Apelação Cível n. 0309776-59.2015.8.24.0008 Relator: Desembargador Marcus Tulio Sartorato PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE CONTRATO DE HONORÁRIOS. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM EXAME DO MÉRITO POR FALTA DE REQUISITO À CONSTITUIÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO. ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. REQUISITO INAPLICÁVEL. EFICÁCIA EXECUTIVA ATRIBUÍDA PELA LEI. EXEGESE DOS ARTS. 24, LEI 8.906/94 - EAOAB C/C 585, VIII, DO CPC/1973. SENTENÇA ANULADA. RECURSO PROVIDO. "A ausência de duas testemunhas tampouco macula a validade do contrato de honorários advocatícios, nem lhe retira eventual força executiva. A exigência constante da regra geral do inciso II do art. 585 do CPC não se aplica ao contrato escrito de honorários advocatícios, por ser este regido pelas disposições especiais do art. 24 do EAOAB, c/c o art. 585, VIII, do CPC." (REsp 1070661/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 05/12/2013, DJe 15/08/2014) Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 0309776-59.2015.8.24.0008, da comarca de Blumenau 5ª Vara Cível em que é Apelante Nirceia Regina Lopes e Apelados Sara Salete Kuhlmann e outro. A Terceira Câmara de Direito Civil decidiu, por unanimidade, dar provimento ao recurso para anular a sentença, determinando-se o retorno dos autos à origem para instrução do feito. Custas legais. Participaram do julgamento, realizado nesta data, com votos vencedores, a Exma. Sra. Des.ª Maria do Rocio Luz Santa Ritta e o Exmo. Sr. Des. Saul Steil. Presidiu a sessão o Exmo. Sr. Des. Fernando Carioni. Florianópolis, 14 de novembro de 2017.
Desembargador Marcus Tulio Sartorato Relator
RELATÓRIO Adota-se o relatório da sentença recorrida que é visualizado à fl. 18, por revelar com transparência o que existe nestes autos, in verbis: Cuido de execução por quantia certa promovida por Nircéia Regina Lopes contra Sara Salete Kuhlmann e Ana Rita Obregon Martins. Requereu a parte exequente o pagamento da dívida referente ao inadimplemento do contrato de prestação de serviços advocatícios entabulado entre as partes. Juntou documentos. Vieram-me então conclusos. O MM. Juiz de Direito, Dr. Sérgio Agenor de Aragão, decidiu a lide nos seguintes termos (fl. 20): Ex positis, JULGO EXTINTO O FEITO, sem análise de mérito, por indeferimento da exordial e por ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, por inexistência de título executivo extrajudicial, nos termos dos arts. 267, I e IV, art. 295, V, art. 618, I, todos do CPC. Porquanto não angularizada a relação processual, deixo de condenar a parte exequente ao pagamento da verba honorária em favor do procurador da parte contrária. Condeno-a, contudo, ao pagamento de eventuais custas processuais. Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação (fls. 25/43), no qual assevera a validade do contrato de honorários e a desnecessidade da assinatura de 2 (duas) testemunhas para que tenha eficácia de título executivo extrajudicial, a qual decorre automaticamente do art. 585 do CPC/1973 c/c art. 24 da Lei n. 8.906/94. Pede, ao fim, a anulação da sentença com o prosseguimento da execução. Em contrarrazões, os réus pugnam o desprovimento do recurso (fls. 84/91).
VOTO Aplica-se à hipótese o Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da publicação da sentença. No caso em voga, a autora move a presente ação executiva de contrato de honorários advocatícios em face das rés, sob a alegação de que prestou serviços jurídicos pendentes de pagamento. Acostou o instrumento contratual denominado "Contrato Particular de Prestação de Serviços Advocatícios" às fls. 7/9, assinado pelas contratantes, contratada e fiadores, mas sem assinatura de testemunhas. Justamente pela falta da assinatura das testemunhas, entendeu o magistrado de piso que faltou requisito essencial à constituição do título executivo, forte no inciso II do art. 585 do Código de Processo Civil, in verbis: "a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas [...]", em função do que julgou extinto o feito sem resolução do mérito. A respeito dos títulos executivos hábeis à deflagrar a execução extrajudicial, o art. 585 do aludido diploma processual dispõe: Art. 585. São títulos executivos extrajudiciais: [...] VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva. Em relação ao contrato de honorários advocatícios, aplicável o art. 24, caput, da Lei n 8.906/94 (Estatuto da OAB): Art. 24. A decisão judicial que fixar ou arbitrar honorários e o contrato escrito que os estipular são títulos executivos e constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial. Infere-se que a eficácia executiva do contrato de honorários emana do próprio texto legal, tornando-o instrumento hábil à deflagração de ação de execução.
