A QUALIFICAÇÃO PARA O TRABALHO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA



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Transcrição:

A QUALIFICAÇÃO PARA O TRABALHO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA ELIANE DE SOUSA NASCIMENTO -FACULDADE EDUCAÇÃO/UFBA CAPES 1 THERESINHA GUIMARÃES MIRANDA -FACULDADE EDUCAÇÃO/UFBA 2 Introdução De acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, emitida pelas Nações Unidas em 1948, o direito ao trabalho é fundamental para todos os seres humanos. Observamos na atualidade, mais do que em épocas anteriores que o ser humano se vê diante do conflito das novas regras do mercado de trabalho e de suas próprias necessidades. Uma das maiores preocupações são as oportunidades e exigências do trabalho formal 3 para a população brasileira e mundial. O mundo moderno exige maior escolaridade, qualificação, conhecimentos atualizados e o aprendizado das novas tecnologias, contudo a inserção no mercado de trabalho está cada dia mais difícil, não somente pelas novas exigências do mundo do trabalho, como também pelo aumento do desemprego, entre os mais velhos, os menos qualificados, as camadas mais jovens, principalmente os jovens que não tiveram o primeiro emprego, decorrente segundo Bruno (1996) da formação precária ou inadequada. Constatamos que a reestruturação produtiva ocasionou profundas transformações na gestão e na organização do trabalho. Dentre as novas exigências feitas aos trabalhadores, temos novas habilidades e novos conhecimentos que vão além do conhecimento técnico e em constante processo de aprendizagem, a capacidade de readaptação, e a exigência da elevação do nível de escolaridade. Sendo, o discurso empresarial que a qualificação do trabalhador é a garantia da qualidade do trabalho e da empregabilidade 4 (CASTIONI, 1998). 1 Pedagoga e Mestranda em Educação; e-mail: elianelik@yahoo.com.br 2 Professora Dra. Adjunta; e-mail: tmiranda@ufba.br 3 Aquele que garante ao empregado os direitos sociais e contratuais, garantidos por lei, ao passo que o informal é uma modalidade profissional sem vinculo empregatício legal com o empregador, não há contrato de trabalho assinado, contando tempo para aposentadoria, e tão pouco vínculo com o Sistema de Previdência Social, não tem tais garantias (MANFREDI, 2002; DEL MASSO, 2000). 4 Segundo Castioni (1998, p. 29) empregabilidade é a capacidade do trabalhador manter-se atualizado num mundo em mudança e de acordo com Dultra citando Mehedff (2001, p. 16) é um conjunto de conhecimentos, habilidades, comportamentos e relações que tornam o profissional necessário não apenas para uma, mas para qualquer organização. 458

Dentro desse contexto, para as pessoas com deficiência é ainda mais difícil o acesso ao trabalho, em decorrência da resistência para o seu engajamento nas relações sociais, no exercício de sua cidadania e em atividades laborais. A atual política pública de atenção à profissionalização da pessoa com deficiência favorece a qualificação profissional e a inserção no trabalho, mas constatamos que na prática, isso não vem ocorrendo de forma satisfatória, pois há uma baixa escolaridade das pessoas com deficiência o que limita o acesso a cursos profissionalizantes que requerem um maior nível acadêmico, bem como os cursos existentes não têm as devidas adaptações para atenderem às necessidades especiais das pessoas com deficiência. Na perspectiva delineada acima, a pesquisa de mestrado em andamento, tem como objetivo investigar a qualificação profissional de pessoas com deficiência. Adotou-se como metodologia, a pesquisa qualitativa de cunho etnográfico, com bibliográfica e trabalho de campo, em uma Instituição que promove cursos profissionalizantes em Salvador para essa população. Para conhecer essa realidade, realizaremos entrevistas semi-estruturadas a partir de um roteiro de perguntas previamente elaboradas com egressos de cursos de qualificação profissional com deficiência. Ressaltamos que, o presente artigo é parte integrante da pesquisa de mestrado já citada, e dessa forma analisaremos e discutiremos os pressupostos legais e a qualificação profissional dessa população. Primeiramente, foi realizada uma pesquisa bibliográfica, para identificar a literatura existente na área em questão, e a legislação que regulamenta a relação trabalho e deficiência, sobretudo com relação à profissionalização para o trabalho da pessoa com deficiência, visando à análise e reflexão das informações encontradas. O presente trabalho se justifica pela necessidade de se compreender as mudanças ocorridas nos aspetos ideológicos, teórico-práticos da relação trabalho e pessoas com deficiência, principalmente para colaborar na reflexão e discussão sobre a temática. A legislação para o trabalho da pessoa com deficiência O Brasil na Constituição e na legislação existente, oferece as pessoas com deficiência proteção especial, oferecendo as garantias constitucionais num sistema legal de proteção bem articulado, entre algumas temos a lei de cotas, reserva de vagas em concursos públicos, benefícios de estágio aos alunos de educação especial e etc. Segundo estimativas disponíveis, no Brasil, dos 26 milhões de trabalhadores formais ativos, 537 mil são pessoas com deficiência, representando 2,05% do total de empregados. Mas constata-se que a categoria mais expressiva da população brasileira é de inativos, entre as pessoas sem deficiência chega a 32% e entre as pessoas com deficiência cerca de 52%. A renda média do trabalho das pessoas sem deficiência é de R$ 643,00, enquanto que a média de renda das pessoas com deficiência é de R$ 529,00 (NERI, 2003). 459

