APRENDIZAGEM BASEADA NA RESOLU- ÇÃO DE PROBLEMAS. Características, organização e supervisão

Documentos relacionados
Perfil do Professor em Tecnologias de Informação e Comunicação

APRENDIZAGEM POR PROBLEMAS: UM MÉTODO CENTRADO NO ALUNO E PROMOTOR DO TRABALHO COLABORATIVO

E N S I N O SECUNDÁRIO

Ser focalizados num grupo específico, que apresente factores de risco ligados ao uso/abuso de substâncias psicoactivas lícitas e ilícitas;

DEPARTAMENTO CURRICULAR: MATEMÁTICA E CIÊNCIAS EXPERIMENTAIS

ANO LECTIVO 2008/2009 1º ANO. As Propostas de Formação

COMO MELHORAR O CAPITAL SOCIAL DOS JOVENS EM RISCO DE NEET? TERESA ESPASSANDIM

GESTÃO DO CURRÍCULO: ENSINO EXPERIMENTAL DAS CIÊNCIAS

AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DOCENTE

Plano da Unidade Curricular

Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas (APBR)

ÍNDICE GERAL INTRODUÇÃO CAPÍTULO 1 (RE) PENSANDO A ESCOLA COM AS NOVAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO E

CAPÍTULO 5 PLANO DE FORMAÇÃO

CRITÉRIOS GERAIS de AVALIAÇÃO na EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR

Ano Lectivo 2007/08. Agrupº. Escolas Padre Vítor Melícias

O PORTFOLIO E A AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS. Ana Cláudia Cohen Coelho Ana Paula Ferreira Rodrigues

APOIO AO ESTUDO 1º CICLO LINHAS ORIENTADORAS 2015/ INTRODUÇÃO


CRITÉRIOS GERAIS E NORMAS DE AVALIAÇÃO

Transição para a vida pós-escolar: Portaria n.º 201-C/2015

AVALIAÇÃO. Educação Orientada para Resultados (EOR/OBE)

Educar para a Cidadania Contributo da Geografia Escolar

Programa de Formação Contínua em Matemática para Professores do 1º Ciclo do Ensino Básico da ESEG

CURSO PROFISSIONAL DE TÉCNICO DE VENDAS

ENSINO BÁSICO 6º,8º E 9º ANOS

CRITÉRIOS GERAIS DE AVALIAÇÃO 2017/2018

AVALIAÇÃO CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO INTERNA SEGUNDO CICLO DO ENSINO BÁSICO 6.º ANO. Ano letivo 2013/2014

REFERENTES E LEMENTOS CONSTITUTIVOS C RITÉRIOS I NDICADORES. Oferta formativa. . Projecto de Auto-avaliação da Escola Secundária de Alberto Sampaio

GESTÃO DO CURRÍCULO: ENSINO EXPERIMENTAL DAS CIÊNCIAS

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DO 1ºCICLO. Critérios de Avaliação

Desenvolvimento e avaliação de competências

Curso Profissional de Técnico de Apoio à Gestão Desportiva

Psicologia Educacional I. O Desenvolvimento Moral e a Educação moral e nas escolas

Plano Estratégico do Departamento de Matemática e Ciências Experimentais

acesso à informação local e global, para as aprendizagens curriculares e individuais,

AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DO RESTELO Sede - Escola Secundária do Restelo

Plano da Unidade Curricular

CRITÉRIOS GERAIS E NORMAS DE AVALIAÇÃO 2018/2019

Avaliação da biblioteca escolar. A. Currículo literacias e aprendizagem. Avaliação

PADRÕES de DESEMPENHO DOCENTE

Ana Silva (2003) Análise do Software Poly Pro Programa de Geometria Dinâmica

manhã PROGRAMA AS ACTIVIDADES LABORATORIAIS NO ENSINO DA BIOLOGIA E DA GEOLOGIA Características e desafios Prof. Dra. Laurinda Leite Univ.

