UMA PERSPECTIVA SOCIOLINGUÍSTICA NO TRABALHO ESCOLAR COM A LÍNGUA MATERNA

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Transcrição:

Capítulo publicado no livro MIRANDA Sonia Regina PACHECO, Luciana Marques. (org) Investigações: experiências de pesquisa em educação. Juiz de Fora: EDUFJF, 2009. p. 49-61. UMA PERSPECTIVA SOCIOLINGUÍSTICA NO TRABALHO ESCOLAR COM A LÍNGUA MATERNA Profª Drª Lucia F. Mendonça Cyranka UFJF/FAPEMIG 1 Introdução O título deste trabalho pode ser também A linguagem na escola: como transpor esse obstáculo? Isso não é uma provocação. Ao contrário, pretendemos, com ele, somar esforços aos muitos cientistas da linguagem, pesquisadores e educadores das últimas décadas, no sentido de desestabilizar perigosas e nocivas crenças construídas através da história do ensino escolar da disciplina Português, ou Língua Portuguesa no Brasil. De fato, desde que a Linguística se constituiu como ciência e a Sociolinguística, na década de 60, como desenvolvimento da investigação das relações entre língua e sociedade, um olhar sobre a escola como instituição formadora de cidadãos competentes no uso da língua pátria se tornou constante. Já Labov (1964/1974), investigando os estágios na aquisição do inglês standard, chama a atenção para o papel do professor e da escola nesse processo. No Brasil, essa discussão ganhou corpo a partir, principalmente, das reflexões de Soares (1986) sobre as causas do fracasso escolar ligadas ao desprestígio da variedade linguística dos alunos das escolas públicas brasileiras. Nas suas reflexões, ela retoma Bourdieu (1930-2002) que, ao tratar a língua como um bem simbólico do capital cultural, assinala as sanções do mercado escolar que se exercem sobre os alunos, com todas as aparências de legitimidade, e suas consequências. Gnerre (1994, p. 25) entrevê aí uma questão ideológica, afirmando: A única brecha deixada aberta [pelos princípios democráticos] para a discriminação é aquela que se baseia nos critérios da linguagem e da educação. 1 Este artigo é fruto do Projeto de Pesquisa Os dialetos populares no trabalho escolar com a língua materna (modalidade UFJF/BIC/PROVOQUE/julho de 2008/agosto de 2009). Nela colaboraram, como voluntários, os seguintes alunos do Curso de Letras da UFJF: Moema Rosa Feital, Nathalia Félix de Oliveira, Rafael Costa Marques e Patrícia Rafaela Otoni. Em 2009, o trabalho se expandiu com o projeto Laboratório de Alfabetização: aprendizagem da leitura e da escrita na escola pública, financiado pela FAPEMIG, para o biênio 2009/2010, tendo como alunos bolsistas, do Curso de Letras da UFJF: Marcus Vitor Dias Leoni, Rafael Costa Marques e Simone Rodrigues Peron.

Muitos outros sociolinguistas ligados à educação vêm se empenhando no estudo das relações entre o trabalho escolar com a língua materna e o sucesso/insucesso dos alunos no desenvolvimento de competências na oralidade e na escrita. Para isso, têm-se voltado para as ações que acontecem dentro das salas de aula, procurando observar o que se passa nesse cenário, espaço de construção de crenças, muitas vezes extremamente equivocadas sobre o falar e o escrever certo/errado. Um bom exemplo foi a pesquisa-ação empreendida por Eglê Franchi (1984) em sua própria sala de aula, procurando caminhar na direção oposta da tradição, no tratamento das experiências linguísticas levadas para a escola por seus alunos. Obteve, como resultado, a autoconfiança adquirida por aqueles falantes de variedades linguísticas desprestigiadas, construindo abertura para a extensão de suas competências em direção às variedades prestigiadas em seu meio social. Também Mollica (2000, 2007) tem chamado a atenção dos professores para a necessidade de se trabalhar eficientemente a heterogeneidade da língua, desconstruindo preconceitos a partir do que ela denomina metodologia pedagógica para transformar em recursos didáticos itens em processo de variação e/ou mudança, já apontados por especialistas da área. É justamente no trabalho desses sociolinguistas que se tem buscado os fundamentos para a discussão sobre a incongruência entre o que se considera como fenômeno de linguagem, legitimado, portanto, por sua própria natureza, e a já tradicional imposição, pela escola, de apenas um modelo de língua a ser adotado, a língua padrão. Ela, sabe-se hoje, sequer coincide com o que se conhece como variedade culta, ou língua culta, esta sim, contemporânea, flexível, compreendendo diferentes lugares num contínuo de estilos monitorados. O projeto NURC (Norma Urbana Culta), pesquisando o moderno conceito de língua culta falada no Brasil, concluiu (PRETTI, 1997) que ele corresponde a um dialeto que é comum tanto ao chamado falante culto, quanto aos falantes que têm menor grau de escolaridade, um dialeto social dividido entre as influências de uma linguagem tensa, marcada pela preocupação com as regras de gramática tradicional, e uma linguagem popular, espontânea, distensa. Carece de base científica, portanto, a prática de desqualificação da linguagem dos alunos, a negação de sua fala espontânea como sendo correta. O critério de certo e errado em linguagem não é absoluto, e isso deve ser reconhecido e adotado pela escola, para evitar a rejeição, pelos alunos, justamente daquela variedade que ela pretende ensinar. Também Matos e Silva (2004) discute essa questão da adequação devida à escola e, principalmente, ao professor da disciplina Português, do que seja lícito ensinar, tendo em vista a variação da sintaxe, definindo o que seria uso linguístico socialmente aceitável.