O percentual de pessoas com deficiência inseridas no mercado de trabalho é muito inferior às pessoas sem deficiência, embora tenham o mesmo direito de trabalhar, se considerarmos essas pessoas como cidadãos, tanto quanto os sem deficiência, que também estão desempregados e representam um contingente grande da população brasileira. Na opinião de Pastore (2000, p. 71), O fenômeno é mundial. Em todos os países, o mercado de trabalho é mais restrito aos portadores de deficiência. As causas são múltiplas. De um lado, a falta de qualificação. De outro, a falta de esclarecimento. E, por cima de tudo, a falta de estímulos que facilitam a sua contratação. Atualmente, a política para a integração de pessoas com deficiência no mercado de trabalho é disciplinada pelo Decreto nº 3.298, 20 de dezembro de 1999 do Poder Executivo Federal, que regulamenta a Lei N 7.853, de 24 de outubro de 1989, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida normas de proteção e dá outras providências. Estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida e dá outras providências. O artigo 35, do referido Decreto 3.298/99 prevê a inserção da pessoa com deficiência no mercado de trabalho de três maneiras diferentes: no inciso I - colocação competitiva através de processo de contratação regular, nos termos da legislação trabalhista e previdenciária, que independe da adoção de procedimentos especiais para sua concretização, não sendo excluída a possibilidade de utilização de apoios especiais. No inciso II, colocação seletiva - o processo de contratação regular, nos termos da legislação trabalhista e previdenciária, que depende da adoção de procedimentos e apoios especiais para sua concretização. No inciso III promoção do trabalho por conta própria: processo de fomento da ação de uma ou mais pessoas, mediante trabalho autônomo, cooperativado ou em regime de economia familiar, com vista à emancipação econômica e pessoal. O art.36 desse Decreto nº 3.298/99 ratifica o sistema de cotas, sendo aplicável aos beneficiários da Previdência Social reabilitado ou a pessoas com deficiência habilitadas. Ainda, em seus artigos 37º e 43º assegura à pessoa com deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, e reserva 5% das vagas, para provimento de função, cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portadora. No panorama político, as pessoas com deficiência vêm conseguindo aos poucos que seus direitos individuais, sociais e trabalhistas sejam reconhecidos e assegurados em documentos internacionais e nacionais. A compreensão que a deficiência não significa impossibilidade para a atividade laboral mostrou a necessidade de mudanças no tratamento dado às pessoas com deficiência em relação ao preconceito e a discriminação para a inserção no mercado de trabalho. 460