PLANO DE MELHORIA QUADRIÉNIO 2014/2018

Formação continuada de educadores de infância Contributos para a implementação do trabalho experimental de ciências com crianças em idade pré-escolar

Elisabete Pereira (2003) Análise do Software Eu Aprendo Ciências da Natureza 6º Ano

M e t a s d e s u c e s s o 2013/ / /16 Histórico 2016/ /18 Nº de alunos aprovados. Nº de alunos aprovados. Nº de alunos inscritos

CIRCULAR N.º 5/2001, de 6 de Novembro. Esclarecimentos sobre o Despacho Normativo N.º 30/2001

AS PREOCUPAÇÕES METODOLÓGICAS. A participação do aluno na elaboração de seu conhecimento é um dos pontos

Uma escola com projectos

PARECER DA ASSOCIAÇÃO DE PROFESSORES DE MATEMÁTICA ACERCA DO DESENVOLVIMENTO DA AVALIAÇÃO FORMATIVA

PLANO DE FORMAÇÃO 2013/2015

Designação Aprendizagem baseada na resolução de problemas no Ensino das Ciências. Região de Educação Área de Formação A B C D

Estudo de impacto dos recursos: Hipertexto/ Vídeo da actividade laboratorial

D23. PROGRAMA DE TEORIA DA EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO CURRICULAR 11ª Classe. Formação de Professores para o Pré-Escolar e para o Ensino Primário

PLANO DE ACÇÃO ESTRATÉGICA A - IDENTIFICAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA

Operacionalização na Escola Secundária Alfredo dos Reis Silveira

Competências gerais. Princípios e valores orientadores do currículo. Competências gerais

Regulamento do Prémio Portugal, País de Excelência em Engenharia

ACOMPANHAMENTO DA AÇÃO EDUCATIVA RELATÓRIO DA 3ª INTERVENÇÃO. Início 21 de junho de Fim 23 de junho de 2016

AVALIAÇÃO CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO AVALIAÇÃO INTERNA TERCEIRO CICLO DO ENSINO BÁSICO 7.º ANO. Ano letivo 2013/2014

REGULAMENTO DA INICIAÇÃO À PRÁTICA PROFISSIONAL DOS 2º CICLOS EM ENSINO DA FCUP. I - Natureza e Objectivos

Quimicamente pensando, Fisicamente falando!

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO DO AGRUPAMENTO

Diretrizes para as bibliotecas escolares (IFLA/UNESCO)

Filomena Lemos / 20 Janeiro Programa de Português

Educação Inclusiva: Decreto-Lei nº 54/2018

Ciências Experimentais

Agrupamento de Escolas Afonso de Paiva. Castelo Branco. Glossário

Construir o Futuro (I, II, III e IV) Pinto et al. Colectiva. Crianças e Adolescentes. Variável. Nome da prova: Autor(es): Versão: Portuguesa

INFORMAÇÃO-PROVA DE EQUIVALÊNCIA À FREQUÊNCIA

Reunião de Rede LVT Fevereiro de Equipa Regional de Lisboa e Vale do Tejo

CRITÉRIOS GERAIS DE AVALIAÇÃO 1º, 5º, 7º e 10º anos de escolaridade 2018/19 (aprovados em reunião de CP de 21 de novembro)

APRENDIZAGENS ESSENCIAIS

DESIGNAÇÃO DA ACÇÃO DE FORMAÇÃO A Aprendizagem da Matemática através da Resolução de Problemas Acção 28 / 2009

Percursos e práticas para uma escola inclusiva ÍNDICE GERAL. Ìndice de Gravuras... vi. Ìndice de Anexos... vii INTRODUÇÂO... 1

Agrupamento de Escolas General Humberto Delgado Sede na Escola Secundária/3 José Cardoso Pires Santo António dos Cavaleiros

Seminário Nacional Eco-Escolas 2018

Programa Nacional de Ensino do Português (PNEP) 1.º Ciclo do Ensino Básico

PLANO DE PROMOÇAO DA LEITURA

1º Ciclo. Competências Gerais do Ensino Básico

CRITÉRIOS DE AVALIAÇÃO

Plano da Unidade Curricular

GUIÃO ENTREVISTA ÀS PROFESSORAS

Compreender o mecanismo de cálculo do IVA, identificando as operações tributáveis e os sujeitos passivos;

Referencial de Educação Ambiental para a Sustentabilidade Flexibilidade Curricular e Eco-Escolas. Lisboa, 24 de julho de 2018

Observe! Vai ver que encontra.

