A COLABORAÇÃO COMO UMA FORMA DE PROMOVER A APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA Francisco José Quaresma de Figueiredo (Universidade Federal de Goiás)

Documentos relacionados
Universidade Federal de Goiás Faculdade de Letras Pós-Graduação em Letras e Linguística Mestrado e Doutorado

Universidade Federal de Goiás Faculdade de Letras Pós-Graduação em Letras e Linguística Mestrado e Doutorado

Universidade Federal de Goiás Faculdade de Letras Pós-Graduação em Letras e Linguística Mestrado e Doutorado

Universidade Federal de Goiás Faculdade de Letras Pós-Graduação em Letras e Linguística Mestrado e Doutorado

ALLWRIGHT, R. L. The importance of interaction in classroom language learning. Applied Linguistics, v. 5, n. 2, p , 1984.

ALUNOS SURDOS: O USO DE SCAFFOLDINGS PARA A AQUISIÇÃO DE LÍNGUA INGLESA. Mestranda em Letras e Lingüística, Faculdade de Letras, UFG RESUMO

APRENDIZAGEM COLABORATIVA: ASPECTOS POSITIVOS DA INTERAÇÃO PARA INICIANTES EM LÍNGUA INGLESA

inglês: Online Collaborative Learning francês: Apprentissage Collaboratif en Ligne espanhol: Aprendizage Colaborativo Online

BILINGUISMO NA INFÂNCIA ATRAVÉS DO MÉTODO LEARNING FUN

AS TEORIAS VYGOTSKIANAS E SUAS APLICAÇÕES NA SALA DE AULA

OS JOGOS COMO FACILITADORES DA APRENDIZAGEM DE INGLÊS DE ALUNOS ADOLESCENTES: AS ESTRATÉGIAS MEDIADORAS EM FOCO

O uso da língua materna na aprendizagem da língua estrangeira: as perspectivas do aluno e do professor

Apêndice A: Trabalhos completos publicados em anais de congressos

Mestrado em Ciências da Educação Área de Inovação Pedagógica Seminário de. Avaliação de software educativo. Número de horas presenciais: 30

TEORIAS DE AQUISÇÃO DE L1 TEORIA SÓCIO INTERACIONISTA LLE 7042 ESTUDOS LINGUISTICOS II PROFA. RAQUEL D ELY

PLANO DE ENSINO DA DISCIPLINA BLOCO I IDENTIFICAÇÃO. (não preencher) Psicolinguística do Bilinguismo Segunda 09h-12h

Ambiente Virtual de Aprendizagem Moodle Conhecendo o ambiente. Prof a. Silvana Tabosa Salomão

Aprendizagem Colaborativa

PLANO DE ENSINO DA DISCIPLINA BLOCO I IDENTIFICAÇÃO. (não preencher) Topics on Language and Cognition Terça-feira 16h-18h

7 Considerações finais: Aprendendo com os erros

CURSO DE LICENCIATURA EM LETRAS PORTUGUÊS/INGLÊS PROGRAMA DE DISCIPLINA E DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO

PERCEPÇÕES DE UMA PROFESSORA E SEUS ALUNOS SOBRE O USO DE JOGOS NAS AULAS DE LE/INGLÊS

7. Uma análise final sobre os meus resultados

UM ESTUDO DAS POSSIBILIDADES PARA MELHORAR OS RESULTADOS DE ANÁLISE MATEMÁTICA I PARA ENGENHARIA DE POLÍMEROS

APRENDIZAGEM BASEADA EM PROBLEMA

Apresentação de professores e alunos. Esclarecimentos sobre o estágio supervisionado

Escrito por Davi Eberhard - SIL Dom, 10 de Abril de :47 - Última atualização Qui, 14 de Abril de :19

CLASSIFICAÇÃO DE ESTRATÉGIAS DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUAS 1 : CRITÉRIOS, ABORDAGENS E CONTRAPONTOS

INTERAÇÃO E COLABORAÇÃO NO PROCESSO DE ESCRITA E REESCRITA DE TEXTOS EM LÍNGUA INGLESA

PRODUÇÃO COLABORATIVA DE TEXTOS ESCRITOS EM LÍNGUA INGLESA:

DESEMPENHO EM ATIVIDADES DE AUTO-ESTUDO POR UM GRUPO DE ALUNOS- PROFESSORES DA REDE PÚBLICA DO ESTADO PARANÁ

SURDOS E OUVINTES EM UMA SALA DE AULA INCLUSIVA: INTERAÇÕES SOCIAIS, REPRESENTAÇÕES E CONSTRUÇÕES DE IDENTIDADES

FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE MATEMÁTICAS:

