PALAVRAS-CHAVE: ecossistema de manguezal, beneficiamento, economia regional, caranguejo, resíduos.

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Transcrição:

IDENTIFICAÇÃO DAS PROBLEMÁTICAS ASSOCIADAS A AUSÊNCIA DE GERENCIAMENTO ADEQUADO DO RESÍDUO DA ATIVIDADE DE CATAÇÃO DO CARANGUEJO UÇÁ (UCÍDES CORDATUS), BRAGANÇA-PA Bruna Silva dos Santos (*), Thalita de Paula Brito Santos 2, Glorgia Barbosa de Lima de Farias 3 * Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnologia do Pará Campus Bragança. brunasantosifpa2015@gmail.com RESUMO Os manguezais são berçários ecológicos de várias espécies, neles animais reproduzem-se, crescem e se alimentam, desde macro invertebrados até mamíferos. A grande riqueza contida nos manguezais, faz com que esse ecossistema seja estudado por muitos pesquisadores, que em um conjunto de estudos mostram o qual importantes são os mangues para os animais e populações. A região norte do país, especificamente nordeste do Pará, no município de Bragança, esse ecossistema se faz presente em uma grande área, que em 2005 se tornou a Reserva Extrativista Marinha Caeté- Taperaçu, uma RESEX de desenvolvimento sustentável que gera renda para muitas famílias e empresas de forma direta ou indireta, ou seja, desde o tirador até as empresas fabricantes de utensílios de pesca ou de exportação de pescado. As relações sociais, ambientais e econômicas serão discutidas nesse trabalho, tendo como ponto principal o gerenciamento dos resíduos provenientes do beneficiamento do caranguejo Ucides Cordatus, uma das espécies principais da economia regional. A pesquisa mostra-se necessária pela falta de estudos científicos sobre a temática do resíduo proveniente de uma cadeia produtiva que basicamente ocorre em toda costa brasileira. Tem como objetivos a análise do gerenciamento dos resíduos proveniente do beneficiamento do caranguejo e a identificação dos impactos socioeconômicos e ambientais gerados da destinação final dos resíduos. Através de pesquisas bibliográficas, visitas técnicas e entrevistas pode-se fazer comparações sobre o que é estabelecido na legislação e a realidade existente na comunidade do Treme. PALAVRAS-CHAVE: ecossistema de manguezal, beneficiamento, economia regional, caranguejo, resíduos. INTRODUÇÃO O Brasil é o pais que apresenta a maior faixa continua de manguezal do planeta. Os ecossistemas de manguezais localizam-se em áreas tropicais, formam-se entre os meios terrestre e aquático e são considerados berçários ecológicos de várias espécies. Sua flora não apresenta grande diversidade de espécies, porém as que o habitam possuem grande adaptabilidade para viver em um solo mole e em uma água com altas concentrações de sal. O manguezal é moradia, área de reprodução, desenvolvimento e alimento para muitas espécies (RODRIGUES et al., 2000). Para aqueles que habitam em seu espaço territorial, ou seja, animais que vivem em águas doces, salobras ou salgadas e que de acordo com o regime de marés nele são encontrados, ou para mamíferos, aves e jacarés que o utilizam em períodos determinados. SILVA et al (2003) em seu estudo relata que, a região norte brasileira concentra 20% da área de ecossistema de manguezal do país, e que a falta de planejamento na gestão desse sistema faz com que em várias regiões do planeta as florestas de manguezal estejam sendo degradadas. Os manguezais paraenses são áreas protegidas por restingas, apresentam estuários ricos em diversidade de peixes, aves, crustáceos e moluscos, é um ecossistema que proporciona diversas e contínuas atividades pesqueiras, que beneficiam comunidades ribeirinhas (COSTA et al,2013) e empresas. Há também a extração de madeira, remédios e tinturas, essas ações antrópicas causam a supressão e degradação do ecossistema (TERCEIRO et al., 2013) No brasil para conter as atividades antrópicas sobre o meio ambiente, foi instituído pela Lei n 9.985, de 18 de julho de 2000, o SNUC ( Sistema Nacional de Unidades de Conservação ) com o intuito de proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de unidades de