Variabilidade da composição e das propriedades tecnológicas de leite de ovelha da região de produção de queijo de Nisa (DOP)

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Transcrição:

VIII Congresso Ibérico Recursos Genéticos Animais SPREGA 13-15 de Setembro de 2012 Évora Variabilidade da composição e das propriedades tecnológicas de leite de ovelha da região de produção de queijo de Nisa (DOP) Pedro Louro Unidade de Investigação de Tecnologia Alimentar INIAV Martins, APL 1,3 ; Belo, AT 2 ; Belo, CC 2 ; Barros, AC 3 ; Martins,M.P. 1 ;Pereira,EA 4 ;Vasconcelos,MM 1 1 L-INIA Oeiras INIAV IP, Instituto Superior de Agronomia, Lisboa, pedro.louro@iniav.pt 2 L-INIA Fonte Boa, INIAV IP, Fonte Boa, Vale de Santarém 3 Instituto Superior de Agronomia, Lisboa 4 DRAPC, Castelo Branco

INTRODUÇÃO A evolução do sector dos queijos tradicionais portugueses tem promovido modificações estruturais importantes ao nível dos sistemas de produção e da transformação de leite de ovelha As modificações são relevantes, susceptíveis de influenciar as propriedades do leite e a qualidade e a tipicidade do queijo, por via da influência sobre os factores geradores de tipicidade e especificidade: - características do leite (raças, sistemas de produção, outros factores com influência na produção animal) - Relação produção de leite/produtor de queijo (concentração/dimensão, conservação do leite) - Transformação 2 Seminário Queijos Tradicionais Açorianos: Socio-economia, Tecnologia, Segurança e Inovação INOVA, 25 de Julho de 2012 Ponta Delgada, Açores

Exemplos modificação dos sistemas de produção - diminuição da sazonalidade aumento da produtividade dos rebanhos - introdução de novas raças modificações tecnológicas - conservação e transformação do leite São modificações importantes, em geral não precedidas de uma avaliação específica dos seus impactos Poderão ser responsáveis por insucessos a nível de algumas unidades de produção, por deficiências de qualidade e pela falta de tipicidade de alguns produtos 3

Desde há anos que nos preocupamos com o impacto das características e propriedades do leite nas características dos queijos tradicionais, de leite cru de ovelha Trabalhos anteriores, com lotes de leite para fabrico de queijo de Nisa DOP mostram diferenças significativas de produção, composição e de propriedades tecnológicas, em função da raça, da época e fase de lactação (Martins et al., 2005; Martins et al., 2009; Marques et al., 2011) - Influência no rendimento queijeiro - Influência na qualidade do queijo por proporcionarem comportamentos diferenciados do leite durante a fase de coagulação - Influência decisiva sobre as fases posteriores, dessoramento da coalhada e maturação do queijo. 4

OBJECTIVO E METODOLOGIAS Torna-se, assim, necessário acompanhar as alterações dos sistemas de exploração, no seu todo, de uma monitorização das propriedades tecnológicas do leite para ser possível, no fabrico tradicional, encontrar as soluções adequadas à modificação das propriedades do leite. Este estudo avalia a variabilidade a nível de rebanho, a partir de leites individuais, em função da raça, fase de lactação: 5 - Três raças (Merino Branco, Saloia, Assaf) - Cinco explorações - Uma lactação Inverno/Primavera - Leites individuais (ordenha completa da manhã), aos 30, 45, 60, 90 e 120 dias de lactação

Produção diária (ordenha da manhã) Composição e características do leite - teores em sólidos totais - RST, matéria gorda - MG, proteína - PB e lactose (Milk-o-Scan 4000) - teor em matéria útil para o fabrico de queijo MU (soma dos teores em PB e MG) - ph (potenciometria, Metrohm 713, Suisse, com eléctrodo combinado Crison, España) Propriedades tecnológicas - Monitorização de coagulações em pequena escala (10mL de leite, em Optigraph (Ysebaert Dairy Division, Frepillon, France) - Avaliação de parâmetros de tempo (R, 0K20) e de firmeza do gel (A 20, A 40, AR, A2R) 6

R (minutos) Tempo de coagulação OK20 (minutos) Tempo decorrido a partir do início da coagulação, até que se obtenha uma consistência padrão (equivalente a 6,5 Volt) A 20 (volt) Intensidade do sinal óptico quando decorridos 20 minutos após o início ensaio A 40 (volt) Intensidade do sinal óptico quando decorridos 40 minutos após o início ensaio (Mahaut et al., 1997) AR (volt) Intensidade do sinal óptico quando decorrido um tempo igual ao dobro do tempo de coagulação (2R) A2R (volt) - Intensidade do sinal óptico quando decorrido um tempo igual ao triplo do tempo de coagulação (3R) 7

