A EXPERIÊNCIA SOBRE REDE DE PROTEÇÃO CONTRA VIOLÊNCIA DE GÊNERO EM ARACAJU



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Transcrição:

A EXPERIÊNCIA SOBRE REDE DE PROTEÇÃO CONTRA VIOLÊNCIA DE GÊNERO EM ARACAJU Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira 1 Catarina Nascimento de Oliveira 2 Magna de Sousa Silva Mendonça 3 O presente trabalho resulta de experiência de estágio curricular em Serviço Social realizada junto a Casa-Abrigo Professora Núbia Marques, instituição vinculada a Secretaria Municipal de Assistência Social de Aracaju/Sergipe que atende mulheres vítimas de violência doméstica no estado. Por ser uma instituição enquadrada na Proteção Social Especial de Alta Complexidade do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), seu serviço é direcionado para casos que apresentem rompimento dos laços afetivos, risco pessoal e social. Com o objetivo de sensibilizar os profissionais que trabalham no enfrentamento da violência doméstica sobre a importância do atendimento diferenciado e adequado para as usuárias, foi possível realizar ações junto à rede de atendimento, como visitas institucionais para apresentar a os serviços da Casa-Abrigo as entidades mais requisitadas nos encaminhamentos realizados pela instituição. A atividade proporcionou um maior conhecimento sobre as necessidades apresentadas pelas usuárias, além de subsidiar o fortalecimento da Rede de Atendimento às vítimas de violência doméstica com a divulgação dos serviços oferecidos pela Casa-Abrigo, por meio de materiais impressos e também através da comunicação virtual no qual foi produzido um blog, possibilitando assim um espaço interativo para troca de experiências sobre a temática. PALAVRAS-CHAVE: Mulher; Violência; Rede de Atendimento 1 Graduada em Serviço Social pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). E-mail: monique.ufs@gmail.com 2 Mestre em Serviço Social; Professora e Supervisora Pedagógica de Estágio Supervisionado do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Sergipe(UFS). E-mail: catarinanoliveira@hotmail.com 3 Graduada em Serviço Social pela Universidade Tiradentes (UNIT). Assistente Social da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania de Aracaju (SEMASC) e Supervisora Técnica de Estágio Supervisionado. E-mail: maggna@bol.com.br 1

A violência doméstica consiste na violação dos direitos humanos, ligados ao respeito da dignidade, enquadrado nos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988. Após anos em âmbito privado, a violência doméstica contra a mulher passou a ser um problema público, visto as reivindicações dos movimentos populares, sobretudo do feminista. Apesar dos avanços, a violência doméstica ainda tem ocupado lugar expressivo nos lares e na sociedade brasileira caracterizada agressões de ordem física, psicológica, sexual, moral e patrimonial. Pode-se perceber através da mídia, pesquisas, relatos, índices e outros meios que estas são práticas recorrentes, visto o número representativo de casos registrados em delegacias. Nesse sentido é pertinente dizer que a violência está ligada a questão de gênero, ou seja, na relação entre homens e mulheres ao longo da história, numa realidade de submissão e correlação de forças. Por isso que a prática agressiva é mais comum entre pessoas que possuem laços consanguíneos ou pela afinidade. Segundo Rocha, Distingue-se, entre formas de violência doméstica, a violência conjugal. Enquanto expressão da violência de gênero, as mulheres são a quase totalidade das vítimas dessa forma de violência, caracterizada por relações de dominação e de abuso de poder do cônjuge do sexo masculino sobre o cônjuge do sexo feminino. A origem dessa violência encontra-se na organização social de gênero, alicerçada na superioridade masculina, em relações de desigualdade e hierarquia que se expressam, no plano individual, na vivência cotidiana dos papéis sociais sexuados em proveito dos homens 4. A violência doméstica não está restrita as camadas populares com menor poder aquisitivo, já que sua prática independe de classe social e raça. Entretanto, a concentração de instituições que tratam da temática de gênero está localizada em regiões com menor desenvolvimento humano, tendo em vista a amplitude direcionada à ruptura dos episódios de agressões, sobretudo na efetivação da denúncia através do registro do boletim de ocorrência. 4 ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. Casas-Abrigo no Brasil: no enfrentamento da violência de gênero. São Paulo: Veras Editora, 2007. p.49. 2

