Programa de Educação Médica Continuada. Hemorragia. Digestiva Varicosa. realização. apoio. FEderação brasileira de gastroenterologia.

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Transcrição:

Programa de Educação Médica Continuada Hemorragia Digestiva Varicosa Sociedade Brasileira realização sociedade brasileira de hepatologia apoio FEderação brasileira de gastroenterologia de Hepatologia

Editorial Raymundo Paraná Presidente A Sociedade Brasileira de Hepatologia tem como um de seus objetivos primordiais a promoção de Educação Médica Continuada de elevada qualidade científica. Neste projeto ela se propõe a fazê-lo através de discussão de casos clínicos, entrevistas e revisões de atualização sobre temas fundamentais em Hepatologia, abordados por renomados especialistas da área. A Zambon participa desta iniciativa, levando à classe médica a melhor mensagem técnico-científica, com a realização da Sociedade Brasileira de Hepatologia. Nesta edição o médico terá a oportunidade de atualizar seus conhecimentos através da informação mais precisa e atual sobre um importante problema: Hemorragia Digestiva Varicosa. Editores científicos ALBERTO QUEIROZ FARIAS Professor-Doutor do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Sao Paulo (USP) Coordenador Clinico do Programa de Transplante Hepatico do Hospital das Clinicas da USP Paulo Lisboa Bittencourt Coordenador da Unidade de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital Português, salvador - ba Doutor em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo Membro do Grupo Internacional de Estudo da Hepatite Autoimune realização: sociedade brasileira de hepatologia apoio: FEderação brasileira de gastroenterologia Cortesia: Atha Comunicação e Editora e-mail: 1atha@uol.com.br Criação e Coordenação editorial

Hemorragia Digestiva Varicosa Angelo Alves de Mattos Professor Titular da Disciplina de Gastroenterologia da Fundação Faculdade Federal de Ciências Médicas de Porto Alegre (FFFCMPA); Professor do Curso de Pós-Graduação em Hepatologia da FFFCMPA; Doutor e Livre Docente em Gastroenterologia. I consenso brasileiro x consenso de baveno V Tendo em vista a frequência e o mau prognóstico relacionado ao sangramento digestivo em pacientes com hipertensão portal (HP), a Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH), através de sua Diretoria, se propôs a organizar uma reunião de consenso sobre este tema. Em decorrência de a ruptura de varizes de esôfago ser a causa mais frequente de sangramento e ela de ser uma emergência médica associada com uma mortalidade que beira os 20% nas primeiras semanas, nos melhores centros, entendeu-se que este tema deveria ser aquele de maior destaque. O I Consenso Brasileiro sobre Hemorragia Digestiva Varicosa foi realizado no dia 6 de maio de 2009, na cidade de Salvador. Seu objetivo foi o de promover uma ampla discussão, fundamentalmente sobre a prevenção e o tratamento da hemorragia varicosa, visando, assim, estabelecer recomendações da SBH. Aqui abordaremos as recomendações referentes à profilaxia primária e secundária feitas pela SBH, tecendo comentários comparativos em relação àquelas referidas por ocasião do Consenso de Baveno V, (Italia) realizado, posteriormente, em maio de 2010. Por tratar-se de uma análise comparativa entre os dois consensos, ambos já publicados na íntegra (1,2), nos furtaremos em referendar as assertivas feitas a seguir, uma vez que as mesmas poderão ser pesquisadas nos artigos de origem. Prevenção do primeiro sangramento varicoso Rastreamento de varizes de esôfago no paciente com HP Quando avaliamos, na literatura, a prevalência de varizes, de acordo com a gravidade da cirrose, observa-se que até 30% dos pacientes com cirrose compensada e até 60% dos com doença descompensada poderão apresentar esta complicação. Quando avaliada a incidência cumulativa de surgimento de varizes de esôfago, ela foi, em regra, de 5% a 10% em um ano. Um outro dado de interesse a ser observado é a progressão das varizes. A taxas de progressão gira entre 5% e 30% por ano (10% em média). Assim, os estudos concluem que a velocidade de crescimento das varizes é maior que a velocidade de seu surgimento, o que fornece base à indicação da frequência do rastreamento a ser feito nos pacientes com cirrose. De qualquer maneira, fica resguardado o fato de que o screening de varizes deve ser realizado em todo o paciente com cirrose. Pacientes Child-Pugh A, que não tenham varizes na primeira endoscopia, 3

