Inserção Externa da China: Uma experiência diferenciada



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Inserção Externa da China: Uma experiência diferenciada Área: Economia Augusto Cezar Brandenburg UNIOESTE/Campus de Cascavel e-mail: guttobrandenburg@hotmail.com Andréia Polizeli Sambatti UNIOESTE/Campus de Cascavel e-mail: andreiarun@gmail.com Resumo Nos anos 1990 houve um desenvolvimento sem precedentes do fluxo mundial de investimento externo direto (IED), por meio da atuação das empresas transnacionais. Sendo que nesse período se constatou uma desconcentração dessa modalidade de capital a favor dos países em desenvolvimento. Dentre os fatores que podem explicar essa maior participação, destacam-se: a liquidez advinda do processo de globalização financeira, as estratégias de diversificação e expansão de mercado adotadas pelas empresas transnacionais, além das próprias políticas de atração do IED implementadas pelos países em desenvolvimento e do crescente movimento de fusões e aquisições que também contemplou esses países. No entanto, não houve um consenso por parte dos países em desenvolvimento com relação as suas estratégias de inserção externa, com a participação do IED. Dese modo, o objetivo desse trabalho consiste em discutir de que forma a abertura econômica e as políticas voltadas ao IED contribuíram para a inserção diferenciada da China no comércio internacional. Concluiuse que na China, o IED foi visto como parte do processo de modernização e inserção externa do país. Com isso, o processo de abertura da economia se restringiu basicamente à entrada dessa forma de capital, sendo este vinculado à sua política de comércio exterior. Não obstante, apesar dos estímulos ao ingresso do IED na China, a exemplo dos incentivos fiscais, prevaleceu um rígido controle político sobre suas condições de atuação. Além disso, para orientar a localização do capital recebido e objetivando ampliar a abertura econômica, criouse no país as Zonas Econômicas Especiais (ZEEs). No mais, observou-se que o governo chinês deu preferência à abertura aos investimentos estrangeiros, visando incentivar o comércio internacional por meio da promoção das exportações, especialmente dos produtos industriais com o emprego de tecnologia avançada. Palavras-chave: Inserção Externa, Investimento Externo Direto, China.

1. Introdução Nos anos 1970, os fluxos de capitais que se dirigiam aos países em desenvolvimento estavam atrelados ao elevado grau de liquidez internacional existente no mercado de eurodólares e da ação mais agressiva dos bancos, objetivando novos clientes (BAHRY; PORCILE, 2004). No entanto, segundo Belluzzo (1999) e Barboza (1996), no ano de 1979 teve início o esgotamento desse ciclo abundante de recursos externos destinados ao financiamento dos países em desenvolvimento, dado o aumento das taxas de juros internacionais. Diante disso, os Estados Unidos, nos anos 1980, se tornaram o principal captador de poupanças internacionais, devido a sua necessidade de financiar seus déficits recorrentes em transações correntes e no setor público, enquanto o Japão e a Alemanha foram os principais responsáveis pela oferta desses recursos, impulsionando à globalização financeira. Conforme Lacerda (2004), essa política externa norte-americana visava impor sua supremacia financeira, já que havia perdido a liderança nas esferas tecnológica e comercial. A rigor foi a transnacionalização dos capitais americanos no pós-guerra bancário e produtivo que criou fortes competidores fora do espaço americano, deteriorando progressivamente sua hegemonia comercial (CARNEIRO, 1999, p.9). Não obstante, o mercado financeiro internacional continuou se expandindo, mas direcionando seus capitais para os países desenvolvidos em crescimento, já que estes apresentavam baixos riscos e elevadas taxas de juros. Essa transferência provocou uma modificação no sistema financeiro, por meio da introdução de mecanismos de proteção (hedging), de novos ativos financeiros (desintermediação bancária) e do avanço da desregulamentação dos mercados financeiros (BARBOZA, 1996). Esse processo de transformação na esfera financeira pode ser entendido como a generalização e a supremacia dos mercados de capitais em substituição à dominância anterior do sistema de crédito comandado pelos bancos (BELLUZZO, 1995, p.16). Nesse sentido vale destacar que, segundo Lacerda (2004), a globalização financeira ocorrida nos anos 1980 consistiu