OS POSSÍVEIS BENEFÍCIOS DO USO DE UM FORMULÁRIO DE ORIENTAÇÃO

ESTRATÉGIAS MEDIADORAS UTILIZADAS POR ALUNOS EM JOGOS EM SALA DE AULA DE INGLÊS NA ESCOLA PÚBLICA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE ARTES E LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS. Proposta de Seminário de Estudos Avançados

CORREÇÃO E AUTOCORREÇÃO NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA ATRAVÉS DE TAREFAS COLABORATIVAS

Educação continuada para professores de inglês da rede pública - ECOPLI

PALAVRAS-CHAVE Abordagem complexa. Pedagogia do pós-método. Teoria da complexidade. Estágio supervisionado.

O uso das TIC numa perspectiva de mediação pedagógica

O PROFESSOR DE LEITURA EM LÍNGUA ESTRANGEIRA BARBRA SABOTA* INTRODUÇÃO

ANALYZING EMERGING ASPECTS AND STUDENTS' PERCEPTIONS OF A WRITTEN PRODUCTION IN PAIRS: AN EXPERIENCE IN AN ENGLISH LANGUAGE CLASSROOM

ANO LECTIVO DE HORAS SEMANAIS 3,5 UC PRETENDE DESENVOLVER NOS ALUNOS A CAPACIDADE DE ANALISAR AS

Conhecimento Específico

PARA QUE SERVE A CRECHE E A PRÉ- ESCOLA = FINALIDADE NA SOCIEDADE: QUAL SEU PAPEL / FUNÇÃO DIANTE DA CRIANÇAS E DE SUAS FAMÍLIAS

UNIDADE 1 Ambientes virtuais de aprendizagem

liderança escolar curso de Inspirado no modelo inglês de formação de gestores Comprometimento Trabalho em equipe

PLAYING GAMES! UMA ANÁLISE DE ESTRATÉGIAS MEDIADORAS UTILIZADAS POR ALUNOS EM JOGOS NAS AULAS DE INGLÊS

INGLÊS INSTRUMENTAL: uma abordagem.

COMO SER UM PROFESSOR AUTÔNOMO? DA TEORIA À PRÁTICA, REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE ALEMÃO COMO LE

ESP: O USO DAS ESTRATÉGIAS DE LEITURA PARA COMPREENSÃO DE TEXTOS EM LÍNGUA INGLESA

Considerações básicas sobre pesquisa em sala de aula

EDITAL 93/2018 CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA O PROVIMENTO DOS CARGOS DA CARREIRA DO MAGISTÉRIO DO ENSINO BÁSICO, TÉCNICO E TECNOLÓGICO

A motivação como elemento propulsor da aprendizagem implícita da pronúncia de palavras em inglês por meio do game Pac-English

O PROCESSO DE COLABORAÇÃO NA PRODUÇÃO DE TEXTOS EM ESCRITA DAS LÍNGUAS DE SINAIS (ELIS): UM ESTUDO SOBRE AS INTERAÇÕES ENTRE ALUNOS SURDOS

Universidade Estadual de Maringá PROGRAMA E CRITÉRIO DE AVALIAÇÃO DE DISCIPLINA

MAPAS CONCEITUAIS NA EDUCAÇÃO: PROPONDO UMA NOVA INTERFACE PARA AMBIENTES DE APRENDIZAGEM BASEADOS NA PLATAFORMA MOODLE

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS FACULDADE DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS E LINGUÍSTICA MARCO ANDRÉ FRANCO DE ARAÚJO LET S PLAY GAMES!

ESTUDO DE CASO: AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO ENSINO DE ELETROMAGNETISMO NO CURSO DE TECNOLOGIA EM SISTEMAS DE TELECOMUNICAÇÕES DO IFPA/CAMPUS BELÉM 1

O TRABALHO DO PROFESSOR COMO AGENTE LETRADOR EM TURMAS DO 6 ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL

Metodologias ativas na EaD. Sandra Rodrigues

LIVRO DIDÁTICO X VARIAÇÃO LINGUÍSTICA

INTERAÇÃO SOB A PERSPECTIVA DO PROFESSOR DE LÍNGUA INGLESA

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS DE ANÁPOLIS

ETNOMATEMÁTICA E LETRAMENTO: UM OLHAR SOBRE O CONHECIMENTO MATEMÁTICO EM UMA FEIRA LIVRE

Tratamento corretivo na escrita colaborativa em língua inglesa em meio digital

A NOÇÃO DOS PROFESSORES DE INGLÊS SOBRE A ABORDAGEM

PLANO DE ENSINO DA DISCIPLINA BLOCO I IDENTIFICAÇÃO. (não preencher) Linguagem e cognição Quarta 16h-18h

Palavras chave: trabalho colaborativo, desenvolvimento profissional, articulação curricular, tarefas de investigação e exploração.

