ANÁLISE SEMIÓTICA NA PUBLICIDADE: LINHAS AÉREAS GOL 1



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Transcrição:

1 ANÁLISE SEMIÓTICA NA PUBLICIDADE: LINHAS AÉREAS GOL 1 Odete Marquini Felipetto 2 Regiane Ribeiro 3 RESUMO Esta análise tem por objeto a peça publicitária produzida para as Linhas Aéreas Gol. A escolha do anúncio gráfico em revista, em detrimento do filme de TV, embora este apresentasse a vantagem de absorver a linguagem publicitária da mídia impressa e de se apropriar da linguagem do rádio e do cinema, se deve ao fato de que a mídia impressa detém dentre seu público alvo, os formadores de opinião. O anúncio analisado reúne ingredientes históricos, sociais, mercadológicos e psicanalíticos. A combinação dos signos, organizada de forma hábil, vincula ao produto uma vida de luxo, projeção, aceitação social e, sobretudo de sonhos míticos. A linguagem é carnavalizada e o avião é tratado não como um meio de transporte, mas como um meio de satisfazer fantasias e sonhos. PALAVRAS-CHAVE: comunicação; linguagem publicitária; transporte aéreo; sentido; Gol. INTRODUÇÃO A peça publicitária objeto desta análise é constituída de um duplo registro - verbal e visual, cuja complementação não se dá reciprocamente em dosagens iguais. Foi produzida pela agência Almap BBDO para a empresa aérea 4 GOL. Embora a peça publicitária em questão não tenha sido concebida somente para a mídia impressa, optou-se pelo estudo da peça publicada na 5 Revista Super Interessante. É formada por um conjunto serial de texto e imagem, impresso em duas páginas. Trata-se de um signo da empresa de linhas aéreas GOL, que é o objeto deste signo. O impacto ou não que a publicidade despertar no seu público é o interpretante da publicidade. O signo é um primeiro (algo que se apresenta à mente), 1 Artigo apresentado ao curso de Comunicação Social-habilitação em Publicidade e Propaganda da Faculdade Pitágoras de Londrina-PR, como requisito parcial para obtenção do grau de bacharel em Publicidade e Propaganda, sob a orientação da Profa. Ms. Luciana de Oliveira (DEZ/2007) 2 Graduada em Publicidade Propaganda na Faculdade Pitágoras de Londrina-PR 3 Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP 4 Empresa de Transporte aéreo Gol foi fundada pelo empresário mineiro Nenê Constantino. Começou a operar em 2001 com uma frota de seis aviões e uma participação de apenas 5% no mercado. Inicialmente só fazia vôos nacionais, em 2005 começou a voar para os países vizinhos. O faturamento que no primeiro ano foi de 230 milhões de reais, chegou a 3,8 bilhões de reais em 2006. Pode ser apontada como um fenômeno do capitalismo brasileiro, a empresa que nasceu na era da internet, meio pelo qual quase todas as suas passagens são vendidas. 5 A Revista Super Interessante é publicada pela Editora Abril, é uma revista mensal, de tiragem nacional.

2 ligando a um segundo (aquilo que o signo indica, se refere ou representa) e a um terceiro (efeito que o signo tem sobre um possível intérprete) (SANTAELLA, 2002). De acordo com Peirce, há três elementos formais e universais em todos os fenômenos que se apresenta à percepção e à mente. Num nível de generalização máxima, esses elementos foram chamados de primeiridade, secundidade e terceiridade (apud SANTAELLA, 2002). A primeiridade aparece em tudo que estiver relacionado com o acaso, a possibilidade, qualidade, sentimento, originalidade, liberdade, mônada. A secundidade está ligada às idéias de dependência, determinação, dualidade, ação e reação, aqui e agora, conflito, surpresa, dúvida. A terceiridade diz respeito à generalidade, continuidade, crescimento, inteligência. Processos comunicativos incluem pelo menos três faces: a singnificação ou representação, a referência e a interpretação das mensagens (SANTAELLA, 2002). OS TRÊS ASPECTOS A fase de significação possui três aspectos. O primeiro deles diz respeito às qualidades e sensorialidade de suas propriedades internas, como por exemplo, na linguagem visual, as cores, as linhas, formas, volumes, movimento, luz. O segundo aspecto se relaciona à mensagem na sua particularidade, no seu aqui e agora em um determinado contexto. O terceiro aspecto se refere àquilo que a mensagem tem de geral, convencional, cultural (SANTAELLA, 2002). A referencialidade nos permite compreender aquilo que as mensagens indicam, aquilo a que se referem ou aplicam. Também aqui encontramos três aspectos. O primeiro deriva do poder meramente sugestivo, tanto sensorial como metafórico da mensagem, sua capacidade para indicar algo que está fora dela. O segundo, o índice é quando as mensagens indicam sem ambigüidade ao que se referem. O terceiro deriva da sua capacidade das mensagens para representar idéias abstratas e convencionais, culturalmente compartilhadas (SANTAELLA, 2002). O signo produz um efeito interpretativo em uma mente real ou meramente potencial. Este aspecto será melhor observado no final deste estudo. Na peça, analisando a mensagem em si mesma, no aspecto qualitativo o publicitário