em uma pré-condição para a ampliação dos fluxos de investimento externo direto (IED) e de portfólio, bem como para as alterações que se sucederam no paradigma tecnológico, sobretudo, porque a crescente disponibilidade de recursos, decorrentes da maior mobilidade de capitais e das novas formas de engenharia financeira, foi um fator fundamental para viabilizar o processo de reestruturação produtiva e tecnológica que se iniciou naquela década. Diante disso, os fluxos internacionais de capitais apresentaram uma modificação em sua composição, ou seja, o investimento externo direto e o investimento de portfólio assumiram uma importância maior em relação aos empréstimos bancários e os fundos advindos do setor público. O novo perfil do financiamento internacional, que surge com a globalização das finanças deu aos fluxos privados e entre esses ao investimento direto e às finanças diretas uma maior dominância em detrimento dos antigos empréstimos sindicalizados (SILVA, 2006, p.9). Como conseqüência desse novo perfil do financiamento internacional, ocorreu um desenvolvimento sem precedentes do fluxo mundial de IED, através da atuação das Empresas Transnacionais (ETs) além de suas fronteiras nacionais, constituindo-se nos principais agentes do processo de globalização. Silva (2006) também reforça que os investimentos externos diretos tornaram-se muito dinâmicos, em âmbito mundial, passando de US$ 53,7 bilhões em 1985 para US$ 196 bilhões em 1989, estando basicamente concentrados nos países da tríade

(Estados Unidos, União Européia e Japão). Na década de 1990 houve uma intensificação desse desempenho, saltando de US$ 243 bilhões em 1990 para US$ 1,2 trilhões em 2000. Mas nesse período, o IED passou a se dirigir a um número crescente de países em desenvolvimento. Exemplo disso, é que no ano de 2000 os países em desenvolvimento receberam US$ 246 bilhões na forma de IED, um montante muito maior ao verificado em 1992 que foi de, aproximadamente, US$ 40 bilhões (GREGORY; OLIVEIRA, 2005). E, ainda, vale ressaltar que, no ranking do estoque acumulado de IED absorvido até 1999, por esses países, a China e o Brasil ocuparam os dois primeiros lugares. A China com um montante de US$ 306 bilhões e o Brasil com US$ 164 bilhões (LACERDA, 2004). Para Lacerda (2007), o que explica essa maior participação dos países em desenvolvimento nos fluxos de IED a partir dos anos 1990 é o somatório de alguns fatores, tais como: a liquidez advinda do processo de globalização financeira, as estratégias de diversificação e expansão de mercado adotadas pelas empresas transnacionais e as próprias políticas de atração de IED implementadas pelos países em desenvolvimento políticas de ajuste macroeconômico, de abertura comercial e financeira e de privatizações. Aliado a isso, Amal e Seabra (2005) acrescentam que o direcionamento dos fluxos de IED para os países em desenvolvimento nos anos 1990 esteve atrelado à atratividade dos países emergentes em decorrência de suas altas taxas de crescimento e de rentabilidade e de seus amplos mercados domésticos. Ademais, essa maior participação refletiu, em termos qualitativos, uma modificação nos condicionantes do IED. Em outras palavras, os fatores locacionais a estrutura e dimensão dos mercados internos, o grau de abertura e inserção externa, o quadro institucional para garantir o funcionamento do mercado, dentre outros assumiram um papel relevante na distribuição do IED entres os países em desenvolvimento. A que se destacar também, que se o fluxo de IED no pós-guerra visava ampliar o investimento produtivo, especialmente, na indústria manufatureira e apresentava uma distribuição geográfica mais abrangente, nas décadas de 1980 e 1990 a sua dinâmica caracterizou-se por: i) um crescimento sem paralelo das operações de fusões e aquisições transfronteiras, acompanhado da expansão do investimento de portfólio e da formação de megacorporações; ii) uma distribuição espacial concentradora; e iii) sua preferência pelo setor de serviços (SILVA, 2006, p.10). No que diz respeito ao movimento crescente de fusões e aquisições, é oportuno observar que o mesmo consiste no principal motivador dos investimentos estrangeiros diretos, nos últimos anos, sobretudo nos anos 1990. Para Silva (2006), esse movimento foi viabilizado por meio das inovações financeiras sucedidas nos mercados de capitais, mediante a criação de fundos emprestáveis necessários para dar suporte às grandes operações entre