deverão realizar rastreamento a cada dois-três anos; no entanto, se Child-Pugh B ou C, este seguimento deve ser anual. Por outro lado, aqueles pacientes com varizes finas, não submetidos a nenhum tratamento profilático, deverão realizar o seguimento de forma anual, embora ele seja preconizado a cada dois anos, por alguns autores, nos pacientes com doença compensada. No que tange ao rastreamento, existem várias propostas com o intuito de diagnosticar ou predizer a presença de varizes. Assim, parâmetros laboratoriais, ultrassonográficos, o Fibroscan, a determinação do gradiente de pressão de veia hepática (GPVH), a utilização do varipress e, mais recentemente, da cápsula endoscópica têm sido propostos. No entanto, até o presente, o método endoscópico convencional é o que tem sido considerado o padrão ouro. Quando se avaliam os preditores de sangramento por varizes, os mais importantes relacionados ao risco de sangrar de maneira independente são: tamanho das varizes; gravidade da doença hepática; presença de sinais vermelhos nas varizes e um GPVH 12mmHg. No que tange ao tamanho das varizes, ele tem sido mensurado através de diversas classificações. A SBH optou por escolher uma das que classifica o calibre das varizes como fino, médio e grosso. Para esta classificação, os parâmetros utilizados foram: quando o calibre for inferior a 3mm, as varizes seriam de fino calibre; quando entre 3 e 5mm, de médio calibre; e quando superior a 5mm, de grosso calibre. Considerou-se como parâmetro o diâmetro de uma pinça de biópsia aberta (5mm). Foram consideradas como manchas vermelhas: cherry red spot; red wale mark e hematocystic point. 1) Recomendações quanto ao screening de varizes em pacientes com HP associadas à cirrose: Houve consenso de que todo o paciente com cirrose deveria fazer rastreamento de varizes de esôfago no momento do diagnóstico e que o método a ser utilizado é o endoscópico. Pacientes Child-Pugh A que não tenham varizes na primeira endoscopia deverão realizar rastreamento a cada dois anos; se Child-Pugh B ou C, este seguimento deve ser anual. Pacientes com varizes finas, não submetidos a nenhum tratamento profilático, deverão realizar o rastreamento de forma anual, independente da gravidade de sua hepatopatia. O Consenso de Baveno V também recomenda que todos os pacientes com cirrose devam ser submetidos a screening para o diagnóstico de varizes. Profilaxia pré-primária O conceito de profilaxia pré-primária ainda encontra alguma discussão na literatura. Assim, alguns entendem ser a profilaxia pré-primária aquela que visa usar medidas para evitar o surgimento ou o crescimento de varizes esofagianas em pacientes com HP que ainda não as tenham ou que as tenham pequenas, enquanto outros aceitam o conceito de que seria aquela empregada ao se usar medidas para evitar o surgimento de varizes esofagianas em pacientes com HP. Na dependência da conceituação utilizada, os objetivos desta profilaxia seriam variáveis, porém a proposta básica é tentar prevenir o surgimento de varizes ou o seu crescimento, de modo a evitar sangramento digestivo alto em cirróticos. Embora existam quatro ensaios clínicos controlados na literatura, somente um avalia exclusivamente pacientes que não tinham varizes na endoscopia inicial. Neste estudo controlado com placebo, a despeito da droga utilizada ser o timolol, não houve diferença nos desfechos avaliados. Assim, os autores não recomendam a realização de profilaxia pré-primária. 2) recomendação em relação à profilaxia pré-primária: Houve consenso de que a profilaxia pré-primária seria aquela empregada ao se usar medidas para evitar o surgimento de varizes esofagianas em pacientes com hipertensão portal e de que não há evidências atuais para a sua indicação. O Consenso de Baveno V também conclui que, no conceito de profilaxia pré-primária, devam ser incluídos somente pacientes sem varizes, bem como o fato de não haver indicação para o uso de betabloqueadores. No entanto, ressalta que o tratamento da doença de base pode reduzir a HP e prevenir as complicações clínicas. Indicação de profilaxia do primeiro sangramento varicoso Quando avaliamos a possibilidade de profilaxia em um paciente com varizes de esôfago e cirrose, é 4

