Como chamar as pessoas que têm deficiência? *

Documentos relacionados
Como chamar as pessoas que têm deficiência? *

Como chamar as pessoas que têm deficiência? *

O ASSISTENTE SOCIAL E SEU PAPEL NA EFETIVAÇÃO DE GARANTIAS DE DIREITOS DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NAS APAES

INCLUSÃO SOCIAL DO DEFICIENTE POR MEIO DO AMPARO JURÍDICO

ALTERAÇÕES TORÁCICAS CORREÇÕES CIRÚRGICAS

INSTRUÇÕES: Crédito imagem: metasinergia desenvolvimento de pessoas

CONSELHO REGIONAL DE ENFERMAGEM DE SANTA CATARINA

I ENCONTRO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NOS CURSOS DE LICENCIATURA LICENCIATURA EM PEDAGOGIA: EM BUSCA DA IDENTIDADE PROFISSIONAL DO PEDAGOGO

PROJETO DE LEI Nº., DE DE DE 2012.

Usando potências de 10

O PAPEL DA ESCOLA E DO PROFESSOR NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM EM CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) Introdução

Análise Qualitativa no Gerenciamento de Riscos de Projetos

Colégio Brasileiro de Cirurgia Digestiva

Cotas raciais nas universidades, a contradição do Brasil!

Comandos de Eletropneumática Exercícios Comentados para Elaboração, Montagem e Ensaios

Pokémon e a globalização 1

Repercussão do Registro em Carteira de Trabalho da Pessoa com Deficiência junto ao Regime Geral de Previdência Social

Projeto 10Envolver. Nota Técnica

SISTEMAS DISTRIBUÍDOS

Por uma prática promotora de saúde em Orientação Vocacional (Ana Bock e Wanda Aguiar)

IPERON - ABRIL VERDE/ PASSOS PARA UMA LIDERANÇA DE RESULTADOS

O texto de hoje da UNESCO é simples mas deveria ser pensado por todos nós. Vamos a ele:

ATIVIDADE 02 O CONJUNTO ARQUITETÔNICO DA PAMPULHA: UM CARTÃO-POSTAL DA CIDADE

EDUCADOR, MEDIADOR DE CONHECIMENTOS E VALORES

Pessoa com deficiência: a evolução de um paradigma para reafirmar direitos

Dislexia: dificuldades, características e diagnóstico

A Obsessão Espiritual (Autor: Osvaldo Shimoda)

BB Crédito Imobiliário

EDITAL DE LANÇAMENTO E SELEÇÃO DE ALUNOS PESQUISADORES PARA O PROJETO DE PESQUISA

Instruções para o cadastramento da Operação de Transporte e geração do Código Identificador da Operação de Transporte CIOT.

Plenário Adriano Jorge, em 22 de abril de PROFESSOR BIBIANO PT VEREADOR

Procedimento é realizado no Hospital do Olho da Redentora, em Rio Preto Enxergar

GOVERNO DO ESTADO DE ALAGOAS SECRETARIA DE ESTADO DA GESTÃO PÚBLICA SUPERINTENDÊNCIA DA ESCOLA DE GOVERNO REGULAMENTO DO CONCURSO DE AÇÕES INOVADORAS

Treinamento sobre Progress Report.

PROGRAMA PARA A VALORIZAÇÃO DE INICIATIVAS CULTURAIS VAI SECRETARIA MUNICIPAL DA CULTURA São Paulo, Janeiro de 2012.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO FUNDO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO DIRETORIA DE ASSISTÊNCIA A PROGRAMAS ESPECIAIS

Exemplo COMO FAZER UM TRABALHO ESCOLAR O QUE DEVE CONSTAR EM UM TRABALHO ESCOLAR? Um Trabalho Escolar que se preze, de nível fundamental, deve conter:

Módulo 6: Desenho Industrial

Relatório sobre as interpretações de Libras nas Audiências Públicas da Prefeitura de Salvador para discussão do PPDU

FACULDADE MULTIVIX CURSO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO 2º PERÍODO MARIANA DE OLIVEIRA BERGAMIN MONIQUE MATIELLO GOMES THANIELE ALMEIDA ALVES

CPGP 2016 CONGRESSO PARANAENSE DE GERENCIAMENTO DE PROJETOS CHAMADA DE TRABALHOS

DATAS COMEMORATIVAS. O tema: Construindo uma história de igualdade e oportunidades para todos! APAE BRASIL: 60 anos fazendo inclusão.