Ensino sem fronteira

Metodologias Ativas. Parte 04 Aprendizagem Baseada em Projetos. Prof. Dr. Dilermando Piva Jr.

RECURSOS EDUCACIONAIS. Metodologias de ensino-aprendizagem

AVALIAÇÃO. Educação Orientada para Resultados (EOR/OBE)

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS CENTRO DE ENSINO E PESQUISA APLICADA À EDUCAÇÃO NOME DO ALUNO TÍTULO DO TRABALHO

Padrão: Ensino. David Ausubel [1] afirma que para haver aprendizagem significativa é preciso haver duas condições:

1 Introdução. A linguagem é o maior tesouro da raça humana. É um mistério que une uma pessoa a outra no tempo e no espaço. (Stevick, 1996: 3)

REESCRITA COMO PRÁTICA AVALIATIVA NA FORMAÇÃO INICIAL DE PROFESSORES NAS LICENCIATURAS

A TEORIA SÓCIO-CULTURAL DA APRENDIZAGEM E DO ENSINO. Leon S. Vygotsky ( )

Subjects on this conversation: Nathanael s first contact with Portuguese and his experience living in Brazil.

Programa Two-Way Português/Inglês. O que os pais precisam saber..

A interação e o processo de negociação em L2

Volume 2, Janeiro-março de O CONCEITO DE MEDIAÇÃO E ZDP EM SALA DE AULA DE LÍNGUA ESTRANGEIRA

A IMPORTÂNCIA DO PAIR WORK NA SALA DE AULA DE LÍNGUA INGLESA PARA NÍVEIS INICIAIS

Caderno 2 de Prova PR02. Inglês. Professor de. Prefeitura Municipal de Florianópolis Secretaria Municipal de Educação. Edital n o 003/2009

Construção de glossário das provas de inglês do vestibular da UFRGS em um curso pré-vestibular popular

Inglês para fins específicos Inglês instrumental. Profa. Ms. Valéria Lopes de Aguiar Bacalá

A MATEMÁTICA E O ALUNO SURDO: INCLUSÃO, DESAFIOS E ESTRATÉGIAS NO CAMINHO DA APRENDIZAGEM

CAPÍTULO. Rabelo, Ana Paula Stoppa 1 *; Andreata, Mauro Antonio 2 ; Stoppa, Marcelo Henrique 3. Universidade Federal de Goiás/Catalão

APRENDENDO SEMPRE RESUMO

CRENÇAS QUE ALUNOS DE LETRAS PORTUGUÊS/INGLÊS MANIFESTAM A RESPEITO DO PAPEL DA GRAMÁTICA NO ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA

A Linguística de Corpus no ensino de línguas materna ou estrangeira ANDRÉA GEROLDO DOS SANTOS XII SEMANA DE FILOLOGIA FFLCH -USP

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE CIÊNCIAS SÓCIO-ECONÔMICAS E HUMANAS DE ANÁPOLIS COORDENAÇÃO DO MIELT. Plano de Curso 2012

TAREFAS COLABORATIVAS COMO PROMOTORAS DE NEGOCIAÇÃO ENTRE APRENDIZES DE INGLÊS 1

Atuação do professor em Sala de Aula e Inovação do Ensino. Anne L. Scarinci

Acessibilidade: mediação pedagógica. Prof. Blaise Duarte Keniel da Cruz Prof. Célia Diva Renck Hoefelmann

COORDENAÇÃO DE LETRAS PORTUGUÊS E INGLÊS PLANO DE CURSO

Sistemas de Tutoria em Cursos a Distância. Semana 5 A importância do papel do tutor num curso a distância. Giulliana Panzer Sobral

AUXILIO FORMAÇÃO O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA ATRAVÉS DOS GÊNEROS TEXTUAIS: (RE)PENSANDO A LÍNGUA PORTUGUESA COMO CAPITAL CULTURAL

