GRUPO DE CONVIVÊNCIA COM DEFICIENTES VISUAIS: PRÁTICA DE ESTÁGIO



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Transcrição:

GRUPO DE CONVIVÊNCIA COM DEFICIENTES VISUAIS: PRÁTICA DE ESTÁGIO Lisiane Botelho Ferreira 1 Mara Regina Nieckel da Costa 2 RESUMO O presente artigo tem como finalidade discutir as adversidades encontradas no contexto social dos alunos deficientes visuais na escola onde atuo com a prática de estágio escolar. O Instituto Santa Luzia, escola de referência no Estado do Rio Grande do Sul na inclusão de Alunos deficientes visuais, busca, através de seus alunos, o desenvolvimento integral, oportunizando caminhos para sua inserção social. Dentre tantas atividades exercidas nesta prática de estágio, destaca-se o Grupo de Convivência que tem como finalidade propiciar um momento de interação e integração, no qual se favoreça a troca de experiências de cada um, a expressão de seus sentimentos, troca de idéias, discussão de assuntos de interesse que possam auxiliar no desenvolvimento psicossocial saudável, e o reconhecimento da sua deficiência como uma diferença, mas não como uma impossibilidade. Assim, percebe-se a evolução deste trabalho, na medida em que os alunos vêm se apropriando deste espaço para trazer seus conflitos intrapessoais que interferem no relacionamento grupal e familiar. Palavras chave: Deficiência Visual; Grupos; Integração Social. 1 Acadêmica da Faculdade de Psicologia da Ulbra/ Guaíba-RS 2 Professora e Supervisora da Faculdade de Psicologia da Ulbra/Guaíba- RS

INTRODUÇÃO Este artigo se justifica pela necessidade de proporcionar aos alunos deficientes visuais espaços de escuta e discussão de assuntos que expressem seus sentimentos e que de alguma forma favoreçam no reconhecimento de suas capacidades e no enfrentamento de suas limitações. Este projeto foi elaborado pela equipe Técnica dos setores de Psicologia e Assistência Social da Escola Santa Luzia há dois anos, proporcionando acompanhamento individual e atividades de grupo para estes alunos. E nestes encontros percebeu-se a necessidade de um espaço onde se oportunizasse uma maior integração social entre estes alunos. O Grupo de Convivência acontece semanalmente com alunos deficientes visuais dos anos iniciais do Ensino Fundamental, estes alunos são jovens e estão na fase da transformação e de aquisição primordiais para seu desenvolvimento humano, a adolescência. Nesse sentido, através do acompanhamento dos alunos nesses encontros, buscamos atender às famílias, orientando sobre a educação dos filhos, os cuidados básicos, a necessidade do estímulo positivo, o reconhecimento e identificação das potencialidades que vão além da deficiência e a importância do acompanhamento educacional permanente. Como forma de preservar a identidade os nomes utilizados neste trabalho são fictícios. GRUPO DE CONVIVÊNCIA: DEFICIÊNCIA VISUAL, INTEGRAÇÃO ESCOLAR, SOCIAL E PRÁTICA A presença de dúvidas em educadores e leigos em geral, quanto a deficiência, mostra a separação que ainda está presente em nossa cultura entre: perfeição e imperfeição, deficiência e eficiência, normalidade e anormalidade. Essas considerações influenciam e geram sentimentos de medo, tensão, ansiedade, insegurança, quando a escola recebe pela primeira vez um aluno deficiente visual. Esses sentimentos revelam atitudes negativas, conscientes ou inconscientes, de rejeição, negação, fuga ou super proteção nestes alunos (BRASÍLIA, 2004). Estes sentimentos que foram apontados pelo autor, quer sejam eles conscientes ou inconscientes, está bastante presente também na família da criança diante do ingresso desta na escola. Os pais ao participarem da primeira entrevista