fundamental que conheçamos a história natural desta complicação nos pacientes com hepatopatia crônica. A este respeito, entendemos de fundamental importância o estudo que avalia o curso clínico e a probabilidade de morte dos pacientes com cirrose. Os autores estadiam os pacientes com doença compensada (estádios 1 e 2) e descompensada (estádios 3 e 4) em quatro estádios. No estádio 1 (pacientes sem varizes e sem ascite), a mortalidade ao cabo de um ano gira ao redor de 1%; no estádio 2 (pacientes com varizes e sem ascite), de 3,4%; no estádio 3 (pacientes com ascite, independente da presença ou não de varizes), de 20%; e no estádio 4 (pacientes com sangramento por varizes independente da presença ou não de ascite), de 57%. Desta forma, fica claro o impacto da hemorragia digestiva por ruptura de varizes na sobrevida do paciente com cirrose. Quando se avalia o impacto da profilaxia primária na progressão das varizes e na frequência do primeiro sangramento varicoso, é de interesse considerar estudo que, ao avaliar o papel dos β-bloqueadores não específicos (BBNE), observou que eles retardam a progressão e previnem o primeiro episódio de sangramento varicoso em pacientes com varizes de fino calibre. Ressalte-se que a mortalidade foi similar em ambos os grupos (BBNE e controle) e que os efeitos adversos foram maiores no grupo do BBNE. De qualquer forma, fica sugerido que o grupo com varizes finas sem fatores de risco para o uso de BBNE poderia ser submetido à profilaxia com o objetivo de evitar a progressão das mesmas. Aqueles Child-Pugh B ou C mereceriam profilaxia, já que o risco de sangramento seria semelhante ao dos pacientes com varizes mais calibrosas. Da mesma forma, pacientes com varizes finas e com sinais preditivos de sangramento (manchas vermelhas), pelo maior risco de sangramento, se beneficiariam da profilaxia. Em meta-análise, em que foram avaliados estudos de pacientes com varizes de todos os calibres, ao se analisar o impacto da profilaxia primária na frequência do primeiro sangramento, observouse diminuição significativa do mesmo e, embora a mortalidade tenha sido reduzida, não o foi de forma significativa. No entanto, em uma revisão Cochrane, avaliando-se a profilaxia primária com BBNE, constatou-se que ela reduz a mortalidade de pacientes cirróticos com varizes de qualquer tamanho. Nos pacientes com varizes calibrosas, não há dúvida da necessidade de profilaxia, independente da existência ou não de fatores de risco. Ressalte-se que, embora não utilizada de rotina, a determinação do GPVH é útil em predizer em quais pacientes a profilaxia será exitosa. Assim, quando o GPVH é substancialmente diminuído (< 12mmHg ou redução de 20% nos níveis basais), o risco de sangramento é marcadamente reduzido. 3) Quais são os pacientes cirróticos que se beneficiam da profilaxia primária do sangramento varicoso? Houve consenso de que pacientes com varizes de fino calibre se beneficiam da profilaxia quando têm maior risco de sangramento, ou seja, Child-Pugh B ou C ou com sinais vermelhos nas varizes e, quando sem fatores de risco, a mesma poderia ser utilizada com o objetivo de evitar progressão das varizes (menor evidência). Pacientes com varizes mais calibrosas apresentam maior risco quando são Child- Pugh B e C ou apresentam sinais vermelhos nas varizes, merecendo todos, no entanto, a profilaxia. Embora o GPVH seja um método muito útil na seleção dos pacientes de risco, bem como para avaliar a resposta ao tratamento, na realidade atual de nosso país, não pode ser recomendado seu uso na rotina clínica do manejo do paciente com hipertensão portal, ficando seu uso restrito a centros especializados. O Consenso de Baveno V também recomenda a profilaxia em pacientes com varizes de fino calibre, no entanto, só o faz de forma mais enfática naquelas com manchas vermelhas ou nos Child C. Estratégia terapêutica para profilaxia primária Existem, na atualidade, duas propostas a serem empregadas na profilaxia primária: BBNE ou ligadura elástica das varizes de esôfago (LEVE). Em meta-análises, em que foram avaliados estudos comparando BBNE e LEVE na redução do risco do primeiro sangramento e na mortalidade dos pacientes com varizes de calibre médio ou grosso, observou-se que a ligadura controlava mais o sangramento, sem, no entanto, trazer 5