RESULTADOS Efeito da raça, fase de lactação e respectiva interacção na produção e nas características do leite de ovelha Produção ph MG PB Lactose RST MU Raça ** * ns ** ** ** ** Fase de lactação ** ** ** ** ** ** ** Raça x Fase lact. * * ** * ** ** ** * P<0,05; ** P<0,01; ns-não significativo - Efeito muito significativo (P<0,01) da raça e da fase de lactação no nível produtivo e em quase todos os parâmetros físico-químicos - As excepções foram o ph (P<0,05) e o teor em matéria gorda, onde o efeito da raça não foi estatisticamente significativo - A interacção atenuou as diferenças (produção, ph e PB) 8

Efeito da raça, fase de lactação e respectiva interacção nas propriedades tecnológicas do leite de ovelha ph R AR A2R A 20 A 40 0K20 Raça * * ** ** ns ** ** Fase de lactação ** ** ** ** ** ** ** Raça x Fase lactação * ** ** ** ** ** ns * P<0,05; ** P<0,01; ns-não significativo - Efeito muito significativo (P<0,01) da raça e da fase de lactação na consistência do gel e na velocidade de agregação micelar 9

Efeito da raça na produção e nas características do leite de ovelha Produção ph MG PB Lactose RST MU (L) (g/100g) (g100g) (g/100g) (g/100g) (g/100g) Assaf média 1034,2 b 6,59 a 5,85 5,09 a 4,90 c 16,76 a 10,95 a epm 47,96 0,02 0,22 0,07 0,05 0,22 0,25 N 98 94 89 89 89 89 89 Merino média 233,8 a 6,69 b 6,61 6,14 c 4,58 a 18,22 b 12,75 b Branco epm 70,82 0,03 0,32 0,10 0,08 0,32 0,36 N 41 34 41 41 41 41 41 Saloia média 319,4 a 6,60 ab 6,13 5,74 b 4,84 b 17,62 ab 11,89 ab epm 59,1 0,03 0,29 0,09 0,06 0,29 0,29 N 52 40 52 52 52 52 52 Nota: letras diferentes na mesma coluna significam diferenças signiicativas entre os valores médios apresentados - Maior produção e menor variabilidade de produção demonstrada pela raça Assaf (CV=46%, contra 194% e 133%, respectivamente para as raças Merino Branco e Saloia) - Leite mais pobre para a raça Assaf; leite de Saloia (+13% PB, +8,6 MU) mais próximo da composição do Merino Branco (+21%, +16%) do que da Assaf - Diferença do teor em MG não significativo provavelmente devido à variabilidade, naturalmente a mais elevada de entre os teores dos componentes do leite 10

Efeito da raça nas propriedades tecnológicas do leite de ovelha ph R AR A2R A 20 A 40 0K20 (m) (V) (V) (V) (V) (m) Assaf média 6,59 a 12,16 a 5,54 a 8,15 a 3,93 8,79 a 11,00 b epm 0,02 0,38 0,28 0,43 0,28 0,46 0,42 N 94 93 93 91 93 92 93 Merino média 6,69 b 14,50 b 8,64 c 12,40 b 4,02 11,94 b 7,33 a Branco epm 0,03 0,65 0,48 0,75 0,45 0,72 0,69 N 34 29 29 23 29 29 29 Saloia média 6,60 a b 12,95 ab 6,89 b 10,41 b 4,6 10,87 b 8,90 a epm 0,03 0,60 0,45 0,61 0,40 0,61 0,63 N 40 38 37 34 37 38 37 - Leite da raça Assaf mais rápido (6% e 19%, respectivamente para a Saloia e Merino branco) a iniciar a coagulação mas mais lento a evoluir (1,25 ou 1,5 vezes mais lento) - Para o mesmo tempo, por exemplo 40m, a firmeza do gel do leite Assaf é 24% e 36% inferior à obtida para os leites de Saloia e Merino branco, respectivamente - Para A2R, normalmente usado para queijos deste tipo, as diferenças são de 27% e de 52%, respectivamente 11

Efeito da fase de lactação na produção e nas características do leite de ovelha Legenda: As letras diferentes, a vermelho, indicam diferenças significativas em função do tempo de lactação, para a mesma raça; letras diferentes, a azul, indicam diferenças significativas entre as raças, para a mesma fase de lactação. 12