Assim, [ela acrescenta] entre as variantes sintáticas em convívio nas falas brasileiras, o professor terá de distinguir, pelo menos, as estruturalmente mais salientes e socialmente mais estigmatizadas, para, sem desprestigiar as segundas, selecionar ambas, a fim de treinar o uso formal falado e os usos escritos de seus alunos. Aí está a grande contribuição que a sociolinguística sobre o português brasileiro poderá dar para uma efetiva virada no ensino da língua portuguesa no Brasil (p. 114-115). Nessa mesma direção, Bortoni-Ricardo (2004, 2005, 2008) tem realizado trabalho consistente de construção de saber crítico na formação inicial e continuada de professores de Português. Para ela, a formação do professor, em todos os níveis, não pode carecer de boa formação sociolinguística, de modo a se tornar sensível aos padrões culturais levados à escola pelos alunos de seus círculos familiares, nem sempre coincidentes com os da cultura escolar letrada, mas nem por isso menos valiosos. Há necessidade, portanto, ela conclui, de uma pedagogia culturalmente sensível, para que o trabalho de sala de aula, que implica numa interação assimétrica entre professor e alunos, seja realizado sem prejuízo de seus valores culturais. E explica (2005, p. 128): É objetivo da pedagogia culturalmente sensível criar em sala de aula ambientes de aprendizagem onde se desenvolvam padrões de participação social, modos de falar e rotinas comunicativas presentes na cultura dos alunos. Tal ajustamento nos processos interacionais é facilitador da transmissão de conhecimento, na medida em que se ativam nos educandos processos cognitivos associados aos processos sociais que lhes são familiares. Lembramos aqui o que afirmam Leite e Callou (2004, p. 16): Cumpriria a uma educação realmente democrática e igualitária reconhecer a diversidade e com ela trabalhar, no sentido de possibilitar a todos os usuários da língua o acesso às normas prestigiadas e às mesmas oportunidades. Enquanto a escola não reconhecer a legitimidade dos diferentes usos linguísticos, desde que adequados às situações de produção; enquanto não se eliminar o policiamento obsessivo em favor de uma variedade linguística que nem o próprio professor é capaz de sustentar em todos os momentos de sua aula; enquanto os princípios da Sociolinguística não se tornarem o fundamento de uma educação linguística na escola, o Brasil continuará, sem dúvida, amargando resultados tão ruins nas avaliações não apenas das próprias escolas, como também nas institucionais como SAEB, Prova Brasil, PISA, etc., no que diz respeito ao reconhecimento, por parte dos alunos, da variedade culta da língua portuguesa e à capacidade de utilizá-la para ler e escrever.