As mulheres em situação de violência que provém de uma estrutura familiar abastada, geralmente acabam omitindo as agressões, conduta adotada para a não exposição da vida pessoal à sociedade, visto que a divulgação constitui uma vergonha para a vítima e sua família. A violência contra a mulher constitui, portanto, uma expressão da questão social, seja na perspectiva histórica de submissão e desigualdade perante a visão do homem, seja pelo risco pessoal e social ao qual são expostas. Após anos em âmbito privado, a violência doméstica passou a ser caso público, com políticas voltadas ao combate da prática da violação de direitos. Nessa linha de reflexão, a questão da política de gênero no Brasil ainda é considerada recente, principalmente na execução de organismos que trabalham no enfrentamento da violência, por essa razão há a dificuldade em sistematizar dados que contemplem o número de casos em território nacional. Por meio da aprovação do I Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres, sob o comando da Secretaria Especial de Políticas Públicas para as Mulheres, houve a criação da rede de atendimento às mulheres em situação de violência em todos os estados brasileiros, com a implementação de serviços especializados, como: Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM s), Centro de Referências, Casa-Abrigo, Defensorias Públicas, dentre outros. No campo da Assistência Social houve a criação da Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e do seu mecanismo de gestão, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que consistem em definir ações voltadas para a prevenção de riscos sociais e pessoais e no combate em casos em que já existe a violação de direitos e vínculos familiares fragilizados ou rompidos. Para o desenvolvimento da referida política, foram criados os níveis de proteção assim classificados: proteção social básica direcionada ao Centro de Referência de Assistência Social-CRAS, com caráter preventivo; proteção social especial direcionada ao Centro de Referência Especializado da Assistência Social-CREAS, com ações em dois níveis média complexidade, em que há violação de direitos, cujos laços familiares ainda não foram rompidos e alta complexidade, destinada aos casos de violação de direitos, com a inexistência de vínculos familiares. 3

Face ao exposto, dados do IBGE (2009) evidenciam o crescimento da rede de enfrentamento à violência doméstica, sobretudo no apoio emergencial desenvolvido pelos abrigos em todo Brasil. Faz-se necessário destacar que os órgãos com serviços especializados estão concentrados na Região Sudeste com 35% dos que possuem Casas-Abrigos e 32,2% daqueles que contam com centros de referências, sendo que o Nordeste concentra apenas 16% do total de Casas-Abrigos no Brasil, o número apresentado está diretamente ligado ao fator populacional e extensão do território. Em Aracaju, a rede de atendimento tem em sua composição um Centro de Referência da Mulher, uma Delegacia Especializada, duas Organizações Governamentais de Políticas para as Mulheres, uma Casa-Abrigo, uma unidade de Serviço de Atendimento as Mulheres Vítimas de Violência Sexual, três Conselhos de Direitos da Mulher, uma ONG e uma Vara Especializada. A Casa-Abrigo por disponibilizar um serviço direcionado aos casos que apresentam rompimento dos laços afetivos, risco pessoal e social, está enquadrada como uma instituição vinculada a Proteção Social Especial de Alta Complexidade do SUAS. O abrigo por ser de natureza sigilosa, requer o controle quanto à divulgação de seu endereço em qualquer meio de comunicação. A precaução é tomada para evitar o contato da usuária e profissionais com o agressor, já que o mesmo pode realizar ameaças ou até mesmo reincidir na violência física. Através dessa medida há a garantia da segurança e tranquilidade necessária num momento de extrema fragilidade emocional. O contato da mulher em situação de violência com a Casa-Abrigo é realizado pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher-DEAM, pelo CREAS ou CRAS mais próximo da residência da vítima. A Casa-Abrigo oferece apoio às mulheres no período de abrigamento, por meio da escuta especializada dos profissionais, momento crucial para a identificação dos possíveis encaminhamentos, realizados de acordo com a realidade a qual se encontra a usuária. 4

