Tem que escrever?! Para quê?!: representações sociais da escrita em professores e alunos do ensino médio 1

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Transcrição:

Tem que escrever?! Para quê?!: representações sociais da escrita em professores e alunos do ensino médio 1 2 1 Contextualização Este estudo foi realizado como parte do projeto guarda-chuva 3 desenvolvido no Laboratório de Pesquisa e Ensino de Leitura e Redação (LabLeR) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), cujo objetivo é investigar diferentes aspectos da popularização da ciência. O presente trabalho também contribui para o projeto intitulado Representações sociais sobre a área de Letras 4, no qual são investigadas as representações sociais sobre a área de Letras acerca do seu estatuto como área do saber, da popularização de conceitos referentes a esse saber científico e da relevância da educação linguística na sociedade. O objetivo desse trabalho é identificar as representações sociais sobre educação linguística como manifestação da popularização do conhecimento em Letras, especificamente ensino e aprendizagem da escrita em uma comunidade escolar pública de ensino médio em São Gabriel, RS. Com isso, pretende se somar aos esforços de pesquisa do grupo no sentido de identificar as representações sociais sobre letramento e o estatuto da popularização da ciência em Letras por uma comunidade escolar, ampliando os espaços de reflexão sobre a área de Letras. O estudo também poderá colaborar para a percepção de como o senso comum manifesta o conhecimento científico produzido na área de Letras, servindo de base para ações futuras que interfiram na realidade escolar para qualificar a educação linguística. O presente artigo está organizado em cinco seções. Após a contextualização, apresentamos o conceito de representações sociais utilizado neste estudo. Na sequência, apresentamos a descrição da metodologia, especificando os 1 Trabalho orientado pela Profª Drª Désirée Motta-Roth (PPGL-UFSM/CNPq). 2 Mestranda no PPGL-UFSM e professora da Escola Estadual de Ensino Médio XV de Novembro, em São Gabriel, Rio Grande do Sul; e-mail: angela_abrasil@hotmail.com 3 Motta-Roth, D. Projeto de Produtividade em Pesquisa, CNPq nº 301962/2007-3, intitulado Análise crítica de gêneros com foco em artigos de popularização da ciência (2008-2011). 4 Projeto registrado no Comitê de Ética e Pesquisa da UFSM sob o número 0068.0.243.000-08.

instrumentos e procedimentos de coleta de dados e os resultados levantados até este momento de análise. Na última seção, apresentamos as considerações finais deste estudo. 2 Representações Sociais Neste artigo, empregamos o termo Representações Sociais, um conceito introduzido pela Psicologia Social por meio da obra La Psychanalyse: Son image et son public, de Serge Moscovici (1961). Nessa obra, o autor procura compreender o que ocorre quando uma disciplina científica passa do domínio dos especialistas para a sociedade como um todo (SANTOS, 2004, p.50). Esse conceito foi escolhido por vir ao encontro da importância que deve ser dada à introdução do discurso da ciência na escola, de forma a proporcionar ao aluno situações de reflexão e posterior ação no seu meio social. Para Moscovici (2007, p.21) as representações são um sistema de valores, ideias e práticas construídos socialmente, por meio do qual indivíduos e comunidades estabelecem uma ordem para se orientarem no mundo material e social e controlá-lo e, também, comunicam-se e constroem um código para nomear e classificar os aspectos do mundo e da sua história individual e social (MOSCOVICI, 2007, p.21). As representações sociais são originadas a partir de dois mecanismos de um processo de pensamento baseados na memória e em conclusões passadas: a ancoragem e a objetivação. O primeiro mecanismo, a ancoragem, é a aproximação de algo desconhecido para nós a um paradigma que já temos estabelecido anteriormente. Após, nomeamos o objeto da ancoragem e, desse modo, ele se torna distinto pelas características que lhe são atribuídas, tornando-se também objeto de uma convenção entre os que adotam e partilham a mesma convenção (MOSCOVICI, 2007, p.67). O outro mecanismo que origina a representação social é a objetivação, que é um processo mais atuante que a ancoragem. Esse mecanismo consiste em Discursos de popularização da ciência 256

