EDUCAÇÃO E NACIONAL- DESENVOLVIMENTISMO NO BRASIL

Documentos relacionados
REALIDADE EDUCACIONAL BRASILEIRA

Unificação da Itália, Alemanha e EUA

Processo Seletivo/UFU - julho ª Prova Comum - PROVA TIPO 1 SOCIOLOGIA QUESTÃO 51

China. A história da China é marcada por ciclos econômicos cuja crise provocava a ascensão de uma nova dinastia.

CONTRIBUIÇÕES DO PROGRAMA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL PARA A FORMAÇÃO DE PROFESSORES DO ENSINO BÁSICO

I ENCONTRO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NOS CURSOS DE LICENCIATURA LICENCIATURA EM PEDAGOGIA: EM BUSCA DA IDENTIDADE PROFISSIONAL DO PEDAGOGO

Objetivo da aula: Origens da ciência econômica. A Economia Política e sua critica (aula 1 Adam Smith)

Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto USP Departamento de Economia

EDUCADOR, MEDIADOR DE CONHECIMENTOS E VALORES

Nova Ordem Mundial. Página 1 com Prof. Giba

08/11/2004. Discurso do Presidente da República

GRAÇA FOSTER, CRISE NA PETROBRAS E PREÇO DA GASOLINA

Pokémon e a globalização 1

POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS X EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA: QUESTÕES PARA O DEBATE

Investimentos em Infraestrutura e Crescimento Econômico Brasileiro

(Eixo Temático: Formação de tradutores/intérpretes de língua de sinais)

Pós - Graduação Em Docência Superior

CURITIBA ANOS de PLANO DIRETOR e IPPUC

O Brasil e os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio

Geografia. Aula 02. Projeções Cartográficas A arte na construção de mapas. 2. Projeções cartográficas

Perspectivas de atuação da Assemae para fomento do saneamento básico no Brasil. Aparecido Hojaij Presidente da Assemae

NOVO MAPA NO BRASIL?

INCLUSÃO SOCIAL DO DEFICIENTE POR MEIO DO AMPARO JURÍDICO

Clima equatorial quente e úmido o ano todo com baixa variação térmica ( 24e 26 graus). Vegetação composta principalmente da floresta Amazônica e

A SOCIEDADE SALARIAL EM CRISE: A NOVA QUESTÃO SOCIAL

Mineração brasileira perspectivas e desafios. Geólogo Elmer Prata Salomão

O Desafio da Recuperação Económica e Financeira. Prova de Texto. Erebu Escola Secundária Engenheiro Acácio Calazans Duarte

CONEXÃO VERDE IASEA REDE NACIONAL DE ENSINO SOCIOAMBIENTAL INSTITUTO PARA APRENDIZAGEM SOCIAL, EMOCIONAL E AMBIENTAL

DISSERTAÇÃO DEFENDIDA EM FEVEREIRO DE MAIS EDUCAÇÃO NO MUNICÍPIO DE MESQUITA - RJ

Banco Central: função do Estado e autonomia

A ARTE DA EAD NA BAHIA

Autora: Deputada RAQUEL TEIXEIRA Relatora: Deputada FÁTIMA BEZERRA

Congresso nacional camponês: polêmicas agrárias

SEGUNDA EDIÇÃO REVISTA EATUALIZADA D) CO. D f ANTÓNIO DIAS LEITE PRÉMIO JABUTI 1998 CAMPUS ELSEVIER

O iluminismo ou Século das luzes

Ciências Humanas História. Guerra Fria

REQUERIMENTO (Do Sr. Dr. UBIALI)

CARTA DA PLENÁRIA ESTADUAL DE ECONOMIA POPULAR SOLIDÁRIA DE PERNAMBUCO AO MOVIMENTO DE ECONOMIA SOLIDÁRIA, AOS MOVIMENTOS SOCIAIS E À SOCIEDADE

da Universidade Estadual de Goiás

Melhor Prática vencedora: Aspectos Ambientais (Capital) Cidade Limpa

Linha do Tempo. Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica

A aposta em investimento em energias renovaveis em STP

Marco regulatório da Educação a Distância

ENQUADRAMENTO DO VOLUNTARIADO NA UNIVERSIDADE DE AVEIRO

Entrevista com o Prof. José Sérgio Fonseca de Carvalho

Estados Fracos no Sistema Internacional: O caso de África. David Sogge Seminário 23 de Novembro de 2012 Projecto Contraponto CIDAC Lisboa

Professor de Antropologia da Universidade Estadual de Campinas.