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO PRO-REITORIA DE ENSINO, PESQUISA E PÓS GRADUAÇÃO DIREÇÃO DE ENSINO COORDENAÇÃO DE ENSINO TÉCNICO PLANO DE ENSINO

O processo de ensino e aprendizagem em Ciências no Ensino Fundamental. Aula 2

Transcrição:

A COLABORAÇÃO COMO UMA FORMA DE PROMOVER A APRENDIZAGEM DE LÍNGUA ESTRANGEIRA Francisco José Quaresma de Figueiredo (Universidade Federal de Goiás) Alguns estudiosos (Johnson, 1995; Tsui, 1995, entre outros) descrevem a interação na sala de aula como sendo predominantemente estruturada da seguinte forma: o professor inicia a interação, estruturando uma pergunta e solicitando que um aluno responda, o aluno responde à pergunta e o professor faz algum comentário. Por exemplo: Professor inicia: What is this? Aluno responde: It s a ball. Professor comenta: Very good. Segundo Thornbury (1996), a seqüência Inicia-Responde-Comenta, especialmente quando o comentário consiste em um feedback, restringe o desenvolvimento de interações autênticas em sala de aula, pois o discurso, nessa perspectiva, é totalmente controlado pelo professor. Além de controlar o discurso, as pesquisas mostram que, geralmente, o professor domina os turnos de fala em sala de aula, alocando pouco tempo para a produção lingüística dos alunos. Johnson (1995) afirma que, mesmo na interação aluno-aluno, o professor ainda mantém certo controle sobre a fala dos alunos, tanto no que diz respeito à estrutura quanto ao conteúdo. O que se percebe é que, geralmente, poucos são os alunos que tentam introduzir um tópico ou interromper o professor (cf. Dalacorte, 1999). O que geralmente ocorre é que os alunos permanecem com dúvidas e em silêncio. Segundo Musumei (1996), os alunos preferem pedir ajuda quando em pequenos grupos ou em interação pessoal com o professor.

2 Dessa forma, para otimizar a participação dos aprendizes e para torná-los mais envolvidos no seu processo de aprendizagem, é necessário que sejam desenvolvidas, em sala de aula, atividades nas quais os alunos possam interagir entre si e aprender uns com os outros. Trabalhando de forma colaborativa, os aprendizes podem trocar não apenas informações, mas também estratégias de aprendizagem. Daí, a importância de utilizarmos uma abordagem colaborativa no ensino de línguas. A aprendizagem colaborativa de línguas A aprendizagem colaborativa é uma abordagem construtivista, que se refere, grosso modo, a situações educacionais em que duas ou mais pessoas aprendem ou tentam aprender algo juntas, seja por meio de interações em sala de aula ou fora dela, seja por intermédio de interações mediadas pelo computador (Dillenbourg, 1999), cuja ênfase recai na coconstrução do conhecimento dentro e a partir dessas interações. Essa abordagem tem sido objeto de estudo de vários pesquisadores (Tinzmann et al., 1990; Kessler, 1992; Oxford, 1997; Bruffee, 1999; Figueiredo, 2006) devido ao fato de a interação não ajudar apenas os alunos menos experientes: ela também leva os alunos mais experientes a descobrir novas formas de aprender. Conforme nos mostram alguns autores (Tinzmann et al., 1990; Oxford, 1997; Figueiredo, 2006), a aprendizagem colaborativa baseia-se, principalmente, na teoria sociocultural, elaborada por Vygotsky e seus colaboradores. De acordo com essa teoria, o homem é um ser social e aprende por meio da interação com outras pessoas. De acordo com a teoria vygotskiana, a criança passa por três estágios de desenvolvimento cognitivo (Vygotsky, 1981):

