ÁCIDO LINOLEICO CONJUGADO: APLICAÇÕES EM SAÚDE E PRODUÇÃO ANIMAL 1

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Transcrição:

ÁCIDO LINOLEICO CONJUGADO: APLICAÇÕES EM SAÚDE E PRODUÇÃO ANIMAL 1 Origem O CLA (ácido linoleico conjugado) é um ácido graxo, originado a partir da reação de isomerização que ocorre durante o metabolismo do ácido linoleico no ambiente ruminal, assim pode se dizer que o CLA é um composto natural, existente em diferentes formas, de acordo com o arranjo de suas moléculas, caracterizando os isômeros geométricos do ácido linoleico (C18:2) que contém duas duplas ligações e que está presente em diversos alimentos de origem animal. Alimentos de origem animal de ruminantes foram apontados como fonte de CLA em dietas humanas (Chin et al., 1992; McGuire; McGuire, 2000), anteriormente outros estudos (Pariza et al., 1979; Pariza; Hargraves, 1985) haviam descoberto a respeito das propriedades funcionais dos alimentos que continham CLA, bem como o potencial efeito anticarcinogênico. Posteriormente outros efeitos benéficos do CLA foram descritos na literatura como a redução da gordura corporal, efeitos antidiabéticos e modulação do sistema imune (Belury, 1995; Banni; Martin,1998). Biossíntese do CLA O CLA encontrado no leite ou na carne de ruminantes pode ser sintetizado no organismo animal de duas diferentes formas e locais distintos. A primeira ocorre no rúmen durante a biohidrogenação ruminal do ácido linoleico e a segunda forma é efetuada no tecido animal através de compostos intermediários que foram formados durante a biohidrogenação ruminal de ácidos graxos poli-insaturados. Assim, a fase de hidrogenação que ocorre pela ação dos microorganismos no rúmen, sendo uma etapa de suma importância para a biossíntese do CLA, realizada durante o metabolismo de lipídeos (Griinari; Bauman, 1999). O metabolismo ruminal de gordura é iniciado após a liberação da matriz do alimento, ou seja, após o rompimento da parede celular. Posteriormente os triacilgliceróis sofrem hidrólise (lipólise), a ligação éster é rompida pela ação de lipases microbianas, gerando ácidos graxos e glicerol. O metabolismo dos ácidos graxos no rúmen é alvo de muitos estudos, que buscam entender os motivos pelos quais existe uma preferência por parte dos microrganismos e sua ação de lipase sobre as diferentes naturezas de lipídeos. Sabe-se que os ácidos graxos não são 1 Passos, L.T. Ácido linoleico conjugado: aplicações em saúde e produção animal. Seminário apresentado na disciplina Bioquímica do Tecido Animal, Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2016. 8 p. 2

totalmente oxidados e nem degradados pelos microrganismos ruminais, há evidências de que à medida que se suplementa a ração com teor de lipídeos, pode ocorrer a redução dos ácidos graxos no rúmen, indicando um declínio na biossíntese ruminal quando há uma oferta exógena elevada (Palmquist; Mattos, 2011). A natureza anfifílica de alguns ácidos graxos, entre eles os poli-insaturados tem sido apontada como possível efeito tóxico para determinados microrganismos ruminais, o qual parece estar associado com ácidos graxos que possuem solubilidade maior em água e membranas celulares, com potencial para romper membranas. Mediante essas evidencias, é possível que exista uma preferência por parte dos microorganismos em incorporar ácidos graxos saturados em suas membranas celulares, a fim de obter menos susceptibilidade de rompimento de membrana, evitando a ruptura, ou seja, a morte bacteriana. Por outro lado existe uma tentativa desses microorganismos em utilizar os ácidos graxos de cadeia poli-insaturada, e para isso o ecossistema ruminal tem um mecanismo denominado biohidrogenação ruminal, que é considerada também como uma autodefesa que os microrganismos desenvolveram para atenuar a toxidade (Palmquist; Mattos, 2011). O principal objetivo da biohidrogenação ruminal é realizar a saturação da gordura insaturada, sobretudo dos ácidos linoleico e linolênico que estão presentes em algumas dietas. A etapa de biohidrogenação ruminal é a principal responsável por elevar a quantidade de gordura saturada em alimentos de origem animal, e está gordura é considerada maléfica para a saúde humana. A biohidrogenação ruminal é realizada em duas etapas denominadas de isomerização (intermediário conjugado) e hidrogenação (redução). De forma simplificada, o processo inicia com a isomerização ácidos graxos poli-insaturados, formando um intermediário conjugado, seguindo-se passos redutivos (hidrogenação) sequenciais até se formar um ácido graxo totalmente saturado. Porém, muitos ácidos graxos são apenas isomerizados e/ou incompletamente hidrogenados gerando-se uma grande diversidade de intermediários da biohidrogenação, a maioria do quais com duplas ligações trans. Assim estima-se que apenas 60% dos ácidos graxos poli-insaturados hidrogenados no rúmen seja completamente hidrogenado em C18:0 (Fievez et al., 2007). O processo de biohidrogenação ruminal é especificamente bacteriano, a elucidação da estrutura e dos genes de certas isomerases, bem como o sequenciamento dos genomas completos de bactérias ruminais, permitiu a monitorização e identificação destas bactérias. Porém, a atividade bacteriana do ecossistema ruminal e suas ações enzimáticas, ainda não estão totalmente esclarecidas (Jenkins et al., 2008). Bactérias com capacidade de isomerizar e hidrogenar os ácidos graxos poli-insaturados têm sido identificadas no rúmen, no intestino de mamíferos ou culturas lácteas, incluem certas estirpes de Butyrivibrios, Ruminococcus, Eggerthella (antes designadas por Eubacterium), 3