as empresas. Desse modo, uma parte significativa desses investimentos gera apenas uma transferência de patrimônio, não promovendo uma elevação da capacidade produtiva das economias. Conforme Gregory e Oliveira (2005) e Lacerda (2004), estima-se que 90% dos IEDs realizados no mundo se relacionam com a compra e venda de empresas já existentes, indicando que os mesmos estão cada vez menos ligados ao crescimento da capacidade produtiva dos países. Nesse caso, os países em desenvolvimento também acompanharam, ainda que em menor grau, a tendência dos países desenvolvidos em absorver fluxos de IED relacionados a fusões e aquisições. No mais, cabe observar que embora os países asiáticos tenham absorvido mais IED na década de 1990 do que os países latino-americanos, a presença dos primeiros nas fusões e

aquisições mundiais foi menos significativa. A compreensão dessa aparente contradição, nos reporta a questão das diferenças entre os países em desenvolvimento no que diz respeito as suas estratégias de inserção nos fluxos mundiais de IED. Isso porque, enquanto os primeiros adotaram uma estratégia ativa e de engajamento ao novo paradigma produtivo e comercial, os segundos optaram por uma inserção passiva ocasionando, em muitos casos, um baixo crescimento econômico e uma elevada vulnerabilidade externa. Conforme Acioly (2007), nos anos 1990, o Brasil e a China modificaram seus respectivos marcos regulatórios no que diz respeito ao capital externo com o intuito de atrair fluxos de IED. No entanto, os resultados obtidos, quanto à natureza e direção, foram diferentes em ambos os países, mesmo porque as ações dos governos, no que diz respeito às políticas de atração do IED, não foram semelhantes. No caso do Brasil, o IED esteve concentrado no setor de serviços (finanças e telecomunicações) e atrelados fortemente à aquisição de empresas públicas e privadas. Na China, por sua vez, o IED concentrou-se nos setores industriais, especialmente nas atividades de maior valor agregado, voltados para as exportações. Essas especificidades no que tange a quantidade e, especialmente, a qualidade (contribuição ao crescimento e, por conseguinte, ao desenvolvimento) do investimento estrangeiro podem estar associadas ao papel que cada país atribuiu a essa modalidade de capital dentro das suas estratégias de inserção externa. Desse modo, pode-se dizer que enquanto a China, grande líder na atração de investimentos, promoveu uma abertura parcial e cautelosa de sua economia, permitindo a entrada apenas de capitais na modalidade de IED, o Brasil adotou um programa de estabilização apoiado em uma estratégia de abertura financeira, onde foram retirados todos os obstáculos a livre movimentação dos fluxos de capitais, com a desregulamentação do mercado financeiro (JABBOUR; ACIOLY; MIGUEL, 2007). Nesse sentido, Medeiros (2007) reforça que, em decorrência das diferenças de concepções sobre as estratégias domésticas e os condicionantes internacionais, a China tem apresentado um crescimento expressivo, enquanto o Brasil tem demonstrado um crescimento menos significativo. A título de ilustração, de acordo com Gonçalves (2002), a China cresceu, no período de 1980 a 2000, a uma taxa média de 10,3% enquanto a taxa de crescimento do Brasil foi somente de 2,9% no mesmo período. Com base nessa explanação, o objetivo desse trabalho consiste em discutir de que forma a abertura econômica e as políticas voltadas ao IED contribuíram para a inserção diferenciada da China no comércio internacional. 2. Abertura Econômica da China Conforme observam Rossi e Marques (2005), por ser uma economia estatizada, a China se manteve, até o final da década de 1970, mais fechada ao investimento externo do que ao comércio internacional. Desse modo, Acioly (2005) e Rossi e Marques (2005) explicam que o processo de abertura comercial e econômica da China iniciou-se em 1979, fazendo com que o país passasse por reformas que visaram à modernização e uma melhor inserção externa do país, bem como lançaram as bases para a transição da economia chinesa ao regime de mercado. Nesse ambiente de modernização, o IED passou a ser entendido como parte de um processo de abertura e reforma, visando elevar a participação do país no comércio internacional, bem como favorecer as parcerias com o capital estrangeiro para introduzir modernas técnicas