EDUCAÇÃO ESPECIAL RESPOSTAS EDUCATIVAS

DISCIPLINA DE ÁREA PROJECTO

Gostaríamos que respondessem de forma reflectida e sincera, a fim de acedermos a um conhecimento fundamentado sobre as questões em análise.

GESTÃO DO CURRÍCULO: ENSINO EXPERIMENTAL DAS CIÊNCIAS

Objeto e finalidades A avaliação visa:

Plano de Ações de Melhoria

Plano da Unidade Curricular

Uma iniciativa para a promoção da literacia científica na disciplina de Ciências Físico-Químicas do 3.º ciclo do ensino básico

COMPETÊNCIAS TRANSVERSAIS

Transcrição:

XIV Congreso de Enciga 253 INTERDISCIPLINAR APRENDIZAGEM BASEADA NA RESOLU- ÇÃO DE PROBLEMAS. Características, organização e supervisão LEITE, Laurinda AFONSO, Ana Sofía UNIVERSIDADE DE MINHO lleite@iep.uminho.pt & aafonso@iep.uminho.pt INTRODUÇÃO O acelerado ritmo do progresso científico e tecnológico que se verifica nos nossos dias faz com que os conhecimentos que possuímos fiquem rapidamente desactualizados. A menos que nos vamos mantendo informados acerca do que se passa no mundo da investigação científica e tecnológica, ver-nos-emos impossibilitados não só de desempenhar capazmente as tarefas profissionais que nos estão atribuídas mas também de participar de forma activa e esclarecida na sociedade a que pertencemos. Torna-se, assim, premente a necessidade de a escola, como refere o artigo 8º da Lei de bases do Sistema Educativo Português, proporcionar a aquisição de atitudes autónomas, visando a formação de cidadãos responsáveis e democraticamente intervenientes na vida comunitária. Torna-se ainda relevante que, tal como defende o programa de Ciências Físico-Químicas do 3º ciclo do ensino básico, em vigor em Portugal, o ensino das ciências, na escolaridade obrigatória, privilegie uma formação/educação do aluno que: desenvolva competências necessárias a uma formação global que lhes permita actuarem no futuro como consumidores esclarecidos e cidadãos capazes de se tornarem intervenientes responsáveis na resolução dos problemas do dia-a-dia, pessoais e da comunidade, que envolvam conhecimentos científicos e tecnológicos..