3 optou, na peça de exame, por trabalhar com as cores verde, branco, bege, marrom, preto, laranja e uma pequeníssima faixa de cinza na logomarca. Circunscreveu de forma visível a janela de um ônibus, mostrando na região interna parte de um banco e um pássaro sobre o encosto deste. Na região externa delimitou na lateral superior esquerda uma faixa de árvores e na quase totalidade da imagem utilizou a cor verde em desfoque indicando vegetação, uma faixa em branco na região superior indicado atmosfera e uma faixa em marrom e bege (em desfoque caracterizando a estrada). As sensações visuais acromáticas (aquelas que têm apenas a dimensão da luminosidade) foram utilizadas para caracterizar o reflexo do vidro da janela e criar a sensação de velocidade no desfoque em verde e em marrom e bege. As variações no tom, na saturação e na luminosidade, tanto no tom do verde, quanto do marrom, quanto no reflexo do vidro produzem modulação. O pássaro possui o bico e os pés laranja, peito branco e costas em nuance escura foi posicionado olhando para fora da janela. Ancorando a figura do pássaro, no terço médio da lateral direita foi lançado em letras pretas de contorno acentuado o slogan Por que viajar de outro jeito se você pode voar.. No terço inferior desta mesma região foi lançada a logomarca, em fundo retangular predominantemente laranja, com uma faixa estreita na base de cor cinza, o texto em letras brancas Gol. Aqui todo mundo pode voar. Por que viajar de ônibus ou de carro se você pode voar nos aviões mais modernos, pagando as melhores tarifas? Faça como mais de 30 milhões de passageiros nos últimos 5 anos. Viaje pela Gol. 03007892121 Custo de ligação local. GOL Linhas aéreas inteligentes www.voegol.com.br A parte textual faz funcionar a mensagem no campo da linguagem, criando imagens verbais. Não há linguagem possível sem o prévio estabelecimento de um acordo, que supõe regras com o destinatário, com o meio social, com os modos culturais de uma comunidade. Umberto Eco diz em muitíssimos casos, a comunicação publicitária fala uma linguagem já falada, e exatamente por isso se torna compreensível (ECO, 1987:183). O conjunto serial em estudo tem um contexto no qual age e interage, seja em relação com os demais elementos de publicidade, seja na articulação com os elementos culturais da sociedade na qual pretende interferir, compelindo, motivando ou informando seus objetivos.

