A REPRESSÃO PM O QUINTO CAVALEIRO DO APOCALÍPSE Autor: José Jorge Guerra Cel. PM Reformado Após a batalha de Ásculo, o rei Pirro, ao felicitar seus generais depois de verificar as enormes baixas sofridas por seu exército, teria dito que com mais uma vitória daquelas estaria perdido. Qual o modelo de atuação que a nossa PM deve utilizar na preservação da ordem pública: o centrado no combate ou o centrado na prevenção? Legalmente, as PMs brasileiras sempre foram remetidas para ações preventivas. Apenas uma interpretação equivocada do artigo 144 da atual Constituição, poderia justificar a prática de políticas autoritárias por elas exercidas. A propósito, Álvaro Lazzarini nos ensina: função de todas as conquistas sociais corporificadas na atual Constituição, o conceito de segurança pública a ela adequado, sem a mínima sombra de dúvida, é aquele que se harmoniza com o princípio democrático, com os direitos fundamentais e com a dignidade da pessoa humana. É o biodireito que, por conta de sua importância para a configuração de um estado democrático de direito, determina que os princípios fundamentais produzam eficácia irradiante sobre os demais preceitos que compõem a Constituição, inclusive sobre aqueles, especificamente, relacionados à segurança pública. Por essa razão, apenas as políticas de segurança pública alicerçadas em concepções democráticas, comprometidas com a observância efetiva desses princípios, são compatíveis com a Constituição Federal.
Entretanto, como os instrumentos de defesa pública não são por ela citados, os Comandantes Supremos das Forças Estaduais de Segurança Pública os concebem da melhor forma que facilitem o atingimento de seus objetivos. Da mesma forma, a não definição de ordem pública pela Constituição Federal como também a não regulamentação do seu artigo 144, acabam por contribuir com os Governadores beligerantes e autoritários, ocasião em que a entendem como sendo um conceito que pode ser mobilizado de acordo com as circunstâncias políticas. Quanto ao encaminhamento das PMs para funções militares que a atual Constituição faz é fruto, única e exclusivamente, de sua característica como força auxiliar e reserva do Exército e não como força militar que enxerga o nacional como inimigo interno. Assim, as ações autoritárias e violentas de nossa PMERJ não encontram guarida na lei maior brasileira. O dado concreto é aquele que se apoia na assertiva de que a violência social é o efeito e não a causa que se corporifica, em face, das ausências do Estado na prática de ações sociais e das outras Instituições que compõem o sistema de Segurança Púbica no desempenho de suas atividades constitucionais. Assim, se os instrumentos de defesa pública a cargo da PM não se bastam, não se pode sobrecarregá-la, transferindo-lhe as atividades das outras Instituições do Estado. O próprio exercício de UPP, verdadeira missão suicida, extrapola os limites de atuação da PM. Acrescenta-se a isto a sua forma equivocada de concepção e atuação: conceito estático e repressivo, não explora as alternativas de controle da população, do trânsito, das saídas e entradas locais e não interage com a comunidade. A aparente pacificação inicial, fruto do enxotamento dos marginais da área ocupada trará, certamente, efeito muito perverso mais adiante.
Só servem para iludir a população e encaminhar os nossos PM a sérios riscos, inclusive o de morte. Ocupação do território conceito militar - honra e glória dos estrategistas políticos! Onde já se viu preservar a ordem pública através da ocupação de território? No Rio de Janeiro os policiais estão matando e morrendo numa proporção em muito superior a qualquer padrão que venha aferir tais ações. A UPP por si só é uma falsa solução temporária para um problema muito mais profundo. E sem a menor dúvida é que, pela vontade encoberta dos PMs, tais ações não seriam praticadas, pois não contam com o apoio local, o terreno lhes é altamente adverso: não conhecem os becos e vielas. Já o marginal, domina perfeitamente a área, está aculturado à comunidade, por ela é aceito, não têm medo da morte e não se importa com as marcas da guerra. Além do mais, pertencem a uma organização que faz sempre prevalecer a sua ética e, por extensão, a sua revolucionária justiça. Já os PMs, estes sim, já apresentam estas marcas da guerra. Estão estressados e muitos já se encorajam através do uso de substância tóxica quando assumem a patrulha em terreno tão hostil e inseguro como o dos morros. Mas não é somente a UPP que é repressiva. Todos os instrumentos de defesa pública desembocam no mar da repressão. Por isso, as condições psicológicas, físicas e mentais dos PMs estão combalidas.