transformar ideias e noções em algo quase concreto, em algo que exista no mundo físico, unindo a ideia de não familiaridade com a de realidade, sendo percebido primeiramente como um universo puramente intelectual e remoto, para depois aparecer de forma física e acessível (MOSCOVICI, 2007, p.71). Toda representação social é constituída como um processo em que se pode localizar uma origem sempre inacabada, de modo que outros fatos e discursos virão nutri-la ou corrompê-la. Dessa forma, os sujeitos constantemente reformulam suas próprias representações, logo estamos sempre analisando representações de representações. Segundo Moscovici (2007, p. 218), é necessário, então, compreender como os sujeitos agem para definir a si mesmo e agir no social. 3 Metodologia O universo de análise investigado neste estudo é a comunidade de uma escola situada no município de São Gabriel, região da Campanha, no Rio Grande do Sul. Nesse universo, foram investigados 31 alunos de uma turma de 1ª série, dez professores, 18 pais, mães ou responsáveis por alunos dessa turma e quatro funcionários. Entretanto, neste trabalho, foram considerados apenas os segmentos de professores e alunos, totalizando 41 participantes. Este estudo foi desenvolvido por meio de uma pesquisa qualitativa de base etnográfica, que foi escolhida por permitir a aproximação do contexto pesquisado, onde se podem observar os participantes em seu local de ação. Esse tipo de pesquisa é frequentemente utilizado para tentar compreender vários comportamentos e relações de/entre grupos de pessoas (professores, alunos de uma sala de aula, pais, funcionários e administradores de uma escola, etc.) dentro de um contexto social específico (escola, comunidade, família, etc.) e seu propósito é descrever e interpretar a cultura e o comportamento cultural dessas pessoas e grupos. (TELLES, 2002, p.102) Para a realização da pesquisa, utilizamos como instrumento de coleta do corpus um questionário semi-estruturado escrito (conforme Quadro 1), aplicado aos Discursos de popularização da ciência 257

participantes. Após a aplicação do questionário, foi realizada uma entrevista semiestruturada (informal) por segmento, com grupos focais formados por participantes que produziram respostas mais significativas nos questionários, a fim de aprofundar as informações dadas ao questionário escrito. As respostas dadas ao questionário foram processadas por meio da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), que consiste em reunir, sob a forma de discursos únicos, os conteúdos de depoimentos com sentidos semelhantes. (LEFEVRE, LEFEVRE & MARQUES, 2007). Os DSCs foram identificados como A,B e C, conforme o discurso veiculado. Os dados colhidos a partir dos questionários e entrevistas serviram de corpus para a análise do discurso que identificou as representações sociais sobre escrita dos participantes da pesquisa. A análise utilizou procedimentos quantitativos e qualitativos. Título do projeto: Representações sociais sobre a área de Letras Registro no Comitê de Ética e Pesquisa/UFSM: CAAE 0068.0.243.000-08 Instituição: Universidade Federal de Santa Maria Mestrado em Letras E-mail para contato: angela_abrasil@hotmail.com Local da coleta de dados: E. Estadual de Ensino Médio XV de Novembro - São Gabriel,RS Questionário destinado à comunidade da E. E. de Ensino Médio XV de Novembro: Data: / / 1. O ensino da escrita é importante para a comunidade onde você vive? Por quê? 2. Em que situações você utiliza a linguagem escrita? Para quê? 3. O que é mais interessante na aprendizagem da língua portuguesa? 4. Qual é o papel do professor no ensino e na aprendizagem de língua portuguesa? E o papel do aluno? 5. O que é necessário para que haja uma aprendizagem eficaz da língua portuguesa? 6. Quais foram as suas dificuldades com relação à aprendizagem da escrita? E hoje, quais são essas dificuldades? 7. Em algum momento de sua vida, o texto escrito já foi motivo de impedimento para você alcançar um objetivo? 8. Você acha que escrever é um conhecimento importante para sua vida? Por quê? 9. Para você, o que significa saber bem a língua portuguesa? 10. Você se considera um conhecedor da língua portuguesa? Por quê? Quadro 1 - Questionário escrito aplicado aos segmentos da comunidade escolar Discursos de popularização da ciência 258