A qualificação para o trabalho da pessoa com deficiência No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiência no campo educacional é reconhecidamente precário. De acordo com o SENAI (1999, apud PASTORE, 2000) apenas 3% (três por cento) dessas pessoas possuem escolaridade adequada. Dados levantados pelo Censo Escolar de 2000 (apud PASTORE, 2000) identificaram apenas 280 mil alunos cursando as escolas regulares no país. Segundo o MEC (2000), desses alunos apenas 3 mil estão cursando o Ensino Médio. Vale lembrar que o Brasil abriga mais de 16 milhões de pessoas com deficiência. Um quadro como esse, compromete seriamente as chances dessas pessoas ingressarem no mercado de trabalho. O problema é amplificado, devido à combinação da deficiência com o descaso da sociedade e a generalizada inadequação da arquitetura, transporte, falta de formação e preparo dos docentes e outros complicadores. Nesse contexto, dentre os que conseguem atingir grau de escolaridade mínima exigida pelo mercado, estão os que possuem deficiência física, embora tenham que enfrentar muitas vezes barreiras arquitetônicas, são os que mais facilmente chegam à escola formal. Tem ainda uma pequena proporção que consegue atingir o nível superior, entretanto são aqueles que adquiriram a deficiência mais tardiamente (PASTORE, 2000). Nas outras formas de deficiência, o que fica dificultado muitas vezes, é o acesso de conhecimentos que a escola regular oferece como é o caso das pessoas com deficiência mental. Essas por sinal estão enquadradas no grupo de analfabetos e semi-alfabetizados, devido ao baixo grau de escolaridade que alcançam (LANCILLOTTI, 2003). Destaca-se a necessidade de ampliação das oportunidades educacionais de acesso à educação. O grande desafio é superar a exclusão das pessoas com deficiência no processo de escolarização, promovendo de fato a educação para todos. Assim com uma educação de qualidade, os problemas que as pessoas com deficiência encontram no acesso aos cursos de capacitação profissional podem ser minimizados (JESUS, 2003). Desde o final da década de 90, vem se gestando uma nova institucionalidade no campo da Educação Profissional no Brasil, que anuncia como objetivo prioritário a melhoria da oferta educacional e sua adequação às novas demandas econômicas e sociais da sociedade globalizada, portadora de novos padrões de produtividade e competitividade, de maneira que acompanhem o avanço tecnológico e atendam às demandas do mercado de trabalho, que exige flexibilidade, qualidade e produtividade (MIRANDA, 2006). Entidades ligadas a Indústria e ao Comércio, o SENAI e o SENAC, escolas do sistema S, também conhecidas por, conscientizaram-se a respeito da necessidade de oferecer capacitação 461

profissional para as pessoas com deficiência, já que até então só atendiam pessoas normais. Promovendo junto às empresas o exercício de sua responsabilidade social (SENAC, 2000). As atividades voltadas para as pessoas com deficiência começaram em base experimental em 1998-1999 e as avaliações realizadas indicaram a sua viabilidade, necessitando assim, de expansão. Ao longo dos anos, o número de capacitados em vários cursos profissionalizantes oferecidos por essas instituições têm aumentado, mas será que estão conseguindo atender à demanda por educação e qualificação das pessoas com deficiência? Em Salvador-Bahia temos instituições governamentais, na esfera municipal e estadual, que promove cursos profissionalizantes e encaminhamento dessa população para o mercado de trabalho. Existem também, em Salvador, algumas instituições sem fins lucrativos - Organizações Não Governamentais ONGS promovem cursos profissionalizantes e encaminham pessoas com deficiência para o mercado de trabalho e há uma instituição governamental, que se dedica à colocação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho (JESUS, 2003). As Instituições que mantêm parcerias com as Associações APADA (Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos) e a ABADEF (Associação Baiana dos Deficientes Físicos) que após selecionarem os alunos, os encaminham para receberem os cursos de capacitação nas instituições parceiras. Nas duas instituições, os cursos de capacitação profissional são estendidos às demais formas de deficiência (mental, visual) e os cursos de capacitação profissional oferecidos aos alunos das Associações com as quais fazem parcerias, são inteiramente gratuitos. De acordo com as Instituições, os cursos de qualificação profissional oferecidos, são de duas naturezas: turmas abertas e turmas fechadas. Esses cursos fechados são realizados sob encomenda da Instituição Especializada e destinam-se ao público oriundo da APADA e ABADEF e para terem acesso a esses cursos, os alunos devem estar cursando o Ensino Fundamental. Os cursos administrados nas turmas fechadas são: Criação e montagem de bijuterias; Costura industrial; Panificação; Doces em compota; Produção de licores, sendo que os cursos ligados à culinária são preferencialmente voltados para as pessoas com deficiência física. Os cursos oferecidos nas turmas abertas são disponibilizados para atenderem a demanda da comunidade, mas pessoas com deficiência podem ter acesso a eles, dependendo do grau da deficiência (no caso da deficiência visual, só são atendidos os de baixa visão), e depende do grau de escolaridade, para esses cursos exigem que o aluno já tenha concluído o Ensino Médio. Os cursos são: Técnico de refrigeração; Manutenção mecânica; Técnico de projetos mecânicos; Segurança do trabalho; Refrigeração e condicionamento de ar; Projetos mecânicos e Logística. 462

