Parecer nº 02/2014-CGJ/CE Referência: 8501836-35.2013.8.06.0026 Assunto: NEPOTISMO ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA GABINETE DA ASSESSORIA JURÍDICA Interessado: ANTÔNIO CARNEIRO ROBERTO JUIZ DE DIREITO Trata-se de processo (CONSULTA JURÍDICA) cujo pedido formulado pelo Sr. Antônio Carneiro Roberto, Juiz de Direito Diretor do Foro da Comarca de Tianguá/CE, objetiva a sua orientação no sentido da possibilidade de indicação do cônjuge para a interinidade de tabeliã substituta indicada pelo Sr. Thyago Ribeiro Soares, o qual formalizou sua Renúncia perante aquele juízo em virtude de aprovação em concurso público de provas e títulos em outro Estado da Federação. Os autos ascenderam a esta assessoria jurídica (fl. 46). É o breve relatório. Conforme relatado, o objeto da presente consulta configura-se na possibilidade de indicação de parente para a assunção das atividades anteriormente exercidas pelo Tabelião de Registros de Imóveis suso mencionado, precisamente da sua esposa. Ab initio, mister salientar que a nomeação de oficial de registro substituto interino segue as regras elencadas no art. 20, da Lei nº. 8.935/1994 Lei dos Notários e Registradores in verbis: Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho. 49
Depreende-se, portanto, da norma nuper-transcrita, que esta expressamente afirma que caberá aos notários e oficiais de registro contratar os substitutos, nada dispondo acerca da possibilidade de indicação de parente próximo, motivo pelo qual deve ser levado em consideração o princípio da legalidade ao caso sub examine. Em outras palavras, não há óbice legal na indicação de parente ao cargo de notários e oficiais de registro, e consequentemente, de nomeação do mesmo. Ad argumentandum tantum, apenas para fins de esclarecimento acerca do assunto, a Súmula Vinculante nº. 13 do Supremo Tribunal Federal 1 não se aplica ao caso em apreço. É que, inobstante a súmula vinculante nº. 13 trate do nepotismo, esta carrega em seu bojo a nomeação de servidor investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, o que não é dirigido aos delegatários de serviços públicos das serventias extrajudiciais. Preliminarmente, importante levar em consideração que as serventias extrajudiciais NÃO integram a estrutura orgânica do Poder Judiciário a que alude o art. 92, da Constituição Federal de 1988. Em segundo lugar, não se trata de nomeação para o desempenho de um cargo, muito menos em comissão ou função comissionada, mas de contratação para um emprego, na acepção do Direito Administrativo. In hoc casu, ressalte-se que o regime jurídico a que estão submetidas as serventias extrajudiciais reside na equiparação de atividades, em caráter privado, por delegação do Poder Público e sob a fiscalização deste. Inobstante a controvérsia existente acerca do assunto, salienta-se que a Carta Política de 1988, em seu art. 236, caput, dispõe o seguinte: 1 A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal. 50
Art. 236. Os serviços notariais são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. Desta forma, depreende-se, claramente, que os serviços notariais são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, inferindo-se, portanto, que não se trata de cargo público. Por delegação constitucional direta deverá ser prestada, mediante concurso público de provas e títulos, por pessoas privadas. É atividade de execução da lei e, portanto, de natureza tipicamente administrativa. À luz da clássica tripartição das funções estatais originalmente proposta por MONTESQUIEU, aceita dogmaticamente como um dos pilares de sustentação do denominado Estado de Direito, outra solução não será possível, uma vez que não haverá de ser tida como legislativa (pois por ela não são produzidas normas genéricas disciplinadoras da vida em sociedade, ou seja, atos legislativos) ou como jurisdicional (uma vez que por ela também não são aplicadas sanções aos transgressores da ordem jurídica, ou seja, produzidas sentenças judiciais dotadas da autoridade de coisa julgada). Logo, consubstancia-se em típica e propriamente enquadrada no âmbito da função administrativa do Estado, integrando o objeto de estudo e de disciplina do Direito Administrativo, conforme dito anteriormente. Com a finalidade de se evitarem maiores delongas, na conceituação de serviços públicos, adota-se, no momento, a definição de serviço público proposta por JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO 1, segundo o qual é toda atividade prestada pelo Estado ou por seus delegados, basicamente sob regime de direito público, com vistas à satisfação de necessidades essenciais e secundárias da coletividade.. Nesse ínterim, por serem agentes delegados pelo Poder Público, em conformidade com o disposto na Lei Máxima/1988, a natureza jurídica de suas atribuições está intrinsecamente ligada ao desempenho de atividades estatais remuneradas pelos particulares usuários dos seus serviços. 1 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 23ª ed. rev., ampl. e atualizada até 31.12.2009. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, pág. 350. 51