benefícios na sobrevida. Muito se tem publicado em relação ao tema, mas uma resposta definitiva ainda não foi atingida. De qualquer forma, parece que as duas propostas terapêuticas controlam o sangramento e, a despeito dos efeitos adversos serem mais frequentes nos que usam BBNE, são mais graves nos que realizam LEVE. Assumindo que ambas condutas tenham uma eficácia similar, a LEVE deve ser oferecida a: pacientes não aderentes; pacientes com efeitos colaterais sérios e aqueles com contraindicação inicial ao BBNE. Ressalte-se não estar errado indicar como primeira opção a realização da LEVE, principalmente em varizes de médio e grande calibre, tendo em vista as evidências já existentes na literatura. O uso de BBNE deve ser ajustado à dose máxima tolerada (aquela imediatamente abaixo da que desencadeasse algum efeito colateral no paciente), e as sessões de LEVE devem ser realizadas a cada duas semanas até a erradicação, sendo que deve ser feito um primeiro controle endoscópico até três meses após a obliteração e, posteriormente, a cada seis-12 meses. Nas varizes de fino calibre, o uso de BBNE pode ser considerado, particularmente nos pacientes com alto risco de sangramento. É importante salientar não haver evidências do papel dos nitratos ou da escleroterapia endoscópica de varizes na profilaxia primária. Não foram encontradas evidências para a utilização de inibidores de bomba protônica para evitar sangramento por úlcera/escara quando da ligadura elástica, bem como não foi encontrado racional para uso de plasma e/ou plaquetas na profilaxia primária quando da utilização de método endoscópico em pacientes com plaquetopenia ou INR alargado. 4) Qual a melhor estratégia a ser utilizada na profilaxia primária? Está indicada a profilaxia primária com BBNE (propranolol ou nadolol) em pacientes com cirrose hepática e com varizes de médio ou grosso calibre. Quando há evidências de sinais vermelhos ou os pacientes são Child B/C, pode ser utilizado BBNE ou ligadura elástica. Ligadura elástica de varizes está indicada como primeira opção em cirróticos não aderentes, intolerantes ou com contraindicações aos betabloqueadores. Em pacientes com varizes de fino calibre a profilaxia é com BBNE. O Consenso de Baveno V também recomenda que todos os pacientes com varizes de médio ou grosso calibre realizem profilaxia, no entanto, sugere que a escolha da terapia (BBNE ou LEVE) deva ser norteada pelos recursos e experiência de cada serviço, pelas características e preferência do paciente, sempre considerando os efeitos colaterais e as contraindicações. Lembra que o carvedilol é uma alternativa farmacológica promissora, mas que necessita de mais estudos. Profilaxia secundária Estratégia terapêutica para profilaxia secundária Após o primeiro episódio de hemorragia varicosa, as possibilidades de ressangramento, nos cirróticos não submetidos à profilaxia secundária, são elevadas, atingindo ao redor de 60% dos pacientes, com mortalidade de 30%. Os BBNE induzem a queda do débito cardíaco e promovem também uma vasoconstrição arteriolar esplâncnica que reduz o fluxo venoso e a pressão portal. Duas meta-análises confirmaram a redução significativa de ressangramento, sendo que, em uma, houve melhora da sobrevida. Além disso, estudos de coorte, com seguimento de cirróticos com resposta satisfatória ao uso de BBNE (avaliadas pela determinação do GPVH), demonstraram que eles não apenas tiveram menor risco de hemorragia como também menor mortalidade e menor incidência de outras complicações da HP, tais como: ascite, peritonite bacteriana espontânea, encefalopatia hepática e síndrome hepatorrenal. Assim, os BBNE constituem medicação de primeira linha para a profilaxia secundária (após um primeiro episódio hemorrágico). Restabelecidas as condições hemodinâmicas, considera-se sua utilização de forma precoce, em regra a partir do sexto dia do sangramento. Deve-se, no entanto, ter em conta suas contraindicações, particularmente a doença pulmonar obstrutiva crônica, as doenças cardía- 6