O PROCESSO DE ELABORAÇÃO DA CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Município de Piracaia PIRAPREV CNPJ: / Política de Responsabilidade Social

Gestão de Pessoas e Avaliação por competências

Prospeto a publicar nas ofertas públicas de valores mobiliários

Política de Responsabilidade Socioambiental da PREVI

PEQUENAS EMPRESAS E PRÁTICAS SUSTENTÁVEIS TENDÊNCIAS E PRÁTICAS ADOTADAS PELAS EMPRESAS BRASILEIRAS

ÉTICA E LEGISLAÇÃO PROFISSIONAL MÓDULO 12

GESTÃO ESTRATÉGICA 21/03/2011 UNIVERSIDADE GAMA FILHO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO

A TECNOLOGIA DO ENSINO MÉDIO: UMA FERRAMENTA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA Rosimeire Cabral Romeiro COSTA 1 Mário Augusto Andreta CARVALHO 2

LÍNGUA PORTUGUESA com DUDA NOGUEIRA Comentários da prova BANCO do BRASIL Aplicada 15/03/2015

E-Learning Uma estratégia para a qualidade do ensino/aprendizagem. Ensino a Distância

Manual Geral de Aplicação Universal Entrada 2008

Contratar um plano de saúde é uma decisão que vai além da pesquisa de preços. Antes de

ISO 9000 e ISO

Manual do Revisor Oficial de Contas. Recomendação Técnica n.º 5

OFICINA DE ORGANIZAÇÃO PESSOAL MARCIA NOLETO PERSONAL ORGANIZER

Como remover vírus do celular

Estudo aponta influência do código de barras e da tecnologia na decisão de compra do consumidor e na estratégia do varejo

CAPÍTULO I DA NATUREZA E DOS OBJETIVOS

Engenharia de Software II

RELATÓRIO DE AVALIAÇÃO DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO PRÉ ESCOLAR. Ano Letivo 2014/ º Período

Boletim epidemiológico HIV/AIDS /11/2015

a) No Projeto d) Em sua residência b) No Escritório da UNESCO e) Outros c) No Escritório Antena

COMPROMISSO COM A FAMILIA

O que é uma rede social virtual?

LENTES DE CONTATO. Sua história e evolução

Inteligência Artificial

LABORATÓRIO DE INFORMÁTICA: ESPAÇO DE INCLUSÃO

MAPEAMENTO DA SITUAÇÃO EDUCACIONAL DOS SURDOS NA REGIÃO DE ABRANGÊNCIA DO NÚCLEO REGIONAL DE EDUCAÇÃO DO MUNICÍPIO DE IRATI/PR

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

EDITAL PARA INSCRIÇÃO DE TRABALHOS NO III CURSO DE EXTENSÃO SOBRE O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA EDUCAÇÃO DO IFMG

O PARTO NA PACIENTE SOROPOSITIVO

EMPREENDEDORISMO E MERCADO DE TRABALHO

CRIAÇÃO DE TABELAS NO ACCESS. Criação de Tabelas no Access

A Orientação Educacional no novo milênio

Função Exponencial. Função exponencial Gráfico da função exponencial Equações exponenciais Função exponencial de base e

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS UFAL Coordenadoria Institucional de Educação a Distância - CIED

COMISSÃO DE SEGURIDADE SOCIAL E FAMÍLIA. PROJETO DE LEI Nº 328, DE 2011 (Apensos os Projeto de Lei nº 823, de 2011; e 6.

Ensino Português no Estrangeiro Nível A1 Prova A (13A1AE) 60 minutos

Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto USP Departamento de Economia

Vamos dar uma olhada nos Processos de Produção Musical mas, antes, começaremos com alguns Conceitos Básicos.

ELABORAÇÃO DE UM RECURSO DE COMUNICAÇÃO ALTERNATIVA PARA CONTAÇÃO DE HISTÓRIAS A CRIANÇAS NÃO-ORALIZADAS NA EDUCAÇÃO INFANTIL

2 Workshop processamento de artigos em serviços de saúde Recolhimento de artigos esterilizados: é possível evitar?

Normas de Utilização do Laboratório de Fisiologia e Aspectos Práticos e Éticos da Experimentação Animal Curso de Nutrição (UFV/CRP)

DISTRIBUIÇÕES ESPECIAIS DE PROBABILIDADE DISCRETAS

O Questionário RX. 1 - Você está acima do peso? E se está, sabe exatamente quantos quilos tem hoje?