administrativas nas empresas chinesas e, ainda, suprir as principais deficiências econômicas do país, tais como a falta de infra-estrutura, de tecnologia avançada e a baixa competitividade internacional (LEMOINE, 2000). Assim, inicialmente, o governo chinês adotou uma política de atração dos investimentos externos baseada em objetivos finais diferentes. Com relação a esses objetivos, Sampaio (1999) relaciona e explica duas intenções centrais do governo chinês, ao permitir a participação do capital internacional em sua economia. A primeira condiz com o fato de que a área de atuação das ETs e dos credores externos, deveria limitar-se àquela que fosse estritamente necessária para potencializar a assimilação de tecnologias que, sem a participação do capital estrangeiro, não poderiam ser absorvidas na velocidade almejada, tendo em vista os limites da capacidade de importação, as frágeis estruturas empresarial e financeira interna, ou ainda a indisponibilidade no mercado internacional. No tocante a segunda intenção central, constatou-se que a participação do capital internacional foi planejada, considerando três objetivos estratégicos a saber: -diminuir de forma gradativa a dependência financeira e tecnológica que o país tinha em relação ao exterior; -impor um limite para a movimentação de recursos destinados ao exterior como pagamento de remessas de lucros e royalties, para que esse montante não chegasse a um nível prejudicial ao equilíbrio de longo prazo do balanço de pagamentos; -reduzir o efeito exercido pela presença do capital internacional sobre os rumos da política econômica (SAMPAIO, 1999, p.5). Dessa maneira, pode-se observar que, em um primeiro momento, o governo chinês demonstrou grande interesse em permitir a participação do capital internacional, por se tratar de uma estratégia que possibilitaria à China, a utilização de novas tecnologias, assim como de importantes recursos para o desenvolvimento das empresas nacionais. Entretanto, percebeu-se também, que o Partido Comunista Chinês (PCC) receava que a vinda desse capital aumentasse a dependência do país em relação aos investidores internacionais. Como conseqüência disso, houve a tomada de decisão por parte do governo chinês de permitir efetivamente a entrada no país do capital internacional, objetivando a modernização da economia, mas impondo certas limitações à atuação do investimento estrangeiro. Desse modo, conforme Acioly (2005), formas de investimentos como os de portfólio e os empréstimos bancários, foram desestimulados, de modo que o processo de abertura da economia chinesa dissesse respeito quase que exclusivamente à entrada de investimento direto externo vinculado à sua política de comércio exterior (ACIOLY, 2005, p.27-28). Mesmo porque, em virtude da falta de poder de compra da população, os investimentos estrangeiros foram orientados para a criação de setores produtivos exportadores, possibilitando ganhos de escala e de qualidade dada a concorrência internacional. Assim, conforme Gonçalves (2002), houve na China um caso de inserção ativa na economia mundial, pois o governo, no intuito de defender sua soberania nacional, optou por um financiamento externo que tornasse o país pouco dependente dos empréstimos bancários. Para Lacerda (2004), enquanto a América Latina teve uma inserção passiva no processo de globalização, os países asiáticos, sobretudo a China, souberam articular a abertura de seus mercados com os objetivos estratégicos. Nesse contexto, Sampaio (1999, p.5) afirma que houve a decisão chinesa em recorrer ao capital internacional, como uma estratégia de alavancar o desenvolvimento nacional, sendo

que essa medida consubstanciou-se na adoção de uma política pragmática de investimentos diretos e de endividamento externo. Medeiros (2007) evidencia que entre 1978 e 1979 a China passou a ser financiada internacionalmente e sua dívida externa cresceu cerca de 250%, sendo que os empréstimos dos credores oficiais expandiram em 743%. Já no período compreendido entre 1981 e 1983, os empréstimos dos credores oficiais se contraíram dada a crise da economia mundial observada naquele momento. A partir de 1984, a oferta de crédito voltou a crescer rapidamente, sendo que no ano de 1991, 60% da dívida chinesa pertencia aos bancos. Contudo, como reflexo da forma diferenciada de inserção externa, no período de 1993-1998, a China reduziu sua dependência dos empréstimos estrangeiros, absorvendo somente 1,3% do total de empréstimos bancários e dos financiamentos oferecidos pelo sistema internacional aos países em