. As aulas práticas se constituíram de planejamento das peças, criação de modelagens específicas, composição dos retalhos, corte e confecção das peças para serem comercializadas. A avaliação ocorreu sistematicamente ao longo do curso e da produção, pois a participação das mulheres foi fundamental para a discussão das várias etapas do processo de capacitação. 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO Durante o período do curso foram produzidas peças com as mais variadas técnicas aplicadas ao trabalho com retalhos, tais como: Almofadas, colchas, tapetes, jogos americanos, pesos de porta, centros de mesa, jogos para banheiro, jogos de cozinha, bolsas, saias e cestos para pão. Observamos o crescimento pessoal como mulheres, e a importância de trabalhar como grupo também pode ser sentida, a decisão de levar adiante uma atuação política provocou a resistência dos maridos e dos filhos, a quebra da rotina do cotidiano familiar e certos padrões morais predominantes no interior da família e da comunidade. As mulheres estão deixando de atuar nos limites do privado e provocando novas situações no interior da família e nas relações informais de vizinhança e amizade. As peças produzidas pelas mulheres foram expostas no evento em comemoração ao Dia Internacional da Mulher promovido pelo IPA, em exposições de animais das cidades da região, na Feira Nacional de Artesanato (FENEARTE) em Recife, onde vivenciaram na prática a comercialização. Nestes eventos, uma parte dos recursos adquiridos com as vendas dos produtos foi investida na compra de novos materiais e outra parte foi dividida entre o grupo. As mulheres continuam produzindo e recebendo assistência técnica do IPA, o que contribuí para a permanência e fortalecimento do grupo.

Atualmente o grupo faz parte da rede de mulheres produtoras do Pajeú. A rede é uma associação formada por 36 grupos de mulheres agricultoras e artesãs de toda região do Pajeú que se organizaram com a proposta de quebrar o isolamento das mulheres em torno da organização, da produção e da comercialização. Hoje as estratégias de comercialização se dão em torno de uma loja na cidade de Triunfo-PE, nas feiras agroecológicas na região e em feiras estaduais e nacionais. Todo este processo gerido por elas e por organizações de assessoria técnica locais. Consideramos como resultado do trabalho o fato de algumas mulheres estarem fazendo parte da diretoria da associação de moradores da comunidade. 5 CONCLUSÃO A efetivação desta proposta de trabalho possibilitou uma maior conscientização das mulheres como grupo produtivo, além de visibilizar o artesanato realizado pelas mulheres agricultoras de base familiar como uma atividade produtiva e geradora de renda, considerando a diversidade de atividades produtivas realizadas, incluindo o artesanato como produção e não apenas como atividade reprodutiva/doméstica. Assim, o trabalho artesanal além de representar uma geração de renda, propicia um espaço de formação, solidariedade, fortalecimento de sujeitos políticos, empoderamento das mulheres e a melhoria da qualidade de vida e que essa atividade não pode ser vista apenas como uma fonte complementar de renda. Ela é parte de uma estratégia de permanência dos/as agricultores/as em suas terras e passa ser aos poucos uma complementação da renda, ao lado da agricultura, podendo ser considerada como parte de um novo sistema produtivo. REFERÊNCIAS A ARTE DE UNIR RETALHOS. Patchwork. São Paulo: Bem Vindas, 01, maio/1999. BLANCO, Enrique Sérgio. Caderno de Turismo. Rio de Janeiro. COPPE, 2003. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Agrário. Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. Brasília, DF: SAF,Dater, 2004.

BUARQUE, Cristina. Estratégias para a Reforma Agrária sobre a Ótica de Gênero. Projeto Gênero e Reforma Agrária. Brasília: Projeto de Cooperação técnica TCP/BRA/8922 (A). MDA/INCRA/FAO, 2002. CARLOS, Milani. Teorias do Capital Social: lições a partir da experiência de Pintadas (Bahia, Brasil); Projeto de Pesquisa: Capital social, participação e desenvolvimento local: atores da sociedade civil e políticas de desenvolvimento local na Bahia. 2002. COUTO, D. P.LORETO, M.D.S. Estudo exploratório sobre padrões de organização do trabalho feminino. Anais do XIV Congresso Brasileiro de Economia Doméstica-Fortaleza: ABED,1997.582p. FALQUET, J. Três questões aos movimentos sociais progressistas: contribuições da teoria feminista à análise dos movimentos sociais. Ministério do desenvolvimento Agrário MDA. Portal NEAD. Artigo do mês, nº289. 23 jun-03 jul 2005. FRANCO, Augusto de. Desenvolvimento Local, integrado e sustentável Dez consensos. In: Revista PROPOSTA. Rio de Janeiro, n. 78, p. 6-19, set/nov. 1998. GRAZIANO DA SILVA, José. O Novo Rural Brasileiro. São Paulo: Unicamp, 1999. O ESTUDO DA CONDIÇÃO FEMININA NA SOCIEDADE ATUAL. O Lugar da Mulher. Org. LUZ.MT.Rio de Janeiro: Graal, 1992. (Coleções Tendências, Vn,v1). TAUK SANTOS, Salete. Estratégias de Comunicação para o Desenvolvimento Local e os Desafios da Sustentabilidade in Extensão Rural e Desenvolvimento Sustentável. / Jorge Tavares de Lima (org,) Recife: Bagaço, 2003.