conservação de diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos, integrando as diferentes atividades de preservação da natureza, uso sustentável dos recursos naturais e restauração e recuperação dos ecossistemas. O capitulo III desta lei, caracteriza os tipos de UCs, em Unidades de Proteção Integral e Unidades de Uso Sustentável. O SNUC permitiu a criação da reserva extrativista marinha Caeté-Taperaçu, na região nordeste do Pará em 2005, a unidade abrange 42.489,17 hectares (ICMBIO, 2017). A cidade de Bragança está dentro dos limites da RESEX, localizada às margens do rio Caeté e onde se encontra a associação ASSUREMACATA responsável juntamente com o ICMBIO pela gestão da unidade. IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais 1

A comercialização de recursos pesqueiros movimenta a economia regional, é fonte de renda para muitas famílias e empresas. Dentre as espécies mais comercializadas destaca-se o caranguejo Uçá (Ucides Cordatus) um dos recursos mais explorados em toda a zona costeira do país. A captura e catação é considerada uma das atividades mais antigas no Brasil, de elevado valor socioeconômico, sendo um importante recurso pesqueiro (SANTOS et al, 2013). As comunidades tradicionais têm um grande papel na economia regional e na gestão da UC, já que a gestão é compartilhada, para que haja participação de todos. A comunidade estudada (comunidade do treme) não está inserida territorialmente na reserva extrativista marinha Caeté-Taperaçu, porém é atuante na gestão da unidade, já que a renda da maioria das famílias da comunidade é proveniente do manguezal. Então o presente trabalho tem como intuito entender mais a fundo a última etapa da cadeia produtiva do caranguejo Uçá, ou seja, a destinação final dos resíduos da carapaça do caranguejo. Por haver elevada procura e preocupação com esse recurso de importância socioeconômica e ecológica, o governo estadual institui decretos, resoluções e lei, para a regulamentação da captura, beneficiamento, transporte e venda do caranguejo Uçá. Visando regulamentar os trabalhadores, melhorar a salubridade da produção de massa e pata de caranguejo e agregar valor ao produto, que atualmente é referência de qualidade e possibilitando melhor qualidade de vida para os tiradores, catadores, atravessadores e público consumidor. OBJETIVOS OBJETIVO GERAL O trabalho objetiva conhecer a relação entre a sociedade e o meio ambiente no que tange a atividade de catação do caranguejo e analisar as implicações da ausência de gerenciamento dos resíduos do beneficiamento na comunidade estudada. OBJETIVOS ESPECÍFICOS - Analisar o gerenciamento dos resíduos proveniente do beneficiamento do caranguejo. - Identificar os impactos sociais, econômicos e ambientais gerados da destinação final dos resíduos. METODOLOGIA O artigo trata das relações existentes entre o homem e a natureza, principalmente na importância do ecossistema de manguezal para comunidades tradicionais. Segundo Marx, (...) o trabalho é, num primeiro momento, um processo entre a natureza e o homem, processo em que esse realiza, regula e controla por meio da ação, um intercâmbio de materiais com a natureza. O estudo foi realizado na comunidade do Treme e no lixão municipal da cidade de Bragança- Pa, buscando entender mais a fundo os laços sociais, econômicos e ambientais estabelecidos a gerações, pelos moradores dos arredores da reserva extrativista marinha Caeté-Taperaçu. A pesquisa se dividiu em três momentos, no primeiro foram efetuadas pesquisas bibliográficas sobre o tema para a fundamentação teórica, para isso foram utilizados livros, artigos, revistas cientificas e sites na internet; sobre as temáticas, ecossistema de manguezal, legislação aplicada, beneficiamento, resíduos, impactos ambientais e economia regional. Houveram três visitas técnicas que ocorreram em dias distintos, cada uma com uma finalidade. A primeira foi para observação e identificação da problemática, posteriormente houve a segunda visita técnica para obtenção de registros fotográficos do local mais afetado pela falta