desenvolvimento naquele período. Nesse contexto, pode-se perceber um contraste com a situação do Brasil que, no mesmo período relacionado, absorveu 39,3% dessas formas de empréstimos e financiamentos. Desse modo, o IED caracterizou-se como a principal forma de financiamento externo da economia chinesa (GONÇALVES, 2002). No que se refere à opção pelo endividamento externo, Medeiros (1999) atenta para o fato de que o Japão, durante a década de 1990, afirmou-se como o maior emprestador a longo prazo na China, por meio de investimentos concentrados, especialmente, em projetos de infraestrutura e no setor industrial, com predominância dos investimentos em máquinas elétricas. O autor ainda considera que o governo chinês deu grande prioridade aos investimentos realizados no país, provenientes do Japão, aumentando de forma decisiva as relações entre os dois países. Lemoine (2000) complementa que, devido a política ativa do governo chinês em atrair o IED, e às restrições impostas para outras formas de financiamento externo, o padrão do fluxo de IED foi muito diferente do observado em outros países em desenvolvimento. O autor atenta que, desde 1992, o IED constituiu-se na maior fonte de financiamento externo da China, sendo muito mais importante que investimentos de portfólio e empréstimos estrangeiros. Mais precisamente, a estrutura do financiamento externo chinês foi diferente da verificada na maioria dos países emergentes da América Latina e da Ásia (conforme destacado na tabela 1). Na China, a participação do IED foi muito maior do que a participação de empréstimos estrangeiros comparativamente aos demais países asiáticos, sendo que a importância do investimento de portfólio também foi menor na China do que na maioria dos países em desenvolvimento (LEMOINE, 2000, p.22). Tabela 1 - Estrutura do financiamento externo de países em desenvolvimento selecionados em 1997 (em % do estoque). Empréstimos Títulos Equity IED China 23 4 7 65 Brasil 20 49 9 22 México 19 28 18 35 Índia 24 2 51 24 Indonésia 30 8 17 45 Tailândia 84 4 5 7 Fonte: Lemoine (2000, p.22). NOTA: Dados de Caísse des Dépôts et Consignations (1999).

Além disso, segundo Rossi e Marques (2005), a inserção competitiva de um país em desenvolvimento na economia mundial está diretamente relacionada à existência de volumosos recursos para investimentos em infra-estrutura, pesquisa e qualificação da mão-deobra. Nesse contexto, verificou-se, desde o início da década de 1990, uma grande diferença entre as taxas de investimento, por exemplo, no Brasil e na China. Enquanto no Brasil estas permaneceram em torno de 20% do PIB, na China, elas se fixaram ao redor de 40% do PIB. Sampaio (1999, p.7) complementa que, embora tenha havido uma liberalização para a entrada do capital estrangeiro na China, prevaleceu um rígido controle político sobre suas condições de atuação. Segundo o autor, a decisão de subordinar a atuação do capital internacional às diretrizes do planejamento central levou a China a mudar várias vezes suas prioridades em relação à política de investimento direto. Como conseqüência disso, as condições de entrada do IED no país foram estabelecidas de forma gradual e seletiva (ACIOLY, 2005). É importante mencionar que, ao mesmo tempo em que a China optou pela estratégia de abertura econômica, seu governo preocupou-se em proteger a soberania nacional com relação aos rumos tomados pelo país no comércio internacional. Nesse cenário, Sampaio (1999) afirma que, simultaneamente à preocupação em desenvolver as forças produtivas chinesas, houve também, por parte do governo, a adoção de medidas que impedissem que a entrada de empresas estrangeiras levasse a uma desnacionalização da economia. Dessa maneira, o autor explica: A fim de evitar a concorrência predatória com os produtores chineses e preservar setores considerados estratégicos nas mãos de grupos econômicos nacionais, o capital internacional foi proibido de investir em uma série de atividades, entre as quais: aquisição de terras, projetos que ocupam grandes extensões de terra, controle de tráfico aéreo, telecomunicações, serviços de saneamento básico e gás urbano, exploração da riqueza biogenética, atividades artesanais tradicionais e projetos que poluem o meio ambiente (SAMPAIO, 1999, p.8). Portanto, Sampaio (1999, p.5) argumenta que o governo chinês tinha a intenção de que o capital externo contribuísse para potencializar a incorporação de progresso técnico e ampliar a capacidade produtiva voltada para o atendimento do mercado interno e para diminuir a rigidez da pauta de importações e, por conseguinte, aumentar da capacidade de exportação. 