SEMINÁRIO NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PESQUISADORES E INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM DIREITO DA FEPODI

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Transcrição:

SEMINÁRIO NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PESQUISADORES E INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM DIREITO DA FEPODI

S472 Seminário Nacional de Formação de Pesquisadores e Iniciação Científica em Direito da FEPODI [Recurso eletrônico on-line] organização Federação Nacional dos Pós-Graduandos em Direito - FEPODI; Coordenadores: Beatriz Souza Costa, Lívia Gaigher Bosio Campello, Yuri Nathan da Costa Lannes Belo Horizonte: ESDH, 2017. Inclui bibliografia ISBN: 978-85-5505-383-2 Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações 1. Direito Estudo e ensino (Graduação e Pós-graduação) Brasil Congressos nacionais. 2. Direito Constitucional. 3. Direito ambiental. 4. Direito Administrativo. 5. Direito Civil. 6. Direito Penal. 7. Direitos Humanos. 8. Direito Tributário. 9. Filosofia Jurídica. 10. Gênero. 11. Diversidade Sexual. I. Seminário Nacional de Formação de Pesquisadores e Iniciação Científica em Direito da FEPODI (1:2016 : Belo Horizonte, MG). CDU: 34

SEMINÁRIO NACIONAL DE FORMAÇÃO DE PESQUISADORES E INICIAÇÃO CIENTÍFICA EM DIREITO DA FEPODI Apresentação É com imensa satisfação que a Escola Superior Dom Helder Câmara e a Federação Nacional dos Pós-graduandos em Direito FEPODI apresentam à comunidade científica os Anais do Seminário Nacional de Formação de Pesquisadores e Iniciação Científica em Direito. Tal produção resulta do exitoso evento sediado nas dependências da Escola Superior Dom Helder Câmara, em Belo Horizonte-MG, nos dias 10 e 11 de outubro de 2016, que contou com o valioso apoio do Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito CONPEDI e da Associação Brasileira de Ensino do Direito ABEDi. Trata-se de obra coletiva composta por 263 (duzentos e sessenta e três) resumos expandidos apresentados no seminário e que atingiram nota mínima de aprovação dentre os 318 (trezentos e dezoito) trabalhos submetidos ao evento. As comunicações científicas estão organizadas em 21 (vinte e um) Grupos de Trabalho ligados a diversas áreas do direito, inseridos num ambiente de ricos debates e profundas trocas de experiências entre os representantes das mais diversas localidades do Brasil. Os referidos Grupos de Trabalho contaram, ainda, com a contribuição de proeminentes docentes ligados a renomadas instituições de ensino superior do país, os quais indicaram os caminhos para o aperfeiçoamento dos trabalhos dos autores, afim de que eles estejam aptos, após desenvolvimento, a serem publicados posteriormente nos periódicos jurídicos nacionais. Neste prisma, os presentes anais, de inegável valor científico, já demonstram uma contribuição para a pesquisa no Direito e asseguram o cumprimento dos objetivos principais do evento de fomentar o aprofundamento da relação entre pós-graduação e graduação em Direito no Brasil, bem como de desenvolver os pesquisadores em Direito participantes do evento por meio de atividades de formação em metodologias científicas aplicadas. Uma boa leitura a todos! Beatriz Souza Costa Lívia Gaigher Bosio Campello Yuri Nathan da Costa Lannes

Coordenadores Gerais do Seminário Nacional de Formação de Pesquisadores e Iniciação Científica em Direito.