4 Recorda fatos, situações ou idéias: viajar de ônibus, viajar de avião, voar, pássaro, natureza, entre outras coisas. O texto abre a possibilidade de vôo para todos, indicando que voar é muito melhor do que andar de carro ou de ônibus. Os anos 60 e 70 marcaram uma mudança na forma e no conteúdo dos anúncios publicitários, houve a libertação das cerimônias na linguagem e o afastamento paulatino da argumentação racional, dando maior apelo às emoções. O anúncio ora em análise segue a linha publicitária atual, comunicação persuasiva, sedução emocional e é predominantemente imagético. A determinação do que o signo denota é possível através da análise da relação objetal. Dependendo do fundamento, será diferente a forma como o signo pode representar seu objeto Se o fundamento do signo é um quali-signo, na sua relação com o objeto, o signo será um ícone; se for um existente, na sua relação com o objeto, ele será um índice; se for uma lei será um símbolo (SANTAELLA, 2002). Os signos só podem se reportar a algo, porque, de alguma maneira, esse algo que eles denotam está representado dentro do próprio signo. O modo como o signo representa, indica, se assemelha, sugere, evoca aquilo a que ele se refere é o objeto imediato. É o modo de representação do referente/contexto. Aquilo a que o signo se reporta, aquilo a que ele se refere é o objeto dinâmico. É o contexto, o referente. A capacidade de referencialidade da peça publicitária em análise deriva do cruzamento da retórica da imagem e do registro verbal justapostos em contigüidade espacial. A imagem tem uma referencialidade um pouco mais aberta, já o texto verbal é pouco ambíguo, traz uma referência mais factual. A capacidade comunicacional se completa quando evoca os costumes de andar de carro, de ônibus ou de avião, conservando a expectativa social que envolve cada um desses meios de transporte. A forma do pássaro sobre o banco sugere semelhança com o avião, principalmente no bico e pés laranja, mesma coloração da logomarca, numa clara referência aos aviões da Gol; mas produz também uma identificação com o receptor, o passarinho olha pela janela para imagens em desfoque, como o passageiro que olha da janela do avião e não consegue distinguir de forma perfeita a paisagem em razão da velocidade da aeronave. A linguagem publicitária, a linguagem onde tudo é possível cria essa ilusão, uma vez que se observada da janela do ônibus a imagem não estaria em desfoque, estaria nítida, face à velocidade desenvolvida pelo mesmo.

5 Ou seja, o desfoque é índice de velocidade que pode também ser uma referência à velocidade do transporte aéreo em oposição ao transporte terrestre. Sombras foram usadas para dar efeito de profundidade entre o final do desfoque verde e o bege. O slogan sintético, de fácil memorização, de comunicação imediata, não exigindo maiores reflexões busca atrair maior prestígio para o serviço prestado, indica que o receptor deve optar pelo transporte aéreo (GOL) ao invés do terrestre. A linguagem publicitária utilizou símbolos sígnicos densamente povoados de significação para que funcionassem como signos polarizadores de atenção: liberdade, velocidade, natureza, sonho, céu, prestígio, etc. Voar sugere o predomínio do espiritual sobre o material. A figura do pássaro é envolvida numa simbologia de mito e foi explorada com simplicidade e eficiência. O signo produz um efeito interpretativo em uma mente real ou meramente potencial. O primeiro nível é o do interpretante é o interpretante imediato, tratase da interpretabilidade ainda no nível abstrato, antes do signo encontrar um intérprete qualquer em que esse potencial se efetive. A publicidade aqui analisada tem toda uma carga de significação, tem internamente um potencial para ser interpretado. Esse potencial é o interpretante imediato do signo. O segundo nível é o do interpretante dinâmico, que se refere ao efeito que o signo efetivamente produz em um intérprete. Esse efeito ou interpretante dinâmico, de acordo com as três categorias de primeiridade, secundidade e terceiridade, subdivide-se em três níveis: emocionais, no qual o receptor é tomado por efeitos mais ou menos definidos; reativos, o receptor é levado a reagir em função da mensagem recebida; e mentais, leva o receptor a refletir (SANTAELLA, 2002). O terceiro nível do interpretante é o interpretante final, que se refere ao resultado interpretativo a que todo intérprete estaria destinado a chegar se os interpretantes dinâmicos do signo fossem levados até seu limite último. Na avaliação do potencial comunicativo da peça publicitária é preciso antes de entrar no potencial interpretativo propriamente dito lembrar que escrever um texto publicitário é produzir tecnicamente um texto capaz de provocar mudanças de opiniões e sentimentos nos leitores e persuadi-los a assumir comportamentos novos em relação a determinado produto ou serviço. O texto publicitário é destinado