3. Zonas Econômicas Especiais (ZEEs) Como foi visto no item anterior, desde o final dos anos 1970 a China tem adotado diversas reformas visando criar um ambiente propício à atração de IED. Desse modo, para orientar a localização do capital recebido e objetivando ampliar a abertura econômica, a China criou as Zonas Econômicas Especiais (ZEEs), ou seja: Em 1979 foram criadas as quatro primeiras Zonas Econômicas Especiais (ZEE) - número que viria a ser fortemente ampliado nos anos seguintes- as quais deveriam ser capazes de impulsionar o potencial exportador do país e internalizar processos modernos de produção. Todas elas foram escolhidas pela proximidade de fontes externas de capital e pelo fácil acesso a mercados: Zhuhai fica ao lado de Macau;

Shenzen, logo acima da fronteira de Hong Kong; Shantu e Xiamen estão diante de Taiwan (MONTEIRO, 2005, p.13). Essas ZEEs se caracterizavam por serem territórios na zona costeira, onde havia concessão de benefícios especiais para a entrada de empresas estrangeiras. De acordo com Branstetter e Feenstra (1999), além de uma liberdade incomum para suas operações, foi dada às firmas estrangeiras um tratamento diferenciado quanto a taxas administrativas e tributárias. Acioly (2005, p.28) atenta para o fato de que o governo chinês optou por uma política de atração de investimentos, através das ZEEs fundada em tratamentos administrativos preferenciais e redução e isenções tarifárias naquelas indústrias para as quais o IED foi considerado desejado. Em decorrência disso, Nonnenberg et al. (2008) salientam que as ZEEs foram responsáveis pela absorção da quase totalidade das empresas estrangeiras que se dirigiram à China. Entre os principais fatores que atraíram essas empresas, os autores destacam o recebimento de incentivos fiscais, terrenos e edificações. No que se refere a outros aspectos positivos, pode-se destacar também, que as ZEEs possuíam localizações privilegiadas, estando próximas a fornecedores e outras indústrias semelhantes, além de centros de pesquisa, incubadoras de empresas, laboratórios de ponta e estavam amparadas por toda uma infra-estrutura de energia e transporte (NONNENBERG et al., 2008). Na opinião de Moraes (2004), a implantação das ZEEs pode ser interpretada como uma maneira de se obter experiência com o modelo capitalista que nelas foi imposto. O autor entende ainda que elas serviram tanto como um modo de se avaliar as reformas econômicas, como para maximizar os ganhos inerentes ao estreitamento de relações com Hong Kong, Macau e Taiwan. O autor também reforça a idéia de que as ZEEs atraíram o capital externo, expandiram as exportações, receberam novos aportes de tecnologia, absorveram métodos ocidentais de administração e gestão empresarial, e se constituíram em importante mercado para os produtos produzidos nas demais regiões. Contudo, Branstetter e Feenstra (1999) complementam que com a efetivação das ZEEs, pela primeira vez na história chinesa, empresas de capital integralmente estrangeiro foram aceitas no país. Os autores atentam, ainda, para o fato de que no ano de 1979, nenhuma das ZEEs consistiam em centros industriais desenvolvidos, e que, na verdade, essas ZEEs foram estabelecidas fora dos grandes centros industriais, justamente para se prevenir uma contaminação da indústria pesada chinesa por parte das influências externas. O sucesso dessas ZEEs foi tal que, em 1984, 14 outras áreas adicionais, conhecidas como cidades costeiras abertas, foram estimuladas a receberem o capital internacional, através de incentivos fiscais do governo, em uma tentativa de atração do IED. Essas cidades cobravam uma taxa de imposto de 24% para as filiais das empresas estrangeiras, sendo aprovados, pelas autoridades locais, apenas projetos de investimentos estrangeiros inferiores a US$ 30 milhões (BRANSTETTER; FEENSTRA, 1999, p.4). Acioly (2005) argumenta que na década de 1990, com o bom resultado obtido através dessas experiências, houve um aumento na quantidade de zonas alvos de políticas especiais, ao longo da faixa costeira do país. Além disso, foram criadas as Zonas de Desenvolvimento Econômico e Tecnológico, com a intenção de se incentivar os investimentos estrangeiros em tecnologia para o desenvolvimento dos setores de energia e transportes.