A DECOLONIALIDADE DO PODER E O NOVO CONSTITUCIONALISMO LATINO AMERICANO THE DECOLONIALITY OF THE POWER AND THE NEW LATIN AMERICAN CONSTITUCIONALISM Resumo Luiz Damasio de Moura Mainart 1 Priscylla Áurea Duarte Azevedo de Sousa 2 Vinicius Silva Bonfim 3 O objetivo do presente trabalho é criar uma análise do conceito de Novo Constitucionalismo Latino-Americano inserido no contexto hipercomplexo brasileiro. Buscar a correlação entre a proposta teórica dos autores constitucionalistas da América Latina e a realidade brasileira que é heterogênea somente pode ocorrer num desafio peculiar, vez que a análise desafiadora da cultura brasileira implica em elemento fundamental para legitimar o modelo de Constituição a se adotar na desconstrução do processo colonizador. Palavras-chave: Interculturalidade, Novo constitucionalismo latino-americano, Pluridireito Abstract/Resumen/Résumé The aim of this work is to create an analysis of the new concept of Latin American Constitutionalism inserted in the Brazilian hypercomplex context. Search the correlation between theoretical proposals from constitutionalists authors of Latin America and the Brazilian reality, that is heterogeneous and can only occur in a peculiar challenge, since the challenging analysis of Brazilian culture implies fundamental element to legitimize the constitution model to adopt in deconstructing the colonizing process. Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: Interculturalism, New latin american constitutionalism, Pluri law 1 Bacharelando em Direito na Faculdade Arquidiocesana de Curvelo, atualmente cursando o 4º período. 2 Bacharelanda em Direito na Faculdade Arquidiocesana de Curvelo, atualmente cursando o 4º período. 3 (Orientador) Doutor em Direito pela PUC Minas. 1218

Uma grande corrente que vem ganhando força recentemente na academia é o chamado novo constitucionalismo latino-americano 1, consolidado depois das constituições do Equador (2008) e da Bolívia (2009), que apresenta uma proposta de interculturalidade valorizada na Constituição do país, afim de garantir Direitos e não um Direito. Essas constituições são inovadoras em âmbito internacional ao trazerem uma proposta de pluridireito, garantindo direitos inerentes a cada povo ou cultura, com suas necessidades próprias e conceitos de Direito que coadunam regular suas vidas. Assim, o reconhecimento dos povos que antes eram tidos como subalternos a constituições elaboradas por elites homogeneizadoras, sobretudo para resguardar os direitos dos mesmos, agora passam a representar uma sociedade plurinacional, de conformidade com a exigência histórica. (CONAIE, 2003:2 apud WALSH, 2009, p. 101 Tradução Nossa). O objetivo do presente trabalho é criar uma análise do conceito de Novo Constitucionalismo Latino-Americano inserido no contexto hipercomplexo brasileiro. Buscar a correlação entre a proposta teórica dos autores constitucionalistas da América Latina e a realidade brasileira que é heterogênea somente pode ocorrer num desafio peculiar, vez que a análise desafiadora da cultura brasileira implica em elemento fundamental para legitimar o modelo de Constituição a se adotar na desconstrução do processo colonizador. A metodologia de trabalho da pesquisa constituiu-se por análise bibliográfica e construção dialógica entre autores e orientador do presente trabalho, tomando os exemplos de Bolívia e Equador como marcos teóricos, além de autores já renomados, utilizando como referência para a construção uma realidade teórica que é aplicada na prática em países com uma realidade colonizadora e de miscigenação bem próximas da brasileira. Este processo busca superar o que se tem de tradicional e europeu com a particularidade das demandas teóricas e práticas do constitucionalismo brasileiro. É importante salientar a importância do Pluralismo no Direito uma vez que ele demonstra a sociedade com seus inúmeros grupos sociais, formados pelos seus diversos sujeitos, que também são fontes do Direito, assim, como o poder do Estado. O que se busca nessa nova proposta do direito constitucional é um texto que permita o diálogo entre as mais diversas culturas, com respeito à diferença e à construção igualitária e respeitosa de cada um dos ordenamentos jurídicos. 1 O conceito de novo constitucionalismo latino-americano aqui trabalhado é baseado no conceito apresentado por Wolkmer em seu texto Pluralismo e crítica do constitucionalismo na América Latina, em que se valoriza a interculturalidade nos moldes trabalhados por Walsh e Schavelzon. 1219

