1 AVALIAÇÃO DA VELOCIDADE DE ONDA DE PULSO ARTERIAL EM UM FELINO APARENTEMENTE SAUDÁVEL POR MEIO DA ULTRASSONOGRAFIA DUPLEX DOPPLER EVALUATION OF THE ARTERIAL PULSE WAVE VELOCITY IN AN APPARENTLY HEALTHY FELINE BY DOPPLER DUPLEX ULTRASONOGRAPHY Lorena Aparecida ALVES 1 ; Rodrigo Bernardes NOGUEIRA 2 ; Claudine Botelho de ABREU 3 ; Luiz Eduardo Duarte de OLIVEIRA 3 ; Clarice Cristine Vieira e SILVA 4 1 Mestranda em Ciências Veterinárias, Universidade Federal de Lavras (UFLA), lorenaalves09@hotmail.com 2 Professor(a) do Departamento de Medicina Veterinária (DMV), Universidade Federal de Lavras (UFLA) 3 Mestrando(a) em Ciências Veterinárias, Universidade Federal de Lavras (UFLA) 4 Graduanda em Medicina Veterinária, Universidade Federal de Lavras (UFLA) Resumo: A velocidade de onda de pulso arterial é a velocidade da onda de pressão gerada durante a ejeção ventricular, que caminha pelas artérias desde o coração até a periferia. Em humanos, a velocidade de onda de pulso carotídea-femoral (VOPcf) tem sido associada como uma medida de avaliação do enrijecimento arterial e a ultrassonografia duplex Doppler (UDD), tem sido considerada um método bem difundido, de comprovada acurácia, não invasivo e indolor para sua obtenção. Em veterinária, a determinação da VOPcf é pouco estudada e ainda não estão definidos limites de normalidade, especialmente na clínica felina, por meio da UDD. Desse modo, este trabalho teve por objetivo verificar se a UDD é um método capaz de avaliar e determinar a medida da VOPcf em felinos domésticos. Os resultados demonstraram que a metodologia utilizada neste trabalho permitiu a determinação da VOPcf por meio da UDD com boa exequibilidade. A VOPcf deste animal teve um valor aproximado de 0,0109±0,0022m/s. Estudos mais aprimorados serão realizados para avaliar a aplicabilidade da VOPcf na medicina clínica felina. Palavras-chave: Arterial. Duplex Doppler Fluxo sanguíneo. Gatos. Vascular. Keywords: Arterial. Duplex. Doppler. Blood flow. Cats. Vascular. Revisão de literatura: O estudo sobre a fisiopatologia vascular periférica desperta interesse na pesquisa científica veterinária, pois como demonstrado em medicina, diversos conceitos têm auxiliado na compreensão entre as variações da fisiologia cardíaca e Anais do 38º CBA, 2017 - p.2021
2 da sua associação com a dinâmica de perfusão de órgãos e tecidos periféricos. Está bem comprovado que distúrbios associados à dinâmica de perfusão das artérias, exercem efeitos capazes de influenciar o desempenho cardíaco. A UDD fornece, em tempo real, informações sobre a anatomia e a hemodinâmica dos vasos. Este método permite o reconhecimento de anormalidades morfológicas (KIENLE e THOMAS, 2002) e determinação da presença, direção e tipo do fluxo sanguíneo no vaso avaliado (SZATMÁRI et al., 2001). Por se tratar de uma técnica não invasiva, segura e indolor ao paciente, é um método aceito na rotina de investigações das alterações hemodinâmicas das doenças vasculares periféricas ou não, em humanos (KIENLE e THOMAS, 2002) e animais (MASOUDIFARD et al., 2006). Em felinos, ainda pouco se sabe sobre associação entre diferentes enfermidades sistêmicas e a dinâmica de perfusão vascular. Apesar de ser considerado que placas de ateromas raramente se formam em gatos, quase não há estudos demonstrando se o envelhecimento ou distúrbios comuns nestes animais, como obesidade, Diabetes mellitus, hipertensão arterial sistêmica, cardiomiopatia hipertrófica e hipertiroidismo são capazes de alterar de algum modo a fisiologia e a dinâmica de distensão vascular. Atualmente, a UDD é uma ferramenta diagnóstica bem difundida para a avaliação vascular em humanos. Ela é utilizada tanto para fornecer uma avaliação qualitativa da arquitetura vascular, quanto quantitativa, relacionada a diferentes parâmetros hemodinâmicos. A UDD é, portanto, um método que permite estimar as propriedades mecânicas das paredes arteriais, que são decisivas para a compreensão da propagação e reflexão das ondas de pressão ao longo das artérias. Um