254 Boletín das Ciencias Dada a natureza holística dos problemas do dia-a-dia, a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas (ABRP) será o tipo de trabalho prático (Hodson, 1988) que mais potencialidades apresenta para a consecução dos objectivos referidos. Assim, o objectivo deste trabalho é caracterizar o ensino orientado para a Aprendizagem Baseada na Resolução de Problemas, discutir formas de o implementar e apresentar um instrumento para a monitorização dessa implementação. CARACTERIZAÇÃO DO ENSINO ORIENTADO PARA ABRP A ABRP teve a sua origem nos currículos de Ciências da Saúde, na América do Norte (Estados Unidos e Canadá), por volta dos anos sessenta, como consequência da insatisfação sentida com o ensino tradicional da medicina, provocada pela explosão da informação e das novas tecnologias e pelas crescentes e permanentemente diferentes exigências colocadas pelas práticas futuras (Boud & Feletti, 1997). Ao contrário do que acontece no ensino tradicional, onde os conceitos são introduzidos em primeiro lugar e depois seguidos de um problema de aplicação, na ABRP os alunos começam por ser confrontados com um problema, aberto e qualitativo, o qual constitui o ponto de partida para a aprendizagem (Duch, 1996). O conhecimento é adquirido através da actividade desenvolvida pelo aluno com vista à compreensão dos princípios subjacentes ao problema e à resolução do mesmo (Engel, 1997). Assim, a ABRP não nega a importância de aprender conteúdo mas não reconhece a utilidade futura do conteúdo memorizado, adquirido em contextos abstractos, e antes coloca a ênfase na capacidade de adquirir conhecimento conceptual, à medida que ele é necessário, e de tirar o máximo partido desse conhecimento numa dada situação (Margetson, 1997). As razões que conduziram à dispersão do ensino orientado para a ABRP por todo o mundo têm a ver, por um lado, com o facto de ele permitir aos alunos tirarem o máximo partido do estudo independente e, por outro lado, de utilizar a resolução de problemas em pequenos grupos, aspectos que têm a ver não só com a promoção da autonomia mas também com a cooperação e a vida em sociedade. Os problemas, apesar de simulados, têm a ver com o diaa-dia (Boud & Feletti, 1997) e facilitam a integração de aprendizagens de diferentes disciplinas, na medida em que os conhecimentos a tratar não são seleccionados a priori mas antes são os identificados durante a resolução do problema como necessários para o resolver (Margetson, 1997), independentemente da disciplina a que pertencem.

XIV Congreso de Enciga 255 Quando se utilizam metodologias de ensino orientado para a ABRP pretende-se atingir dois objectivos: utilizar um método que ajude os alunos a tornarem-se proficientes num conjunto de competências (de trabalho, de cooperação, de raciocínio, etc) generalizáveis, e que são relevantes durante a sua vida futura, e criar condições favoráveis à aprendizagem ao longo da vida (Engel, 1997). Para Engel (1997), a fim de ser eficaz, um currículo baseado em problemas deve aceitar os seguintes princípios: - Aprendizagem cumulativa um dado tópico não deve ser estudado uma única vez mas antes deve ser reintroduzido a um nível crescente de complexidade sempre que contribua para uma tomada de decisão fundamentada acerca de uma dada situação problemática; - Aprendizagem integrada os assuntos/disciplinas não devem ser tratados separadamente mas antes devem ser estudados quando se relacionam com um dado problema; - Progressão na aprendizagem à medida que os alunos se desenvolvem também os diversos aspectos do currículo devem alterar-se e progredir; - Consistência na aprendizagem as diferentes metas da ABRP devem ser apoiadas pelas diversas facetas do currículo (modo de tratar os alunos, materiais utilizados, avaliação efectuada, etc.). Os currículos baseados em problemas promovem a integração de conhecimentos conceptuais, saber que, e de conhecimentos procedimentais, saber como (Margetson, 1997). Segundo Ross (1997), estes currículos diferem não só dos currículos orientados por problemas mas também dos currículos de resolução de problemas. Nos primeiros, os problemas são usados como critérios para selecção dos conteúdos a incluir no currículo, enquanto que nos segundos, os currículos são organizados de modo a facultar aos alunos treino em resolução de problemas, permitindo-lhes aprender estratégias de resolução de problemas. Segundo Margetson (1997), estes currículos: - Encorajam a abertura de espírito, a reflexão, o espírito crítico e a aprendizagem activa mas implicam uma diminuição do controlo do professor sobre o aluno e a aprendizagem que este efectua; - São moralmente defensáveis, uma vez que consideram tanto o aluno como o professor como pessoas com conhecimentos, sentimentos e interesses que são partilhados no processo educativo mas constituem uma ameaça não só para os que vêem o ensino-aprendizagem como um processo unidireccional, em que o professor, detentor do conhecimento, transmite o conhecimento para os alunos ignorantes