Segundo Rocha 5 para o enfrentamento da violência doméstica é necessário que as instituições trabalhem em rede, oportunizando meios necessários a autonomia das mulheres através da articulação entre políticas e programas de habitação, trabalho e geração de renda. Para o caso aqui relatado, a experiência do estágio supervisionado em Serviço Social desenvolvida na Casa-Abrigo Professora Núbia Marques, permitiu evidenciar uma instituição prestadora de serviço de alta complexidade que oferece as mulheres vítimas de violência um local seguro para permanecer temporariamente após agressões ou ameaça de morte, até que providências cabíveis sejam tomadas por intermédio da justiça, ação prevista na Lei 11.340/2006 (Maria da Penha) em seu Capítulo III artigo 11, no qual a autoridade policial tem como competência fornecer transporte da ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro. As atividades da referida Casa-Abrigo estão em consonância com a Lei Maria da Penha, por prever um atendimento especializado a mulher vítima, com o mecanismo das Medidas Protetivas de Urgência e transferência de vítimas para outro Estado ou País, conforme a demanda e especificidades de cada caso. Para resguardar as vítimas e sua prole, a instituição objeto de intervenção mantém o endereço sigiloso, de modo a acolher mulheres vítimas de violência doméstica e que estão sob ameaça de morte, juntamente com filhos/as menores de idade, com objetivo de garantir a integridade física e psicológica do público em questão, visando o fortalecimento dos laços afetivos, bem como o resgate da autoestima. O sigilo constitui uma norma do Ministério da Justiça, para garantir a segurança das abrigadas e da equipe de profissionais, item assegurado desde o firmamento do convênio entre a justiça e a Prefeitura de Aracaju. A norma de sigilo é uma exigência para o funcionamento de qualquer Casa-Abrigo no território brasileiro. Para a manutenção deste são tomadas algumas precauções, como: a não divulgação de endereço em listas telefônicas ou em outros indicadores públicos, nos meios de comunicação social e a mudança de endereço a cada ano. 5 ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. Casas-Abrigo no Brasil: no enfrentamento da violência de gênero. São Paulo: Veras Editora, 2007. p.154-155. 5

Outros aspectos relevantes valem registro como: a localização em perímetro urbano, funcionando 24 horas, durante todo o ano, com capacidade para acolher 20 mulheres. O funcionamento assemelha-se a uma casa comum, no qual as usuárias desenvolvem atividades domésticas e cuidam dos filhos. Face ao rompimento com as agressões sofridas, elas passam por momento de reflexão sobre a própria vida, uma vez que a casa dispõe de profissionais capacitados e habilitados para ações interventivas, além do monitoramento e acompanhamento sistemáticos. Quanto as medidas protetivas de urgência consistem em petições realizadas pelo Ministério Público em favor da vítima de violência doméstica, com encaminhamentos à justiça para que o Juiz, no prazo de 48 horas, venha apresentar seu parecer final e encaminhamento de providências de acordo com os casos. A experiência do estágio supervisionado em Serviço Social na Casa-Abrigo Profª Núbia Marques 6 proporcionou a prática de ações para o fortalecimento da rede de atendimento à mulher em situação de violência no estado de Sergipe, tendo em vista o desvelamento da realidade posta no cotidiano das usuárias abrigadas junto às instituções responsáveis pela prestação de serviços. Com a apropriação do conhecimento técnico-operativo do Serviço Social e constante reflexão acerca da dinâmica institucional, foi identificado por meio dos encaminhamentos realizados pelos profissionais do abrigo a outros órgãos públicos e privados, que maior parte desses desconheciam a Casa-Abrigo, fator que dificultava o atendimento das usuárias, já que passavam por algumas exposições, dentre elas o longo tempo de espera para realizar um exame no Instituto Médico Legal (IML) ou atendimento em algum hospital. A partir da demanda evidenciada apontada pela fragilidade no atendimento das vítimas de violência domésticas, foram traçadas estratégias para o minoramento dos impactos ocasionados pela prestação de um acolhimento fragmentado. Por ser a violência doméstica um ato que traz em seu bojo consequências tanto físicas quanto psicológicas, as usuárias necessitavam de atendimento diferenciado. 6 Criada em dezembro de 2002 e inaugurada em fevereiro de 2003, a partir de convênio entre a Prefeitura Municipal de Aracaju, por meio da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania-SEMASC e a União Brasileira de Mulheres do Estado de Sergipe-UBM. 6