cas que contraindiquem o betabloqueio, como a insuficiência cardíaca e bradicardia acentuada, ou a presença de hipotensão arterial. No emprego de BBNE, a posologia do propranolol deve ser ajustada em cada paciente, iniciando com 40mg/dia em duas tomadas (12/12 horas), aumentando a dose de acordo com a tolerância do paciente. O nadolol, de custo mais elevado, pode ser empregado na posologia inicial de 40mg-80mg uma única vez ao dia, sempre levando em conta a tolerância do paciente. Os BBNE devem ser utilizados de forma contínua, uma vez que sua suspensão pode induzir a um aumento da pressão portal, com surgimento de hemorragia. Apenas 40% dos pacientes tratados conseguem reduzir a pressão portal para os níveis preconizados. Naqueles pacientes não respondedores, a adição de mononitrato de isossorbida consegue aumentar em 10% a 20% os índices de resposta. Entretanto, quando utilizada esta associação, seria de importância a determinação do GPVH, que só é realizada em centros de referência, o que limita esta forma de terapia. Não há consenso que se deva indicar a associação de propranolol e nitratos sem uma avaliação apropriada. O primeiro tratamento endoscópico na profilaxia do sangramento foi a escleroterapia, sendo que ela mostrou eficácia em relação ao grupo controle. Após a introdução da LEVE, vários estudos comprovaram sua superioridade em relação à escleroterapia. Por outro lado, meta-análise avaliando a associação da escleroterapia com LEVE não mostrou aumento de eficácia, havendo maiores efeitos colaterais. Assim, a LEVE é também considerada como tratamento de primeira linha com o intuito de evitar o ressangramento. Estudos comparativos do uso de BBNE versus LEVE demonstraram resultados divergentes. Mais recentemente, estudos comparando BBNE e LEVE versus LEVE ou BBNE utilizados de forma isolada mostraram superioridade da associação das duas terapias, sendo atualmente esta a melhor proposta terapêutica. Nos pacientes com contraindicações ao uso dos BBNE, indica-se o tratamento com LEVE, bem como naqueles em que o uso de betabloqueadores foi ineficaz em prevenir o ressangramento. Recomendações 5) A combinação de LEVE com BBNE tem se mostrado a melhor atitude terapêutica para profilaxia secundária de sangramento varicoso em cirróticos. O uso de BBNE deve ser ajustado à dose máxima tolerada, e a medicação deve ser utilizada de forma contínua, uma vez que a suspensão da droga pode induzir ao aumento rebote da pressão portal, com surgimento de hemorragia. A LEVE é a técnica endoscópica considerada de primeira linha na profilaxia secundária do sangramento digestivo. O Consenso de Baveno V, em regra, vai ao encontro do aqui recomendado, no entanto, o faz de forma mais sistematizada. Vejamos pois: A terapia preferida é a associação de BBNE com a LEVE. Em pacientes com cirrose incapazes de serem tratados com LEVE: BBNE com mononitrato de isossorbida é a opção preferida. Em pacientes com cirrose que apresentem contraindicação ou intolerância aos BBNE: o tratamento preferido é a LEVE Pelo exposto nesta breve revisão, podemos concluir que, embora haja diferenças entre as recomendações entre as duas reuniões de consenso, elas são sutis, não traduzindo divergência significativa a ser adotada frente ao paciente. Referências 1. Bittencourt PB, Farias AQ, Strauss E, Mattos AA e membros do painel do 1 0 Consenso de Sangramento Varicoso da Sociedade Brasileira de Hepatologia. Variceal Bleeding: consensus meeting from the Brazilian Society of Hepatology. Arq Gastroenterol. 2010;47:202-16. 2. De Franchis R. Baveno V Faculty. Revising consensus in portal hypertension: Report of the Baveno V consensus workshop on methodology of diagnosis and therapy in portal hypertension. J Hepatol. 2010;53:762-8. 7