Para se chegar ao Novo Constitucionalismo Latino-Americano, onde se reconhece o pluralismo jurídico nos países do Equador e Bolívia, não foi simples, foram necessárias várias reformas constitucionais até chegar aos modelos que existem atualmente. Durante essas reformas, muitas comunidades foram privadas de direitos tradicionalmente compartilhados, algumas vezes, sequer reconhecidos como cidadãos. Dentre esses povos pode-se citar os afrodescendentes, os povos indígenas, os quilombolas, os camponeses, cada qual explorado por seu poder produtivo e à sua maneira pela elite que detinha o poder cujo único intuito era que fossem beneficiados a qualquer custo. O Brasil passou por várias reformas constitucionais. A primeira foi a Lei Fundamental (1824), a segunda Constituição da República (1891), e na sequência surgiram as Constituições de 1934, 1937, 1967, 1969 e a nossa atual Constituição de 5 de outubro de 1988 que foi a primeira a reconhecer direitos referentes aos povos indígenas, o que por sua vez, chega a ser contraditório, já que os povos indígenas foram os primeiros habitantes do nosso território e, por tanto tempo, já deveriam ter tido seus direitos garantidos, mas, mesmo com uma certa demora e depois de muita luta, os direitos das minorias aos poucos estão sendo reconhecidos. Apesar de algumas conquistas de direitos das minorias terem ocorrido, ainda a muito o que percorrer. Veja, por exemplo, que o atual texto constitucional foi escrito por uma Assembleia Nacional Constituinte Originária composta especialmente por homens, brancos, católicos e de ótima condição financeira. Isso demonstra que a defesa de interesses foi explicitamente transcrita nos textos da Constituição de 1988, de tal forma que, por ser extremamente extensa, analítica, passou a ser também reguladora. A Constituição disciplina sobre temas dos mais diversas, como por exemplo, imunidades, garantias, composição, ingresso, perda do mandato dos parlamentares. Portanto, apesar dos avanços, num país tão plural quanto o Brasil, os direitos são em regra, constituídos muitas vezes, sem ao menos sequer perguntar às minorias o que elas entendem por direito. Nas palavras de Wolkmer: Ainda que de forma limitada e pouco satisfatória, a Carta Política de 1988 contribui para superar uma tradição publicista liberal-individualista e social-intervencionista, transformando-se num importante instrumento diretivo propulsor para um novo constitucionalismo, de tipo pluralista e multicultural. (WOLKMER, 2010, p. 152 Tradução Nossa) Há uma crítica do constitucionalismo latino americano atual contra o constitucionalismo moderno tradicional que existe uma homogeneização dos direitos e garantias individuais como se partisse do pressuposto de uma cultura una de indivíduos iguais. O constitucionalismo moderno não permite que os diferentes tenham acesso à participação das decisões, da construção do Direito e do Estado. O novo constitucionalismo 1220

latino americano propõe que o texto Constitucional respeite a pluralidade de ordenamentos jurídicos, consagrando os grupos étnicos e culturais, o direito de criarem o seu Direito, o direito de terem sua tradição e que esta, possa dar o tom das organizações sociais próprias dessas comunidades. Isso envolve respeitar as diversas formas de família, de felicidade, de racionalidade e lógica. Parafraseando Boaventura de Souza Santos: temos o direito de sermos diferentes, quando a igualdade nos descaracteriza (SANTOS apud WALSH, 2009, p.17 Tradução Nossa). O positivismo jurídico no Brasil tem características bastante peculiares, baseadas em uma linha de pensamento romano-germânica, embasado no fundamento da aplicação da Constituição, da implementação de direitos, da existência de concursos públicos de provas e títulos para ingresso na magistratura, toda a organização do poder judiciário demonstra um fechamento operacional impossibilitando qualquer intervenção social na instituição. Os bacharéis de direito passam anos a fio para se tornarem burocratas e repetidores de súmulas e jurisprudências. Há algo de errado quando se presencia numa sala de aula na faculdade de direito uma média de 50 alunos lendo o texto constitucional sem qualquer crítica e decorando decisões do Supremo Tribunal Federal para fazer provas objetivas. O direito está em sua mais alta fase instrumental. Sob o risco de uma anomia, ou perda do controle das instituições e desfacelamento do tecido social, possibilita-se atropelar direitos e afastar qualquer garantia por parte do Estado. Se o Poder Judiciário se atentasse à interculturalidade, os cidadãos não precisariam de uma derrubada do texto constitucional ou elaborar uma nova constituição revolucionária como ocorreu na Bolívia e no Equador que, diga-se de passagem, foram revoluções de baixo para cima. O que também leva a acreditar que, não é porque se tem um texto construído de baixo pra cima, da sociedade para as instituições é que esse texto irá ser efetivado. A preocupação com uma ordem jurídica legítima passa por uma educação em direitos que deve ser disseminada não somente pelos cursos de direito, como ocorre contemporaneamente, infelizmente, mas sobretudo, nas escolas de ensino fundamental, com linguagens comuns de respeito à alteridade e de construção compartilhada da felicidade. O novo constitucionalismo latino americana depende sobretudo de uma nova concepção cívica, um novo modelo de vida e de polis, uma matriz da ecopolítica que sustente uma sociedade centrada na preservação do meio ambiente. A interculturalidade segundo Catherine Walsh: é uma ferramenta e um projeto necessário na transformação do estado e da sociedade, mas para que essa transformação seja realmente transcendental, necessita romper com o marco uninacional, enfatizando o plurinacional, não como divisão sim 1221

