Exercício 18. Demonstre a proposição anterior. (Dica: use as definições de continuidade e mensurabilidade)

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Transcrição:

Proposição 2.7. Sejam Y e Z espaços métricos e X um espaço mensurável. Se f : X Y é uma função mensurável e g : Y Z é uma função contínua então g f : X Z é uma função mensurável. Exercício 18. Demonstre a proposição anterior. (Dica: use as definições de continuidade e mensurabilidade) Proposição 2.8. Sejam X um espaço mensurável, Y um espaço métrico, u, v : X R duas funções mensuráveis e φ : R 2 Y uma função continua. Então h : X Y definida por h(x) = φ(u(x), v(x)) é uma função mensurável. Demonstração. É suficiente demonstrar que a função f : X R 2 definida por f(x) = (u(x), v(x)) é mensurável. De facto, como h = φ f e φ é contínua, basta aplicar a Proposição 2.7. Resta então provar que f é mensurável, ou seja, para qualquer aberto A R 2 tem-se que f 1 (A) é mensurável. Procedemos em dois passos: 1. Considere-se primeiro abertos do tipo A = I J (rectângulos) onde I, J R são dois intervalos abertos. Então, segue da definição de f que f 1 (I J) = u 1 (I) v 1 (J). Como u e v são mensuráveis, logo u 1 (I) e v 1 (J) são conjuntos mensuráveis de X, tal como sua intersecção. Logo f 1 (I J) é mensurável. 2. Como todo o aberto A R 2 pode ser escrito como uma união numerável de rectângulos abertos I n J n, n = 1, 2,... (porquê?) então f 1 (A) = f 1 ( I n J n ) = f 1 (I n J n ) = u 1 (I n ) v 1 (J n ). Como u 1 (I n ) v 1 (J n ) é um conjunto mensurável (pelo argumento do ponto 1.) e a união numerável de conjuntos mensuráveis é mensurável, segue que f 1 (A) é mensurável. Exercício 19. Mostre, usando a proposição anterior, que se f, g : X R são duas funções mensuráveis então 1. f + g é mensurável. 2. f g é mensurável. 15

Observação 2.9. Do exercício anterior conclui-se que o conjunto das funções mensuráveis f : X R é um espaço linear. De seguida, enunciaremos mais dois resultados que fornecem condições equivalentes para verificar a mensurabilidade de funções. Dado um espaço métrico Y, designamos por B(Y ) a σ-álgebra gerada pelos conjuntos abertos de Y, ou seja, B(Y ) = σ(abertos de Y }). À σ-álgebra B(Y ) chamamos σ-álgebra de Borel de Y e os seus conjuntos mensuráveis os Borelianos de Y. Note-se que esta definição generaliza para qualquer espaço métrico o conceito de σ-álgebra de Borel de R. Proposição 2.10. Sejam X um espaço mensurável, Y um espaço métrico e f : X Y. São equivalentes: 1. f é uma função mensurável. 2. f 1 (A) é mensurável qualquer que seja o Boreliano A de Y. Demonstração. Uma vez que os abertos de Y são também Borelianos de Y então é claro que 2. implica 1. Mostremos então que 1. implica 2. Considere-se a colecção de conjuntos C = A Y : f 1 (A) é um conjunto mensurável }. Quer-se provar que B(Y ) C. Uma vez que f é mensurável então C contém todos os abertos de Y. Por outro lado, usando as propriedades da imagem inversa mostra-se sem dificuldade que C é uma σ-álgebra de Y. Como a σ-álgebra de Borel B(Y ) é a menor σ-álgebra que contém C segue que B(Y ) C. Proposição 2.11. Seja X um espaço mensurável e f : X R. São equivalentes: 1. f é uma função mensurável. 2. f 1 (]a, ]) é mensurável qualquer que seja a R. Demonstração. Como ]a, ] é aberto de R segue que 1. implica 2. Para demonstrar a implicação inversa, considere-se (como na proposição anterior) o conjunto C = A R : f 1 (A) é um conjunto mensurável }. Quer-se mostrar que C contém todos os abertos de R. Sejam a, b R e vejamos que C contém os seguintes intervalos: 16

1. ]a, ] C. Segue por hipótese uma vez que f 1 (]a, ]) é mensurável. 2. [, b] C. De facto, f 1 ([, b]) = X \ f 1 (]b, ]). Como f 1 (]b, ]) é mensurável temos que X \f 1 (]b, ]) é mensurável. 3. ]a, b] C. De facto, f 1 (]a, b]) = f 1 ([, b] ]a, ]) = f 1 ([, b]) f 1 (]a, ]). Como f 1 ([, b]) e f 1 (]a, ]) são mensuráveis, segue que f 1 (]a, b]) é mensurável. 4. ]a, b[ C. De facto, tome-se uma sucessão crescente b n e convergente para b. Então f 1 (]a, b[) = f 1 ( ]a, b n ]) = f 1 (]a, b n ]). Como f 1 (]a, b n ]) é mensurável para todo n = 1, 2,... segue que f 1 (]a, b[) é mensurável. Finalmente, como todo o aberto A R pode ser escrito como uma união numerável de intervalos I n C do tipo 1, 2, 3 ou 4 temos que f 1 (A) = f 1 ( I n ) = f 1 (I n ), de onde segue que A é mensurável. Logo C contém todos os abertos de R. Exercício 20. Seja X um espaço topológico e (X, B) o espaço mensurável onde B é a σ-álgebra de Borel de X. Mostre que se f : X R é uma função contínua então f é mensurável. Exercício 21. Dado c R, mostre que a função constante f(x) = c para todo x R é uma função mensurável. Exercício 22. Seja f : X R uma função e defina-se f + f(x) se f(x) > 0 (x) = e f 0 se f(x) > 0 (x) = 0 se f(x) 0 f(x) se f(x) 0 a parte positiva e negativa de f, respectivamente. Mostre que f é mensurável sse f + e f são mensuráveis. (Dica: f + = f χ E onde E = x X : f(x) > 0}) 17