4 Resultados e Discussão As respostas foram analisadas, inicialmente, por segmento escolar, em relação aos conteúdos temáticos evidenciados pelas escolhas léxico-gramaticais dos participantes, observando-se as categorias seguintes: 1) Relevância da escrita; 2) Situações de uso da escrita; 3) Papel do professor e papel do aluno e 4) Dificuldades em relação à escrita. Os participantes da pesquisa foram identificados como: A e números de 1 a 31, para alunos (Ex.: A/1- Aluno número 1) e Pr e números de 1 a 10, para professores (Ex.: Pr/1- Professor número 1). 4.1 Relevância da escrita No espaço escolar pesquisado, 96% dos alunos relatam que a escrita é importante, principalmente para a comunicação. A importância da escrita também está ligada às práticas sociais dos alunos, principalmente ao seu cotidiano, já que eles conseguem nomear os gêneros relativos a essas práticas, como mostram os DSCs no exemplo 1. Exemplo 1: A escrita é relevante... A/A porque precisamos escrever para nos comunicar. Uso a linguagem escrita quando estou no MSN e também para qualquer tipo de aviso necessário, comércio, ruas e várias outras coisas (12 alunos). A/C para deixar recados no caso na geladeira, alguma placa dizendo não coloque lixo, em uma rifa, em cheque, etc. (4 alunos) Para a maioria dos professores, a escrita é relevante principalmente como prática social, como mostra o Exemplo 2. Exemplo 2: A escrita é relevante... Pr/C- Porque é através da escrita que os alunos irão expressar seus conhecimentos e se preparar para o campo do trabalho e também porque Discursos de popularização da ciência 259

necessitamos de registros, documentos, bilhetes e cartas para guardarmos as informações (4 professores). 4.2 Situações de uso da escrita Com relação às situações de uso da escrita, a escola foi citada por 13 alunos (41% dos entrevistados), sendo a escrita utilizada, principalmente para cópia de conteúdos, percebendo-se que não são citadas práticas de inserção social por meio do texto escrito, como apontam os excertos: escrever na escola (A1); Na aula para copiar a matéria (A2). Pode-se depreender das respostas dadas que o ensino de escrita, como tradicionalmente é realizado na escola, não tem relevância para os alunos, uma vez que eles não fazem referência ao uso da escrita escolar, exceto para cópia. Já no cotidiano, a maioria das respostas dos alunos sugere o uso da escrita relacionada ao computador, especificamente ligado à internet e ao MSN (11 alunos), demonstrando que essa prática é relevante, uma vez que nas entrevistas, os alunos relataram que ficam de 1 a 4 horas por dia no MSN. Além do MSN, os alunos citaram outros gêneros discursivos eletrônicos, tais como: ORKUT, e-mails, cartão virtual e mensagem em celular. Também foram citados cartas, documentos, recados, lista de compras, rifa, cheque e avisos. Quanto aos professores, relatam que o uso da escrita está ligado ao trabalho, como explicações no quadro, anotações, projetos, registros, planos, recados e uso do computador, conforme excertos: Para explicações no quadro; para fazer planos e anotações; para especificar projetos. (Pr1). Na vida diária, são citados outros gêneros discursivos, tais como: lista de mercado, agenda telefônica, documentos, MSN, cartas e bilhetes. 4.3 O papel do professor e o papel do aluno Para a maioria dos alunos participantes da pesquisa, o papel do professor na aprendizagem da língua portuguesa é o de ensinar (16 alunos). Alguns alunos parecem perceber a importância da aprendizagem da escrita para sua inserção nas Discursos de popularização da ciência 260

práticas futuras de vida em sociedade, embora não nomeando quais seriam essas práticas, quando relatam que o papel do professor é: aplicar um conteúdo que será utilizado na vida dele (A12); Ensinar o aluno para que o aluno saiba escrever, ler, interpretar bem, para que no futuro sega um cidadão capacitado. (A23). Já os docentes relatam que o papel do professor deve ser o de orientar a aprendizagem, corrigir os erros, ser mediador entre o aluno e o novo conhecimento e mostrar conhecimento. Em suas respostas, percebe-se que 50% entendem o seu papel como um processo interativo de aprendizagem entre professor e aluno (como por exemplo, Aprender e ensinar tanto um quanto o outro, pois quando se ensina algo, a gente aprende também e vice-versa. (Pr1)), entretanto, a outra metade vê esse papel dentro de um processo linear, com o conhecimento sendo repassado do professor para o aluno. Essas respostas demonstram uma visão tradicional sobre ensino-aprendizagem. Nessa concepção, o processo de ensino está centrado na transmissão de conhecimentos. Isso supõe uma fonte que sabe, lugar ocupado exclusivamente pelo professor, e um receptáculo desse saber, lugar ocupado exclusivamente pelo aluno (GERALDI,1997, p. 20) Como seu papel, os alunos relatam que é, principalmente, o de aprender (10 alunos): Os alunos tem o papel [de] aprender e entender a importância da língua portuguesa (A10); O papel do aluno é querer aprender para levar esse conhecimento pra vida. (A13). Já para os professores, o papel do aluno na aprendizagem da língua portuguesa é exercitar a língua escrita e falada (3 professores): [O papel d]os alunos por sua vez [é] exercitar (Pr4); O papel do aluno é colocar em prática o que aprendeu na escrita e na fala (Pr6). Desse modo, percebem-se duas visões diferentes: o aluno vê seu papel no processo de ensinoaprendizagem como algo que depende de seus sentimentos e percepções, demonstrados por processos mentais como entender e querer (HALLIDAY, 2004), enquanto que os professores veem o papel do aluno como uma situação prática, algo que deve ser feito, como demonstram os processos materiais realizar e colocar em prática" nos excertos acima. Discursos de popularização da ciência 261

