CONHECIMENTO 1 CONCEITO No sentido correto da palavra, conhecer é elucidar a realidade. Etimologicamente a palavra elucidar vem do latim lucere, cujo significado é trazer luz. Assim, conhecer significa trazer luz à realidade. E somente com aquisição do conhecimento é possível desvendar a verdade presente na realidade, tornando-a inteligível, transparente, clara, cristalina (LUCKESI). O ato de conhecer é o processo de interação efetuado entre o indivíduo e a realidade, permitindo descobrir a sua forma de ser ou, pelo menos, adquirir respostas provisórias para um problema definido. O conhecimento, portanto, é o primeiro passo para a libertação. E o saber crítico metodológico assegura aos indivíduos uma situação de competência, autonomia e liberdade. Na antiguidade, já havia preocupação científica, embora faltassem métodos e observação dos acontecimentos. Pode-se dizer que o conhecimento é uma amoldagem do sujeito com o objeto. Na busca do conhecer, o sujeito toma posse do objeto, porém essa posse é parcial, pois não temos a capacidade intelectual e a aptidão de sentir e verificar a abrangência total de um objeto, e sim parte dele. No que se refere à ciência, trata os conhecimentos de várias maneiras, procurando leis gerais que abriguem certo número de fatos particulares. A ciência é sempre algo incompleto: acumula conhecimentos e está constantemente se renovando por meio de novas descobertas. No decorrer dos tempos, as ciências prosperam e formam necessárias divisões para melhor compreensão, mas é evidente que qualquer modalidade da ciência se ramifica em outras áreas do saber, ou seja, estão relacionadas umas com as outras. As diversas classificações foram feitas por necessidades e exigências do progresso científico. 2 O CONHECIMENTO E SEUS NÍVEIS O homem não age diretamente sobre as coisas. Sempre há um intermediário, um instrumento entre ele e seus atos. Isto também acontece quando se faz ciência, quando investiga cientificamente. Ora, não é possível fazer um trabalho científico, sem conhecer os instrumentos. Sabemos pouquíssimo, e aquilo que sabemos sabemo-lo muitas vezes superficialmente, sem muita certeza. A maior parte de nosso conhecimento somente é provável. Existem certezas absolutas incondicionais, mas estas são raras. O que é conhecer? É uma relação que se estabelece entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido. No processo de conhecimento o sujeito cognoscente se apropria, de certo modo, do objeto conhecido. O conhecimento sempre implica uma dualidade de realidades: de um lado, o sujeito cognoscente e, de outro, o objeto conhecido, que está possuído, de certa maneira, pelo cognoscente. O pensamento é conhecimento intelectual.
2.1. O Conhecimento Empírico O conhecimento empírico é adquirido pela aprendizagem informal, ou pela experiência do cotidiano. Tal conhecimento não se fundamenta em procedimentos metodológicos, simplesmente desconhece o rigor dos métodos. O conhecimento empírico, também chamado vulgar, é o conhecimento do povo, obtido ao acaso, após inúmeras tentativas. Pelo conhecimento empírico, o homem simples conhece o fato e sua ordem aparente, tem explicações concernentes à razão de ser das coisas e dos homens e tudo isso obtido das experiências feitas ao acaso, sem método, e de investigações pessoais feitas ao sabor das circunstâncias da vida ou então sorvido do saber dos outros e das tradições da coletividade ou, ainda, tirado da doutrina de uma religião positiva. 2.2. O Conhecimento Teológico O conhecimento teológico por sua vez, baseia-se na fé e na crença em algo superior ao ser humano. Ele provém das revelações do mistério, do oculto, por algo que é interpretado como mensagem ou manifestação da divindade. O conhecimento revelado - relativo a Deus - aceito pela fé teológica, constitui o conhecimento teológico. É aquele conjunto de verdades a que os homens chegaram, não com o auxílio de sua inteligência, mas mediante a aceitação dos dados da revelação divina. Vale-se de modo especial do argumento de autoridade. São os conhecimentos adquiridos nos Livros Sagrados e aceitos racionalmente pelos homens, depois de terem passado pela crítica histórica mais exigente. O conteúdo da revelação, feita a crítica dos fatos aí narrados e comprovados pelos sinais que a acompanham, revestem-se de autenticidade e de verdade. Passam tais verdades a serem consideradas como fidedignas, e por isso são aceitas. Isto é feito com base na lei suprema da inteligência: aceitar a verdade, venha donde vier, contanto que seja legitimamente adquirida. 2.3. O Conhecimento Filosófico A filosofia procura conhecer a natureza profunda das coisas e seus fins. Ela é um modo de atuar inacabado, é a investigação constante, de um interrogar e um exercício reflexivo realizado pela busca de um conhecer e não sua posse. O conhecimento filosófico tem por origem a capacidade de reflexão do ser humano e por instrumento exclusivo raciocínio. Pode-se afirmar que, por meio desse conhecimento, chega-se ao conhecimento científico. O conhecimento filosófico distingue-se do científico pelo objeto de investigação e pelo método. O objeto das ciências são os dados próximos, imediatos, perceptíveis pelos sentidos ou por instrumentos, pois, sendo de ordem material e física, são por isso suscetíveis de experimentação (método científico = experimental). O objeto de filosofia é constituído de realidades mediatas, não perceptíveis pelos