3 a) regulação pelo objeto: o ambiente exerce influência sobre a criança; b) regulação pelo outro: a criança é capaz de realizar certas tarefas com o auxílio de outras pessoas; c) auto-regulação: a criança, de forma independente, desenvolve estratégias para realizar as tarefas. A transição do estágio de regulação pelo outro (atividade interpsicológica) para o estágio de auto-regulação (atividade intrapsicológica) é favorecida por estruturas de apoio conhecidas como scaffolding e ocorre na zona de desenvolvimento proximal, 1 na qual a criança e o adulto se engajam num processo dialógico (Lantolf e Appel, 1994). O scaffolding é descrito como um processo que possibilita à criança ou ao aprendiz solucionar um problema, realizar uma tarefa, ou atingir um objetivo que estaria além dos seus esforços, caso não tivesse a ajuda de uma outra pessoa (Wood, Bruner e Ross, 1976). Alguns autores (Long e Porter, 1985; Coelho, 1992) têm demonstrado os benefícios pedagógicos do trabalho em grupo em sala de aula de línguas estrangeiras. Um dos grandes benefícios observados é o fato de que a aprendizagem colaborativa maximiza a aquisição de L2 por promover oportunidades tanto para input quanto para output (Long e Porter, 1985; Ehrman e Dörnyei, 1998). Segundo Swain (2000, p. 97), é por meio do diálogo colaborativo que o uso da língua e a aprendizagem da língua podem ocorrer. Wiersema (2000) acrescenta, ainda, que, se os alunos aprenderem a trabalhar juntos na sala de aula, 1. A zona de desenvolvimento proximal é definida como a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros mais capazes (Vygotsky, 1998, p. 112).

4 eles terão a chance de se tornarem melhores cidadãos, visto que será mais fácil para eles interagir com pessoas que, por ventura, tenham pontos de vista diferentes dos deles. O papel do professor e dos alunos na aprendizagem colaborativa Dessa forma, na aprendizagem colaborativa, o professor exerce um papel importantíssimo de facilitador e de mediador (Tinzmann et al., 1990), na medida em que medeia o processo de aprendizagem em vez de controlá-lo ou de apenas fornecer informações para os alunos. O professor, nesse sentido, é a chave para que a aprendizagem colaborativa ocorra (McDonell, 1992), e ele deve ter uma postura em sala de aula de modo a tornar os alunos mais autônomos, a fim de conferir ao aprendiz um papel mais significativo no processo de aprendizagem. Diferentemente de uma sala de aula tradicional, na qual os alunos recebem o conhecimento do professor de forma passiva, na sala de aula em que se adota uma perspectiva colaborativa, os alunos tornam-se colaboradores e participantes ativos do processo (Tinzmann et al., 1990). Eles têm a oportunidade de aprender com os colegas e de ensinar a eles. Ao resolverem uma atividade em grupo, os alunos podem perceber o que ainda têm de aprender, têm a oportunidade de desenvolver suas habilidades sociais e afetivas por meio da interação decorrente desse tipo de abordagem e podem compartilhar estratégias de aprendizagem. Desse modo, os alunos têm a oportunidade de se tornarem mais reflexivos e mais autônomos, visto que, por intermédio das trocas de informações e pontos de vista e da regulação pelo outro, podem se tornar auto-regulados.

5 Algumas fontes de resistência quanto ao uso da aprendizagem colaborativa A interação entre os alunos não resulta apenas em concordâncias, mas envolve também discordâncias (Matusov, 1996; Ehrman e Dörnyei, 1998), ou conflitos cognitivos (Perret-Clermont,1980, citado por Forman e Cazden, 1985), pois, por meio do diálogo, os alunos não agem passivamente e, dessa forma, são capazes de exprimir suas opiniões e seus pontos de vista. Porém, como afirma Perret-Clermont (1980, citado por Forman e Cazden, 1985), o conflito cognitivo traz à tona os desequilíbrios que tornam necessária a elaboração cognitiva e, dessa forma, confere um papel especial ao fator social como um entre outros fatores que levam ao crescimento cognitivo. Kinsella e Sherak (1998) advertem, ainda, que, no sistema educacional em geral, a centralização do saber e o controle das atividades em sala de aula estão focalizados na figura do professor. Isto pode fazer com que os alunos não se tornem tão entusiasmados com a idéia de trabalhar em grupos, pois estes estariam acostumados a aceitar tudo que vem do professor como uma verdade incontestável, não confiando, pois, no que os colegas teriam a lhes dizer. Um outro aspecto, considerado nos estudos sobre o trabalho em grupo, é o fato de que esse tipo de interação pode promover o uso da L1 na sala de aula de L2 (Prabhu, 1987). Contudo, estudiosos do assunto (Brooks e Donato, 1994; Antón e Dicamilla, 1999) demonstram que o uso da L1 não deve ser visto como um impedimento para a aprendizagem de L2, mas, sim, como um scaffolding utilizado pelos alunos para facilitar esse processo.