4.4 Dificuldades em relação à escrita A maioria dos alunos (87,09%) relata que em nenhum momento de sua vida o texto escrito foi motivo de impedimento para alcançar objetivos, mas, quando perguntados se já estiveram frente a uma real necessidade de mostrar suas habilidades relativas ao texto, demonstraram que não vivenciaram esta realidade. Dessa forma, deduz-se que, como não vivenciaram situações em que tivessem sido discriminados ou prejudicados pela falta desse conhecimento, não identificam as práticas sociais que só estão disponíveis a quem possui o conhecimento da cultura letrada. Entretanto, alguns alunos percebem o desconhecimento de competências específicas que permitem ao aluno interferir na vida diária, fora de seu contexto escolar, conforme o excerto: quem não sabe escrever não tem nem uma chance de crescer na vida. (A11). Os professores, em sua maioria (90%), também expuseram que o texto escrito nunca foi impedimento para alcançar objetivos. Interessante destacar aqui a fala de um único professor que disse não ter conseguido vencer seu objetivo por desconhecer a competência necessária para tanto: Para concluir a monografia da minha pós-graduação que era trigonometria no dia-a-dia, eu passei muito trabalho porque eu não conseguia colocar no papel a real importância do que eu tinha conseguido com o meu trabalho que era simplificar a trigonometria na vida do aluno (...) (Pr7) Em relação às dificuldades acerca da escrita, alunos e professores relatam que são relacionadas às regras do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que passou a vigorar durante este ano de 2009. Outras dificuldades relatadas são relacionadas a verbos e pontuação. 5 Considerações finais Este estudo está ainda em desenvolvimento, sendo que o passo seguinte é realizar uma análise linguística detalhada, de forma a favorecer o processo interpretativista de análise do discurso desses participantes. Discursos de popularização da ciência 262

Segundo Bazerman (2007, p.13), o indivíduo reconhece uma situação que requer a escrita, desencadeando comportamentos e pensamentos que ativam mecanismos psicológicos, por meio dos quais ele constrói sentidos e se alinha com as comunicações de outros, sendo um processo social que liga os pensamentos, as experiências e os projetos às coletividades mais amplas de ação e crença organizadas. Dessa forma, percebe-se a necessidade de favorecer ao aluno situações reais em que ele perceba a necessidade da produção textual para sua inserção em uma sociedade de cultura letrada. Referências BAZERMAN, C. Escrita, gênero e interação social. São Paulo: Ed. Cortez, 2007. HALLIDAY, M. A. K. An introduction to functional grammar. Revisão C.M.I.M Matthiessen. 3 ed. London: Edward Arnold, 2004. LEFEVRE, F.; LEFEVRE, A. M. C.; MARQUES, M. C. da C. Discurso do sujeito coletivo, complexidade e auto organização. 2007. Ciência & Saúde Coletiva. Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva /Faculdade de Saúde Pública da USP. São Paulo. Disponível em: <http://www.abrasco.org.br/cienciaesaudecoletiva/artigos/artigo_int.php?id_artigo=62 2> GERALDI, J. W. Portos de passagem. São Paulo: Martins Fontes, 1991. MOSCOVICI, S. Representações sociais: investigações em psicologia social. Tradução Pedrinho A. Guareschi. 5. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. SANTOS, C. F. O professor e a escrita: entre práticas e representações. 2004. 167 fl. Tese (Doutorado em Lingüística Aplicada) Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2004. TELLES, J. A. É pesquisa, é? Ah, não quero, não, bem! Sobre pesquisa acadêmica e sua relação com a prática do professor de línguas. 2002. Linguagem & Ensino, v. 5, n. 2, p. 91-116. Disponível em: <http://rle.ucpel.tche.br/php/edicoes/v5n2/f_joao.pdf> Acesso em: 09 mai.2008. Discursos de popularização da ciência 263