de triagem feita pelo setor de psicologia da Escola, já expõem seus sentimentos de medo e insegurança ao deixarem seus filhos sob os cuidados de outros cuidadores a qual chamamos de educadores ou professores. Ainda que a Escola procurada por eles seja referência na inclusão de alunos com deficiência visual esse sentimento sempre estará presente, até que os seus próprios filhos apontem o quanto este momento esta sendo importante para o seu desenvolvimento social. Diante desta entrevista de triagem e de outras propostas de trabalho e intervenções, percebe-se a importância de termos um trabalho direcionado para estes alunos, ao qual chamamos de Grupo de Convivência. O grupo tem entre seus pressupostos que o desenvolvimento e a aprendizagem são funções da interação social. O grupo organiza um espaço em que crianças e adolescentes têm a oportunidade de conviver entre si e com adultos, ocupar diversos papéis e posições e desempenhar atividades que envolvem a aprendizagem, mas também um caráter social (MASINI, 2007). Na conjunção deste grupo são desenvolvidas diferentes atividades que promovem a aquisição de conceitos e operação com diferentes tipos de conhecimento, e seu objetivo é colaborar com o processo de inclusão escolar e social. O grupo no qual intervimos atualmente na Escola é formado por alunos do 1º ano ao 4º ano do Ensino Fundamental, no entanto, muitos destes alunos têm idade entre 10 e 14 anos, sendo este atraso escolar um fator importante a ser abordado. Para que a criança se sinta integrada ao seu contexto social, é necessário que ela seja recebida, acolhida, observada, ouvida e compreendida em suas necessidades. Essa forma de relação e comunicação estará influenciando no desenvolvimento psicoafetivo e poderá definir a maneira como a criança irá interagir com as pessoas, objetos e o meio em que vive (BRASÍLIA, 2004). Expor a criança a um ambiente desafiador, que lhe permita ter experiências em situações novas em constante problematização, sendo mediado pelo educador, proporcionando a possibilidade de falar, discutir e questionar estas experiências poderá ajudá-la a construir o seu sistema de significação e representação conceitual (BRASÍLIA, 2004). Segundo DEFENDI (2008), a chegada da adolescência é uma etapa do desenvolvimento humano que traz inúmeras mudanças no corpo da criança, que gradualmente passa para a fase adulta. É uma fase de transformação e de desenvolvimento caracterizada por mudanças físicas, descobertas pessoais,

mudanças psicológicas, de interesses e de expectativas da família e do contexto social em relação a este adolescente. Assim como em qualquer prática de grupo sendo ela direcionada ou não para alunos com algum tipo de deficiência, estas mudanças físicas e psicológicas são evidenciadas nitidamente nestes encontros com grupo de jovens adolescentes. A peculiaridade observada neste grupo de deficientes visuais é que as experiências são mais conservadas e retraídas, devido às limitações muitas vezes encontrada e o medo para enfrentar o novo e o preconceito. Esta prática no estágio nos possibilita esclarecer dúvidas de diversos assuntos trazidos por eles, discutirmos assuntos de interesse ou que estão em evidência no âmbito escolar ou social. As dúvidas e as novas descobertas são o ponto de partida para cada encontro (DEFENDI, 2008). A particularidade de comportamentos, atitudes sociais e formas de percepção do mundo em que vivem, por parte do portador de deficiência visual, muitas vezes tornam-se entendida a partir das suas próprias reações psicológicas a esta perda, principalmente quando adquirida (BARCZINSKY, 2001 apud, COIMBRA, 2003). As reações apresentadas pelos deficientes visuais podem ser resumidas em quatro fases (BARCZINSKY, 2001 apud, COIMBRA, 2003): a) a descrença (negação da cegueira); b) o protesto (manifestação de comportamento de resistência ou anti-sociais); c) a depressão (com sintomas de debilitação física, idéias suicidas e ansiedade paranóides); d) a recuperação (aceitação da cegueira); Logo ao iniciar o ano letivo na Escola, muitas práticas começaram a ser desenvolvidas, sendo o Grupo de Convivência sempre o mais esperado. Tão logo ao iniciar pode-se perceber o quanto este trabalho também era esperado por cada aluno, e o quão rico se torna a cada encontro. No primeiro encontro já fica evidente algumas destas reações psicológicas trazidas pelo autor, e com isto, devemos pensar em como iremos agir e contribuir para trabalhar com cada um deles e com seus sentimentos reprimidos, no decorrer do ano letivo. Para DEFENDI (2008), enfrentar uma dura realidade é aprender a encarar a vida contando com nossas capacidades e reconhecendo nossas limitações. E é com esta proposta que trabalhamos junto com este grupo: fazer com que eles reconheçam suas capacidades e aprendam a encarar futuros desafios que irão encontrar ao longo de seu desenvolvimento. É muito comum ouvirmos frase: Não