6 a controlar o comportamento, direcionar o pensamento e sugestionar decisões (MARTINS, 1997). O consumidor antes de desejar o produto ou serviço precisa sonhar. Ele quer ter o seu imaginário estimulado por vôos que o distanciem da dura realidade do dia a dia. Comprar televisor ao invés de geladeira significa que o homem pode abrir mão do conforto, mas não da irrealidade, da fantasia. A cor exerce um efeito tríplice sobre o indivíduo: primeiro ela é vista, impressiona a retina; depois é sentida, provoca uma emoção e por último tem valor de símbolo e capacidade, ou seja, constrói linguagem que comunica idéia (MODESTO, 2000). O volume do banco do ônibus foi aumentado pela cor clara, a superfície parece maior, pois a luz que reflete confere amplidão, a mesma amplidão que foi intencionalmente conferida na região superior da página, no espaço que indica a atmosfera. O pássaro é diminuído pela cor escura e sofre a ação do ambiente sobre ele, impedido de usar as asas, está preso dentro de um ônibus, esta situação sugere também que usar o ônibus em detrimento da aeronave torna o emissor menor. Promove-se uma identificação com o emissor, pequeno, só, precisando se distanciar da terra e ir ao céu em busca da liberdade, do 6 mito 7 Ícaro e Dédalo. 6 Mitos são histórias de nossa busca da verdade, de sentido, de significação, através dos tempos (Joseph Campbell com Bill Moyers, 2001). 7 Dédado, na Mitologia, era um artífice habilidosíssimo, que construiu para o Rei Minos o labirinto no qual foi colocado Teseu, tendo este escapado com o fio de Ariadne. O rei então aprisionou Dédado numa torre numa Ilha, emobora tenha conseguido fugir da prisão, não conseguiu fugir da ilha por mar, em razão da severa vigilância aplicada pelo rei. Ele então fabricou asas para si e para seu filho Ícaro. Na fuga Ìcaro voou muito próximo do sol e suas asas derreteram (Thomas Bufinch, 2002). O sonho de voar, um dos mitos encontrados em quase todas as culturas. Os automóveis adentraram a mitologia. Adentraram os sonhos. E as aeronaves estão muito a serviço da imaginação. O vôo da aeronave, por exemplo, atua na imaginação, como libertação da terra. É a mesma coisa que os pássaros simbolizam, de certo modo. O pássaro é um símbolo da libertação do espírito em relação ao seu aprisionamento na terra, assim como a serpente simboliza o aprisionamento à terra. A aeronave desempenha esse papel hoje (CAMPBELL E BILL MOYERS, 2001).

7 Com exceção do laranja foram usadas cores frias, as cores frias parecem distantes, frias, leves, transparentes, úmidas e aéreas, o que perfaz uma relação direta com as linhas aéreas, objeto da publicidade. A coloração verde é preponderante. Modesto Farina, em sua obra Psicodinâmica das Cores em Comunicação, menciona a pesquisa de Bamz, que alia o fator idade à preferência, o verde é a cor de preferência da faixa dos 30 aos 40 anos, coincidentemente a idade em que se deseja mais conforto, em que se tem maior condição econômica para pagar pelo conforto da viagem aérea e o público alvo das linhas aéreas GOL. A linguagem utilizada tem por fito selecionar da massa heterogênea o segmento que potencialmente se interessará pelo produto ou pela idéia, no caso em tela a faixa etária de 30 a 40 anos é o principal público focado. Evidentemente este segmento não exclui outros, pois despertar interesse comumente se confunde com a faculdade de criar novas necessidades, fator fundamental para o aumento do contingente de consumidores e objetivo da propaganda comercial. Com relação ao significado psicológico das cores, o verde gera a sensação afetiva de tranqüilidade, segurança, bem-estar, coragem, desejo, entre outros. O verde vem do latim viridis, simboliza a faixa harmoniosa que se interpõe entre o céu e o Sol, muito pertinente ao tema da publicidade em questão. A cor laranja do texto e da assinatura é uma cor fácil de ser memorizada, é comprimento de onda curto, e por isso é visualizada rapidamente (MODESTO, 2000). E em baixa luminosidade o olho só distingue três cores: azulvioleta, vermelho alaranjado e verde. A disposição, as cores, as linhas, a estética da imagem conjugadas ao slogan produzem uma reação emocional no receptor, um desejo de voar, de bem estar imaterial, de sonhar. A publicidade trabalha os símbolos de modo a mobilizar favoravelmente as pessoas para o consumo do produto, do serviço ou da idéia que anuncia, da mesma forma, como no sonho, os símbolos estarão a serviço da representação de desejos, necessidades e idealizações (MARTINS, 1997). A imagem que compõe a peça aqui estudada embute toda uma narrativa interna de natureza textual, envolvendo o passarinho que não voa, o ônibus, a natureza, o emissor e o produto oferecido, promovendo uma aproximação com o intérprete. A linguagem proximidade faz a aproximação com a linguagem dos