de gerenciamento dos resíduos originados da catação do caranguejo; na última visita à comunidade do Treme foram feitas entrevistas não formais com moradores e com o senhor Pedro, atual presidente da associação de tiradores e catadores de caranguejo da comunidade. A análise dos resultados foi feita com base na legislação aplicada a temática da pesquisa, bem como nas entrevistas e visitas técnicas realizadas. Posteriormente, e com base nas pesquisas bibliográficas foram feitas proposições de medidas a serem adotadas pela comunidade com vista ao melhor gerenciamento dos resíduos da atividade. Outras etapas metodológicas que ainda irão acontecer, que possibilitaram uma análise integrada das relações sociais, econômicas e ambientais da cadeia produtiva do caranguejo Uçá na comunidade do Treme. A partir de estudos específicos de cada etapa de produção, não somente a respeito à forma de produção, mas também todas as relações dos moradores com o ecossistema de manguezal e seus conhecimentos adquiridos. 2 IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais

RESULTADOS A comunidade do Treme não faz parte da área territorial da Reserva Extrativista Marinha Caeté-Taperaçu, porém segundo o presidente da associação de tiradores e catadores, a comunidade sente-se parte da reserva principalmente pela proximidade e por haver grande área de mangue, por isso a função da unidade de conservação é incorporada pela comunidade que busca a sustentabilidade da cadeia produtiva, o desenvolvimento econômico regional e a redução da pobreza. Além disso, há grande preocupação dos moradores com a capacitação de jovens e adultos, como medida para a diminuição da venda e consumo de drogas na comunidade, fato notado nas entrevistas. A economia regional Bragantina tem como um de seus protagonistas o caranguejo uçá (Ucídes Cordatus), comercializado na região de várias formas, estando a espécie viva e amarrada em peras ou cambadas, em unidade ou catados e embalados. A atividade de catação do caranguejo é fonte de renda e subsistência para muitas famílias. Segundo Costa et al (2013) a atividade de catação do caranguejo é passada de geração em geração, e é iniciada ainda na infância, o que remete a sérios problemas sociais, especialmente no que se refere a educação e na ausência de conhecimentos acerca dos direitos e deveres de cada cidadão, tanto no que se refere aos cuidados com o meio ambiente, como a compreensão acerca do valor do trabalho. A cadeia produtiva do caranguejo uçá engloba vários indivíduos, sendo eles pessoas físicas, como pescadores (tiradores), atravessadores, catadores (as), e o consumidor final, ou pessoas jurídicas, como fábricas e consumidor final (empresas). A visita de campo permitiu observar como se dão as relações dentro da cadeia produtiva da atividade estudada. Notou-se que: o tirador (a) pode tanto capturar o caranguejo, como catar e comercializar, sem o auxílio do atravessador ou de uma fábrica; no entanto a fábrica depende do tirador (a) e do catador (a) para beneficiamento da massa e da pata do caranguejo. Para melhor entender sobre a complexidade das interações ocorridas na cadeia produtiva do caranguejo uçá, foi utilizada a Lei n 11.959/2009, que dispõe da Política Nacional do Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca, que apesar de não ser especifica para a atividade, pode ser aplicada à mesma, já que foi formulada, coordenada e executada com o objetivo de promover o desenvolvimento sustentável da pesca e da aquicultura como fonte de alimentação, emprego, renda e lazer, garantindo-se o uso sustentável dos recursos pesqueiros, bem como a otimização dos benefícios econômicos decorrentes, em harmonia com a preservação e a conservação do meio ambiente e da biodiversidade. Para pôr tudo em prática a classe trabalhadora que vive da comercialização do caranguejo tem se organizado em associações e cooperativas com o propósito de melhoria da metodologia do trabalho, do bem-estar e da cidadania do trabalhador e para a preservação e conservação do manguezal, fonte de renda de