Borrelia, Propionibacterium, Treponema, Bacteroides, Megasphaera, Clostridium e Lactobacilus. Porém, apenas as estirpes do gênero Butyrivibro são capazes de hidrogenar os ácidos graxos insaturados completamente até 18:0. Tais bactérias foram divididas em dois grandes grupos, mediante sua capacidade de biohidrogenação (Kemp; Lander, 1984). O grupo A, é constituído por bactérias capazes de hidrogenar o ácido linoleico (18:2 n-6) e ácido linolênico (18:3 n-3) incompletamente produzindo ácido vacênico (18:1) em maior quantidade de produto final, não produzindo ácido esteárico (18:0) e o grupo B é capaz de hidrogenar completamente o 18:2 n-6 e 18:1 cis-9 e outros isómeros 18:1 a esteárico (18:0). As reações de isomerização que antecedem a biohidrogenação são catalisadas pela enzima linoleato isomerase, e é uma etapa pré-requisito para a fase de hidrogenação. A partir da primeira fase de isomerização, é possível a formação de diversos isômeros, dentre eles os mais conhecidos cis-9, trans-11 e trans-10, cis-12. Há indícios de que quando os ácidos graxos poli-insaturados estão presentes em grandes quantidades na dieta, pode haver acúmulo dos isômeros intermediários, o que permitiria sua saída do rúmen para o tecido. Entretanto, estudos posteriores provaram que a quantidade de CLA no produto final, tem sua origem em maior quantidade a partir de reações que ocorrem nos tecidos, especialmente na glândula mamária. Para comprovar a síntese endógena de CLA na glândula mamária Corl et al. (1998) infundiram tran-11(18:1) no abomaso de vacas leiteiras durante 3 dias, ao final do terceiro dia observaram um aumento de CLA na gordura do leite. A explicação para isso está na atividade da enzima Δ9-desaturase, presente na glândula mamária, que tem por ação aumentar uma ligação dupla no composto intermediário, e assim conseguir voltar ao formato de isômero de CLA. Aplicações do CLA em saúde Efeito anticarcinogênico O CLA foi classificado como um composto anticarcinogênico, capaz de reduzir a incidência, número e tamanho de tumores em modelos em animais (HA et al., 1990; IP et al., 1991). Efeitos semelhantes foram obtidos em estudos in vitro que utilizaram linhagens de células cancerígenas de melanoma, de cólon, próstata, pulmão, ovário e tecido mamário (SHULTZ et al., 1992; MILLER, 2001; PALOMBO et al, 2002). Ip et al. (1994) relatou atividade preventiva do CLA para o câncer na glândula mamaria de ratas, quando fornecidos cronicamente nas dietas antes da administração do carcinógeno. Observou-se que doses entre 0,05 e 0,5% de CLA na dieta foram o suficiente para a prevenção, 4