consigo mais, Não posso mais, Não sou capaz, Sou um inútil, Vou depender sempre de alguém. Em muitos destes encontros é normal termos relatos de sentimentos de incapacidade, impossibilidade, falta de condições de aprender. Esses sentimentos ocorrem com muita frequência, especialmente quando a perda visual é progressiva e gradual. Pesquisas apontam que as crianças com deficiência visual tomam menos iniciativa de interação social, assim como são menos bem-sucedidas nelas, o que as leva a desenvolver um brincar paralelo com outras crianças e preferir ambientes internos (AMIRALIAN, 2009). Em muitos casos, crianças e adolescentes com deficiência visual apresentam diferentes tipos de problemas de sociabilidade. Uma das decorrências secundárias da deficiência é que ser portador pode ser relegado a uma posição de participação muito limitada no contexto social. Muitos autores mencionam o isolamento social como uma conseqüência não necessária da deficiência (VIGOTSKY, 2000 apud, MASINI 2007). Dificilmente a criança com deficiência visual tem oportunidade de experimentar lugares e papéis sociais mais valorizados, como as de liderança por exemplo. A limitação imposta pela deficiência visual não deveria trazer tantas restrições à participação, mas as condições físicas de alguns locais, as organizações de algumas instituições e outros condicionantes acabam reduzindo esta participação (MASINI, 2007). Com este trabalho é possível orientar os professores, orientadores e a própria família sobre as dificuldades apresentadas por cada um, suas angústias, suas dificuldades de aprendizagem e relacionamento interpessoal com outros colegas. Em suas colocações no grupo, percebe-se o quanto a presença da família para estes alunos é importante: Para mim a família é tudo... não preciso de mais nada. (sic) Rafael A minha família me amando isso para mim é o que importa. (sic) Diego Eu amo a minha família e ela me aceita do jeito que sou. Não me importa o que as outras pessoas pensam. (sic) Lucas A aceitação da deficiência visual por parte da família é fundamental para o desenvolvimento da criança. Buscar recursos especializados, incentivar diante da necessidade de se preparar para encontrar o novo, fortalecer a crença de suas potencialidades e competências, o reconhecimento de sua individualidade, desejos e