como estrutura mais adequada para unificar e integrar. (WALSH, 2009, p.96 Tradução Nossa) O processo decolonial contribui para a representatividade no Judiciário na medida em que se assume a existência de uma sociedade multifacetada e permite a construção de decisões alternativas ao que se tem de praxe. Quando se utiliza o paradigma da decoloniedade, como posto por Quijano, é preciso recorrer a uma reforma basilar, como foi o caso da Constituição de (2008) do Equador ou a de (2009) da Bolívia. Quando se atenta à reforma do judiciário em toda a América Latina, verifica-se que os valores de celeridade, segurança, paz e eficiência estão atentos à regulamentação do patrimônio, da família, das instituições socais, o que acaba por perpetuar a marginalização dos excluídos e daqueles que não possuem voz para participar politicamente da construção dos direitos. O Judiciário precisa considerar o pluralismo jurídico como uma variável de ordenamentos possíveis em uma sociedade etnicamente fragmentada. Para isso não adianta a mera judicialização de questões como os direitos dos povos quilombolas, dos povos indígenas e afrodescendentes como um todo, é preciso mais, é preciso uma atividade legiferante que abra caminho para a autodeterminação cultural e jurídica das mais diversas etnias, culturas e movimentos sociais. Portanto, a participação política se torna um elemento fundamental para a construção de um Estado aberto, para que as pessoas, independente de sua cultura, possa participar, construir, dialogar no exercício da política e dos direitos. O que se defende aqui não é um Estado paternalista, forte e interventou, não é isso. O Estado plurinacional deve possuir estruturas institucionais que propiciem com que a população, na sua mais alta complexidade, possa se ver representada em especial no âmbito dos três poderes. O que é inconcebível é ver a população suplicar algum direito ao Estado que sequestra as dignidades e semelhante a um ato de benevolência ou esmola, declara alguns direitos. O Estado não existe para reprimir ou determinar unilateralmente a formação do direito. Tanto o Estado quanto o direito é para a pessoa. A pessoa é o fim de toda política institucionalizada. Mas quando se refere à pessoa, não se pode olvidar das múltiplas identidades que convivem e compartilham os mesmo lugares. Tudo isto posto, conclui-se que um caminho de gradual migração para os moldes do Novo Constitucionalismo Latino-Americano seria uma experiência extremamente enriquecedora para o contexto do Estado Plurinacional, valorizando as diversas identidades de um povo que se respeita pela diferença, não pela igualdade. tão pluricultural como o nosso e garantindo mais direitos, à medida em que os grupos e a sociedade em uma construção dialética buscam o que concluem ser o melhor caminho para si, sendo a Constituição somente 1222

uma interjeição entre o pluralismo jurídico e estatal, a melhor proposta seria termos Direitos para todos. REFERÊNCIAS WOLKMER, A. C. Pluralismo e Crítica do Constitucionalismo na América Latina. In: ANAIS DO IX SIMPÓSIO NACIONAL DE DIREITO CONSTITUCIONAL, 9., 2010, Curitiba. Resumos... Curitiba: Academia Brasileira de Direito Constitucional ABDCONST, 2010. p. 13. WALSH, C. Interculturalidad, Estado, Sociedad: Luchas (de)coloniales de nuestra época. Quito: Universidad Andina Simón Bolívar, 2009. p. 253. SCHALVEZON, S. Plurinacionalidad y Vivir Bien/Buen Vivir: Dos conceptos leídos desde Bolivia y Ecuador post-contituyentes. Quito: Ediciones Abya-Yala 1223