256 Boletín das Ciencias mas também para os que têm dificuldade em lidar com pessoas diferentes, neste caso no que respeita ao conhecimento que possuem; - Reflectem a natureza do conhecimento na medida em que este se desenvolve como resultado das respostas dos especialistas aos problemas que eles encontram no seu mundo, o que contraria as ideias dos que conceptualizam a ciência como um corpo de conhecimento a ser transmitido, o ensino como um processo de transmissão de conhecimentos e a aprendizagem como um processo de absorção passiva de informação. Ao contrário do que se poderia pensar, o ensino orientado para a ABRP é uma das estratégias de ensino que mais importância dá aos conhecimentos dos alunos (Ross, 1997), na medida em que dificilmente a solução de um problema é descoberta por acaso mas antes exige a concretização de um processo planificado, com base em conhecimentos prévios, conceptuais e procedimentais, e em novos conhecimentos, identificados como relevantes e necessários para a resolução do problema. ORGANIZAÇÃO DO ENSINO ORIENTADO PARA A ABRP A análise do modo como alguns autores (ex.: Lopes, 1994; Duch, 1996; Chang & Barufaldi, 1999; Gandra, no prelo) descrevem o ensino das ciências orientado para a ABRP e das suas características (mencionadas na secção anterior) indica que ele se pode organizar em torno de quatro fases, as quais têm objectivos e duração diferentes. A primeira fase, selecção do contexto, desenvolve-se à custa de trabalho do professor. Sabendo quais os problemas que pretende sejam abordados (num currículo baseado em problemas) ou depois de identificar os conteúdos que pretende leccionar (num currículo baseado em conceitos), o professor identifica pelo menos um contexto problemático que possa fazer emergir ou os problemas a tratar ou os problemas que permitam abordar os conceitos seleccionados. Esta tarefa requer a identificação de materiais impressos (ex.: artigos de revista ou de jornal, etc.), videogravados (ex.: notícias de televisão, filmes, etc.), etc., que sejam adequados ao nível dos alunos e que tenham probabilidade de os interessar, por lhes colocarem questões e desafios, quer enquanto alunos, quer enquanto indivíduos, quer ainda enquanto membros da sociedade. Tentar antecipar os problemas que os alunos poderão colocar a partir do contexto problemático, será útil para o professor decidir sobre a adequação ou não desse mesmo contexto. A segunda fase, formulação dos problemas, desenvolve-se à custa de trabalho dos alunos sobre o(s) contexto(s) problemático(s) seleccionado(s)

XIV Congreso de Enciga 257 pelo professor, desempenhando este apenas o papel de orientador (não directivo) do processo. A partir da análise do(s) contexto(s) problemático(s), os alunos devem explicitar os problemas e questões que este(s) lhes suscita(m), competindo ao professor a tarefa de promover a clarificação dos problemas formulados, a rejeição de problemas irrelevantes, a constatação de eventuais sobreposições entre problemas formulados, etc., com vista à identificação dos problemas a considerar para efeitos de resolução pelos alunos. Uma vez identificados estes, o professor deverá discutir com os alunos a eventual relação hierárquica entre os diferentes enunciados propostos bem como a ordem pela qual os problemas vão ser tratados. A experiência e conhecimentos do professor desempenham um papel fundamental nesta tomada de decisões. A terceira fase, resolução do(s) problema(s), é uma fase que pode ser longa, dependendo a sua duração, entre outros, do número de vezes que incluir o ciclo de actividades necessárias à resolução de um problema. Nesta fase, o professor desempenha, mais uma vez, o papel de orientador do trabalho dos alunos mas é a estes que compete trabalhar a fim de resolverem os problemas formulados e seleccionados. Para resolver um problema identificado, os alunos terão que começar por reinterpretá-lo, planificar a sua resolução, implementar as estratégias de resolução planificadas, obter a solução (se ela existir) e avaliá-la. Durante este processo, eles precisarão consultar diversos tipos de fontes de informação (livros, revistas, jornais, relatórios, filmes, documentários, etc., impressos ou em suporte magnético ou electrónico), realizar diversos tipos de actividades (actividades laboratoriais, saídas de campo, entrevistas a membros da comunidade, etc.). O professor deverá assegurar que a informação mínima necessária está acessível aos alunos mas estes deverão ser impelidos para a identificação e localização de informação relevante. Refirase ainda que os alunos de uma turma poderão trabalhar simultaneamente num mesmo problema, trabalhar em diferentes sub-problemas de um dado problema ou trabalhar em diferentes problemas, dependendo da natureza e interdependência dos problemas a resolver. Depois de analisada a solução obtida, de avaliado o processo de resolução e de integrados os conhecimentos adquiridos através da resolução dos diferentes sub-problemas (caso estes existam) ou problemas eventualmente trabalhados em simultâneo, o ciclo repete-se até que se esgotem todos os problemas formulados e considerados relevantes para serem tratados. Na quarta fase, síntese e avaliação do processo, o trabalho a realizar conjuntamente por professor e alunos terá a ver com a verificação de que todos os problemas inicialmente formulados ou foram resolvidos ou não têm solução, com a síntese final dos conhecimentos (conceptuais, procedimentais, atitudinais) obtidos e/ou desenvolvidos e com a avaliação de todo o processo,