bem como o efeito anticarcinogênico do CLA em que houve a redução no número de tumores mamários induzidos por antraceno-dimetil-benzeno (DMBA). Os autores especulam que mudanças no desenvolvimento da glândula e na morfogênese podem ser os pontos de ação do CLA na modulação da carcinogênese na glândula mamaria. Mecanismos pelos quais o CLA atua na inibição da carcinogênese, foram sugerido por alguns autores, como ação antioxidante (HA et al., 1990; IP et al., 1991; BANNI et al., 1995), inibição da síntese de nucleotídeos (SHULTZ et al., 1992), redução da atividade proliferativa (IP et al., 1994), modulação na composição e metabolismo de lipídeos hepáticos (BELURY e KEMPASTECZKO, 1997) e estimulação na atividade de macrófagos e linfócitos (CHEW et al., 1997). Efeito na mobilização de gordura O efeito de depressão da gordura do leite que foi descoberto por Griinari et al. (1998), envolve mais especificamente um isômero de CLA denominado trans-10-cis-12. A mesma atividade sobre a redução de gordura também foi estudada em modelos animais. Há indícios de que o CLA exerça influência na composição corporal, sobretudo nos teores de gordura corporal e proporção de tecido magro, especialmente em animais jovens em crescimento. Um estudo realizado Cook at al. (1998) constatou que ao fornecer uma dieta com CLA para suínos em crescimento, houve redução de 20% no toucinho e aproximadamente 7% de aumento no tecido magro indicando que o CLA pode induzir a diminuição na deposição de gordura e aumentar a proporção de tecido magro. Estudos para verificar as possíveis alterações na composição corporal de ratas que o CLA na dieta pode ocasionar foram realizados por Park et al. (1999), os quais forneceram dietas controles ou dieta contendo 0,5, 0,3 e 0,25% de CLA, com diferentes concentrações entre cis-9, trans-11 e trans-10, cis-12. Obtiveram como resultado, que o CLA reduziu significativamente a gordura corporal, e aumentou a proporção de tecido magro em relação ao controle. Estudos in vitro com células adiposas de ratos, mostrou que a adição de CLA reduziu significativamente a atividade da lipase lipoprotéica (LPL), a qual é responsável pela captação do ácido graxo. Uma vez diminuída consequentemente reduz as concentrações de triacilglicerol no interior das células, e simultâneo a esse efeito pode ocorrer o aumento da atividade da carnitina palmitoil-transferase (CPT) no músculo (Park et al., 1999), responsável por aumentar a β-oxidação do tecido, impedindo o acumulo de triacilglicerol no adipócito, provavelmente estimulando a lipólise (Willians, 2000). Em humanos um trabalho desenvolvido por Blankson et al. (2000) estudou o fornecimento de CLA em níveis crescentes (1,7, 3,4, 5,1, 6,8 g/d) por 12 semanas para homens 5

obesos. Obtiveram como resultados diferenças significantes na redução de gordura corporal do CLA em comparação ao grupo controle. Porém, diferenças na composição do tecido magro não forma observadas, bem como em parâmetros bioquímicos do sangue. Aplicações do CLA na produção animal Depressão da gordura no leite (DGL) O estudo do CLA teve importante contribuição para o entendimento da teoria da depressão da gordura do leite. A primeira teoria acerca da diminuição do teor de gordura no leite foi desenvolvida por Davis e Brown (1970), estudo que ficou conhecido como teoria da escassez de acetato ruminal. Esta teoria presumia que as alterações na fermentação ruminal resultavam em inadequada produção ruminal de acetato e butirato, os quais servem de suporte à síntese de novo da gordura do leite. Observou-se que ao fornecer dietas com baixa fibra a concentração molar de acetato diminuía e a de propionato aumentava, consequentemente reduzindo a relação acetato:propionato. No entanto, a proporção molar de acetato (moles/dia) não era afetada, assim a redução da relação acetato:propionato foi considerada uma consequência da maior produção de propionato. Devido a isso, esta primeira teoria foi abolida, por não conseguir explicar a depressão da gordura no leite. A fim de tentar explicar a depressão da gordura do leite, Forsberg et al. (1988) propuseram uma segunda teoria, em que o aumento na produção ruminal de propionato e o aumento nas taxas hepáticas de gliconeogênese causavam um aumento na insulina circulante, resultando em escassez de precursores para a síntese de gordura do leite. Considerando que a insulina é um importante regulador do metabolismo do tecido adiposo, com efeito estimulatório sobre a lipogênese e inibitório sobre a lipólise, poderia haver um menor aporte de acetato (maior lipogênese no tecido adiposo) ou de ácidos graxos de cadeia longa (menor mobilização de lipídios) para a glândula mamária, o que supostamente limitaria a secreção de gordura do leite. Esta segunda teoria não explicou a DGL na segunda metade da lactação, quando a mobilização das reservas de gordura é mínima. Curiosamente no início da lactação, o teor de gordura do leite dos animais com DGL foi bastante superior, apesar da grande mobilização já esperada neste período. Por esses motivos, esta segunda teoria não explica a DGL. A terceira teoria é conhecida como teoria da biohidrogenação, desenvolvida por Griinari (1998). Ao contrário das duas anteriores, esta teoria postula que a DGL não é causada pela escassez de precursores lipogênicos para a glândula mamária. Afirma que a síntese mamária da gordura do leite é inibida diretamente por tipos específicos de ácidos graxos, 6