Exercício 23. Mostre que se f : X R uma função mensurável então f também é mensurável. Exercício 24. Seja f : X R uma função mensurável. Dado a R, mostre que o conjunto de nível x X : f(x) = a} é mensurável. Exercício 25. Considere um espaço mensurável (X, F) e um espaço métrico Y. Seja f : X Y uma função mensurável. Prove que a colecção de conjuntos C = A Y : f 1 (A) F } é uma σ-álgebra. De seguida veremos que limites de funções mensuráveis resultam em funções mensuráveis, ou seja, a passagem para o limite não destrói a mensurabilidade. Convém relembrar as seguintes definições. Dada uma sucessão a n R, n = 1, 2,..., o limite superior de a n é o número lim sup a n = inf n sup k 1 n k Ou seja, o maior dos pontos de acumulação da sucessão a n. Analogamente, o limite inferior de a n é o número a n. lim inf a n = sup inf a n. n n k Não é difícil verificar que lim sup n a n = lim inf n ( a n ). Notese que uma sucessão a n é convergente sse o seu limite superior e inferior coincidirem. Considere-se agora uma sucessão de funções f n : X R, n = 1, 2,.... Para cada x X, tem-se que f n (x) é uma sucessão em R. Logo podemos definir as funções sup f n e lim sup f n da seguinte maneira (sup f n )(x) = sup n 1 k 1 f n (x) e (lim sup f n )(x) = lim sup f n (x). n Define-se de forma análoga as funções inf f n e lim inf f n. Diz-se que f n converge pontualmente sse lim inf f n = lim sup f n. Proposição 2.12. Se f n : X R é uma sucessão de funções mensuráveis então inf f n, sup f n, lim inf f n e lim sup f n são funções mensuráveis. Demonstração. Não é difícil verificar a seguinte igualdade } x X : sup f n (x) > a = x X : f n (x) > a}. n k n=k 18

Como f n é uma função mensurável, segue da Proposição 2.11 que fn 1 ((a, ]) é um conjunto mensurável para todo a R. Logo, como a união numerável de conjuntos mensuráveis é mensurável, temos que (sup f n ) 1 ((a, ]) é mensurável. Segue outra vez da Proposição 2.11 que sup f n é uma função mensurável. A demonstração das restantes deixa-se como exercício. 2.3 Integração de funções não negativas Na secção anterior definimos medidas que tomam valores na semirecta estendida, ou seja, [0, ]. A introdução do infinito é necessária porque existem conjuntos de medida infinita, como é o caso da medida de Lebesgue de R. Portanto, no desenvolvimento da teoria de integração temos de ter algum cuidado com a aritmética em [0, ]. Assim, definimos para a adição a + = + a =, a [0, ], enquanto que para a multiplicação a = a = se a ]0, ] 0 se a = 0 Com estas convenções estendemos as leis usuais ao conjunto [0, ], com excepção da lei do corte para o infinito, como demonstra o exemplo: = 0 + = 1 + e no entanto 0 1. 2.3.1 Integração de funções simples Considere-se um espaço de medida (X, F, µ). Uma função ϕ : X [0, ) é simples sse ϕ(x) = a 1, a 2,..., a n } e A i = ϕ 1 (a i }) é um conjunto mensurável para i = 1, 2,..., n. Ou seja, uma função é simples se tiver um número finito de imagens e suas imagens inversas foram mensuráveis. Note-se que os conjuntos A i são disjuntos e sua união é X. Por outro lado pode-se escrever, ϕ(x) = n a i χ Ai (x), i=1 onde χ Ai são as funções características de A i. Exercício 26. Mostre toda a função simples é mensurável. 19

Definição 2.2. O integral de Lebesgue de uma função simples ϕ em E X relativo à medida µ é o número E ϕ dµ = n a i µ(e A i ). i=1 Observação 2.13. Uma vez que é possível µ(a i ) =, usa-se a convenção 0 = 0 descrita no início desta secção. Observação 2.14. Note-se que ϕ dµ = E X ϕ χ E dµ. Exemplo 2.15. Considere o espaço de medida (R, B, m) onde m é a medida de Borel. Segundo a definição anterior, o integral de Lebesgue da função simples χ Q em R relativo a m é χ Q dm = 0 m(r \ Q) + 1 m(q) = 0 + 1 0 = 0. Q Note-se que χ Q não é integrável segundo Riemann. Exercício 27. Sejam ϕ, ψ funções simples e a > 0. Mostre que ϕ + ψ e aϕ são funções simples. Exercício 28. Calcule o integral de Lebesgue em A [0, ) relativo a m das seguintes funções simples: 1. φ(x) = [x] e A = [0, 10]. 2. φ(x) = [ x 2] e A = [0, 2]. Nota: o símbolo [x] denota a parte inteira do número x. Exercício 29. Sejam ϕ, ψ duas funções simples em X. Mostre que se ϕ ψ então E ϕ dµ E ψ dµ para todo conjunto mensurável E. 20