258 Boletín das Ciencias quer em termos de eficácia de aprendizagem quer em termos de desenvolvimento pessoal, social, ético e moral ocorrido. SUPERVISÃO DO ENSINO ORIENTADO PARA A ABRP Implementar um ensino orientado para a ABRP coloca desafios muito grandes aos intervenientes e especialmente aos professores (Margetson, 1997), dadas as diferenças que existem entre ele e os outros tipos de ensino. A fim não só de evitar que ele seja desvirtuado (especialmente quando implementado por professores sem experiência na sua utilização) mas também de orientar a sua planificação e implementação, desenvolvemos, com base nas ideias apresentadas nas secções anteriores, um instrumento para monitorar o ensino orientado para a ABRP. Na figura 1 (Anexo) apresentamos uma versão desse instrumento de supervisão, que resulta da adaptação de versões prévias por nós elaboradas e utilizadas por futuros professores e por professores em serviço, que atende às dificuldades sentidas e aos erros cometidos por pessoas pouco familiares com a estratégia e que inclui aspectos que devem ser contemplados quando se organiza e implementa um ensino orientado para a ABRP. CONSIDERAÇÕES FINAIS O ensino orientado para a ABRP é uma estratégia de ensino inovadora que coloca os alunos numa situação não só de aprenderem ciência mas também de aprenderem a fazer ciência (de uma forma integrada, contextualizada e cooperativa) e de aprenderem a aprender, desenvolvendo, assim, diversas competências relevantes para o cidadão comum. Contudo, pelo facto de se tratar de uma estratégia centrada no aluno e na aprendizagem, ela é pouco estruturada e flexível, requer uma grande alteração no papel do professor, nas actividades de aprendizagem e na forma de implementação das mesmas, na organização da aula e na gestão de espaços e recursos, e constitui um desafio para quem tenta implementar este tipo de ensino. Esperamos que as evidências de que o ensino orientado para a ABRP é proveitoso (Chang & Barufaldi, 1991) e de que os alunos reagem positivamente a ele (Chang & Barufaldi, 1999; Gandra, no prelo) ajudem os professores a vencer os desafios que uma inovação deste tipo lhes coloca e que a que a grelha que aqui apresentamos contribua para a facilitação da organização e da implementação do tipo de ensino em causa.

