ACÓRDÃO Registro: 2016.0000240373 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000, da Comarca de Sumaré, em que é paciente LEONARDO OLIVEIRA DIAS e Impetrante EDINA APARECIDA SILVA. ACORDAM, em 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Concederam a ordem, nos termos do v. acórdão. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores GUILHERME DE SOUZA NUCCI (Presidente), LEME GARCIA E BORGES PEREIRA. São Paulo, 12 de abril de 2016. Guilherme de Souza Nucci RELATOR Assinatura Eletrônica
HABEAS CORPUS nº 2026824-06.2016.8.26.0000 Comarca: Sumaré Impetrante: Edina Aparecida Silva Paciente: LEONARDO OLIVEIRA DIAS VOTO Nº. 13.332 Habeas corpus. Tráfico de entorpecentes. Pleito objetivando a liberdade provisória. Possibilidade. Ausência dos requisitos da custódia cautelar. Paciente primário e possuidor de bons antecedentes, preso com 20 micropontos de LSD e 1 frasco de lança-perfume. Viabilidade de fixação de medidas cautelares previstas no art. 319, incisos I e V, do Código de Processo Penal. Ordem parcialmente concedida para confirmar a liminar. Trata-se de Habeas Corpus, com pedido liminar, em favor de LEONARDO OLIVEIRA DIAS, contra ato do MM. Juiz de Direito, Dr. Aristóteles de Alencar Sampaio, da 1 a Vara Criminal da Comarca de Sumaré, sob a alegação de o paciente sofrer constrangimento ilegal, consistente na manutenção de sua prisão cautelar. Sustenta o impetrante a ilegalidade da decisão coatora, invocando a ausência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar. Menciona, ainda, o paciente possuir ocupação lícita, como elemento favorável à obtenção de liberdade provisória. Postula, destarte, a concessão de liminar e a posterior confirmação desta, a fim de revogar a prisão Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 2
cautelar, com a imediata expedição de alvará de soltura em favor do paciente. A liminar foi deferida, fixando ao paciente as medidas cautelares previstas no art. 319, incisos I e V, do Código de Processo Penal (fls. 48/50). A autoridade coatora prestou as informações necessárias (fls. 54/72). Em seu parecer, a Procuradoria Geral de Justiça opinou pela denegação da ordem (fls. 74/76). É o relatório. Devidamente processado, é caso de concessão parcial da ordem. Infere-se dos autos que o paciente foi preso em flagrante, no dia 9 de janeiro p.p., na rua Fioravante Mancino, nº 700, Sumaré/SP, pela suposta prática de tráfico de drogas, após ser surpreendido por policiais na posse de 20 micropontos com LSD e 1 frasco com lança-perfume (0,5L), além da quantia de R$ 30,00, estando os entorpecentes acondicionados para fins de comércio, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Ao analisar o caso, a autoridade coatora decretou a prisão preventiva do acusado, justificando a medida com base na garantia da ordem pública, uma vez que o crime supostamente praticado seria grave e equiparado a hediondo (fls. 57/59). Nem se olvide que a prisão cautelar é excepcionalidade, devendo, portanto, respaldar-se em elementos Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 3
concretos, idôneos ao preenchimento dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Ademais, nada obstante a vedação constante do art. 44 da Lei de Drogas, a alteração efetuada pela Lei n 11.464/2007 na redação do art. 2º da Lei de Crimes Hediondos, torna a autorizar a concessão de liberdade provisória, sem fiança, na hipótese do parágrafo único do art. 310, do CPP. É, portanto, necessário que se analise os requisitos do art. 312, do CPP. Desta feita, acompanho entendimento firmado pelos Tribunais Superiores, no sentido de não ser suficiente para o indeferimento da liberdade provisória a mera remissão à vedação legal contida no art. 44 da lei específica. Nesse sentido: PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO CONTRA DECISÃO DE RELATOR DE TRIBUNAL SUPERIOR QUE INDEFERIU PLEITO CAUTELAR EM IDÊNTICA VIA PROCESSUAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE. SÚMULA 691/STF. SUPERAÇÃO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA COM FUNDAMENTO APENAS NA GRAVIDADE EM Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 4
ABSTRATO DO DELITO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE BASE EMPÍRICA IDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CARACTERIZADO. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO POR INADEQUAÇÃO DA VIA PROCESSUAL. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. A prisão cautelar para garantia da ordem pública e para conveniência da instrução criminal é ilegítima quando fundamentada, como no caso sub examine, tão somente na gravidade in abstracto, ínsita ao crime. Precedentes. [...] a decisão que decretou a prisão cautelar limita-se a tecer considerações sobre o potencial danoso do tráfico de entorpecentes. Não cuidou, assim, de apontar, minimamente, conduta dos pacientes que pudessem colocar em risco a ordem pública, a instrução processual ou a aplicação da lei penal. 3. A vedação legal à liberdade provisória ao preso em flagrante por tráfico de entorpecentes, prevista no art. 44 da Lei 11.343/2006, foi julgada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (HC Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 5