1. A SOCIOLINGUÍSTICA NA SALA DE AULA Os resultados acima referidos têm, obviamente, preocupado a todos os agentes da educação escolar, especialmente os diretamente responsáveis pelo trabalho com a nossa língua materna. Muitos são os fatores ligados ao fracasso dos alunos no desenvolvimento de suas competências de leitura e escrita. Dentre eles, destacamos a grave distorção, geralmente praticada nas escolas, relativamente à seleção dos aspectos do trabalho com a linguagem a serem enfocados. Sabe-se que a insistência na taxionomia, nas classificações, nas descrições teóricas e nos aspectos normativos da língua a partir de usos literários, desvinculados das práticas linguísticas contemporâneas são, sem dúvida, os mais importantes. Na base dessa seleção, no entanto, está a compreensão distorcida do que seja certo/errado em relação aos usos linguísticos. Na discussão que apresentamos no presente artigo, partimos dessa questão: a desvinculação da proposta escolar no trabalho com a linguagem relativamente às experiências linguísticas levadas pelos alunos como componentes de seu mundo cultural. Em pesquisa empreendida em quatro escolas públicas e uma particular do município de Juiz de Fora (MG), Cyranka (2007) investigou as atitudes linguísticas de alunos de nono ano do ensino fundamental em relação a três diferentes variedades utilizadas no português do Brasil, entre elas a culta. A metodologia utilizada foi quantitativa e qualitativa. A partir de ambas, constatou a identificação de todos os sujeitos do universo testado com uma variedade que faz parte de seu repertório linguístico utilizado nas suas relações pessoais, uma variedade marcada por episódios de desvio das regras de concordância, por exemplo, ao lado de construções em perfeito acordo com as regras de gramática. Em relação à variedade culta, no entanto, mostraram-se desinteressados, desanimados, descrentes de sua capacidade de dominar recursos para utilizá-la com eficiência. A pesquisa constatou também a presença do prestígio encoberto, noção proposta por Labov (1972) para explicar o desejo do falante de manter sua identidade no interior de seu grupo social. Nesse caso, os alunos rejeitam adotar a variedade proposta pela escola se, para isso, a condição for o abandono de seu vernáculo. Interessante constatar que esse fenômeno está presente tanto nos falantes da zona rural quanto nos da zona urbana, sejam eles provenientes de meios socioeconômicos mais abastados ou menos. Uma terceira constatação: há evidências da correlação entre as crenças dos professores sobre o que sejam língua, linguagem, variação e aprendizagem linguística e as crenças e atitudes dos alunos sobre sua própria variedade dialetal.

Tendo isso em vista, podemos concluir que é preciso construir caminhos para que uma educação linguística seja efetivada na escola de tal modo que propicie a todos os alunos o acesso à variedade culta da língua sem que isso implique na necessidade de abandonar sua variedade vernacular. A partir dessa constatação, desenvolvemos um projeto de pesquisa em salas de aula de uma escola pública do município de Juiz de Fora (MG), procurando investigar mais de perto essa problemática. 2.1 A pesquisa-ação Segundo orienta Bortoni-Ricardo (2008 p. 79), a vertente etnográfica de estudos sociolinguísticos educacionais propõe uma teoria da aprendizagem baseada na interação verbal em sala de aula. Na nossa investigação, propusemo-nos justamente um trabalho diretamente com os alunos, de tal modo que pudéssemos, ao mesmo tempo, observar e atuar no processo de ensino/aprendizagem da variedade culta língua, procurando verificar a possibilidade de promover mudanças nas suas atitudes e crenças em relação a ela. Propusemos, assim, uma pesquisa de base etnográfica, sociolinguisticamente orientada. Enquadrando-se no parâmetro da pesquisa qualitativa interpretativista, a pesquisa-ação, segundo propuseram Kemmis & Mc Taggart (1988), se identifica por três características: é desenvolvida pelos próprios participantes envolvidos no processo, não por pesquisadores externos a ele; é colaborativa; propõe mudanças. Para esses autores, o principal objetivo desse tipo de pesquisa é mudar o sistema. Por isso, uma pesquisa que tenha só o objetivo de descrever e compreender o fenômeno não é pesquisa-ação. Essa interpretação está de acordo com Bortoni-Ricardo, que explica (2008, p. 42): [...] é tarefa da pesquisa qualitativa de sala de aula construir e aperfeiçoar teorias sobre a organização social e cognitiva da vida em sala de aula, que é o contexto por excelência para a aprendizagem dos educandos Em nossa pesquisa-ação, perguntamos: Até que ponto o distanciamento entre a variedade linguística do aluno e a que a escola lhe apresenta como a única legítima e recomendável pode afetar suas crenças em relação a sua competência de aprendizagem dessa variedade que lhe é estranha?; Em que momento do processo de aprendizagem escolar o aluno toma consciência dessa diferença?;