dos parâmetros determinados pela UDD é a VOPcf. A VOPcf é a velocidade da onda de pulso gerada durante a ejeção ventricular, que caminha pelas artérias desde o coração até a periferia. Ela é obtida a partir do estudo do fluxo sanguíneo nas artérias carótida comum e femoral. A medida da VOPcf está inversamente relacionada com a distensibilidade da parede arterial, principalmente da aorta. Apesar de descrito como um parâmetro de fácil obtenção e com boa reprodutibilidade em humanos, os limites de normalidade da VOPcf ainda não foram estabelecidos em gatos domésticos. O conhecimento de parâmetros normais da VOPcf de felinos domésticos poderia ser, um passo inicial, para sugerir possíveis alterações ainda pouco esclarecidas, relacionadas à dinâmica de perfusão Anais do 38º CBA, 2017 - p.2022
3 sanguínea vascular, em gatos idosos ou com enfermidades clínicas sistêmicas. Desse modo, este estudo teve por objetivo verificar se a UDD é um método exequível para avaliar e determinar a medida da VOPcf em felinos domésticos. Descrição do Caso: Foi atendido no Setor de Clínica Médica de Pequenos Animais, DMV/UFLA, um felino, fêmea castrada, da raça Persa, pesando 3,6 kg de peso corporal e com 3 anos de idade. O animal foi atendido para check-up anual. Realizou-se anamnese e todos os exames complementares necessários. Para a definição da homeostase corporal, o animal foi avaliado por meio de exame clínico completo, perfil hematológico, bioquímica sanguínea, dosagem sanguínea de colesterol, T4 livre, pressão arterial sistêmica sistólica, eletrocardiografia, ecocardiografia, radiografia de tórax e avaliação do índice de massa corporal felino. A UDD foi realizada para a obtenção da VOPcf. O felino foi mantido em decúbito lateral direito e todas as medidas foram realizadas sem qualquer tipo de sedação ou anestesia. A avaliação da VOP foi obtida por meio de um equipamento de Doppler pulsado bidirecional (MyLab 40, Esaote) com um transdutor eletrônico linear com 7-10 MHz. O fluxo sanguíneo foi avaliado sempre na porção proximal (±0,5cm) antes da bifurcação de ambas as artérias carótida comum esquerda e ilíaca direita. O cálculo da VOPcf foi realizado conforme descrito por Van Bortel (2002) utilizando a distância percorrida, em metros, pela onda de pulso dividida pelo tempo de trânsito (tt ou Δt), em segundos, ou seja, L/Δt. As ondas de fluxo das artérias carótida comum e femoral foram medidas sequencial e sucessivamente e determinou-se o chamado pé da onda ( foot of the wave ), que é definido como tendo o seu início no final da diástole, quando ocorre uma rápida elevação na onda anterógrada. Simultaneamente às ondas de fluxo, registrou-se o traçado eletrocardiográfico para determinação da onda R, que é o segundo ponto de referência para cálculo do tempo de trânsito. O tempo de trânsito foi calculado como a diferença entre [o tempo de trânsito entre do pé da onda da artéria femoral até a onda R - T 2 ] menos [tempo de trânsito entre pé da onda da artéria carótida comum até a onda R - T 1 ] (LAURENT et al., 2006), em cinco ciclos cardíacos, utilizando o cursor do software de medidas (MyLab Desk, v.6.1, Esaote). Resultados e Discussão: Anais do 38º CBA, 2017 - p.2023
4 Todos os exames que definiram a homeostase do animal obtiveram resultados dentro dos padrões de normalidade para a espécie. A técnica de UDD mostrou neste trabalho boa exequibilidade para a obtenção da VOPcf em felinos domésticos. A UDD ainda permite o reconhecimento de anormalidades estruturais do vaso avaliado e no seu fluxo sanguíneo, detectando mudanças na direção, na velocidade ou na característica (laminar ou turbulento) (KIENLE e THOMAS, 2002). No presente estudo, a UDD permitiu o cálculo das variáveis que compõem a VOPcf. O tempo de trânsito entre os valores médios de tais medidas (Δt=T 2 -T 1 ) calculado foi 118,2-85,4m/s e a distância percorrida (L) pela onda de pulso entre os dois pontos de avaliação ultrassonográfica foi obtida, totalizando 0,347 metros. Desse modo, a VOPcf desse animal foi