FILOSOFIA Prof.: Ênio Mendes FILOSOFIA QUESTÕES Prof.: Ênio Mendes

RELATÓRIO DE ACTIVIDADES 2013

Principais causas para revolução francesa

O QUE ORIENTA O PROGRAMA

Regulação e Contratualização

A RELAÇÃO MÉDICO X SUS

SOBRE UM IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA MAIS PROGRESSIVO

II CONFERÊNCIA ESTADUAL DAS CIDADES

REQUERIMENTO DE INFORMAÇÃO N º, DE 2015 (Do Sr. Lobbe Neto)

PROVA 1º BIMESTRE (2011) Correção das Questões

EDUCAÇÃO E NACIONALISMO EM TEMPOS DE GUERRA: REPRESENTAÇÕES DA IMPRENSA PARAIBANA DURANTE A SEGUNDA GUERRA MUNDIAL ( )

INTRODUÇÃO... 3 OBJETIVOS...

PROJETO DE LEI N.º 3.129, DE 2015 (Da Sra. Clarissa Garotinho)

A RNP e a Educação no Brasil

MBA GESTÃO EM EAD E TUTORIA ONLINE

Caixa reduz juros em até 21% para crédito imobiliário

Comissão avalia o impacto do financiamento para as regiões e lança um debate sobre a próxima ronda da política de coesão

PROJETO NBR Adoção de Critérios da Qualidade Baseados nas Normas da Família NBR ISO 9000 para Fornecimento de Produtos

BAILE DA ILHA FISCAL

PLANO NACIONAL E MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO PROPOSTAS PARA A MELHORIA DA QUALIDADE DA EDUCAÇÃO ESCOLAR

TENDÊNCIAS DA CIÊNCIA, TECNOLOGIA E INDÚSTRIA

Qualidade Social na Educação Básica e Diversidade: os desafios para enfrentar as desigualdades

Ministério da Educação Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Acre Pró-Reitoria de Extensão - PROEX

Centro Universitário Newton Paiva Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas Curso Publicidade e Propaganda

Dados internacionais de catalogação Biblioteca Curt Nimuendajú

Como vender MAIS com base nos RECURSOS DA REGIÃO. 25 de maio de 2012 Castelo Branco Alberto Ribeiro de Almeida

André Urani

A visão empresarial da nova institucionalidade

Cotas raciais nas universidades, a contradição do Brasil!

Indicadores e o ciclo de políticas públicas

DESEMPENHO DO TURISMO EM ALAGOAS, PARA ABRIL DE 2015

SILVA, Maurício - UNINOVE - maurisil@gmail.com RESUMO

COMISSÃO DA AMAZÔNIA, INTEGRAÇÃO NACIONAL E DESENVOLVIMENTO REGIONAL

UNIAO VITORIOSA PLANO DE GOVERNO SAUDE

Laboratório de Sustentabilidade Sessão 6: A planificação estratégica. Maio de 2015

AVALIAÇÃO DO FUNDO CLIMA. REUNIÃO DE PARES 29 de março de 2016

POLÍTICA DE SAÚDE NO BRASIL: ALGUMAS REFLEXÕES

Concurso para o design do logótipo do Município de Vila do Conde

Lei nº de 24 de julho de 2000.

SECRETARIA DE EDUCAÇÃO BÁSICA MEC

A empresa quantifica aspectos socioambientais nas projeções financeiras de:

Microcrédito e Comércio Justo

Guerra Fiscal Impactos da Resolução do Senado Federal 13 / Março de 2013

Identidade e trabalho do coordenador pedagógico no cotidiano escolar

Experiência: Gestão Estratégica de compras: otimização do Pregão Presencial

Recursos energéticos e os desafios ambientais

Colonização. Os Estados Unidos foi colonizado por ingleses. A ocupação e exploração dessa colônia não se deu de forma igualitária.

LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA: ESPAÇO DE INCLUSÃO

BARÓMETRO DE OPINIÃO PÚBLICA: Atitudes dos portugueses perante Leitura e o Plano Nacional de Leitura

POLÍTICAS SOCIAIS DE COMBATE A POBREZA, NA GARANTIA DE DIREITOS: UM BREVE RELATO

PREFEITURA MUNICIPAL DE RELVADO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL DECRETO Nº 19/2013, DE 03 DE MAIO DE 2013.

Transcrição:

EDUCAÇÃO E NACIONAL- DESENVOLVIMENTISMO NO BRASIL Manoel Nelito M. Nascimento Publicado em Navegando na História da Educação Brasileira: http://www.histedbr.fae.unicamp.br/navegando/index.html

Em maio de 1945, a 2ª Guerra Mundial chegava ao fim com a vitória das Forças Aliadas, lideradas pelos Estados Unidos, sobre as forças nazifascistas. Este acontecimento repercutiu na política brasileira, a ponto de acelerar o fim do regime ditatorial do Estado Novo (1937-1945), com a deposição de Vargas, dando início a uma nova fase de redemocratização do país. A aliança vitoriosa das superpotências EUA e URSS contra o nazifascismo, logo após o fim do conflito, deu lugar à chamada Guerra Fria, que opunha as forças ocidentais capitalistas lideradas pelos EUA e as forças orientais socialistas lideradas pela URSS. Desde o Estado Novo, a política brasileira se caracterizava pelo populismo, nacionalismo e desenvolvimentismo. O populismo era adotado como instrumento de controle e mobilização das massas em proveito das classes dominantes. O nacionalismo surgiu entre os grupos políticos, tecnocratas e militares, que buscavam uma estratégia estatal capaz de enfrentar os problemas do desenvolvimento crônico do Brasil. (Cunha, 1989).

A ideologia do nacional-desenvolvimentismo teve como lócus privilegiado de discussão e desenvolvimento o Instituto Superior de Estudos Brasileiros ISEB, que foi criado em 1955, no governo interino de Café Filho. No governo de Juscelino Kubitschek o ISEB passou a ser peça essencial da nova administração, com a atribuição de formar uma mentalidade nacional para o desenvolvimento. No pós-segunda guerra mundial, a reconstrução dos países diretamente envolvidos no conflito [ ] deu-se o estabelecimento do Estado do Bem Estar Social nos países centrais. Após a fase de reconstrução, ocorreu um período de ampla internacionalização do capital. O avanço do capitalismo para os países periféricos encontrou o Brasil numa forma peculiar de desenvolvimento, onde a entrada de capitais externos era discutida como opção para acelerar o seu desenvolvimento. [.]. No entanto, a burguesia brasileira estava dividida entre os que defendiam a industrialização sob o controle total do capital nacional e os partidários da participação e comando do processo de industrialização brasileira dos capitais estrangeiros.

[.] em 1954 [.] no governo de Café Filho, foi baixada a Portaria 113 da SUMOC Superintendência da Moeda e do Crédito, que concedia vantagens ao capital estrangeiro que investisse no país. No governo JK, esta portaria foi aproveitada para atrair o capital externo e acelerar o processo de produção de equipamentos, bens de consumo duráveis e produtos químicos. No final da década de 1950, o parque industrial brasileiro havia crescido e diversificado, consolidando a indústria de base no país. Após a II Guerra Mundial, a área rural no Brasil foi invadida pelo capital promovendo a modernização da produção. No início da década de 1960 a sociedade brasileira já havia se tornado bastante complexa, resultado do desenvolvimento urbano e industrial e da mudança das relações de trabalho no campo. Havia um alto nível de desigualdades sociais, que motivaram os movimentos de luta por reformas de base que reduzissem as grandes diferenças de condições de vida entre as classes sociais.