Dados internacionais de catalogação Biblioteca Curt Nimuendajú

POLÍTICAS EDUCACIONAIS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL: AVANÇOS E RETROCESSOS

M =C J, fórmula do montante

O Direito da Acessibilidade e comunicação dos surdos. Neivaldo Zovico Diretor Regional da Feneis/SP

DESAFIOS E PERSPECTIVAS PARA A PESQUISA E USO DE LEGUMINOSAS EM PASTAGENS TROPICAIS: UMA REFLEXÃO. Sila Carneiro da Silva 1

Auditoria de Meio Ambiente da SAE/DS sobre CCSA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ETNOBIOLOGIA E CONSERVAÇÃO DA NATUREZA -Doutorado-

Koinonia, descobrindo a alegria de pertencer.

UM JOGO BINOMIAL 1. INTRODUÇÃO

REGULAMENTO PARA SUBMISSÃO DE TRABALHOS CIENTÍFICOS CAPÍTULO I DA SUBMISSÃO DE TRABALHOS

Transcrição:

Como chamar as pessoas que têm deficiência? * Romeu Kazumi Sassaki ** São Paulo, dezembro de 2006. * A primeira versão desta matéria foi publicada no livreto de Romeu Sassaki: Vida Independente: história, movimento, liderança, conceito, filosofia e fundamentos. São Paulo: RNR, 2003, p. 12-16. ** Consultor de inclusão social. E-mail: romeukf@uol.com.br. Autor do livro Inclusão: Construindo uma Sociedade para Todos (3.ed., Rio de Janeiro: Editora WVA, 1999) e do livro Inclusão no Lazer e Turismo: Em Busca da Qualidade de Vida (São Paulo: Áurea, 2003). Co-autor do livro Trabalho e Deficiência Mental: Perspectivas Atuais (Brasília: Apae-DF, 2003) e do livro Inclusão dá Trabalho (Belo Horizonte: Armazém de Idéias, 2000) Em todas as épocas e localidades, a pergunta que não quer calar-se tem sido esta, com alguma variação: Qual é o termo correto - portador de deficiência, pessoa portadora de deficiência ou portador de necessidades especiais? Responder esta pergunta tão simples é simplesmente trabalhoso, por incrível que possa parecer. Comecemos por deixar bem claro que jamais houve ou haverá um único termo correto, válido definitivamente em todos os tempos e espaços, ou seja, latitudinal e longitudinalmente. A razão disto reside no fato de que a cada época são utilizados termos cujo significado seja compatível com os valores vigentes em cada sociedade enquanto esta evolui em seu relacionamento com as pessoas que possuem este ou aquele tipo de Percorramos, mesmo que superficialmente, a trajetória dos termos utilizados ao longo da história da atenção às pessoas com deficiência, no Brasil. ÉPOCA No começo da história, durante séculos. Romances, nomes de instituições, leis, mídia e outros meios mencionavam os inválidos. Exemplos: A reabilitação profissional visa a proporcionar aos beneficiários inválidos... (Decreto federal nº 60.501, de 14/3/67, dando nova redação ao Decreto nº 48.959-A, de 19/9/60). os inválidos. O termo significava indivíduos sem valor. Em pleno século 20, ainda se utilizava este termo, embora já sem nenhum sentido pejorativo. Outro exemplo: Inválidos insatisfeitos com lei relativa aos ambulantes (Diário Popular, 21/4/76). Aquele que tinha deficiência era tido como socialmente inútil, um peso morto para a sociedade, um fardo para a família, alguém sem valor profissional. Outros exemplos: Servidor inválido pode voltar (Folha de S. Paulo, 20/7/82). Os cegos e o inválido (IstoÉ, 7/7/99). 1