produzidos a partir da biohidrogenação dos lipídeos da dieta sob certas condições ruminais. Sobretudo quando há queda no ph ruminal, esta situação altera as rotas de biohidrogenação ruminal, produzindo um ácido graxo específico (trans-10, cis-12), cuja concentração aumenta significativamente no leite de vacas com DGL. Corl et al. (1998) comprovaram através de isômero de CLA sintetizado industrialmente e sua infusão no abomaso de vacas em lactação, que o CLA possuía grande capacidade de reduzir a secreção de gordura do leite. Outros estudos demonstraram que a formação do CLA trans-10, cis-12 no rúmen só ocorre quando duas condições estão presentes: baixo ph ruminal (ex.: dietas de baixa fibra) e presença de lipídeos poli-insaturados na dieta. Dieta a base do coproduto de uva Um estudo promovido na Austrália, utilizando 32 vacas Holandesas em lactação testou o coproduto da uva em 3 tratamentos (silagem de polpa de uva, polpa de uva peletizada e controle). O trabalho tinha como hipótese que as dietas com resíduo da uva poderiam substituir o feno de alfafa sem alterar a produção de leite, o teor de gordura e proteína, além de que poderiam inibir a emissão de metano. Os principais resultados obtidos relataram que a dieta de polpa ensilada obteve a menor produção de leite, observou-se que dietas a base de uva apresentaram menores teores de gordura no leite, baixa concentração de ácidos graxos saturados na dieta e aumento da concentração de ácidos graxos poli-insaturados em especial o cis-9, trans- 11. Foi observada também a diminuição da emissão de metano nas dietas a base de resíduo de uva. Referências bibliográficas BANNI, S., MARTIN, J. C.. Conjugated linoleic acid and metabolites. In: J. J. Sebedio and W. W. Christie (Ed.) Trans Fatty Acids in Human Nutrition. pp 261-302. Oily Press, Dundee, Scotland. 1998. BANNI, S.; DAY, B.W.; EVANS, R.W.; CORONGIU, P.F.P.; LOMBARDI, B. Detection of conjugated diene isomers of linoleic acid in liver lipids of rats fed a choline-devoid diet indicates that the diet does not cause lipoperoxidation. J. Nutr. Biochem., v.6, p.281-89, 1995. BELURY, M. A. Conjugated dienoic linoleate: A polyunsaturated fatty acid with unique chemoprotective properties. Nutr. Rev. 53:83-89. 1995. BELURY, M. A.; KEMPA-STECZKO, A. conjugated linoleic acid modulates hepatic lipid composition in mice. Lipids, v.32, p.199-204, 1997. BLANKSON, H.; STAKKESTAD, A.; FAGERTUN, H.; THOM, E.; WADSTEIN, J. Conjugated linoleic acid reduces body fat mass in overweight and obese humans. Journal of Nutrition, 130: 2943-2948, 2000. CHEW, B.P.; WONG, T.S.SHULTZ, T. D.; MAGNUSON, N. S. Effects of conjugated dienoic derivatives of linoleic acid and beta-carotene in modulating lymphocyte and macrophage function, Anticancer Res., v.17, p.1099-206, 1997. 7

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