Quais os primeiros sinais indicadores desse fenômeno? Propusemos desenvolver estratégias pedagógicas que levem os alunos ao desenvolvimento de competências de uso da língua materna, sem alterar suas atitudes e crenças sobre seu próprio vernáculo, isto é, torná-los bidialetais e, desse modo, observar se os resultados apontam para as respostas que procuramos. O projeto propôs, então, um estudo longitudinal a se realizar durante dois anos letivos, a partir de 2009, tendo sido aprovado pelo programa FAPEMIG em novembro de 2008. De início, realizamos um trabalho piloto, nos meses de outubro/novembro de 2008, ação que é tema do presente trabalho. Sendo um de nossos objetivos investigar em que momento do processo de aprendizagem escolar as atitudes e as crenças dos alunos em relação a seu vernáculo começam a ser afetadas negativamente, decidimos trabalhar com alunos de dois diferentes momentos do processo, mas contíguos: uma turma de 5º e outra de 6º ano 2. Para nos integrarmos na rotina de sala de aula, obtivemos, da direção da escola e das professoras regentes, um horário semanal pré-determinado (cinquenta minutos, às quartas-feiras), momentos nos quais assumíamos inteiramente a direção da sala de aula. Condição básica de nosso estudo foi desenvolver, em ambas as turmas, o mesmo plano de aula, de modo que pudéssemos observar as eventuais diferenças nas atitudes e nas crenças dos alunos em relação ao que proporíamos. O dia da semana era o mesmo e as aulas, subsequentes, de modo a garantir o ineditismo das ações em ambas as salas. É necessário acrescentar que essa ação se realizou com a participação de quatro estudantes do curso de Letras da UFJF. Todas as sessões contavam com a presença de, pelo menos, dois deles como observadores, fazendo anotações de campo, que eram, posteriormente, analisadas pela equipe. Houve momentos em que havia troca de posição, sendo algumas sessões desenvolvidas por um dos observadores, passando o pesquisador a observador. A posição de observadores, no entanto, não impedia que, em determinados momentos do desenvolvimento das ações, colaborassem na organização das atividades, o que propiciou a criação de vínculos afetivos que muito beneficiaram a 2 Utilizamos aqui a nomenclatura vigente, que considera o ensino fundamental de nove anos.

realização desta pesquisa, já que todos eles acabaram se integrando aos dois grupos de alunos e professores. 2.2 Ação e resultados Conforme anteriormente anunciado, nossa proposta de ação está centrada nos parâmetros da Sociolinguística Educacional. Segundo advoga ela, uma educação linguística bem orientada e sistemática é condição imprescindível na formação do aluno competente no uso das variedades prestigiadas de sua língua materna. Abaixo, selecionamos alguns itens e resultados da ação desenvolvida que nos possibilitaram algumas conclusões. 2.2.1 Sobre a consciência da legitimidade das variedades dialetais Nossa ação se iniciou, então, com uma entrevista semi-estruturada da qual participaram todos os alunos. O tema, a língua que falamos, permitiu-nos construir as seguintes categorias para análise: Categorias de análise Alunos do 5º ano Alunos do 6º ano Consciência do falante sobre a identidade de sua língua. Consciência da existência de outras línguas. Consciência sobre a existência de dialetos do português brasileiro e da presença de falantes de outras línguas no Brasil. Crenças positivas do falante em relação à sua própria competência de uso da língua. Utilidade da disciplina Português na escola. Existente na totalidade dos alunos. Existente na totalidade dos alunos. Desconhecimento da existência das línguas indígenas no Brasil. Existente na totalidade dos alunos. Para aprenderem o que é diferente e a escrever. Idem. Idem Idem Pouco existente. Consideram que não falam corretamente a língua portuguesa. Para aprenderem a falar e a escrever direito.