Como combalidas estão a disciplina e a hierarquia corroídas que são pela repressão que dá carne à promiscuidade. Seria a repressão praticada pela polícia carioca uma ignorância sincera daqueles que enxergam a solução dos problemas das desigualdades sociais somente através dela? Seria a repressão praticada pelas UPPs moralmente corrupta já que consomem milhões de reais mensalmente e que poderiam ser investidos no alívio das necessidades sociais dos moradores dos morros que, constantemente, reclamam? A afirmação pertence a Bayard Rustin: Quando um indivíduo está protestando e a sociedade se recusa a reconhecer sua dignidade como ser humano, seu próprio ato de protesto lhe confere dignidade. Portanto, não contem com a sua solidariedade para nada! Aumento do efetivo, formação continuada, polícia de aproximação, agenda pública e política nada será suficiente se o Estado não praticar o serviço social continuado. A repressão focaliza no policial e no criminoso traficante, mas desfoca da elite criminosa e viciada que dá vida ao tráfico. Portanto, a PMERJ tem que lutar sim e até a morte, mas para mudar seu atual comportamento autofágico que só será possível, legítimo e consistente se ocorrer por intermédio de ações efetivas e não por intermédio da imposição de pensamentos. -Incentivar a indústria de defesa pública e o uso da tecnologia. -Propor a prática da interação por integração do CNSP com as PMs, repensando o crime de forma nacional, estadual e municipal. -Contemplar a vocação como elemento primordial na seleção do PM objetivando a formação de verdadeiros agentes da lei. -Valorizar a atuação dos meios de comunicação de massa a respeito do seu jornalismo de investigação e com ele se inter-relacionar.
-Discutir a posição da ONG Disque Denúncia dentro do sistema de segurança pública uma vez que dele ela não faz parte. -Propor estudos visando à atuação dentro de cada área de responsabilidade das demais Instituições componentes do sistema de Segurança Pública. A repressão como forma de atuação PM, como forma de controle social, como forma de proteger a liberdade individual e coletiva, jamais logrará êxito, uma vez que ela não passa mais do que a construção de verdadeiros muros entre a PM e as comunidades que se finalizam como muros ideológicos, psicológicos, mentais e estéticos pelas diversas áreas do Estado e que se transformam em muros reais, afirmava Mário Ribeiro. A propósito, o que é a geração de crianças abandonadas e entregues ao crak senão um verdadeiro muro ideológico impossível de ser escalado pela repressão? O medo gerado no cidadão em face às ações dissuasórias improvisadas e que quase sempre implicam em mortes de inocentes é ou não um muro psicológico transformado num verdadeiro paredão que separa a PM da comunidade? A violência entre as torcidas de futebol que não é mais do que a imitação do comportamento da PM quando as reprime é ou não um muro mental difícil de ser transposto? O caveirão - o condutor da morte, no morro ou no asfalto, não passa mais do que um muro estético de inviável superação. E a prática da construção de muros, cujos alicerces se apoiam no descaso, na incompetência e na falta de vontade política continua, inclusive, internamente à PM. A forma diferenciada de tratamento salarial entre os mais antigos, os maus PM, e os mais modernos, os bons PM, nada mais é do que a construção de um muro ao mesmo tempo mental, psicológico e ideológico dentro da própria PM.
E cada muro levantado que gera polarizações que sequer são processadas, proporciona um congelamento das relações da PM com a PM e desta com a população. Quanto mais a repressão evolui, menos avança a democracia, uma vez que ela mata, aniquila o presente e torna o futuro desesperançado. Pelo período que é praticada já era tempo dela mostrar-se um tantinho positiva, mas muito pelo contrário, desdobrou-se e pariu o seu mais admirável filhote: a milícia. A intensidade da rejeição social à PMERJ é ou não fruto ao seu período de cegueira relativamente ao seu exercício da repressão? No futuro, no entanto, haverá de prevalecer o que Diogo de Figueiredo afirma: em longo prazo, quando a nossa democracia for verdadeira, ela mesma erodirá a repressão que não passa de um instrumento de defesa pública de regime autoritário e reacionário. No entanto, é justo deixarmos à PMERJ ser utilizada da forma ilegal como vem sendo para, cada vez mais, se afastar da população a qual deveria proteger e ser por ela respeitada? A repressão violenta não pode mais ter guarida, pois como sabemos, a que cabe à PM é a repressão imediata daí, o nosso PM não poder ser utilizado como um réprobo. A que está aí, no entanto, além de afundar a Constituição Brasileira, macular a ordem democrática e de direito, restringir as liberdades individual e coletiva, desmerecer a dignidade da pessoa humana, aniquilar a nossa querida e eterna PMERJ, não respeita a memória daqueles que sacrificaram suas vidas em defesa da sociedade carioca. A vitória que dizem estar conseguindo na preservação da ordem pública é uma vitória com ares de derrota, uma verdadeira vitória de Pirro.