comunidades e empresas da região. A Associação dos Usuários da Reserva Extrativista Marinha Caeté-Taperaçu (ASSUREMACATA) é responsável pelo cadastro dos usuários da reserva, por ministrar e organizar palestras e outras ações. Segundo o art. 3, inciso I, do Decreto nº 2.020, de 24 de janeiro de 2006, que dispõe da Politica Pesqueira e Aquícola no Estado do Pará, a gestão da UCs no estado, deve ser gestões compartilhadas, que consiste na divisão de responsabilidades entre as instituições do Poder Público, nas diferentes esferas de governo, e a sociedade civil organizada do setor. No que se refere ao planejamento e à execução de programas e projetos com vistas ao desenvolvimento da pesca, como a bolsa verde no período do defeso. De acordo com a Lei n 11.959/2009, o período do defeso corresponde a paralização temporária da atividade da pesca, com vistas a promover a preservação da espécie, tendo como motivação a reprodução da mesma. A Lei Estadual n 6.082, de 13 de novembro de 1997, dispõe sobre a criação do Programa de Preservação do Caranguejo-Uçá, com o objetivo de preservar o recurso através da conscientização de famílias e comunidade. Porém a falta de fiscalização na unidade bragantina, faz com que não sejam obedecidas as leis estabelecidas. A pesca do caranguejo uçá é uma profissão muito exercida pelos cidadãos da comunidade do Treme, tanto para a subsistência das famílias, quanto para a comercialização. Além das relações existentes entre ambos, nota-se também que o manguezal e os seus recursos naturais apresentam valor imaterial para os indivíduos entrevistados, uma vez que desde sua infância os mesmos estão inseridos em grupos sociais que vivem dos recursos naturais do mangue, cenário expresso na cultura dos povos tradicionais, em forma de artesanatos, lendas, festas (festival do caranguejo) e na culinária (caranguejo, peixe, sururú, turú). IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais 3

Durante a visita técnica foram identificadas duas empresas pesqueiras na comunidade, a Filé do Mangue (Figura 01) e a Milly Pescados (Figura 02) ambas trabalham com a massa e com a pata do caranguejo, comprando e beneficiando o caranguejo. Nas entrevistas muitos moradores declararam que o beneficiamento não é feito nas instalações das empresas, pelo fato das catadoras não se adaptarem aos métodos de produção, já que a catação do caranguejo faz parte das tarefas domiciliares, isso implicou na falta de mão de obra para as empresas. Muitos moradores relataram que a catação continua sendo domiciliar e as empresas compram o pescado já catado e em suas instalações o embalam, sendo que as fábricas afirmam o contrário. Figura 1: Fábrica Filé do Mangue. Fonte: Silva e Santos (2017). Figura 2: Fábrica Milly Pescados. Fonte: Silva e Santos (2017). A resolução do COEMA n 20, de 26 de novembro de 2002, estabelece que a captura, beneficiamento e transporte de caranguejos machos somente será permitida com a medida de 7 cm, medido pela parte mais estreita do dorso dos indivíduos (cefalotórax). A comercialização das fêmeas da espécie Ucides Cordatus não é permitida, para que haja a preservação da espécie. Segundo Ogawa et al. (2008), o processamento do caranguejo segue uma ordem, que são, 1 lavagem, em seguida a máquina SIAC imobiliza os animais com a aplicação de pulsos elétricos, 2 lavagem, Cocção, Resfriamento, Extração da carne, Inspeção, Pesagem, Embalagem, Pasteurização, Resfriamento, Congelamento e estocagem, porém o beneficiamento do caranguejo na comunidade do Treme, principalmente a produção domiciliar não apresenta e sengue os mesmos passos de produção. O beneficiamento do caranguejo é feito de forma simples, no Diário Oficial nº. 31805 de 06/12/2010 no Art. 1º Aprova as normas que dispõem sobre o processamento e comercialização de massa de caranguejo artesanal; já o Art. 2 diz que a elaboração de massa de caranguejo artesanal, sob a forma artesanal e em pequena escala, é permitida exclusivamente aos empreendedores extrativistas familiares, e/ou suas representações coletivas. 4 IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais

Os resíduos gerados do beneficiamento do caranguejo Uçá são a carapaça, vísceras e carnes residuais, eles eram e ainda são jogados em terrenos baldios, por não haver um plano de gerencialmente de resíduos na comunidade. Em função disso, existe um lago (Figura 03) que está contaminado e eutrofizado devido à disposição inadequada desse resíduo e de resíduos domiciliares. Figura 3: lago eutrofizado. Fonte: Silva e Santos (2017). O lago foi assoreado com restos de matérias de construção civil por máquinas da prefeitura municipal, para tentar conter o odor do lago e também para diminuir o seu tamanho. Em conversas com os moradores das proximidades do lago, os mesmos não souberam responder se a solução adotada pela prefeitura municipal era a mais adequada, logo nota-se que ocorre falta de informação e de orientação para esses indivíduos, no sentido em que os mesmos não compreendem que essa situação gera perda de biodiversidade na área e que causa atração de vetores de doenças. Segundo o Artigo 3, inciso III, da Lei 6.938/81, o que ocorre nesse lago é configurado como poluição, ou seja, degradação da qualidade ambiental que gera, prejuízos a saúde, a segurança e o bem-estar da população; cria condições adversas às atividades sociais e econômicas; afeta desfavoravelmente a biota; afeta as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente, além de lançar matérias ou energia em desacordo com os padrões ambientais estabelecidos. O município não possui um plano de gestão de resíduos, a maior parte dos resíduos do município de Bragança é destinado ao lixão. Nele são encontrados lixos hospitalares, orgânicos, plástico, metal e papel. O resíduo do beneficiamento do caranguejo é coletado pelo sistema de coleta público, misturado com outros resíduos, assim como descrito pelos entrevistados. A carapaça, vísceras e carnes residuais do caranguejo para os moradores é como o lixo domiciliar e para que não haja mais o acúmulo nos quintais das residências e em terrenos baldios a melhor destinação seria o lixão. Os resíduos orgânicos gerados pelas empresas de alimento (carne vinda de matadouros e fábricas de filetação de peixe) da cidade são levados nos caminhões das empresas que os produzem, e depositados em montes dividindo-os dos resíduos domésticos, porém os restos da produção domiciliar da massa de caranguejo têm sua destinação final como qualquer outra matéria orgânica, que além de produzir um odor forte e atrair vetores de doenças, contamina o solo através do chorume. O aproveitamento desses resíduos tanto na comunidade quanto no lixão municipal mostra-se acessível, propiciando fins econômicos para ambos. O reaproveitamento desse material é fundamental para preservação ambiental. Para que esses resíduos voltem a natureza sem agredi-la ou para que sejam transformados em novos produtos, diminuindo o acumulo dos rejeitos, a poluição da área de disposição final, a poluição visual e os danos à saúde pública. Aos arredores do lixão vivem famílias que dependem dos resíduos recicláveis para a geração de renda, principalmente a reciclagem de papelão, metal e plástico. Além disso, alguns dos moradores utilizam restos de alimento como a carne bovina vinda de matadouros e o peixe vindo de fábricas de filétação para a sua alimentação. A melhoria da qualidade de vida dos moradores tanto da comunidade quanto do lixão pode ser revertida, já que existem técnicas de reaproveitamento da carapaça do caranguejo, seja no sistema triaxial cerâmico, na farinha de crustáceos ou na utilização em medicamentos (caranguejo pilado, polybius henslowi), gerando uma nova fonte de renda. IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais 5