O governo Goulart, ao tentar compatibilizar a manutenção do modelo político nacional-desenvolvimentista e mudar a orientação econômica através das reformas de base, sob o argumento de, com esta ação, provocar a redução das desigualdades sociais, deu origem à uma nova crise econômica e social, que levou ao golpe militar de 1964 (RIBEIRO, 2003, p. 155). É esse contexto de redemocratização do país, com uma política baseada no populismo e nacionalismo, e no plano econômico pela opção ao desenvolvimento econômico nacional associado ao capital externo e da crescente urbanização das capitais de Estado, que explica as linhas gerais da educação nesse período e que foi marcada, principalmente, pela elaboração da lei de diretrizes e bases da educação nacional. A quarta Constituição da República foi promulgada em 1946, inspirada na ideologia liberal-democrática. A União, com a atribuição que recebeu de fixar as diretrizes e bases da educação nacional, encaminhou uma proposta de LDB ao Congresso, que teve um período de treze anos de tramitação, com acaloradas discussões entre os educadores progressistas defensores da escola pública e os conservadores que eram partidários da defesa de privilégios à escola privada.

Os conservadores, representados pela Igreja Católica, manifestavam suas preocupações com a questão da laicidade do ensino. Apesar da separação da Igreja e Estado a partir da Proclamação da República, a Igreja continuou atuando sobre a vida nacional, através da educação. A superioridade em número de colégios católicos, em especial para as elites, bem como a tradição católica da população brasileira, permitiam que a Igreja tivesse uma ampla atuação sobre a sociedade. Nessa direção, em 1959, os educadores progressistas e o Jornal O Estado de S.Paulo desencadearam a Campanha de Defesa da Escola Pública, no interior do qual foi divulgado o Manifesto dos Educadores Mais uma vez Convocados, invocando e requentando as idéias do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova de 1932.

A LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - foi aprovada através da Lei 4024, em 1961. Como principais características desta lei, pode-se destacar: a garantia de igualdade de tratamento por parte do Poder Público para os estabelecimentos oficiais e particulares; a obrigatoriedade do ensino primário, [.] foi prejudicada pelas isenções que a Lei permitia e que, na prática, anulava a sua obrigatoriedade; a estrutura de ensino não foi alterada: continuava o ensino pré-primário, o ensino primário de 4 anos, o ensino médio, nas modalidades: ginasial em 4 anos e colegial em 3 anos, e o ensino superior; o Conselho Federal de Educação recebeu a delegação de determinar os valores das bolsas de estudo e financiamento para os graus de ensino, que a lei atribuia aos Estados, ao Distrito Federal e aos Territórios. Pode-se destacar, também, como aspectos positivos da LDBEN: a unificação do sistema escolar e a sua descentralização; a autonomia do Estado para exercer a função educadora e o da distribuição de recursos para a educação.

Em relação às concepções pedagógicas defendidas no período nacional-desenvolvimentista, Saviani (2005) assinala: [...] se o período situado entre 1930 e 1945 pode ser considerado como marcado pelo equilíbrio entre as influências das concepções humanista tradicional (representada pelos católicos) e humanista moderna (representada pelos pioneiros da educação nova), a partir de 1945 já se delineia como nitidamente predominante a concepção humanista moderna. A ênfase no desenvolvimento econômico do país [.] produziu uma inversão do papel do ensino público, colocando a escola sob os desígnios do mercado de trabalho, passando a concepção produtivista a moldar todo o ensino brasileiro por meio da pedagogia tecnicista. (Saviani, 2005)

A decepção dos grupos progressistas que lutaram pela educação pública e desempenharam um papel importante na solução dos problemas nacionais, os levou a se lançarem nas campanhas da educação popular. Os movimentos mais significativos foram o Movimento de Educação de Base (MEB) e o Movimento Paulo Freire de Educação de Adultos. A opção pelas reformas de base - agrária e urbana - com o objetivo de reduzir as desigualdades sociais, acabou agregando os setores mais conservadores da sociedade até a deposição de João Goulart pelo golpe militar de 1964 e a perseguição aos movimentos populares e de estudantes até serem extintos.