planos são fundamentais que a família possa ter para ajudar estas crianças a enfrentarem o mundo e fazer parte dele como todos (DEFENDI,2008). Segundo Coimbra (2003) para a construção do seu próprio comportamento autônomo, o portador de deficiência, não precisa apenas de condições interativas para desenvolver-se, mas também deve colocar-se numa postura de não submissão a influências e a condições impostas, especialmente aquelas que vão de encontro a suas necessidades e ameaçam o exercício da sua cidadania. O processo de autonomia é outro assunto muito discutido entre os alunos deficientes visuais. A ambivalência entre quererem ser independentes ou não, vem de encontro com o medo e a incertezas de não dominar muitas situações que poderão encontrar no dia a dia ou até mesmo de obstáculos físicos. Como vemos na fala de Lucas: Estou fazendo com a Prof.ª Letícia o trabalho de Orientação e Mobilidade, ela fechou meus olhos e me vez caminhar pelo pátio da Escola... Você já fez isso? É muito ruim, é uma escuridão sem fim... dá medo! Eu ainda consigo ver a luminosidade do dia e ver alguma coisa... imagina quando Eu perder a visão total!? Não vou poder fazer mais nada sozinho nem ir ao armazém. Dá um medo! (sic). É necessário que a criança viva e desenvolva sua autonomia na escola. A autonomia que pode ser adquirida na relação com o professor, pode ser vista como fundamental para as trocas sociais e para desenvolver a sua autoconfiança. Isto é básico, principalmente, para o portador de deficiência, que convive ainda com o marca da discriminação (VAYER E ROCIN 1989 apud, COIMBRA 2003). Esta discriminação ressaltada pela autora é muito representada e discutida no Grupo de Convivência, assim como se percebe nas colocações de dois alunos: Os outros colegas nunca querem brincar comigo no recreio, só porque sou cega... Eu não consigo correr, mas posso brincar de outras coisas. (sic) Júlia. Esses dias esqueci em casa meu lápis de cor vermelho e fui pedir emprestado para meu colega do lado, ele disse que não tinha, pedi para o outro e disse que também tinha esquecido... é mentira sei que não queriam me emprestar (sic) Rafael. Com relação aos efeitos da deficiência visual, é necessário distinguir o conceito entre incapacidade e deficiência. E este autor define a incapacidade como uma condição física ou mental que pode ser apresentada conforme termos médicos, ao passo que uma deficiência é o resultado dos obstáculos que a incapacidade insere entre o indivíduo, o seu meio e o seu potencial máximo. Com isto, nem toda incapacidade está acompanhada de uma deficiência. No caso de uma pessoa

deficiente visual, se esta estiver em um ambiente não-visual, a sua falta de visão não originaria obstáculos, embora ela fosse portadora de uma incapacidade. Tendo estes conceitos misturados no senso comum, normalmente, as pessoas que estão perto do deficiente visual exacerbam ainda mais sua incapacidade, em vez de expor suas reais capacidades (SCHOLL 1967 apud, BRUNS 1999). O portador de deficiência visual mantém normalmente uma posição de retraimento em relação aos demais alunos, principalmente nas faixas etárias mais baixas, a ausência de iniciativas para desenvolver comportamentos interativos na classe tem efeitos muito negativos para a participação desse indivíduo e para seu desenvolvimento cognitivo, afetivo, motor, psicológico (COIMBRA, 2003). CONSIDERAÇÕES FINAIS Constata-se neste trabalho que são muitos os obstáculos para ser enfrentado pelo deficiente visual, que a sua falta de visão não é o principal desafio a ser enfrentado por estas crianças e adolescentes que lutam como cidadãos pelos seus direitos e deveres, e que sofrem muitas vezes por se sentirem incapazes de exercer e desenvolver um papel na sociedade. É necessário que lhe sejam oferecidas as condições de aprendizado e os meios de desenvolver suas habilidades e suas capacidades, os portadores de deficiência visual têm condições de andarem sozinhos, estudar, trabalhar e de participarem de uma vida social. REFERÊNCIAS AMIRALIAN, Maria Lucia Toledo Moraes. Deficiência Visual: perspectivas na contemporaneidade. São Paulo: Vetor, 2009. BRASÍLIA. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Saberes e Práticas da Inclusão: Dificuldades de comunicação e sinalização - Deficiência Visual. Brasília, 2004. 84 p. BRUNS, M.A.T.; ZALZEDAS, P.L. Adolescer: a vivência de portadores de deficiência visual. Revista Instituto Benjamin Constant. n.12, p.6-16.jun. 1999. COIMBRA, Ivanê Dantas. A inclusão do portador de deficiência visual na escola regular. Salvador: EDUFBA, 2003.

DEFENDI, Edson Luiz. et. al. A inclusão começa em casa. São Paulo: Fundação Dorina Nowill para cegos, 2008. DEFENDI, Edson Luiz. et. al. Perdi a Visão e agora? São Paulo: Fundação Dorina Nowill para cegos, 2008. MASINI, Elcie F. Salzano Masini. A Pessoa com Deficiência Visual: Um livro para educadores. 1ed.São Paulo: Vetor, 2007.