Não é outro o entendimento da Corte da Cidadania: RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CONTRATO ESCRITO. INEXISTÊNCIA DE FORMA PRESCRITA OU DEFESA EM LEI. FORMA EPISTOLAR. VALIDADE. FORÇA DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL. POSSIBILIDADE (LEI 8.906/94 - EAOAB, ART. 24, C/C ART. 585, VIII, DO CPC). AUSÊNCIA DE TESTEMUNHAS NO CONTRATO. IRRELEVÂNCIA. INAPLICABILIDADE DA REGRA GERAL DO INCISO II DO ART. 585 DO CPC. PREVALÊNCIA DE REGRA ESPECIAL (EAOAB, ART. 24). [...] 1. A Lei 8.906/94 - Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil - EAOAB, em seu art. 24, dispõe que o contrato escrito estipulando honorários advocatícios é título executivo. Por sua vez, o contrato escrito pode assumir diferentes formas de apresentação, pois não há, na lei, forma prescrita ou defesa, nem exigência de requisitos específicos. [...] 4. A ausência de duas testemunhas tampouco macula a validade do contrato de honorários advocatícios, nem lhe retira eventual força executiva. A exigência constante da regra geral do inciso II do art. 585 do CPC não se aplica ao contrato escrito de honorários advocatícios, por ser este regido pelas disposições especiais do art. 24 do EAOAB, c/c o art. 585, VIII, do CPC. [...] (REsp 1070661/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 05/12/2013, DJe 15/08/2014) Na mesma esteira, deste Sodalício: EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CLÁUSULA DE SUCESSO. PORCENTAGEM A SER PERCEBIDA SOBRE VALOR EFETIVAMENTE REDUZIDO A TÍTULO DE DÉBITOS TRIBUTÁRIOS. PARCIAL PROCEDÊNCIA. APELO DO EXECUTADO. [...] TÍTULO EXECUTIVO. CERTEZA, LIQUIDEZ E EXIGIBILIDADE MANIFESTAMENTE DEMONSTRADAS. O contrato de honorários advocatícios constitui o título extrajudicial do art. 585, inciso II, do CPC, ainda que indeterminadas as testemunhas, uma vez que, mediante interpretação conjunta ao art. 24 da Lei nº 8.906/98, ante o caráter de crédito privilegiado, prescinde de tal requisito para embasar feito executivo. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação Cível n. 0002910-59.2011.8.24.0005, de Balneário Camboriú, rel. Des. Gilberto Gomes de Oliveira, j. 20-04-2017). APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ALEGADA AUSÊNCIA DE EXIGIBILIDADE DO TÍTULO. INTELIGÊNCIAS DOS ARTIGOS 24 DA LEI 8.906/94 C/C O ARTIGO 585, VIII, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. CONTRATO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS QUE POSSUI FORÇA DE TÍTULO
EXECUTIVO. DISPENSABILIDADE DA ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. [...] I - Segundo os ditames do artigo 24 da Lei 8.906/94 c/c os disposto no artigo 585, VIII, do Código de Processo Civil, o contrato de honorários advocatícios, por si só, consubstancia-se em título executivo extrajudicial, fato este que prescinde de assinatura de duas testemunhas. [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2012.051297-3, de Criciúma, rel. Des. Joel Figueira Júnior, j. 15-04-2014). APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS DO DEVEDOR. EXECUÇÃO DE CONTRATO DE HONORÁRIOS DE ADVOGADO. SUBSTABELECIMENTO. DESNECESSIDADE DE FORMAÇÃO DE LITISCONSÓRCIO. PRESCINDIBILIDADE DE ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS. TÍTULO HÍGIDO. [...] São títulos extrajudiciais os elencados nos incisos do art. 585 do Código de Processo Civil, bem assim aqueles que "[...] a lei atribuir força executiva" (inc. VIII). Logo, incidente à hipótese o conteúdo do 24 da Lei 8.906/94, que dispensa a assinatura de duas testemunhas, ao contrário do estipulado na Lei nº 4.215/63 (antigo EOAB) [...] (Apelação Cível n. 2009.060137-3, de Lages, rel. Des. Henry Petry Junior, j. 25-5-2010). [...] (TJSC, Apelação Cível n. 2009.067929-7, da Capital, rel. Des. Stanley da Silva Braga, j. 13-06-2013). APELAÇÃO CÍVEL - EMBARGOS À EXECUÇÃO - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ADVOCACIA - AUSÊNCIA DA ASSINATURA DE DUAS TESTEMUNHAS - AJUSTE QUE, AINDA ASSIM, CONSTITUI HÁBIL TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL - EXEGESE DO ART. 24 DA LEI Nº 8.906/94 - EXCESSO DE EXECUÇÃO INEXISTENTE - SERVIÇOS PRESTADOS ADEQUADAMENTE - DIREITO DE OPOR EMBARGOS À EXECUÇÃO QUE EQUIVALE À GARANTIA CONSTITUCIONAL DO CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA - INTENTO PROTELATÓRIO NÃO EVIDENCIADO - ATO ATENTATÓRIO À DIGNIDADE DA JUSTIÇA TAMPOUCO CONFIGURADO - AFASTAMENTO DA PENA APLICADA - APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. "O art. 24 da Lei nº 8.906/94 não exige a assinatura de duas testemunhas para que o contrato de honorários seja considerado título executivo" (STJ-REsp nº 226.998/DF, rel. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Julgado em 03/12/1999). (TJSC, Apelação Cível n. 2008.049529-6, de Blumenau, rel. Des. Luiz Fernando Boller, j. 21-06-2012). Conclui-se, pois, que houve equívoco na extinção precoce do feito com fulcro na invalidade do título executivo imputada à falta da assinatura de 2 (duas) testemunhas, haja vista a inexistência desse requisito para lastrear a respectiva execução. Dessarte, como sequer angularizada a relação processual na
origem, com a citação dos executados para o pagamento do alegado débito ou apresentação de embargos (art. 621, CPC), impõe-se a anulação do feito desde a sentença, inclusive, a fim de que se prossiga sua regular tramitação. Ante o exposto, vota-se no sentido de dar provimento ao recurso para anular a sentença, determinando-se o retorno dos autos à origem para instrução do feito.