sentidos e que, por serem de ordem suprassensíveis, ultrapassam a experiência (método racional). O filosofar é um interrogar, é um contínuo a si e à realidade. A filosofia não é algo feito, acabado. A filosofia é uma busca constante de sentido, de justificação, de possibilidades, de interpretação a respeito de tudo aquilo que envolve o homem e sobre o próprio homem em sua existência concreta. A tarefa fundamental da filosofia resume-se na reflexão. A filosofia procura refletir sobre este saber, interroga-se sobre ele, problematiza-o. Filosofar é interrogar principalmente pelos fatos e problemas que cercam o homem concreto, inserido em seu contexto histórico. A máquina substituirá o homem? Também o homem será produzido em série, em tubos de ensaio? A filosofia procura compreender a realidade em seu contexto mais universal. Não há soluções definitivas para grande número de questões. Entretanto, habilita o homem a fazer uso de suas faculdades para ver melhor o sentido da vida concreta. 2.4. O Conhecimento Científico No que tange ao conhecimento científico, ele precede do conhecimento empírico dos fatos ou dos objetos observados e os transcende, para procurar conhecer a realidade além de suas aparências superficiais. O conhecimento científico resulta da pesquisa metodológica, sistemática do contexto factual; procura analisar, a fim de descobrir suas causas e concluir as leis gerais que o orientam. É verificável, na prática por demonstrações ou por testagem, explica e demonstra com clareza e precisão, descobre relações de predomínio, igualdade ou subordinação com outras descobertas, e estabelece leis gerais e universais válidas para todos os casos da mesma espécie. O conhecimento científico vai além do empírico procurando conhecer, além do fenômeno, suas causas e leis. Para Aristóteles o conhecimento só se dá, de maneira absoluta, quando sabemos qual a causa que produziu o fenômeno e o motivo, porque não pode ser de outro modo; é o saber através da demonstração. 2.5. Caracterização do Conhecimento Certo, porque sabe explicar os motivos de sua certeza, o que não acontece com o empírico; Geral, no sentido de conhecer no real o que há de mais universal e válido para todos os casos da mesma espécie. A ciência, partindo do indivíduo concreto, procura o que nele há de comum com os demais da mesma espécie; Metódico e Sistemático, pois o cientista não ignora que os seres e fatos estão ligados entre si por certas relações. O seu objetivo é encarar e reproduzir este encadeamento. Alcançando-o por meio de conhecimento ordenado das leis e princípios. A ciência, assim entendida, é resultado da demonstração e da experimentação, só aceitando o que foi provado. A ciência não é considerada como
algo pronto, acabado ou definitivo. Não é a posse de verdades imutáveis. Atualmente a ciência é entendida como uma busca constante de explicações e soluções, de revisão e reavaliação de seus resultados e tem a consciência clara de sua falibilidade e de seus limites. Por ser algo dinâmico, a ciência busca renovar-se e reavaliar-se continuamente. Ciência é processo de construção. 2.6. Histórico do Método Científico A ciência, nos moldes em que se apresenta hoje, é relativamente recente. Só na Idade Moderna da História adquiriu o caráter científico que tem atualmente. Entretanto, desde o início da humanidade já se encontravam os primeiros traços rudimentares de conhecimentos e técnicas que constituiriam a futura ciência. A revolução científica, propriamente dita, registra-se nos séculos XVI e XVII, com Copérnico, Bacon e seu método experimental, Galileu, Descartes e outros. Não surgiu porém, do acaso. Toda descoberta ocasional e empírica de técnicas e conhecimentos referentes ao universo, à natureza e ao homem, desde os antigos babilônios e egípcios, a contribuição do espírito criador grego sintetizado e ampliado por Aristóteles, as invenções feitas na época das conquistas prepararam o surgimento do método científico e o espírito de objetividade que vai caracterizar a ciência a partir do século XVI, ainda de forma vacilante e agora de modo rigoroso. Aos poucos o método experimental é aperfeiçoado e aplicado em novos setores. Desenvolve-se o estudo da química, da biologia, surge um conhecimento mais objetivo da estrutura e funções dos organismos vivos no século XVIII. Já no século seguinte, verifica-se uma modificação geral nas atividades intelectuais e industriais. Surgem novos dados relativos à evolução, ao átomo, à luz, à eletricidade, ao magnetismo, à energia. No século XX, a ciência, com seus métodos objetivos e exatos, desenvolve pesquisas em todas as frentes do mundo físico e humano, atingindo um grau de precisão surpreendente não só na área das navegações espaciais e de transplantes, como nos mais variados setores da realidade. 2.7. Formação do Espírito Científico De pouco adiantaria o conhecimento e o emprego do instrumental metodológico, sem aquele rigor e seriedade de que o trabalho científico deverá ser revestido. 2.8. Natureza do Espírito Científico O espírito científico, na prática, se traduz por uma mente crítica, objetiva e racional. A consciência crítica levará o pesquisador a aperfeiçoar seu julgamento e a desenvolver o discernimento, capacitando-o a distinguir e separar o essencial do acidental, o importante do secundário.