Com a efetivação do atendimento diferenciado e conhecimento das necessidades evidenciadas pelas usuárias, haverá um atendimento mais qualificado, com respostas mais pontuais a cada caso. Sem o apoio das instituições e profissionais que são requeridos pela Casa- Abrigo no período de abrigamento das assistidas, as ações ao enfrentamento à violência passam a ser fragmentadas, o que compromete a execução do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres, que propõe a eliminação de qualquer forma de discriminação contra a mulher 7. A origem da fragilidade na rede de atendimento deu-se do caráter sigiloso do endereço institucional 8, fato que gerou certo mistério sobre os serviços prestados ou até mesmo o desconhecimento da sua existência, ocasionando uma lacuna na continuidade do enfrentamento da violência doméstica. Segundo Rocha, Para o enfrentamento da violência doméstica é necessário que as instituições trabalhem em rede, oportunizando meios necessários a autonomia das mulheres através da articulação entre políticas e programas de habitação, trabalho e geração de renda 9. Sendo a violência doméstica umas das refrações da questão social que perpassou por anos sem a interferência do estado no sentido de coibir esse ato, entende-se que cabe a sociedade e ao poder público promoverem o reconhecimento sobre a prestação de um serviço de qualidade para as usuárias, tendo em vista que só com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que sociedade e o estado transferiram a violência do âmbito privado para o público e posteriormente com a Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Entretanto, mesmo com os avanços a dinâmica institucional encontrava-se fragilizada e com resquícios de pensamentos voltados para o pensamento de culpabilização da vítima. Por isso, para dar início ao processo de fortalecimento da rede de atendimento, foi elaborado o projeto de intervenção Tecendo a Rede da Casa-Abrigo 7 OLIVEIRA, Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira. Relatório Supervisionado em Serviço Social I, II e III: Universidade Federal de Sergipe. São Cristóvão/SE, 2010. p. 56. 8 Ação adotada para salvaguadar a integridade física e psíquica da vítima. 9 ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. Casas-Abrigo no Brasil: no enfrentamento da violência de gênero. São Paulo: Veras Editora, 2007. p.154-155. 7