Quadro 1: Categorias de análise de crenças dos alunos de 5º e 6º anos sobre sua competência de falantes da língua materna. A análise do quadro acima nos leva a identificar, já no intervalo de um ano letivo que medeia a vida escolar dos alunos do 5º e do 6º anos, diferença alarmante no que diz respeito à construção de suas crenças sobre sua competência como falantes nativos da língua portuguesa. Enquanto os alunos do 5ª ano ainda se conservam autoconfiantes, competentes usuários de seu idioma pátrio, os do 6º já revelam abalado seu sistema de crenças positivas nesse sentido. Essa diferença se pôde perceber nitidamente nas notas de campo do pesquisador-aluno da Universidade, relativamente ao 5º ano: Conclusão: Parece que, no 5º ano, os alunos não se sentem tão pressionados e preconceituosos quanto ao uso de uma variante não culta. Muito significativos foram também os resultados dessa primeira ação que, como todas as outras, para se manter dentro dos parâmetros da pesquisa-ação, propôs promover mudanças. Sobre isso também se lê numa das notas de campo referindo-se à ação na sala do 5º ano: É importante mencionar que um dos alunos da turma, o Geraldo 3, utiliza a variante rural e alguns colegas mencionaram o jeito dele falar. No final da aula, ele falou para uma das colegas que esta pesquisadora falava carioca. A colega o corrigiu dizendo: - Ela fala português, mas o jeito dela falar é carioca. Ele respondeu que era isso que ele queria dizer. Essa pequena conversa deixa entrever um efeito positivo da interação acontecida naquela aula, tendo em vista a variedade rural utilizada pelo Geraldo. Percebe-se que uma orientação sociolinguística já começa a construir uma crença positiva em relação à diversidade dialetal, o que poderá, se sustentado por uma educação linguística consistente, por um lado, fortalecer esse pequeno falante contra as pressões do preconceito linguístico; por outro, quem sabe, contribuir para a desconstrução desse preconceito. 3 Os nomes utilizados aqui e nas citações subsequentes são fictícios.

2.2.2 Sobre o conhecimento/reconhecimento de variantes dialetais nas dimensões de sexo, idade e cortesia Para o trabalho com variantes dialetais nas dimensões de sexo, idade e cortesia, os alunos procuraram reconhecer a identidade dos falantes de diferentes enunciados, bem como identificar os modalizadores disponíveis no seu repertório linguístico e ampliá-los, tendo em vista o desenvolvimento de competências. O quadro abaixo ilustra esses resultados. Categorias de análise Alunos do 5º ano Alunos do 6º ano Presença de 88,8% 95,8% reconhecimento das variantes de sexo e idade. Ausência de 35% 33% recursos para variantes de polidez. Quadro 2 Categoria de análise para identificação do reconhecimento dos alunos de variantes de sexo, idade e polidez. Com relação às categorias acima descritas, verificou-se que, se por um lado, os alunos reconhecem muito bem variantes de sexo e idade, a ponto de identificarem o enunciador de pequenas falas, por outro, no que se refere à dimensão de polidez, dispõem de poucos recursos. Nenhum deles, por exemplo, está familiarizado com a expressão por obséquio, manifestando mesmo estranhamento em relação a ela. Curiosa foi a dificuldade de todos eles de transformarem em polida a expressão Desembucha logo! Muitos deles apenas acrescentaram, ao final do enunciado, a expressão por favor, do que resultou Desembucha logo, por favor. Na direção oposta, entretanto, quando solicitados a adequarem a fala polida de uma mulher que acabara de ser assaltada à situação de estresse e revolta em que se encontrava (Na frase-estímulo, ela dizia: Por favor, senhor ladrão, queira fazer o obséquio de devolver minha bolsa!) todos eles o fizeram muito bem. Pensamos que esse pode ser um indício interessante de diferenças culturais, já que, na sociedade de cultura escolar letrada, são mais comumente utilizados os recursos de salvar a face. Nas notas de campo, encontramos o seguinte comentário:

Em relação à questão três, podemos dizer que os alunos captaram a intenção do exercício e a situação colocada em questão. Assim sendo, adequaram a fala da mulher que pedia ajuda. Ressalto a facilidade dos alunos para tornarem a fala cordial em menos cordial, mas a dificuldade de realizar o contrário, principalmente por não terem tantos recursos. Visto por outro olhar, em outra nota de campo: Parece-nos que as crianças do sexto ano reconhecem a existência da variação linguística, e aqui foco na adequabilidade, na cortesia, mas não a usam em seu dia a dia. É como se os padrões fossem outros: o que eles usam como mais educado é diferente do que imaginamos. De qualquer modo, concluímos, relativamente a essa categoria, a necessidade de ampliar competências dos alunos em ambas as séries, principalmente no que se refere aos modalizadores de todos os tipos. Atividades nesse sentido foram oferecidas nas sessões subsequentes, sempre procurando preservar o reconhecimento da legitimidade dos diferentes padrões culturais e linguísticos, mas apontando para a vantagem da ampliação de competências. Antes de encerrar essa seção, transcrevemos dois trechos de nota de campo referentes ao 5º e ao 6º anos respectivamente, apontando, para o contraponto que já se havia percebido entre as duas salas pesquisadas: Em relação a essa turma [5º ano], podemos dizer que ainda não desmereceram, nem deixaram de acreditar no poder da adequação e apresentam muita vontade de aprender a se adequar. E mais à frente, nas notas do 6º ano: Percebemos que a turma em questão não acredita mais na força da educação, da polidez, dos recursos de adequação da fala do falante. Percebemos que, de tão marcados pela escola e pela vida, já não veem mais a adequação linguística como recurso relevante. 2. CONCLUSÕES A efetivação dessa parte da pesquisa que ora apresentamos permitiu-nos algumas conclusões parciais, apontando para a importância da continuação deste trabalho. a) Os alunos da sala de 5º ano em que se desenvolveram as sessões da pesquisa-ação mostraram-se seguros de sua competência linguística, mesmo havendo entre eles um falante da variedade rural; em contraposição, os alunos do 6º ano já declaram que

falam errado e que a disciplina Português na escola serve para ensiná-los a falar direito, sugerindo a presença da pressão escolar na construção do preconceito linguístico. b) É possível que esse momento em que se dá a passagem do segundo para o terceiro segmento do ensino fundamental no Brasil, com as alterações na rotina escolar seja, por razões que devem ainda ser investigadas, aquele em que se inicia, no aluno, o processo de construção de crenças negativas sobre sua variedade vernacular. c) Quanto aos primeiros sinais indicadores desse fenômeno, acreditamos tê-los entrevisto na expressão espontânea dos alunos sobre suas crenças em relação à sua representação como falantes competentes/incompetentes da língua portuguesa. d) As estratégias pedagógicas propostas aos alunos, segundo os princípios da Sociolinguística, de acordo com os quais a língua é heterogênea e, portanto, todas as variantes são legítimas, tiveram, ao que tudo indica, efeito positivo, tanto nos alunos do 5º ano quanto nos do 6º, sugerindo, que a vertente etnográfica dos estudos sociolinguísticos fornece parâmetros adequados para o trabalho escolar com a língua materna. A continuação da pesquisa, obviamente, fornecerá subsídios mais seguros para essa conclusão. e) Os dados da pesquisa sugerem também que é possível desenvolver, na escola, estratégias pedagógicas para a educação linguística dos alunos, familiarizando-os com a variedade culta da língua, sem que isso implique na desqualificação da cultura vivenciada em seu meio social, ainda que diferente da cultura escolar letrada. Desse modo, seria possível praticar na escola o bidialetalismo, segundo sugerem os especialistas da sociolinguística educacional (BORTONI-RICARDO, 1992). Essas conclusões levam-nos a ressaltar a importância de se praticar, na escola, uma pedagogia culturalmente sensível, que parta das experiências culturais e linguísticas dos alunos, preservandoas, ao mesmo tempo em que os capacita a monitorarem seu estilo, adequando-o às condições de produção. Acreditamos que, dessa forma, o contato dos alunos com o trabalho formal com sua língua materna, que acontece na escola, deixará de ser uma experiência dolorosa e desanimadora. Esta afirmação não se aplica apenas aos alunos das escolas públicas, provenientes, em geral, de comunidades de falantes de variedades linguísticas menos prestigiadas socialmente. Também os alunos que pertencem a grupos sociais usuários de dialetos que mais se aproximam da variedade