6 Alguns estudos cujo foco foi a aprendizagem colaborativa A título de ilustração, apresentarei dois estudos cujo foco foi a aprendizagem colaborativa: o estudo de Figueiredo (2001), sobre revisão colaborativa de textos escritos em inglês; e o de Souza (2003), sobre aprendizagem colaborativa no meio virtual. O estudo de Figueiredo (2001), sobre revisão colaborativa de textos escritos em inglês Figueiredo (2001) investigou uma forma de correção de textos escritos em inglês conhecida por correção com os pares. O objetivo do estudo foi compreender este tipo de correção dialógica e verificar sua influência na aprendizagem de língua inglesa, bem como investigar as percepções dos alunos sobre suas participações em tais atividades de correção. Participaram do estudo 10 alunos (cinco pares de alunos) formandos de inglês da UFG, durante o primeiro semestre de 1999. Os alunos escreviam individualmente seus textos e, posteriormente, realizavam a correção com o seu par. Após a correção, os textos eram reescritos e entregues para a professora da turma. Por meio da interação com o colega e da discussão sobre os textos, os alunos foram capazes de corrigir 31% dos erros existentes na primeira versão de seus textos. Os participantes do estudo consideraram a correção com os pares uma atividade produtiva, pois, além de terem tido a chance de colaborar com o colega, puderam refletir mais sobre sua produção textual, como exemplificado 2 com o relato de uma das participantes do estudo: 2. Os exemplos aqui apresentados foram transcritos verbatim.

7 Paloma: Não, ah eu não me importo se a professora corrigir ou se a Pollyana corrigir, pra mim tanto faz. Mas o bom que a Pollyana corrigindo é que a gente discute o nosso erro, entendeu? Agora, quando a professora corrige, às vezes ela corrige e te entrega, né? Às vezes, assim, eu só dou uma olhadinha assim e pluft e nem olho muito, sabe, e guardo. Agora, se uma fala pra outra o erro, aí é melhor, cê discute, cê vê o que que cê errou. [...] cê aprende mais, né, se tem uma pessoa, um amigo corrigindo. A não ser que o seu professor pegue você e faça Paloma, senta aqui, né, e vai mostrando. Mas esse negócio de você corrigir e entregar, eu pelo menos, tem aluno, a Pollyana mesmo ela olha tudo que errou. Eu não, eu olho a nota. Os erros, às vezes eu olho, às vezes eu nem olho, entendeu? (risos) (Figueiredo, 2001, p. 173) Como aspectos negativos desse tipo de correção, os alunos mencionaram, por exemplo, a falta de confiança na correção do colega, dificuldade em encontrar os erros, dúvidas ao corrigir o texto do colega, erros induzidos pelo colega etc. O exemplo seguinte ilustra uma situação em que a aluna cometeu um erro por causa da sugestão recebida da colega, durante a realização da atividade de correção: Ângela: Eu acho que a atividade com a colega, sim, ela me fez alterar uma estrutura que depois a professora foi fazer a correção com a gente e a minha estrutura estava certa, né? Então, eu achei que isso foi um pouco, foi chato, né? [...] (Figueiredo, 2001, p. 190) Apesar de ter alguns aspectos negativos, a revisão colaborativa serviu não apenas para ocasionar melhorias nos textos, mas para tornar os alunos mais motivados e confiantes na medida em que perceberam que puderam ajudar um ao outro a resolver os erros existentes em seus textos. Por meio desse tipo de atividade, os alunos começaram a compreender a correção como uma forma de aprender e não como uma forma de evidenciar seus erros.

8 O estudo de Souza (2003), sobre aprendizagem colaborativa no meio virtual O estudo de Souza (2003) teve por objetivo verificar como aprendizes, de duas culturas diferentes, realizariam suas prioridades de aprendizagem por meio de interação mediada por computador. Para tanto, foi implementado um projeto de telecolaboração denominado Projeto de Aprendizagem de Português-Inglês em Regime de Tandem. Por aprendizagem em regime de tandem entende-se a colaboração entre falantes de duas línguas distintas, que têm como objetivo a aprendizagem da língua um do outro. Participaram da pesquisa 4 estudantes brasileiros (alunos de Letras da UFMG) e 5 estudantes australianos (alunos de diversos cursos da University of Melbourne) ao longo de 10 semanas, no segundo semestre de 2001, que formaram 3 duplas e 1 trio. A esses alunos foram delegadas atividades 3 que, para serem realizadas, implicavam a colaboração do(s) parceiro(s). Como pontos positivos do projeto telecolaborativo, os alunos mencionaram o fato de poder ter contato com usos da língua não presentes nos livros didáticos, a oportunidade de ter acesso a uma outra cultura e de poder ter uma maior conscientização metalingüística, visto que tinham de explicar aspectos gramaticais e semânticos de sua língua materna ao parceiro falante da outra língua. A oportunidade de aprender a língua portuguesa é mencionada por um dos participantes australianos: Herbert: Meudiario: Eu gosto esta idea, é bem legal mas vai ser deficíl a fazer sempre, todos os semanas. Para mim 400 palavras gastará muito tempo. Por ao outro lado, com isto rejeme vou 3. Os participantes tinham, por exemplo, de planejar uma viagem a Belo Horizonte e a Melbourne, discutir sobre temas correntes na mídia das duas localidades, falar sobre hábitos alimentares regionais etc.