Ademais, a autora também evidencia os incentivos aos setores exportadores e setores alvos de política de substituição de importações, sendo que se destacou, entre as políticas para as empresas estabelecidas nas ZEEs, as que fomentaram a entrada de empresas no setor produtivo, com projetos acima de 10 anos. 4. Contribuição do IED para a Inserção Comercial Chinesa Com relação às políticas de fomento das exportações através do IED, Machado e Ferraz (2007) salientam que o governo chinês deu preferência à abertura aos investimentos estrangeiros e ao incentivo do comércio internacional, com o intuito de promover as exportações, assegurando, conseqüentemente, a geração de superávits comerciais, o acúmulo de reservas cambiais e a criação de empregos. O resultado inicial dessa estratégia foi favorável, tanto que o percentual de participação do comércio internacional em relação ao PIB, passou de 11,3% em 1979 para 26,8% e 60% em 2003. E o IED, por sua vez, se elevou de US$ 916 milhões em 1983 para US$ 3,5 bilhões em 1990 e US$ 60,6 bilhões em 2004 (ROSSI; MARQUES, 2005). Aliado a isso, Medeiros (2007) enfatiza que a política econômica chinesa praticada nos anos 1980 estava focada na indução de dois regimes: o regime de promoção de exportações através das ZEEs e o regime de desenvolvimento e proteção do mercado interno. Com relação ao primeiro regime, o autor explica que houve a promoção das exportações vinculadas às ZEEs espalhadas pelas zonas costeiras, baseando-se no processamento de importações com empresas locais contratadas por empresas estrangeiras ou com empresas de participação estrangeira, que possuíam autonomia de exportações. Nesse sentido, houve um forte fomento das exportações através da isenção do pagamento de qualquer imposto, sendo ainda que essa isenção foi destinada também às importações de equipamentos e matérias-primas destinados à produção para o mercado externo (MACHADO; FERRAZ, 2007). Medeiros (2007) complementa que houve uma política chinesa de atração de investimentos e divisas para que as exportações fossem fomentadas, concedendo-se, para tanto, liberdade cambial e isenção fiscal para as empresas que estivessem vinculadas às ZEEs. Como reflexo disso, a parcela das exportações realizadas por empresas por meio do IED cresceu rapidamente entre 1985 e 1995, de acordo com a tabela 2, passando de 1,1% para 31,5%, respectivamente. Tabela 2 Exportações das Empresas com Investimento Estrangeiro Ano Exportações (bilhões de US$) Participação no total (%) 1985 0,3 1,1 1986 0,6 1,9 1987 1,2 3,1 1988 2,5 5,2 1989 4,9 9,4 1990 7,8 12,6 1991 12,0 16,8 1992 17,4 20,4 1993 25,2 25,8 1994 34,7 28,7 1995 46,9 31,5 Fonte: Medeiros (2007, p.11). NOTA: Dados de Naughton, B. (1995).

No que se refere ao segundo regime de política econômica adotado na década de 1980, pode se dizer que houve a proteção e desenvolvimento do mercado interno, através da criação de legislação referente a direitos aduaneiros, licenças, barreiras tarifárias e não tarifárias, além da proteção natural exercida pelo interior da China, que era precariamente interligado ao sistema ferroviário e rodoviário (MEDEIROS, 2007).. Ademais, de acordo com Medeiros (2007, p.12), se evidenciou em 1984 a adoção de uma política de desvalorização do yuan e o estabelecimento de um mercado dual de câmbio, o oficial, administrado como uma taxa flutuante e o mercado de swaps com acesso restrito às empresas das ZEE e tradings. Essas medidas influenciaram sobremaneira o crescimento das exportações chinesas durante a década de 1980 que, somado ao crescimento econômico no mesmo período, tornaram positivo o financiamento externo líquido. Conforme Machado e Ferraz (2007), a participação chinesa no mercado internacional cresceu de forma significativa, tanto que, entre 1979 e 2003, suas exportações cresceram de forma expressiva, a uma taxa anual de 16%, possibilitando um salto de US$ 13,6 bilhões para US$ 438,3 bilhões. Nesse contexto, também ocorreu um aumento considerável das importações, sendo que essas passaram de US$ 15,6 bilhões em 1979, para US$ 412,8 bilhões em 2003. Como conseqüência do incentivo dado às exportações e da redução de tarifas de importação, a China transformou-se em um dos países mais abertos do mundo, se considerada a relação entre a soma de exportações e importações e o tamanho do PIB. No ano de 2005, o percentual de abertura atingiu 62%, índice superior ao de países como Alemanha, EUA e Japão, e muito acima dos cerca de 30% registrados no Brasil. Como reflexo da preocupação do governo em incentivar a produção de produtos de alta tecnologia, Acioly (2006, p.29) lembra que a