culta sofrem preconceito, quando são avaliados em sua fala espontânea, naturalmente caracterizada por um léxico particular e uma sintaxe não totalmente casada com as normas escolares tradicionais. Também nesse caso, há que se utilizar uma pedagogia culturalmente sensível que reconheça a legitimidade desse uso espontâneo da língua, tanto na modalidade oral quanto na escrita. Somente a partir daí fará sentido o processo de expansão de competência, levando o aluno a ser capaz de transitar pelo contínuo de variações, compreendendo a especificidade dos usos orais e escritos, dos estilos mais ou menos monitorados e das variedades rural/rurbana/urbana, segundo já ficou esclarecido nos estudos da Sociolinguística relativos ao português do Brasil (BORTONI- RICARDO, 2004, 2005). Consideramos que a educação bidialetal, garantindo a autonomia do sujeito como falante de sua língua materna, opera também o reconhecimento das diferentes culturas de letramento que enriquecem a comunidade escolar. É função da escola, como esclarece Rojo (2009, p. 52), [...] estabelecer a relação, a permeabilidade entre as culturas e letramentos locais/globais dos alunos e a cultura valorizada que nela circula ou pode vir a circular. Esse talvez seja, inclusive, um caminho para a superação do insucesso escolar e da exclusão social. Acreditamos ainda que preservar, na consciência do aluno, a legitimidade dos usos linguísticos de sua comunidade familiar, social, de grupo, lhe garante também a possibilidade de sua realização não como um ser isolado, mas como sujeito pleno, integrado em valores ideológicos que podem não ser os da escola, mas devem ser respeitados. Se a palavra, como diz Bakhtin (1979, p. 17), veicula, de maneira privilegiada, a ideologia, na qual se refletem as transformações sociais, ela serve como indicador das mudanças. A língua, expressando, portanto, as lutas sociais tem que ser tratada como expressão legítima dos sujeitos. Esse parece ser o sentido do que diz SILVA (2008, p. 63): A linguagem, na concepção bakhtiniana, é plural. Tal característica da linguagem ser plural descarta qualquer possibilidade de hegemonia de uma linguagem única, poderosa, dona da verdade, em detrimento de outras variedades. Ela rejeita o engessamento do pensamento e, consequentemente, da linguagem e da língua cujo centro de gravidade não reside na conformidade de uma norma ou subjetividade. Ao iniciarmos este artigo, indicamos outro título possível para ele: A linguagem na escola: como vencer esse obstáculo? Acreditamos que a perspectiva sociolinguística no tratamento escolar da língua materna possa contribuir para que o trabalho com a linguagem deixe de ser uma

obrigação dolorosa e pouco rentável, transformando-se numa aventura desafiadora e extremamente produtiva. REFERÊNCIAS BAGNO, Marcos. Português ou brasileiro? : um convite à pesquisa São Paulo : Parábola, 2001.. Preconceito linguístico. São Paulo : Loyola, 2001. BAKHTIN, Mikhail (VOLOCHINOV, V. N.). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1979. BORTONI-RICARDO, Stella Maris. Educação bidialetal: O que é? É possível? Revista Internacional de Língua Portuguesa, n.7, p. 54-65, jul. 1992..Educação em língua materna: a sociolingüística na sala de aula. São Paulo: Parábola, 2004.. Nós cheguemu na escola, e agora? São Paulo: Parábola, 2005.. O professor pesquisador: introdução à pesquisa qualitativa. São Paulo: Parábola, 2008. BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. 6 ed. São Paulo: Perspectiva, 2002. (A primeira edição é de 1930). CYRANKA, Lúcia Furtado de Mendonça. Atitudes linguísticas de alunos de escolas públicas de Juiz de Fora-MG. 2007. Tese (Doutorado em Linguística)_Universidade Federal Fluminense, Instituto de Letras, Niterói, 2007. Orientadora: Cláudia Roncarati. FRANCHI, Eglê. Redação na escola: E as crianças eram difíceis. São Paulo: Martins Fontes, 1984. GNERRE, Maurizio. Linguagem, escrita e poder. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1994. KEMMIS, S.; MC TAGGART, R. (Eds.). The Action Research Planner. Melbourne: Deakin University, 1988. LABOV, William. Language in the inner city. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1972.. Estágios na aquisição do inglês standard. Trad. Luiza Leite Bruno Lobo. In: FONSECA, Maria STELLA. V.; NEVES, Moema F. (Org.). Sociolinguística. Rio de Janeiro, Eldorado, 1974. p. 49-85. LEITE, Yonne; CALLOU, Dinah. Como falam os brasileiros. Rio de Janeiro: Zahar, 2004. MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia. O português são dois: novas fronteiras, velhos problemas. São Paulo: Parábola, 2004. MOLLICA, Maria Cecília. Influência da fala na alfabetização. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2000.

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