1 Introdução A Influência de Júpiter na Órbita Terrestre: um Estudo do Caos Thales Agricola Instituto de Física UFRJ Investigar o movimento da Terra ( ) quando submetida aos campos gravitacionais do Sol ( ) e de Júpiter ( ), planeta mais massivo do Sistema Solar, nada mais é do que estudar o problema de três corpos em duas dimensões, uma vez que os momentos angulares dos três astros têm aproximadamente a mesma direção. Tal problema é de difícil tratamento analítico embora em certos casos seja possível uma abordagem perturbativa, de modo que a maneira mais eficiente de se obter resultados sobre ele é a simulação numérica. Conforme veremos mais adiante, este problema possui forte dependência com as condições iniciais e apresenta comportamento imprevisível, razões pelas quais dizemos que se trata de um sistema caótico. 2 Metodologia Nesta seção explicaremos em linhas gerais os métodos utilizados para a obtenção de nossos resultados. 2.1 Cálculo das Órbitas Nesta etapa do programa, nossa tarefa é simplesmente resolver as equações diferenciais acopladas oriundas da Segunda Lei de Newton, onde as forças resultantes são de natureza gravitacional. Para tal, foi empregado o método de Euler Cromer. Abaixo segue um exemplo (cálculo da órbita terrestre): v x (i + 1) = v x (i) + Fx M dt = v x (i) + GM (x r 3 x )dt + GM (x r 3 x )dt, x(i + 1) = x(i) + v x (i + 1)dt. 1
2.2 Estudo do Caos Para compreender um sistema caótico, é comum a análise de alguns indicadores de caos. No nosso caso, investigamos quatro deles: Órbita Terrestre: importante sobretudo para enxergarmos as principais diferenças entre condições iniciais distintas; Trajetória no Espaço de Fases (ẋ x): permite fazer comparações de estabilidade entre diferentes situações; Power Spectrum: consiste em uma Transformada de Fourier, evidenciando a existência ou inexistência de uma ou mais freqüências associadas ao movimento; Expoentes de Lyapunov: avaliam de forma quantitativa quão caótico é um sistema. Sua aplicação ficará mais clara na análise dos resultados (seção 4.4). 3 Verificação do Programa Para confirmar a ausência de erros no algoritmo, convém testar o funcionamento do programa em casos cuja solução já é conhecida. Foram feitos dois testes: um para M = 0, i.e., o problema de dois corpos, e outro para M = 1 (em unidades da massa de Júpiter), que é o caso real. Em ambos os casos, os resultados obtidos estão de acordo com o esperado, como mostram as figuras 1 e 2. 4 Resultados Aqui são apresentados os gráficos obtidos por meio do programa, bem como uma análise dos mesmos. 4.1 Órbitas A figura 3 traz o resultado de uma simulação para M = 100. Notamos que neste caso a Terra continua acompanhando o Sol, mas o movimento deste impede que a órbita terrestre continue elíptica. Na figura 4, vemos que, para M = 1000 M e condições iniciais tais que os dois planetas comecem em lados opostos em relação ao Sol, a Terra se comporta como um satélite natural do Sol. A figura 5 mostra que este movimento é estável. A diferença entre a situação das figuras 4 e 5 e aquela da figura 6 é simplesmente a condição inicial: neste caso, os dois planetas começam o movimento do mesmo lado do Sol. Contudo, percebemos que esta situação é altamente instável, de forma que a Terra chega 2
Figura 1: a ser expulsa do Sistema Solar. Isto mostra que para M = 1000 o sistema apresenta comportamento caótico. 4.2 Espaço de Fases Podemos ver na figura 7 que a trajetória da Terra no espaço de fases para M = 1 é bastante estável. Com efeito, ela é aproximadamente igual à elipse que poderíamos calcular analiticamente no caso de dois corpos. A figura 8, correspondente ao caso em que M = 100, mostra uma certa oscilação da elipse da figura 7, decorrente do movimento do Sol. Finalmente, para a situação da figura 6 a trajetória no espaço de fases é irregular, instável e nada tem a ver com a elipse do caso M = 1, como fica explícito na figura 9. 4.3 Power Spectrum Correspondendo ao caso M = 1, a figura 10 deixa clara a existência de uma freqüência bem definida associada ao movimento da Terra. O fato de a freqüência ser tão baixa está 3
Figura 2: relacionado ao dt escolhido para a resolução das equações diferenciais, que é da ordem de 1 dia. Na figura 11, obtida para M = 100, além da freqüência da figura 10, aparecem outras freqüências, associadas ao movimento do Sol. Este resultado é bastante intuitivo. Já na figura 12, representando o caso M = 1000, não existe uma freqüência bem definida, e o pólo em ω = 0 é devido à parte da viagem em que a Terra deixa o Sistema Solar, passa a se mover com velocidade constante e, portanto, tem período infinito. 4.4 Expoentes de Lyapunov Quando um sistema é caótico, condições iniciais próximas (no espaço de fases) podem levar a resultados totalmente diferentes. A figura 13 ilustra este fato. Construída no caso M = 1000, ela mostra duas possíveis órbitas da Terra, de mesma velocidade inicial, mas de posições iniciais separadas de 10 6 a, onde a é o semieixo maior da órbita terrestre (real). O resultado é surpreendente. Suponha que as condições iniciais de duas possíveis órbitas terrestres estejam separadas de uma distância d 0 no espaço de fases. A evolução temporal da distância entre as órbitas 4
Figura 3: é dada por d(t) e λt, onde λ é conhecido como o expoente de Lyapunov. As figuras 14 e 15 permitem obter estimativas para os expoentes correspondentes a M = 1 (λ 1 ) e M = 1000 (λ 1000 ), respectivamente. O ajuste exponencial nos dá λ 1 0, denotando um sistema conservativo, e λ 1000 0, 0013, denotando um sistema bastante caótico. 1 Repetindo este método para M = 100, 200,..., 900, construímos a figura 16, que mostra o expoente de Lyapunov em função da massa de Júpiter. A partir dela, concluímos que o sistema se torna caótico a partir de uma massa entre 400 e 500. 5 Conclusão Vimos que o sistema de três corpos em duas dimensões pode apresentar comportamento caótico. Além disso, os indicadores de caos analisados neste trabalho nos permitem calcular quão caótico é um sistema. No caso específico deste projeto, concluímos que o 1 Embora 0,0013 possa parecer um valor pequeno, é preciso lembrar que neste problema a unidade de tempo é o dia. Este expoente significa que em cerca de 2 anos a distância entre as órbitas triplicaria. 5
Figura 4: comportamento caótico só aparece para uma massa aproximadamente 450 vezes maior que a de Júpiter. Por este motivo, a Terra está segura. 6
Figura 5: 7
Figura 6: 8
Figura 7: 9
Figura 8: 10
Figura 9: 11
Figura 10: 12
Figura 11: 13
Figura 12: 14
Figura 13: 15
Figura 14: 16
Figura 15: 17
Figura 16: 18