- Perfil de evolução da produção semelhante a uma curva de lactação - O leite evoluiu na sua composição como é geralmente aceite, com um aumento na concentração em sólidos para o final da lactação, com o leite proveniente da raça Saloia a sofrer alguma quebra na composição a partir dos 45 dias (provável efeito da factores inerentes às explorações, quanto à alimentação e maneio) - Os componentes mais relevantes para o rendimento queijeiro foram influenciados significativamente pela fase de lactação, o que não constitui surpresa pois é conhecida a influência desta condicionante fisiológica da produção de leite, relativamente à qual os queijeiros experimentados estão alertados, sobretudo em sistemas de produção tradicionais, sazonais e sem grande utilização de lotes de leite preparados a partir de leite de diferentes explorações. 13

Efeito da fase de lactação nas propriedades tecnológicas do leite de ovelha Legenda: As letras diferentes, a vermelho, indicam diferenças significativas em função do tempo de lactação, para a mesma raça; letras diferentes, a azul, indicam diferenças significativas entre as raças, para a mesma fase de lactação. 14

- As diferenças entre raças mantêm-se praticamente ao longo da lactação para todos os parâmetros avaliados, sendo sobretudo evidente para os parâmetros de firmeza da coalhada. - As coalhadas obtidas com leite Assaf são menos firmes que as obtidas com leites de ovelhas de raça Saloia ou Merino Branco, e de evolução mais lenta, podendo considerar-se de qualidade inferior dada a presumível maior dificuldade a nível do trabalho da coalhada e de dessoramento. - Os resultados evidenciam a superioridade das características de firmeza do gel com origem no leite das raças autóctones, podendo observar-se que a raça Saloia, mais produtiva que o Merino Branco, acompanha bem as proriedades tecnológicas da mesma, realçando o seu potencial para o fabrico de queijo, com o senão da baixa produtividade. 15

- À semelhança de conclusões anteriores (Martins et al., 2005; Martins et al. 2009), parece confirmar-se um potencial interessante do leite da raça Saloia para a actividade queijeira, a qual não é uma surpresa se se pensar que esta raça é identificada com a origem do queijo de Azeitão DOP. - Nas últimas décadas, sob o ponto do rendimento queijeiro e económico, raças exóticas, como a Assaf, mostram níveis de produção que parecem ultrapassar largamente as vantagens qualitativas das raças autóctones (como referido por Marques et al., 2011), mas a falta de atitude tecnológica correcta relativamente ao tipo de leite, em conjugação com a falta de controlo adequado de fabrico, podem criar problemas graves a nível da qualidade do queijo. 16

CONCLUSÕES A composição do leite, foi significativamente influenciada pela fase de lactação e pela raça produtora As raças nacionais revelaram maior riqueza em matéria útil para o fabrico de queijo, devido sobretudo aos superiores teores em proteína, embora tenham registado níveis médios de produção diária (ordenha da manhã) muito baixos quando comparados com a produção da raça Assaf. A maior riqueza em sólidos do leite das raças nacionais proporcionou consistências de coalhada significativamente mais elevadas quando comparada com as obtidas para a raça Assaf, o que indica superior aptidão para a coagulação e, em consequência, para o fabrico de queijo. 17

Apesar de revelarem inícios de coagulação mais lentos que a raça Assaf, o leite das raças nacionais proporcionou velocidades de agregação micelar significativamente mais elevadas, recuperando até ao final da coagulação características final de coalhada concordantes com as diferenças de composição obtidas. Realce para a raça Saloia, considerada a segunda melhor raça leiteira nacional, que neste trabalho volta a mostrar uma aptidão particular para o fabrico de queijo, a qual mereceria ser posta à prova em contexto de selecção e melhoramento relativamente ao nível produtivo. 18

Esta superior aptidão à coagulação das raças nacionais, mais do que representar vantagem ou desvantagem para o fabrico de queijo, aponta para a necessidade de encarar a utilização de cada um destes tipos de leite de modo apropriado ao longo do fabrico, pois tem implicações a nível das características do gel e das fases posteriores do fabrico. O controlo de fabrico e a atitude correcta face às propriedades tecnológicas do leite tornam-se fundamentais para a preservação das características do produto final, principalmente no caso da maioria dos queijos tradicionais fabricados a partir de leite cru de ovelha, uma vez que as suas propriedades dependem das características do queijo em fresco, a nova matéria prima que vai ser transformada pelo processo de maturação. 19

A opção relativa à escolha da raça a utilizar pode passar, para além do rendimento da transformação e do nível produtivo dos animais, por outros aspectos, como sejam eventuais exigências legais e imperativos de tradição ou critérios qualitativos, no que se refere ao queijo, não considerados neste trabalho. Os aspectos produtivos e económicos são cada vez mais decisivos, mas há também aspectos mais abrangentes e relevantes a considerar, como sejam os ligados aos recursos naturais, à sustentabilidade dos sistemas produtivos e à preservação dos recursos genéticos nacionais, os quais vêm de encontro a algumas das vantagens tecnológicas das raças nacionais. 20

21 Muito obrigado pela atenção