9 aprender muito mas portugues do que estou aprendendo agora porque ficará sem vergonha a pergunta. Tenho que ir para Biology Tchaw (Souza, 2003, p. 221) Como pontos negativos, os participantes do estudo mencionaram a divergência nas expectativas e motivações dos participantes, ou seja, alguns tinham interesse por aspectos culturais, outros tinham interesse por aspectos lingüísticos; alguns queriam se corrigidos, outros não gostavam de corrigir. Mencionaram, ainda, a demora nas respostas para as mensagens enviadas ao parceiro, falta de tempo para participar efetivamente do projeto, tensão causada pela falta de colaboração, o que, de certa forma, poderia inviabilizar a realização das tarefas, como podemos ver no seguinte relato de uma aluna brasileira: Helena Myjournal: Olá Ricardo Bem... novamente a minha parceira neste projeto nem deu as caras esta semana. Aliás, eu até hj não troquei nenhuma msg com ela na semana do Português. E mesmo escrevendo para ela, e expondo a situação, nada mudou. Nem sequer um retorno eu recebi. E por causa disto eu já perdi o entusiasmo q outrora tinha com este projeto. E eu não sei se irei continuá-lo. (Souza, 2003. p. 165) Apesar dos pontos negativos, a avaliação global do projeto foi positiva, visto que proporcionou oportunidades significativas de interação entre os participantes falantes das duas línguas. Os alunos também puderam ampliar seus conhecimentos lingüísticos e culturais por meio da interação com o participante do outro país. Considerações finais Os dois estudos, aqui ilustrados, demonstram a importância de atividades colaborativas para a aprendizagem de línguas estrangeiras seja por meio da interação face

10 a face, seja por meio da interação virtual, visto que os alunos tornam-se mais ativos no processo de aprendizagem, por não receberem passivamente informações do professor. Atividades colaborativas têm, ainda, o potencial de promover o desenvolvimento das habilidades intelectuais, sociais e afetivas, bem como o de favorecer a interação e a autonomia. A colaboração é um conceito importante no processo de ensino-aprendizagem, pois enfatiza a questão da mutualidade da aprendizagem na realização de atividades, bem como de uma maior significação nos relacionamentos humanos. Cabe, então, a nós, professores, proporcionar um ambiente de aprendizagem no qual os alunos se engajem em atividades nas quais tenham a oportunidade de interagir significativamente e que, através da interação e da colaboração, possam colocar em prática o que aprenderam e de aprenderem ainda mais uns com os outros. Referências ANTÓN, M.; DICAMILLA, F. J. Socio-cognitive functions of L1 collaborative interaction in the L2 classroom. The Modern Language Journal, v. 83, n. 2, p. 233-247, 1999. BROOKS, F. B.; DONATO, R. Vygotskyan approaches to understanding foreign language learner discourse during communicative tasks. Hispania, v. 77, p. 262-274, 1994. BRUFFEE, K. A. Collaborative Learning: Higher Education, Interdependence, and the Authority of Knowledge. London: The Johns Hopkins University Press, 1999. COELHO, E. Cooperative learning: foundation for a communicative curriculum. In: KESSLER, C. (Ed.). Cooperative language learning: a teacher s resource book. New Jersey: Prentice Hall Regents, 1992. p. 31-49. DALACORTE, M. C. F. A participação dos aprendizes na interação em sala de aula de inglês: um estudo de caso. 1999. Tese (Doutorado em Letras) Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999.