8 sonhos, movendo-se pelo desejo,... os sonhos são realizações de desejos (FREUD, 1972). Essa sensação emocional aliada à informação de bom preço levam o receptor a aderir à proposta de usar o transporte aéreo da GOL. A publicidade não existe para estimular raciocínio, as cores compradas são as cores vívidas do sonho vendido, mas o consumidor precisa do máximo da fantasia, para compensar a realidade. Poderia se dizer que há uma reconstrução da realidade de forma simbólica permeada por conteúdos latentes, pensamentos oníricos e fragmentos de realidade. E o consumidor adere a essa realidade construída, é uma realidade que lhe parece familiar, por possuir as estruturas dos seus sonhos, dos seus desejos e curiosidades de infância (a criança que olha para o avião e da tchau, que sonha voar como um pássaro, que sonha flutuar além das questões adultas). Jean Baudrillard nos diz que a publicidade se empenha [...] em recriar uma ilusão infantil entre o objeto e o desejo pelo objeto (1991). A recriação publicitária das ilusões se nutre dos símbolos que povoam o imaginário das pessoas e que constroem a narrativa histórica do desejo. É evidente também na narrativa da propaganda da GOL os signos de uma comunidade, de uma cultura, de uma identidade social. Historicamente o indivíduo que usa o avião tem mais status, é uma pessoa de estratificação social diferenciado, é feita uma comparação entre andar de carro, de ônibus e de avião, os dois primeiros são apontados como transporte de massa, de pessoas sem a hierarquia social de quem pode usar uma aeronave. Viajar de avião é então colocada como uma forma de distinção social. Num último nível de intérprete o que se registra é essa simbolização existente na arquitetura da persuasão publicitária, cuja pretensão é levar o consumidor a ter atitudes favoráveis em relação ao produto, serviço e idéias oferecidos. CONSIDERAÇÕES FINAIS

9 Através do texto publicitário criam-se identidades, elegem-se valores, solidificam-se novos hábitos e novas modas, multiplicam-se as leituras do mundo, ideologias são assimiladas sem serem questionadas. Se neutralizasse as extrapolações associativas em cadeia, por similaridade ou por contigüidade, promovidas intencionalmente pela publicidade, o foco do receptor na análise da peça publicitária deveria ser a efetiva necessidade da viagem aérea, a real vantagem do preço, a praticidade. Só para exemplificar o aeroporto às vezes, pode estar muito mais distante do destino pretendido do que a rodoviária, de forma que a economia eventualmente oferecida pela passagem área se consumiria no táxi. Outro quesito comum, a tarifa mais baixa vem casada com um certo período entre a ida e a volta, que implicaria em mais gastos de permanência. O horário dos vôos pode também implicar em longa permanência no aeroporto o que implica em perda de tempo e uma série de outras questões práticas que deveriam envolver o ato da compra, mas que são ofuscados pela manipulação que se impõe ao indivíduo. O intérprete final de uma peça publicitária seria o desmonte da arquitetura persuasiva que é imposta ao consumidor, não pela força, mas pelas sensações, pelos sonhos, pela cultura e anticultura e pela manipulação dos desejos. REFERÊNCIAS BAUDRILLARD, Jean. Da Sedução. Campinas: Papirus, 1991. CAMPBELL, Joseph e MOYERS, Bill. O Poder do Mito. São Paulo: Palas Athena, 2001. ECO, Humberto. Apocalípticos e Integrados. São Paulo: Perspectiva, 1987. FREUD, Sigmund. A interpretação dos Sonhos. Rio de janeiro: Imago, 1992. IASBECK, Luiz Carlos Assis. A arte dos slogans: as técnicas de construção das frases de efeito do texto publicitário. São Paulo: Annablume, 2002. KRISTEVA, Julia. História da Linguagem. Lisboa: Edições 70, 1969. MARTINS, S. Jorge. Redação Publicitária Teoria e Prática. São Paulo: Atlas, 1997. MODESTO, Farina. Psicodinâmica das Cores em Comunicação. São Paulo: Edgard Blucher, 2000. SANTAELLA, Lucia. Semiótica Aplicada. São Paulo: Thompson Pioneira, 2002. VANOYE, Francis. Usos da Linguagem. São Paulo: Martins Fontes,1998.

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