XIV Congreso de Enciga 259 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Boud, D. & Feletti, G. (1997). Changing problem-based learning. In Boud, D. & Feletti, G. (Eds). The challenge of problem-based-learning, Londres: Kogan Page, 1-14. Chang, C, & Barufaldi, J. (1999). The use of a problem-based instructional model in initiating change in students achievement and alternative frameworks. International Journal of Science Teaching, 21(4), 373-388. Duch, B. (1996). Problem-based learning in Physics. Journal of College Science Teaching, Março, 326-329. Engel, C. (1997). Not just a method but a way of learning. In Boud, D. & Feletti, G. (Eds). The challenge of problem-based-learning, Londres: Kogan Page, 28-35. Gandra, P. (no prelo). Aprendizagem da Física Baseada na Reslução de Problemas: Reacções de professores e alunos do 9º ano de escolaridade. Actas do IX Encontro Nacioinal de Educação em Ciências na Escolaridade Básica. Viseu:ESE de Viseu. Hodson, D. (1988). Experiments in science teaching. Educational philosophy and theory, 20(2), 53-66. Lopes, J. (1994). Resolução de problemas em Física e Química. Lisboa: Texto Editora. Margetson, D. (1997). Why problem-based learning is a challenge?. In Boud, D. & Feletti, G. (Eds). The challenge of problem-based-learning, Londres: Kogan Page, 36-44. Ross, B. (1997). Towards a framework for problem based curricula. In Boud, D. & Feletti, G. (Eds). The challenge of problem-based-learning, Londres: Kogan Page,

260 Boletín das Ciencias ANEXO Selecção do contexto (preparação da aula) O contexto: - vai de encontro às diferentes perspectivas do ensino das ciências (indivíduo, ciência, sociedade) - tem uma extensão adequada - potencializa a formulação de problemas por parte dos alunos (é apresentado numa linguagem adequada ao nível etário a que se destina, é potencialmente motivador etc. Os potenciais problemas: - exigem a abordagem/desenvolvimento dos conteúdos programáticos pretendidos - constituem um desafio adequado ao nível etário dos alunos (interesses, conhecimentos, estratégias) - relacionam-se com aspectos do "mundo real" - podem pôr em evidência concepções alternativas no tema em questão Formulação do(s) Problema(s) ( situação de aula ) Familiarização com o contexto: - os alunos compreendem o material utilizado para criação do contexto Os problemas: - estão claramente definidos - são relevantes e adequados Organização dos problemas: - os (eventuais) subproblemas estão sequencializados e integrados em problemas - os problemas estão hierarquicamente relacionados entre si - a sequência a adoptar para a sua abordagem é lógica e adequada Resolução do problema Criação de condições (preparação da aula) Preparação de fontes de informação/recursos: - estão assegurados recursos diversificados (laboratório, internet, material impresso, etc.) - a bibliografia disponibilizada - é credível - é, sempre que possível original - não apresenta a resposta directa ao problema (necessita de reorganização) - conduz a diferentes perspectivas sobre o assunto - suscita insatisfação com os conhecimentos prévios Preparação de aspectos administrativos: - estão asseguradas autorizações para visitas de estudo, trabalhos de campo, realização de entrevistas, etc. - estão asseguradas autorizações para uma utilização flexível dos espaços escolares, nomeadamente sala de aula, sala de informática, biblioteca, laboratório Resolução de um dado problema (situação de aula) Re-interpretação do problema: - analisa -se e (eventualmente) reformula-se o enunciado inicial do problema Planificação de estratégias de resolução: - planificam-se linhas gerais para orientar a resolução do problema - distribuem-se tarefas pelos grupos e/ou pelos membros do grupo - elaboram-se estratégias para resolução do problema (pesquisas, actividades laboratoriais) Resolução do problema - executam-se as tarefas planeadas - selecciona-se a informação relevante e interpretam-se os resultados - encontram-se soluções fundamentadas, analisam-se limites de validade dessas soluções e as implicações das aproximações efectuadas Avaliação das soluções: - discutem-se com os pares as soluções encontradas - avaliam-se as diversas soluções - reformulam-se as soluções em função de novos dados/discussões - integram-se os conhecimentos resultantes dos subproblemas (caso se aplique) - Síntese/avaliação do processo (situação de aula) - os problemas foram todos resolvidos - as soluções encontradas são satisfatórias - integraram-se dos diferentes problemas os conhecimentos a eles associados - avaliaram-se que conhecimentos procedimentais, conceptuais, de atitudes, relações inter-pessoais, competências de comunicação que foram desenvolvidos - geraram-se novos problemas Fig 1 Grelha de análise do ensino orientado para a ABRP