Século 20 até 1960. Derivativo para incapacitados (Shopping News, Coluna Radioamadorismo, 1973). Escolas para crianças incapazes (Shopping News, 13/12/64). Após a I e a II Guerras Mundiais, a mídia usava o termo assim: A guerra produziu incapacitados, Os incapacitados agora exigem reabilitação física. De 1960 até 1980. Crianças defeituosas na Grã-Bretanha tem educação especial (Shopping News, 31/8/65). No final da década de 50, foi fundada a Associação de Assistência à Criança Defeituosa AACD (hoje denominada Associação de Assistência à Criança Deficiente). Na década de 50 surgiram as primeiras unidades da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais - Apae. os incapacitados. O termo significava, de início, indivíduos sem capacidade e, mais tarde, evoluiu e passou a significar indivíduos com capacidade residual. Durante várias décadas, era comum o uso deste termo para designar pessoas com deficiência de qualquer idade. Uma variação foi o termo os incapazes, que significava indivíduos que não são capazes de fazer algumas coisas por causa da deficiência que tinham. os defeituosos. O termo significava indivíduos com deformidade (principalmente física). os deficientes. Este termo significava indivíduos com deficiência física, intelectual, auditiva, visual ou múltipla, que os levava a executar as funções básicas de vida (andar, sentar-se, correr, escrever, tomar banho etc.) de uma forma diferente daquela como as pessoas sem deficiência faziam. E isto começou a ser aceito pela sociedade. os excepcionais. O termo significava indivíduos com deficiência intelectual. Foi um avanço da sociedade reconhecer que a pessoa com deficiência poderia ter capacidade residual, mesmo que reduzida. Mas, ao mesmo tempo, considerava-se que a deficiência, qualquer que fosse o tipo, eliminava ou reduzia a capacidade da pessoa em todos os aspectos: físico, psicológico, social, profissional etc. A sociedade passou a utilizar estes três termos, que focalizam as deficiências em si sem reforçarem o que as pessoas não conseguiam fazer como a maioria. Simultaneamente, difundiase o movimento em defesa dos direitos das pessoas superdotadas (expressão substituída por pessoas com altas habilidades ou pessoas com indícios de altas habilidades ). O movimento mostrou que o termo os excepcionais não poderia referir-se exclusivamente aos que tinham deficiência intelectual, pois as pessoas com superdotação também são excepcionais por estarem na outra ponta da curva da inteligência humana. 2

De 1981 até 1987. Por pressão das organizações de pessoas com deficiência, a ONU deu o nome de Ano Internacional das Pessoas Deficientes ao ano de 1981. E o mundo achou difícil começar a dizer ou escrever pessoas deficientes. O impacto desta terminologia foi profundo e ajudou a melhorar a imagem destas pessoas. De 1988 até 1993. Alguns líderes de organizações de pessoas com deficiência contestaram o termo pessoa deficiente alegando que ele sinaliza que a pessoa inteira é deficiente, o que era inaceitável para eles. pessoas deficientes. Pela primeira vez em todo o mundo, o substantivo deficientes (como em os deficientes ) passou a ser utilizado como adjetivo, sendo-lhe acrescentado o substantivo pessoas. A partir de 1981, nunca mais se utilizou a palavra indivíduos para se referir às pessoas com pessoas portadoras de deficiência. Termo que, utilizado somente em países de língua portuguesa, foi proposto para substituir o termo pessoas deficientes. Pela lei do menor esforço, logo reduziram este termo para portadores de deficiência. Foi atribuído o valor pessoas àqueles que tinham deficiência, igualando-os em direitos e dignidade à maioria dos membros de qualquer sociedade ou país. A Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou em 1980 a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, mostrando que estas três dimensões existem simultaneamente em cada pessoa com O portar uma deficiência passou a ser um valor agregado à pessoa. A deficiência passou a ser um detalhe da pessoa. O termo foi adotado nas Constituições federal e estaduais e em todas as leis e políticas pertinentes ao campo das deficiências. Conselhos, coordenadorias e associações passaram a incluir o termo em seus nomes oficiais. De 1990 até hoje. O art. 5 da Resolução CNE/CEB n 2, de 11/9/01, explica que as necessidades especiais decorrem de três situações, uma das quais envolvendo dificuldades vinculadas a deficiências e dificuldades não-vinculadas a uma causa orgânica. pessoas com necessidades especiais. O termo surgiu primeiramente para substituir deficiência por necessidades especiais. daí a expressão portadores de necessidades especiais. Depois, esse termo passou a ter significado próprio sem substituir o nome pessoas com deficiência. De início, necessidades especiais representava apenas um novo termo. Depois, com a vigência da Resolução n 2, necessidades especiais passou a ser um valor agregado tanto à pessoa com deficiência quanto a outras pessoas. 3