Importante destacar o entendimento do Mestre LUCAS ROCHA FURTADO 1, a respeito do tema, in verbis: [...] Notários e registradores, tradutores oficiais e leiloeiros, em razão de delegação do poder público, desempenham atividades estatais em seus próprios nomes e sob fiscalização do Estado. A remuneração dos agentes delegados não é paga pelos cofres públicos, mas pelos usuários dos serviços. (Destaco). Este aspecto é essencial para caracterização do agente público delegado. Lembre-se, ainda, que a Lei nº. 8.935/1994 estatuiu o seguinte: Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito às despesas de custeio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestação dos serviços. [ ] Art. 41. Incumbe aos notários e aos oficiais de registro praticar, independentemente de autorização, todos os atos previstos em lei necessários à organização e execução dos serviços, podendo, ainda, adotar sistemas de computação, microfilmagem, disco ótico e outros meios de reprodução. (Grifos nossos). Conforme evidenciado nos dispositivos supra colacionados, o sistema normativo atribui a prerrogativa de organização e gerenciamento das atividades administrativas da serventia extrajudicial, na medida de critérios próprios de conveniência e oportunidade. D'outra banda, as obras, serviços, alienações, compras realizadas pelos Cartórios não estão submetidos ao regime de licitações e contratos administrativos instituído pela Lei nº. 8.666/1993. No cotejo dessas considerações, o Conselho Nacional de Justiça, através do julgamento proferido nos autos do procedimento de controle administrativo nº. 20090000000060, sedimentou entendimento acerca do assunto, in verbis: 1 FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. 2ª ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2010, pág. 924. 52
EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CONSULTA. NEPOTISMO. OBJETIVO DE ESCLARECER O ALCANCE E APLICAÇÃO DA RES. 7/2005 E DA SÚMULA VINCULANTE Nº. 13 DO STF AOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. CONSULTA RESPONDIDA NEGATIVAMENTE. - I) 'O plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os notários e os registradores exercem atividade estatal, mas não são titulares de cargo público efetivo, tampouco ocupam cargo público (ADI 2.602-0, Rel. Min. Eros Grau) de sorte que, não recebendo vencimentos do Estado e remunerando seus empregados com recursos próprios, nada impede que tenham parentes contratados pelo regime da CLT posto que estes só poderão ser titulares de serventias se aprovados em concurso de provas e títulos, desde que os contratantes sejam titulares concursados. II) 'A Res. 7/2005 do CNJ disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário, segundo a dicção do seu art. 1º, não tendo, portanto, incidência sobre a atividade exercida pelas serventias extrajudiciais, as quais não se caracterizam como órgãos desse Poder, que apenas exerce fiscalização sobre elas.' (PCA CONSULTA JURÍDICA Nº. 20090000000060, Relator Conselheiro Rui Stoco, VOTO Nº. 216/09). Com esteio na presente argumentação, em resposta à consulta requerida, opina esta assessoria jurídica pela possibilidade de indicação e nomeação de parentes para o exercício das funções delegadas de serviço público enquanto substitutos interinos. À consideração superior. Fortaleza, 14 de janeiro de 2014. DAVID SOUSA ALENCAR ASSESSOR JURÍDICO CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA 53
Referência: 8501836-35.2013.8.06.0026 Assunto: CONSULTA JURÍDICA ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA GABINETE DO CORREGEDOR-GERAL DESPACHO/OFÍCIO Nº. 169/2014/CGJ-CE Interessado: ANTÔNIO CARNEIRO ROBERTO JUIZ DE DIREITO Cuida-se de Pedido de Providências assestado pelo MM Juiz de Direito, Sr. Antônio Carneiro Roberto, solicitando informações no sentido da possibilidade de indicação do cônjuge para a interinidade de tabeliã substituta indicada pelo Sr. Thyago Ribeiro Soares, o qual formalizou sua Renúncia perante aquele juízo em virtude de aprovação em concurso público de provas e títulos em outro Estado da Federação. A assessoria jurídica manifestou-se pela possibilidade de indicação e nomeação de parentes para o exercício das funções delegadas de serviço público enquanto substitutos interinos, nos termos fixados no Parecer nº. 02/2014/CGJ-CE. Os