então calculada pela fórmula: L/T 2 T 1, resultando em um valor aproximado de 0,0109±0,0022m/s. Em medicina veterinária, alguns estudos ressaltam a aplicabilidade clínica e experimental da UDD em pequenos animais. Em estudos utilizando cães, definiu-se o padrão de normalidade de algumas artérias nesta espécie. Lee et al. (2004) estudaram dez cães da raça Beagle, pela UDD, padronizando os valores normais das velocidades do fluxo sanguíneo das artérias basilar, carótida, aorta abdominal, ilíaca externa e femoral, além do espectro morfológico característico de cada vaso. Masoudifard et al. (2006) comprovaram o padrão morfológico e as velocidades obtidas, em um estudo com cães saudáveis e não sedados, das artérias femorais e axilares. Ambos os estudos relataram que o método de registro de diferentes parâmetros de fluxo sanguíneo periférico em cães foi factível utilizando a UDD. Para avaliar a ação de alguns anestésicos no fluxo sanguíneo da artéria femoral, Biricik et al. (2010) utilizaram cães saudáveis, sedados com um α-2 agonista adrenérgico (xilazina), e demonstraram haver variação no padrão do fluxo diastólico inicial pela diminuição dos valores de sua velocidade durante avaliação pela UDD. Estudo semelhante foi conduzido por Nogueira et al. (2011) em que, após a administração de uma combinação de acepromazina e buprenorfina, se observou, com a UDD da artéria femoral, diminuição do pico de velocidade sistólico, sem modificação no volume de fluxo sanguíneo. Recentemente, um estudo realizou a determinação da VOPcf por meio da UDD em cães saudáveis, definindo a aplicabilidade do método e os seus limites de normalidade (NOGUEIRA et al., 2016). A determinação de valores normais da VOPcf para a espécie felina por meio da UDD ainda é algo inexplorado, porém por Anais do 38º CBA, 2017 - p.2024
5 se tratar de uma técnica não invasiva, segura e indolor ao paciente, a mesma também poderá ser reproduzida em felinos domésticos e mais estudos deverão ser realizados nestes animais. Conclusão: Conclui-se que a UDD permitiu a mensuração da VOPcf em felinos domésticos. Apesar de o resultado ser de um único animal, a técnica foi factível de ser realizada e este modelo servirá para um estudo mais aprofundado e amplo sobre as medidas da VOPcf em felinos domésticos, para que estudos clínicos mais aprofundados passem a ser efetuados. Referências: BIRICIK, H. S. et al. The effect of xylazine on femoral arterial flow determined by Doppler Sonography in dogs. Journal of Animal and Veterinary Advanced, Philadelphia, v. 9, n. 1, p. 47-48, Jan. 2010. KIENLE, R. D.; THOMAS, W. P. Ecocardiografia. In: NYLAND, T. G.; MATTON, J. S. (Ed.). Ultra-som diagnóstico em pequenos animais. 2. ed. São Paulo: Roca, 2002. p. 365-438. LAURENT, S. et al. Expert consensus document on arterial stiffness: methodological issues and clinical applications. Eur Heart J; 27(21):2588e605, 2006. LEE, K. et al. Spectral waveforms analysis of major arteries in conscious dogs by Doppler ultrasound ultrasonography. Veterinary Radiology and Ultrasound, Raleigh, v. 45, n. 2, p. 166-171, Mar. 2004. MASOUDIFARD, M. et al. Normal color and Pulsed waved Doppler ultrasonography of femoral and axillary arteries in dogs. Iranian Journal of Veterinary Surgery, Tehran, v. 1, n. 1, p. 43-49, Jan. 2006. NOGUEIRA, R. B. et al. Alterations in the large peripheral circulation in dogs with heart failure. The Veterinary Journal, London, v. 188, n. 1, p. 101-104, May 2011. NOGUEIRA, R. B. et al. Arterial Pulse Wave Propagation Velocity in Healthy Dogs by Pulse Wave Doppler Ultrasound. Vet Res Commun, 41 (1), 33-40, Dec 2016. SZATMÁRI, V. et al. Normal duplex Doppler waveforms of major abdominal blood vessels in dogs: a review. Veterinary Radiology & Ultrasound, Raleigh, v. 42, n. 2, p. 93-107, Mar. 2001. VAN BORTEL LM; et al. Clinical applications of arterial stiffness, Task Force III: recommendations for user procedures. American Journal of Hypertension. New York, v.15, n.5, p: 445-52, 2002. Anais do 38º CBA, 2017 - p.2025