104.339/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes), devendo, contudo, o magistrado apreciar a existência dos requisitos da prisão preventiva à luz do artigo 312 do Código de Processo Penal. [...] 5. Agravo regimental desprovido, em razão da inadequação da via eleita. Ordem concedida de ofício para assegurar aos pacientes o direito de aguardarem em liberdade o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, salvo se por outro motivo devam permanecer presos e sem prejuízo de nova decretação de prisão preventiva fundamentada ou de uma ou mais das medidas cautelares previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, caso seja necessário. (STF. HC 121181 AgR, Primeira Turma, Relator(a): Min. LUIZ FUX, d.j. 22/04/2014, grifamos). Além disso, em análise aos requisitos e, após consulta ao sistema informatizado deste E. Tribunal, verificou-se que o paciente é primário e possuidor de bons antecedentes, cuja conduta delitiva sub judice não se demonstra revestida de gravidade exacerbada, sendo ainda considerada baixa a quantidade de droga encontrada em seu poder. Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 6
Tais fatores sinalizam-se precipuamente favoráveis ao paciente, afastando-o de ímpetos de fuga ou desassossego, evidenciando a possibilidade de aguardar o julgamento da ação em liberdade, sem risco à ordem pública. É preciso cessar o mau vezo de se decretar a prisão cautelar com base em abstrações. Todos os requisitos do art. 312 do CPP precisam ser analisados no plano concreto, apontando-se, nos autos da investigação policial ou do processo-crime, quais elementos justificam a cautela. A propósito, vimos defendendo: A gravidade concreta do delito espelha-se pelo fato e suas circunstâncias e consequências. Um roubo, por exemplo, abstratamente é um delito grave, mas nem sempre o é no caso concreto. Essa busca pela concretude do fato é o dever do juiz, a fim de não banalizar a decretação da prisão cautelar, que é uma exceção, não a regra. 1 Ainda sobre o mesmo tema: (...) devemos conferir à garantia da ordem pública um significado realmente concreto, distante de ilações ou presunções de gravidade abstrata de 1 NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade: as reformas processuais penais introduzidas pela Lei 12.403, de 4 de maio de 2011, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 64. Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 7
qualquer infração penal. 2 Por tais razões, tenho por desnecessária a manutenção da custódia cautelar do paciente. Com efeito, se por um lado a manutenção da prisão preventiva revela-se descabida, frente aos mandamentos legais, ante a carência dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal, por outro, a concessão de liberdade provisória culmina em benesse deveras favorável, não correspondendo à casuística sub judice. Diante do panorama, melhor solução resulta na concessão da liberdade provisória mitigada por medida cautelar, consoante hipótese prevista na Lei nº. 12.403/2011, em razão de sua adequabilidade, fator sobre o qual assim vimos entendendo: Esse fator, sem dúvida, concerne ao princípio constitucional da proporcionalidade. Observa-se cada vez mais, a vinculação e a integração entre os princípios constitucionais penais e processuais penais. Neste mesmo prisma, já havíamos apontado a umbilical ligadura entre a proporcionalidade e a individualização da pena, além de indicar a união entre legalidade e prisão cautelar. Agora, nota-se o vínculo entre as 2 NUCCI, Guilherme de Souza. Op. Cit., p. 63. Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 8
medidas cautelares e a proporcionalidade, ou seja, tal como se fosse uma autêntica individualização da pena, deve-se analisar o fato e seu autor, em detalhes, para aplicar a mais adequada medida cautelar restritiva da liberdade. Cuida-se da individualização da medida cautelar, vez que existem várias à disposição do magistrado para a aplicação ao caso concreto 3 Muito embora sejam as condições favoráveis ao paciente, não se olvide estar respondendo à ação penal pelo cometimento de suposto crime de tráfico de drogas, demonstrando-se pertinente o recolhimento domiciliar noturno e nos dias de folga, o qual o acusado deve recolher-se à sua casa todos os dias, o período noturno, bem como nos fins de semana e dias de folga, evitando-se que se mantenha em contato social, quando fora de sua atividade laborativa e o comparecimento mensal em juízo, que visa o acompanhamento da vida do sujeito, durante o inquérito ou processo, constituindo medida positiva; afinal, se não cumprir ou se apresentar conduta incompatível com as atividades esperadas de quem responde a processocrime, pode ser preso preventivamente 4 Ante o exposto, pelo meu voto, concedo parcialmente a ordem impetrada, confirmando a liminar já 3 NUCCI, Guilherme de Souza, Prisão e Liberdade, RT, p.27,28. 4 NUCCI, Guilherme de Souza, Prisão e Liberdade, RT, p.82, 84 e 85. Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 9
concedida. GUILHERME DE SOUZA NUCCI Relator Habeas Corpus nº 2026824-06.2016.8.26.0000 10