autos ascenderam-me em conclusão (fl. 46). Conforme relatado, o objeto da presente consulta configura-se na possibilidade de indicação de parente para a assunção das atividades anteriormente exercidas pelo Tabelião de Registros de Imóveis suso mencionado, precisamente da sua esposa. Nesse ínterim, pondero que a nomeação de substituto interino segue as regras elencadas no art. 20, da Lei nº. 8.935/1994 Lei dos Notários e Registradores in verbis: O original deste documento é eletrônico e foi assinado digitalmente por FRANCISCO SALES NETO e Tribunal de Justica do Estado do Ceara em 15/01/2014 às 13:59:22. Para verificar a autenticidade desta cópia impressa, acesse o site http://portaladmin.tjce.jus.br/atendimento e informe o processo 8501836-35.2013.8.06.0026 e o código I25U9Q7A. 54
Art. 20. Os notários e os oficiais de registro poderão, para o desempenho de suas funções, contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos, e auxiliares como empregados, com remuneração livremente ajustada e sob o regime da legislação do trabalho. Depreende-se, portanto, da norma nuper-transcrita, que a norma expressamente afirma que caberá aos notários e oficiais de registro contratar os substitutos, nada dispondo acerca da possibilidade de indicação de parente próximo, motivo pelo qual deve ser levado em consideração o princípio da legalidade ao caso sub examine. Em outras palavras, não há óbice legal na indicação de parente ao cargo de notários e oficiais de registro, e consequentemente, de nomeação do mesmo. Ademais, conforme evidenciado, a Súmula Vinculante nº. 13 do Supremo Tribunal Federal não se aplica ao caso em apreço, mormente quando o Conselho Nacional de Justiça, através do julgamento proferido nos autos do procedimento de controle administrativo nº. 20090000000060, cuja ementa transcrevo a seguir, in verbis: EMENTA: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CONSULTA. NEPOTISMO. OBJETIVO DE ESCLARECER O ALCANCE E APLICAÇÃO DA RES. 7/2005 E DA SÚMULA VINCULANTE Nº. 13 DO STF AOS SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. CONSULTA RESPONDIDA NEGATIVAMENTE. - I) 'O plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu que os notários e os registradores exercem atividade estatal, mas não são titulares de cargo público efetivo, tampouco ocupam cargo público (ADI 2.602-0, Rel. Min. Eros Grau) de sorte que, não recebendo vencimentos do Estado e remunerando seus empregados com recursos próprios, nada impede que tenham parentes contratados pelo regime da CLT posto que estes só poderão ser titulares de serventias se aprovados em concurso de provas e títulos, desde que os contratantes sejam titulares concursados. II) 'A Res. 7/2005 do CNJ disciplina o exercício de cargos, empregos e funções por parentes, cônjuges e companheiros de magistrados e de servidores investidos em cargos de direção e assessoramento, no âmbito dos órgãos do Poder Judiciário, segundo a dicção do seu art. 1º, não tendo, portanto, incidência sobre a atividade exercida pelas serventias extrajudiciais, as quais não se caracterizam como órgãos desse Poder, que apenas exerce fiscalização sobre elas.' (PCA CONSULTA JURÍDICA Nº. 20090000000060, Relator Conselheiro Rui Stoco, VOTO Nº. 216/09). O original deste documento é eletrônico e foi assinado digitalmente por FRANCISCO SALES NETO e Tribunal de Justica do Estado do Ceara em 15/01/2014 às 13:59:22. Para verificar a autenticidade desta cópia impressa, acesse o site http://portaladmin.tjce.jus.br/atendimento e informe o processo 8501836-35.2013.8.06.0026 e o código I25U9Q7A. 55
Diante do exposto, em análise detida dos vertentes autos digitalizados, e em consonância com o entendimento da assessoria jurídica desta Casa Correcional, APROVO o parecer retro. Notifique-se o douto magistrado consulente acerca do inteiro teor do parecer retromencionado enviando-lhe cópia da presente decisão. Determino, ainda, o envio de cópia integral dos presentes autos para deliberação, no prazo de 05 (cinco) dias, acerca da nomeação do(a) oficial(a) interino(a), conforme determinação emanada desta Casa Censora no despacho de fls. 13/14. Após as comunicações e notificações de praxe, ARQUIVEM-SE. Cópia da presente servirá como ofício. Expedientes atinentes. Fortaleza, 15 de janeiro de 2014. FRANCISCO SALES NETO CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA O original deste documento é eletrônico e foi assinado digitalmente por FRANCISCO SALES NETO e Tribunal de Justica do Estado do Ceara em 15/01/2014 às 13:59:22. Para verificar a autenticidade desta cópia impressa, acesse o site http://portaladmin.tjce.jus.br/atendimento e informe o processo 8501836-35.2013.8.06.0026 e o código I25U9Q7A. 56