O uso prolongado diminui a progressão da CBP e a necessidade de transplante hepático 1 Estimula a secreção biliar 2 Diminui a evolução para o óbito e melhora os sintomas de prurido e fadiga 202942 Programa Educação Continuada SBH/ABRIL/2011 Poupon RE, Poupon R, Balkau B. Ursodiol for the long-term treatment of primary biliary cirrhosis; The UDCA-PBC Study Group. N Engl J Med. 1994;330:1342-7. 2. Bula do produto. Ursacol. Ursacol, ácido ursodesoxicólico. Comprimido simples 50, 150 e 300 mg, embalagens com 20 comprimidos. Uso oral - Uso adulto. Indicações: Dissolução dos cálculos biliares, formados por colesterol que apresentam litíase por cálculos não radiopacos, com diâmetro inferior a 1 cm, em vesícula funcionante ou no canal colédoco; para pacientes que recusaram a intervenção cirúrgica ou apresentam contraindicações para a mesma; em casos de supersaturação biliar de colesterol na análise da bile colhida por cateterismo duodenal. Cirrose biliar: tratamento da forma sintomática da cirrose biliar primária; alterações qualitativas e quantitativas da bile; colecistopatia calculosa em vesícula biliar funcionante; litíase residual do colédoco ou recidivas após intervenção sobre as vias biliares; síndrome dispéptico-dolorosas das colecistopatias com ou sem cálculos e pós-colecistectomia; discinesias das vias biliares e síndrome associada; alterações lipêmicas por aumento do colesterol e/ou triglicérides; terapêutica coadjuvante da litotripsia extracorpórea. Contraindicações: Icterícia obstrutiva e hepatites agudas graves; colecistite, cólicas biliares frequentes, úlcera gastroduodenal em fase ativa; alterações hepáticas e intestinais, que interferem com a circulação entero-hepática dos ácidos biliares; insufi ciência renal grave; pacientes em estado terminal de cirrose biliar primária. É contraindicado em processos infl amatórios do intestino delgado ou do intestino grosso e em caso de hipersensibilidade aos componentes da fórmula. Precauções e advertências: - Gerais: Os cálculos radiotransparentes, que melhor respondem ao tratamento litolítico, são aqueles pequenos e múltiplos em vesícula biliar funcionante; um eventual controle da composição biliar, para verifi car a saturação em colesterol, representa importante elemento de previsão para um êxito favorável do tratamento. - Gravidez e/ou lactação: Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica. Informe imediatamente seu médico em caso de suspeita de gravidez. Não há estudos que confi rmem ou não a eliminação através do leite materno e, portanto, não é recomendado a mulheres que estejam amamentando. Interações medicamentosas: Com antiácidos à base de alumínio, colestiramina, clofi brato e neomicina. Reações adversas: Diarreia, dores estomacais, náusea a vômito, constipação intestinal, dor de cabeça, indigestão ou gosto metálico na boca. Posologia e administração: A dose diária deve ser administrada em 2 ou 3 vezes ao dia, após as refeições. Metade da dose diária poderá ser administrada após o jantar. A ingestão antes de deitar aumenta a efi cácia do medicamento. - Dissolução de cálculos biliares: 5 a 10 mg/kg de peso corporal, dividida em duas ou três tomadas, por períodos de 4 a 6 meses, pelo menos, podendo chegar a 12 meses. - Sintomas dispépticos: geralmente são sufi cientes doses de 50 mg três vezes ao dia, ou 150 mg duas vezes ao dia. - Cirrose biliar primária estágio I a III: 12 a 15 mg/ kg/dia, dividida em duas a quatro doses, por um período de 9 meses a 2 anos de tratamento. - Cirrose biliar primária estágio IV com bilirrubinemia normal: 12 a 15 mg/kg/dia, dividida em duas a quatro doses, por um período de 9 meses a 2 anos de tratamento, devendo ser realizado controle periódico da função hepática. - Cirrose biliar primária estágio IV com bilirrubinemia elevada: 6 a 8 mg/kg/dia (metade da normal), dividida em duas a quatro doses. - Terapia coadjuvante de litotripsia extracorpórea: 8 mg/kg/dia, associada a 7 mg/kg/dia de ácido ursodesoxicólico, por um período de tratamento que se inicia 2 a 3 semanas antes da intervenção até 1 mês após o procedimento. Não é necessária a redução posológica na insufi ciência renal, uma vez que o ácido ursodesoxicólico é excretado predominantemente pela bile e somente uma quantidade muito pequena pela urina. VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. Registro MS.: 1.0084.0067. Se persistirem os sintomas, o médico deverá ser consultado. SAC Zambon: 0800-0177011 - www.zambon.com.br