11 DILLENBOURG, P. What do you mean by collaborative learning? In: DILLENBOURG, P. (Ed.). Collaborative learning: cognitive and computational approaches. Oxford: Elsevier, 1999. p. 1-19. Disponível em: <http://tecfa.unige.ch/tecfa/publicat/dil-papers-2/dil.7.1.14.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2004. EHRMAN, M. E.; DÖRNYEI, Z. Interpersonal dynamics in second language education: the visible and invisible classroom. Thousand Oaks: SAGE Publications, 1998. FIGUEIREDO, F. J. Q. de. Correção com os pares: os efeitos do processo da correção dialogada na aprendizagem da escrita em língua inglesa. 2001. Tese (Doutorado em Letras: Estudos Lingüísticos) Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001. FIGUEIREDO, F. J. Q. de. (Org.). A aprendizagem colaborativa de línguas. Goiânia: Ed. da UFG, 2006. FORMAN, E. A.; CAZDEN, C. B. Exploring vygotskian perspectives in education: the cognitive value of peer interaction. In: WERTCH, J. V. (Ed.). Culture, communication and cognition: vygotskian perspectives. New York: Cambridge University Press, 1985. p. 323-347. JOHNSON, K. E. Understanding communication in the classroom. New York: Cambridge University Press, 1995. KESSLER, C. (Ed.). Cooperative Language Learning: A Teacher s Resource Book. New Jersey: Prentice Hall Regents, 1992. KINSELLA, K.; SHERAK, K. Designing ESL classroom collaboration to accommodate diverse work styles. In: REID, J. M. (Ed.). Understanding learning styles in the second language classroom. New Jersey: Prentice Hall Regents, 1998. p. 85-99. LANTOLF, J.; APPEL, G. Theoretical framework: an introduction to vygotskian perspectives on second language research. In. LANTOLF, J.; APPEL, G. (Ed.). Vygotskian approaches to second language research. New Jersey: Ablex Publishing Corporation, 1994. p. 1-32. LONG, M. H.; PORTER, P. A. Group work, interlanguage talk, and second language acquisition. TESOL Quarterly, v. 19, n. 2, p. 207-228, 1985. MATUSOV, E. Intersubjectivity without Agreement. Mind, Culture, and Activity, v. 3, n. 1, p. 25-45, 1996. MCDONELL, W. The role of the teacher in the cooperative learning classroom. In: KESSLER, C. (Ed.). Cooperative language learning: a teacher s resource book. New Jersey: Prentice Hall Regents, 1992. p.163-174. MUSUMEI, D. Teacher-learner negotiation in content-based instruction: communication at cross-purposes. Applied Linguistics, v. 7, n.3, p. 286-325, 1996.

12 OXFORD, R. L. Cooperative learning, collaborative learning, and interaction: Three communicative strands in the language classroom. The Modern Language Journal, v. 81, n. 4, p. 443-456, 1997. PERRET-CLERMONT, A. N. Social interaction and cognitive development in children. New York: Academic Press, 1980. PRABHU, N. S. Second language pedagogy. Oxford: Oxford University Press, 1987. SOUZA, R. A. Aprendizagem de línguas em tandem - Estudo da telecolaboração através da comunicação mediada pelo computador. 2003. Tese (Doutorado em Letras: Estudos Lingüísticos) Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2003. SWAIN, M. The output hypothesis and beyond: mediating acquisition through collaborative dialogue. In: LANTOLF, J. P. (Ed.). Sociocultural theory and second language learning. Hong Kong: Oxford University Press, 2000. p. 97-114. THORNBURY, S. Teachers research teacher talk. ELT Journal, v. 50. n. 4, p. 279-289, 1006. TINZMAN, M. B.; JONES, B. F.; FENNIMORE, T. F.; BAKKER, J.; FINE, C.; PIERCE, J. What is the collaborative classroom? 1990. Disponível em: <http://www.ncrel.org/sdrs/areas/rpl_esys/collab.htm>. Acesso em: 9 out. 2003. TSUI, A. B. M. Introducing classroom interaction. London: Penguin, 1995. VYGOTSKY, L. S. The development of higher forms of attention in childhood. In: WERTSCH, J. V. (Ed.). The concept of activity in Soviet psychology. New York: M.E. Sharpe, 1981b. p.189-240.. A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. São Paulo: M. Fontes, 1998. WIERSEMA, N. How does collaborative learning actually work in a classroom and how do students react to it? a brief reflection. 2000. Disponível em: <http://www.lgu.ac.uk/deliberations/collab.learning/wiersema.html>. Acesso em: 9 out. 2003. WOOD, D.; BRUNER, J. S.; ROSS, G. The role of tutoring in problem solving. Journal of Child Psychology and Psychiatry, v. 17, p. 89-100, 1976.