Mesma época acima. Surgiram expressões como crianças especiais, alunos especiais, pacientes especiais e assim por diante numa tentativa de amenizar a contundência da palavra deficientes. pessoas especiais. O termo apareceu como uma forma reduzida da expressão pessoas com necessidades especiais, constituindo um eufemismo dificilmente aceitável para designar um segmento populacional. O adjetivo especiais permanece como uma simples palavra, sem agregar valor diferenciado às pessoas com O especial não é qualificativo exclusivo das pessoas que têm deficiência, pois ele se aplica a qualquer pessoa. Em junho de 1994. A Declaração de Salamanca preconiza a educação inclusiva para todos, tenham ou não uma Em maio de 2002. O Frei Betto escreveu no jornal O Estado de S.Paulo um artigo em que propõe o termo portadores de direitos especiais e a sigla PODE. Alega o proponente que o substantivo deficientes e o adjetivo deficientes encerram o significado de falha ou imperfeição enquanto que a sigla PODE exprime capacidade. O artigo, ou parte dele, foi reproduzido em revistas especializadas em assuntos de pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência, quando tiverem necessidades educacionais especiais e se encontrarem segregadas, têm o direito de fazer parte das escolas inclusivas e da sociedade inclusiva. portadores de direitos especiais. O termo e a sigla apresentam problemas que inviabilizam a sua adoção em substituição a qualquer outro termo para designar pessoas que têm O termo portadores já vem sendo questionado por sua alusão a carregadores, pessoas que portam (levam) uma O termo direitos especiais é contraditório porque as pessoas com deficiência exigem equiparação de direitos e não direitos especiais. E mesmo que defendessem direitos especiais, o nome portadores de direitos especiais não poderia ser exclusivo das pessoas com deficiência, pois qualquer outro grupo vulnerável pode reivindicar direitos especiais. 4 O valor agregado às pessoas é o de elas fazerem parte do grande segmento dos excluídos que, com o seu poder pessoal, exigem sua inclusão em todos os aspectos da vida da sociedade. Trata-se do empoderamento. Não há valor a ser agregado com a adoção deste termo, por motivos expostos na coluna ao lado e nesta. A sigla PODE, apesar de lembrar capacidade, apresenta problemas de uso: 1) Imaginem a mídia e outros autores escrevendo ou falando assim: Os Podes de Osasco terão audiência com o Prefeito..., A Pode Maria de Souza manifestou-se a favor..., A sugestão de José Maurício, que é um Pode, pode ser aprovada hoje... 2) Pelas normas brasileiras de ortografia, a sigla PODE precisa ser grafada Pode. Norma: Toda sigla com mais de 3 letras, pronunciada como uma palavra, deve ser grafada em caixa baixa com exceção da letra inicial.