2.9. Qualidades do Espírito Científico Como virtude intelectual, ele se traduz no senso de observação, no gosto pela precisão e pelas ideias claras, na imaginação ousada, mas regida pela necessidade da prova, na curiosidade que leva a aprofundar os problemas, na sagacidade e poder de discernimento. Moralmente, o espírito científico, assume a atitude de humanidade e reconhecimento de suas limitações, da possibilidade de certos erros e enganos. Qualidades: 1) O espírito científico é uma atitude ou disposição subjetiva do pesquisador que busca soluções sérias, com métodos adequados, para o problema que enfrenta. Essa atitude não é inata na pessoa. É conquistada ao longo da vida, à custa de muitos esforços e exercícios. Pode e deve ser aprendida, nunca porém transmitida. 2) A consciência crítica levará o pesquisador a aperfeiçoar seu julgamento e a desenvolver o discernimento, capacitando-o a distinguir e separar o essencial do acidental, o importante do secundário. 3) Criticar é julgar, distinguir, discernir, analisar para melhor poder avaliar os elementos componentes da questão. A crítica, assim entendida, não tem nada de negativo. É, antes, uma tomada de posição, no sentido de impedir a aceitação do que é fácil e superficial. O crítico só admite o que é suscetível de prova. 4) A consciência objetiva, por sua vez, implica o rompimento corajoso com todas as posições subjetivas, pessoais e mal fundamentadas do conhecimento vulgar. Para conquistar a objetividade científica, é necessário libertar-se de toda a visão subjetiva do mundo, arraigada na própria organização biológica e psicológica do sujeito e ainda influenciada pelo meio social. 5) A objetividade é a condição básica da ciência. O que vale não é o que algum cientista imagina ou pensa, mas aquilo que realmente é. Isso porque a ciência não é literatura. 6) A objetividade torna o trabalho científico impessoal a ponto de desaparecer, por exemplo, a pessoa do pesquisador. Só interessam o problema e a solução. Qualquer um pode repetir a mesma experiência, em qualquer tempo, e o resultado será sempre o mesmo, porque independe das disposições subjetivas. 7) A objetividade do espírito científico não aceita meias soluções ou soluções apenas pessoais. O eu acho, o creio ser assim não satisfazem a objetividade do saber. 8) Finalmente, o espírito científico age racionalmente. As únicas razões explicativas de uma questão só podem ser intelectuais ou racionais. As razões da
arbitrariedade, do sentimento e do coração nada explicam nem justificam no campo da ciência. 9) O possuidor do verdadeiro espírito científico cultiva a honestidade. Evita o plágio. Não colhe como seu o que os outros plantaram. Tem horror às acomodações. É corajoso para enfrentar os obstáculos e os perigos que uma pesquisa possa oferecer. 10) O espírito científico não reconhece fronteiras. Não admite nenhuma intromissão de autoridades estranhas ou limitações em seu campo de investigação. Defende o livre exame dos problemas. A honestidade do cientista está relacionada, unicamente, com a verdade dos fatos que investiga. Todas essas qualidades e virtudes intelectuais e morais existem, indubitavelmente, desde que há homens sobre a face da terra, ao passo que a ciência é uma aventura do espírito bem recente. Aristóteles, certamente não sentia falta de nenhuma das virtudes supracitadas e, no entanto, sua Física nada tem de científico, no sentido moderno da palavra. Trata-se, portanto, de reconhecer que o espírito científico é, antes de tudo, um produto da História. É uma progressiva aquisição das técnicas que exigem pesquisas exatas e verificáveis. Pouco a pouco, institui-se um mundo científico ou, como diz Bachelard, uma cidade científica, cujos costumes e leis constituem o espírito científico. Este é, portanto, o espírito de um grupo, quase um espírito de corporação no qual cada aprendiz de sábio é iniciado; quase como os novos membros de um clube, ou como os calouros das grandes escolas são iniciados pelos veteranos, no espírito e tradições do grupo. Iniciação nas técnicas de trabalho, familiaridade no manuseio dos instrumentos de laboratórios, habilidade no trato com fontes bibliográficas não se aprendem num dia.