CONCLUSÃO Como em muitos municípios brasileiros, Bragança não apresenta saneamento básico de qualidade, um aterro sanitário e nem um PGRS (Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos), os resíduos do beneficiamento do caranguejo, assim como os demais, não recebem a atenção devida. Existe a falta de informação, de educação ambiental e de conscientização da população. Compete ao poder público municipal, ao órgão de gestão da RESEX, ONGs e aos moradores da comunidade, mobilizase em prol da conservação do ecossistema de manguezal, da gestão da unidade (principalmente orientando a população sobre os impactos gerados pelas suas próprias ações) e do bem-estar da população. A fiscalização é de grande importância para as leis ambientais sejam cumpridas, fato não identificado na comunidade e que a própria população sente necessidade que ocorra. E para que ocorra uma restauração dos ecossistemas já afetados (lago e lixão), é necessário profissionais capacitados e o financiamento de estudos e práticas para a descontaminação. Além disso há formas mais sustentáveis de tratar os resíduos da cadeia produtiva do caranguejo, que possivelmente geraria renda extra para as famílias, preservaria o meio ambiente, livrando a população de possíveis doenças relacionadas à problemática e contribuiria para espação da economia regional. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Rodrigues, A. M. T., Branco, E. J., Saccardo, S. A., Blankensteyn, A. A Explotação do Caranguejo Ucides Cordatus (Decapoda: Ocypodidae) e o Processo de Gestão Participativa Para Normatização da Atividade na região sudeste-sul do brasil. Boletim do Instituto de Pesca, São Paulo 26 (1): 63 78, 2000. 2. Silva, R. B. C., Costa, A. C. L., Silva, L. R. G. Desenvolvimento Sustentável em Ecossistema de Manguezais. Editorial -"Educação Ambiental em Ação", 4ª. Edição, 2003. Disponível em: http://www.revistaea.org/artigo.php?idartigo=132. Acesso: 24 de agosto de 2017. 3. COSTA, J. S. P.; Bentes, A. B.; Cruz, P. A. P.; Pereira, L. J. G.; Fernandes, S. C. P.; Fontes, V. B.; LIMA, W. M. G. e Bentes, B. Produção e Socioeconomia do Sistema Caranguejo-uçá em Unidade de uso sustentável da costa norte do Brasil. Fortaleza: Arquivos de Ciência do Mar, 46 (2), 76-85, 2013 4. Terceiro, A. M., Santos, J. J. S., Correia, M. M. F. Caracterização da Sociedade, Economia e Meio Ambiente Costeiro Atuante à Exploração dos Manguezais no Estado do Maranhão. Revista de Administração e Negócios da Amazônia, v.5, n.3, set/dez. 2013. 5. Brasil. Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza SNUC (Lei n 9.985/2000). Diário Oficial da União, Brasília, 18 de jul., 2000. 6. Brasil. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO). Unidades de Conservação- Marinho, Resex Marinha Caeté-Taperaçu. Ministério do Meio Ambiente. http://www.icmbio.gov.br/portal/unidadesdeconservacao/biomas-brasileiros/marinho/unidades-de-conservacaomarinho/2107-resex-marinha-de-caete-taperacu. Acesso: 17 de agosto de 2017. 7. Santos, R. S. F., Terra, R. P. Diagnóstico da Coleta e Transporte do Caranguejo Ucides Cordatus na Comunidade de Gargaú, São Francisco de Itabapoana/ RJ. Anais IV Seminário sobre Gestão de Recursos Hídricos e V Fórum do Observatório Ambiental. Edição n 4, 2004. 8. Mark, K. O Capital. Nova York: Internacional Publishers, 1967. 9. Brasil. Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável da Aquicultura e da Pesca (Lei n 11.959/2009). Diário Oficial da União, Brasília, 29 de jun., 2009. 10. Pará. Política de Pesca e Aquicultura no Estado do Pará; (Lei nº 6.713/2005); Decreto nº 2.020/2006. Diário Oficial do Pará, 24 de jan., 2006. 11. Pará. Programa de Preservação do Caranguejo-Uçá, no Estado do Pará e dá Outras Providências (Lei n 6.082/1997). Diário Oficial do Pará, 13 de nov., 1997. 12. Conselho Estadual de Meio Ambiente (COEMA). Resolução n 20, de 26 de novembro de 2002. Estabelece o Ordenamento do Caranguejo Uçá. 13. Ogawa, M., Silva, A. I. M., Ogawa, N. B. P., Maia, E. L., Nunes, M. L. Adequações Tecnológicas no Processamento da Carne de Caranguejo. Ciênc. Tecnol. Aliment., Campinas, 28(1): 78-82, jan.-mar. 2008. 14. Pará. Decretos e Despacho. nº 31805/2010. Diário Oficial do Pará, 06 de dez., 2010. 15. Brasil. Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81). Diário Oficial da União, Brasília, 31 de ago., 1981. 6 IBEAS Instituto Brasileiro de Estudos Ambientais