Professora Núbia Marques, cuja execução passou por três etapas: elaboração de folders informativos, criação de blog e visitas institucionais. Os folders foram aplicados nas visitas institucionais com a devida explicação sobre os serviços disponibilizados pela Casa-Abrigo e a necessidade do oferecimento de um atendimento diferenciado para as usuárias que já tinham sofrido com a violência doméstica, bem como o endereço virtual do blog (http://abrigonubia.blogspot.com/), que foi hospedado no site da Prefeitura Municipal de Aracaju, através da Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania (SEMASC). Com o debate em pauta, os profissionais compreenderam o teor do trabalho envolvendo a fragilização e/ou rompimento de laços afetivos, bem como o alto nível de complexidade em lidar com mulheres com baixa autoestima, machucadas em seu íntimo, sobretudo externamente. A partir dos contatos desenvolvidos nos Centros de Referência de Assistência Social, Hospitais, IML, Fóruns, Maternidades e Delegacias, houve o fortalecimento na rede de atendimento à mulher, o que segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) constitui, [...] atuação articulada entre as instituições/serviços governamentais, não governamentais e a comunidade, visando à ampliação e melhoria da qualidade do atendimento; à identificação e ao encaminhamento adequado das mulheres em situação de violência; e ao desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção. O trabalho busca dar conta da complexidade do fenômeno da violência contra as mulheres e de seu caráter multidimensional, que perpassa diversas áreas, tais como: a saúde; educação; a segurança pública; a assistência social; a justiça; a cultura; entre outros 10. A articulação com diferentes instituições vinculadas às Políticas Setoriais compostas pela Assistência Social, Saúde, Segurança Pública e Judicial, permitiram um estreitamento de relações aliado ao comprometimento com a prestação de um serviço de maior qualidade para as usuárias atendidas pela Casa-Abrigo e demais órgãos da rede de atendimento à mulher. 10 INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Perfil dos Municípios Brasileiros 2009. Disponível em: http://www.ibge/home/estatistica/economia/perfilmunic/assistencia_social2009/munic_as2009.pdf.acesso em 01 de junho de 2010. p. 117. 8

Esse procedimento constituiu-se imprescindível à execução do projeto, visto que os objetivos passaram a ser concretizados, especialmente no que concerne a tecer a rede envolvendo a Casa-Abrigo ao enfrentamento da violência doméstica. A articulação intra e interinstitucional ocorreu por meio da participação dos profissionais envolvidos, cujos resultados também provocaram a elaboração de novas propostas para o direcionamento das políticas e da própria visão do Estado sobre a Mulher e a conquista de seu espaço, não só no reconhecimento como cidadã, mais também como sujeito e não como vítima da agressão masculina. Outra intervenção relevante correspondeu a proposta inovadora de produção do blog para a troca de experiência e conhecimento acerca da violência doméstica e Casa- Abrigo. Criado em 08 de agosto de 2010, possui um conjunto de informações, materiais de pesquisa, links e outros atalhos direcionados ao objeto de intervenção da Casa-Abrigo. Atualmente possui 4.145 acessos assim distribuídos: 3.911 no Brasil, 102 em Portugal, 94 nos Estados Unidos, 16 na Rússia, 6 na Alemanha, 5 no Canadá, 5 em Moçambique, 3 em Angola, 2 na Guiana Francesa e 1 na Argentina. Desse modo, conclui-se que o projeto de intervenção atingiu o seu principal objetivo na perspectiva de divulgar a Casa-Abrigo aos profissionais, com o fortalecimento da rede de atendimento, como também ultrapassou fronteiras, uma vez que o mundo pode se apropriar dos conhecimentos lançados no espaço virtual, desvelando o enfrentamento à violência doméstica na busca de atitudes mais eficazes, despidas de preconceitos e de julgamentos originados no senso comum, sob o viés do machismo. Referências BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%c3%a7ao.htm. Acesso em 05 de maio de 2010., Lei 11.340 de 7 de agosto de 2006. Dispõe de Mecanismos para Coibir a Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm. Acesso em 12 de maio de 2010. 9

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Perfil dos Municípios Brasileiros 2009. Disponível em: http://www.ibge/home/estatistica/economia/perfilmunic/assistencia_social2009/munic_as2 009.pdf.Acesso em 01 de junho de 2010. OLIVEIRA, Monique Elen Rodrigues de Araújo Oliveira. Relatório Supervisionado em Serviço Social I, II e III: Universidade Federal de Sergipe. São Cristóvão/SE, 2010. ROCHA, Lourdes de Maria Leitão Nunes. Casas-Abrigo no Brasil: no enfrentamento da violência de gênero. São Paulo: Veras Editora, 2007. 10