De 1990 até hoje e além. A década de 90 e a primeira década do século 21 e do Terceiro Milênio estão sendo marcadas por eventos mundiais, liderados por organizações de pessoas com A relação de documentos produzidos nesses eventos pode ser vista no final deste artigo. pessoas com deficiência passa a ser o termo preferido por um número cada vez maior de adeptos, boa parte dos quais é constituída por pessoas com deficiência que, no maior evento ( Encontrão ) das organizações de pessoas com deficiência, realizado no Recife em 2000, conclamaram o público a adotar este termo. Elas esclareceram que não são portadoras de deficiência e que não querem ser chamadas com tal nome. Os valores agregados às pessoas com deficiência são: 1) o do empoderamento [uso do poder pessoal para fazer escolhas, tomar decisões e assumir o controle da situação de cada um] e 2) o da responsabilidade de contribuir com seus talentos para mudar a sociedade rumo à inclusão de todas as pessoas, com ou sem Os movimentos mundiais de pessoas com deficiência, incluindo os do Brasil, estão debatendo o nome pelo qual elas desejam ser chamadas. Mundialmente, já fecharam a questão: querem ser chamadas de pessoas com deficiência em todos os idiomas. E esse termo faz parte do texto da Convenção Internacional para Proteção e Promoção dos Direitos e da Dignidade das Pessoas com Deficiência, a ser aprovada pela ONU em 2006 e a ser promulgada posteriormente através de lei nacional de todos os Países-Membros. Eis os princípios básicos para os movimentos terem chegado ao nome pessoas com deficiência : 1. Não esconder ou camuflar a deficiência; 2. Não aceitar o consolo da falsa idéia de que todo mundo tem deficiência; 3. Mostrar com dignidade a realidade da deficiência; 4. Valorizar as diferenças e necessidades decorrentes da deficiência; 5. Combater neologismos que tentam diluir as diferenças, tais como pessoas com capacidades especiais, pessoas com eficiências diferentes, pessoas com habilidades diferenciadas, pessoas deficientes, pessoas especiais, é desnecessário discutir a questão das deficiências porque todos nós somos imperfeitos, não se preocupem, agiremos como avestruzes com a cabeça dentro da areia (i.é, aceitaremos vocês sem olhar para as suas deficiências ); 6. Defender a igualdade entre as pessoas com deficiência e as demais pessoas em termos de direitos e dignidade, o que exige a equiparação de oportunidades para pessoas com deficiência atendendo às diferenças individuais e necessidades especiais, que não devem ser ignoradas; 7. Identificar nas diferenças todos os direitos que lhes são pertinentes e a partir daí encontrar medidas específicas para o Estado e a sociedade diminuírem ou 5

eliminarem as restrições de participação (dificuldades ou incapacidades causadas pelos ambientes humano e físico contra as pessoas com deficiência). Conclusão A tendência é no sentido de parar de dizer ou escrever a palavra portadora (como substantivo e como adjetivo). A condição de ter uma deficiência faz parte da pessoa e esta pessoa não porta sua Ela tem uma Tanto o verbo portar como o substantivo ou o adjetivo portadora não se aplicam a uma condição inata ou adquirida que faz parte da pessoa. Por exemplo, não dizemos e nem escrevemos que uma certa pessoa é portadora de olhos verdes ou pele morena. Uma pessoa só porta algo que ela possa não portar, deliberada ou casualmente. Por exemplo, uma pessoa pode portar um guarda-chuva se houver necessidade e deixá-lo em algum lugar por esquecimento ou por assim decidir. Não se pode fazer isto com uma deficiência, é claro. A quase totalidade dos documentos, a seguir mencionados, foi escrita e aprovada por organizações de pessoas com deficiência que, nos debates para a elaboração do texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, estão chegando ao consenso quanto a adotar a expressão pessoas com deficiência em todas as suas manifestações orais ou escritas. Documentos do Sistema ONU 1990 - Declaração Mundial sobre Educação para Todos (Unesco). 1993 - Normas sobre a Equiparação de Oportunidades para Pessoas com Deficiência (ONU). 1993 - Inclusão Plena e Positiva de Pessoas com Deficiência em Todos os Aspectos da Sociedade (ONU). 1994 - Declaração de Salamanca e Linhas de Ação sobre Educação para Necessidades Especiais (Unesco). 1999 - Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência [conhecida como a Convenção da Guatemala] (OEA). 2001 - Classificação Internacional de Funcionalidade, Deficiência e Saúde (OMS), [que substituiu a Classificação Internacional de Impedimentos, Deficiências e Incapacidades, de 1980]. 2004 Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual (OMS-Opas). 2006 - Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU), [aprovada em 13/12/06]. Documentos de outros organismos mundiais 1992 - Declaração de Vancouver. 1993 - Declaração de Santiago. 1993 - Declaração de Maastricht. 1993 - Declaração de Manágua. 1999 - Carta para o Terceiro Milênio. 1999 - Declaração de Washington. 2000 - Declaração de Pequim. 2000 - Declaração de Manchester sobre Educação Inclusiva. 2002 - Declaração Internacional de Montreal sobre Inclusão. 2002 - Declaração de Madri. 6

2002 - Declaração de Sapporo. 2002 - Declaração de Caracas. 2003 Declaração de Kochi. 2003 Declaração de Quito 2004 Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual. C:\Romeu Sassaju\My Documents\Textos de Word\Terminologias\Como chamar as pessoas que têm doc 7