participação das exportações intensivas em tecnologia passou de meros 3% em 1985, para significativos 22% em 2000, sendo que os dez principais produtos de exportação do país em 2000 (42% do total exportado) corresponderam a produtos dinâmicos no comércio internacional. Shenkar (2005) salienta que os IEDs realizados por filiais de empresas estrangeiras e joint ventures internacionais, foram responsáveis por uma parcela significativa do crescimento das exportações chinesas. A título de exemplo, o autor evidencia que, no início dos anos 1990, as ETs contribuíram com 75% das exportações chinesas de produtos tecnológicos, que é o segmento com maior crescimento no seu comércio exterior. É importante mencionar que, durante o início do século XXI, a China ganhou posição de destaque como um dos principais parceiros comerciais das maiores economias do mundo. O país, no ano de 2005, configurou-se como o segundo maior destino das exportações do Japão, com participação de 13% do total, além de ser seu principal fornecedor, respondendo por 20,7% das importações japonesas. Como outro grande parceiro comercial chinês, pode ser relacionado os EUA, pois somente no ano de 2004, a China ocupou o segundo lugar na lista dos maiores exportadores para os norte-americanos, além do quarto lugar na dos maiores compradores de produtos dos EUA. Nesse mesmo ano, os chineses obtiveram um superávit comercial de US$ 100 bilhões, apenas no comércio bilateral com os Estados Unidos, e um superávit global de US$ 32 bilhões (ROSSI; MARQUES, 2005). Com relação aos dados mais recentes disponíveis sobre o comércio exterior chinês, estes mostram que o desempenho exportador chinês continua tendo uma performance

impressionante. De acordo com dados do Ministério do Comércio da República Popular da China (MOFCOM), no período entre janeiro e agosto de 2007, o total de comércio realizado pela China com o resto do mundo atingiu o montante de US$ 1,367 trilhões. Os dados mostraram ainda que o total de exportações realizadas nos oito primeiros meses desse ano alcançou a significativa marca de US$ 765 bilhões. Para se ter uma idéia da importância adquirida pela China no comércio internacional, somente no mês de agosto de 2007 o país exportou cerca de US$ 111 bilhões, se tornando o maior exportador mundial naquele período, superando inclusive, os US$ 105 bilhões exportados pela Alemanha que é, tradicionalmente, o maior exportador mundial (MOFCOM, 2007). 5. Considerações Finais Com base na experiência chinesa, observou-se que a condução, por parte do governo, do processo de abertura e reforma da economia, influenciou no direcionamento e na contribuição do IED para a inserção externa mais ativa do país. Nesse sentido, o IED foi visto como parte do processo de modernização e inserção externa da China, visando elevar a participação da mesma no comércio internacional, bem como favorecer as parcerias com o capital estrangeiro para introduzir modernas técnicas administrativas nas empresas locais e, ainda, suprir as principais deficiências econômicas do país, tais como a falta de infra-estrutura, de tecnologia avançada e a baixa competitividade internacional. Desse modo, com a política ativa do governo chinês para atrair o IED, e dada as restrições impostas as outras modalidades de financiamento externo, verificou-se que o mesmo constituiu-se na principal fonte de recursos estrangeiros na China. Dessa maneira, para orientar a localização do capital recebido e objetivando ampliar a abertura econômica, criou-se no país as Zonas Econômicas Especiais, onde eram dados diversos benefícios, a exemplo dos incentivos fiscais, para estimular a entrada de empresas estrangeiras. Não obstante, apesar do incentivo ao ingresso de IED, prevaleceu um rígido controle político sobre suas condições de atuação. No mais, evidenciou-se que o governo chinês deu preferência à abertura aos investimentos estrangeiros, visando incentivar o comércio internacional por meio da promoção das exportações, especialmente dos produtos industriais com o emprego de tecnologia avançada. Como conseqüência disso, constatou-se uma melhora no desempenho exportador, bem como uma ampliação da participação e importância do país no comércio internacional. 6. Referências Bibliográficas ACIOLY, L. China: uma inserção externa diferenciada. Economia Política Internacional: Análise Estratégica n.7 out./dez. 2005.. Políticas para o investimento direto externo. Disponível em: <http://sistemasweb.desenvolvimento.gov.br/investimento_web/arquivos/convenioipea-artigo-luciana-acioly.pdf>. Acesso em agosto de 2007.

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