Como já constatado por Jannuzzi (1996 apud LANCILLOTTI, 2003) as pessoas com deficiência alcançam baixo nível de escolarização. De acordo com Jesus (2003), a escolaridade insuficiente faz com que a educação profissional dessas pessoas, seja a do nível básico, que são cursos de curta duração e independem de escolaridade prévia e em geral, ligados ao trabalho manual, às tarefas repetitivas que, na maioria das vezes pouco exige do potencial cognitivo das pessoas. A formação profissional adequada às exigências do trabalho formal na contemporaneidade implica em nível de escolaridade mais elevado, para que atenda a demanda do mercado de trabalho. Resultados e discussões As políticas públicas têm desempenhado um enorme papel na redução de barreiras físicas, e na facilitação e inserção das pessoas com deficiência no mercado de trabalho 5. Percebe-se, entretanto, uma fragilidade no cumprimento das leis que asseguram os direitos das pessoas com deficiência na sua inclusão na sociedade e acesso ao trabalho formal. Para Pastore (2000), a situação para as pessoas que têm limitações muito severas, os afastados temporariamente, os aposentados por razão de deficiência, os muitos idosos e os desalentados é de exclusão da força de trabalho. Algumas atitudes podem contribuir para a colocação de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, destacando-se: educação, qualificação profissional, habilitação e reabilitação para o trabalho, estímulos aos empresários, serviços de colocação e campanhas anti discriminações. Mas o ideal seria que as instituições que oferecem os cursos de capacitação profissional criassem adaptações (em sala de aula, currículos, profissionais especializados, métodos) para atender as necessidades individuais da pessoa com deficiência. Superada essas barreiras, verifica-se que as pessoas com deficiência podem ser muito produtivas mediante pequenas adaptações (PASTORE, 2000). Para que aconteça a contratação das pessoas com deficiência pelas empresas é necessário o ajuste entre a qualificação e a função a ser ocupada. Os responsáveis pelo recrutamento têm que conhecer os limites e as possibilidades das pessoas com deficiência a serem encaminhadas para a seleção, pois os empresários normalmente estão interessados na qualidade, produtividade e lucro, não só em leis, exigências e punições. A instituição 5 DEL Masso (2000, p. 50) explica que, a expressão mercado de trabalho, segundo definição apresentada no Dicionário de Ciências Sociais (1986, p. 14), [...] relação entre a oferta e a procura de mão-de-obra em âmbito restrito ou global, [...] além de designar a relação entre a oferta e a procura de determinados tipos de mão-deobra, [...]. Com relação a expressão mundo do trabalho de maneira complexa, ou seja, uma noção que abarca diferentes tipos de conhecimentos e que tem intuito de informar o indivíduo não somente a respeito do trabalho em si, mas, o de informar para a sua autonomia e, porque não dizer, prepara-lo para a auto-suficiência. 463

encarregada da mediação entre o trabalhador e o empresário precisa mostrar que a mão-deobra é de boa qualidade e que trará vantagens econômicas para a empresa (PASTORE, 2000). Faz-se necessário, também, rever os programas de educação profissional que estão sendo oferecidos às pessoas com deficiência. Em princípio, constata-se que Instituições de Qualificação Profissional oferecer cursos a esse público já é um avanço, pois tradicionalmente só as Instituições Especializadas promoviam cursos profissionalizantes para as pessoas com deficiência, é necessário que as práticas inclusivas não restrinjam o espaço de atendimento profissional a certos tipos de deficiência (auditiva, mental, visual, múltiplas), deixando de efetivar uma educação profissional para todos. Considerações finais Diante das evidências, conclui-se que os postos de trabalho disponibilizados pelo mercado de trabalho, demandam de maior escolarização, e, consequentemente, uma qualificação profissional de qualidade. A parceria entre a escola regular e instituições de formação profissional farão com que os postos de trabalhos abertos para as pessoas com deficiência através das cotas legais, sejam preenchidos por profissionais devidamente qualificados. É necessário que as ações de formação profissional que objetivem a inserção no mercado de trabalho para as pessoas com deficiência não se limitem aos esforços das Associações e instituições especializadas. É preciso que seja uma prática social efetiva, somada pelas instituições governamentais, não-governamentais e organizações empresariais, no sentido de darem apoio aos projetos de educação profissional para as pessoas com deficiência no sentido de que as mesmas tenham mais autonomia pessoal, social e adequado preparo profissional para serem inseridas no mercado de trabalho. Referências BRASIL. Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social, sobre a Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência CORDE, institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público, define crimes e dá outras providências.. Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. Brasília, DF: Senado Federal, 1991.. Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999. Regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de Outubro de 1989, dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, consolida as normas de proteção, e da outras providências. Brasília: Diário Oficial da União, CORDE, 1999. 464

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