Satisfação dos cuidadores de doentes de Alzheimer em relação à qualidade dos cuidados de saúde hospitalares (*)



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Transcrição:

NOTAS DE INVESTIGAÇÃO Satisfação dos cuidadores de doentes de Alzheimer em relação à qualidade dos cuidados de saúde hospitalares (*) ANA MARGARIDA CAVALEIRO (**) JOSÉ A. CARVALHO TEIXEIRA (***) 1. INTRODUÇÃO Existem em Portugal cerca de 50.000 casos conhecidos de pessoas que sofrem de doença de Alzheimer, estimando-se outros tantos não oficializados (Garcia, Costa, Guerreiro, Leitão, Mendonça, & Umbelino, 1994). Se um número tão elevado de pessoas é afectado por esta doença, consequentemente haverá cada vez mais pessoas a precisarem de ajuda e a pedirem uma resposta às suas necessidades. Esta resposta não passa somente pela Medicina, mas também pela Psicologia (Martins, 1994). Muitas vezes, o doente de Alzheimer necessita de recorrer ao hospital e a doença que motiva o recurso ao hospital pode associar-se ao declínio temporário das suas funções cognitivas. Nessas circunstâncias vários factores (tais como o (*) Os autores agradecem a colaboração da Associação Portuguesa dos Familiares e Amigos dos Doentes de Alzheimer. (**) Psicóloga Clínica. (***) Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa. ambiente não familiar, a confusão de um hospital «cheio de serviço» e novos tratamentos medicamentosos, entre outros) podem precipitar estados de ansiedade, confusão e agitação. A pessoa pode gradualmente voltar ao seu funcionamento anterior quando sai do hospital (Mace, Rabins, Castleton, McEwen, & Meredith, 1992). Assim sendo, torna-se importante fazer com que o período de tempo em que o doente permanece no hospital seja o menos disruptivo possível, preferencialmente acompanhado pela pessoa que habitualmente dele cuida. O cuidador é, além disto, a pessoa melhor colocada para informar os técnicos de saúde sobre as características do comportamento do doente de Alzheimer e sobre a melhor foram de lidar com ele. No âmbito da psicologia da saúde reveste-se de considerável importância o apoio que possa ser prestado aos doentes e aos seus cuidadores em situações de recurso ao hospital, quer seja recurso a serviços de urgência quer se trate de internamentos, pelo que também é importante a consideração sistemática dos aspectos psicológicos envolvidos na prestação dos cuidados de saúde que sejam necessários. Assim, é importante conhecer a satisfação 369

dos cuidadores em relação à qualidade dos cuidados de saúde hospitalares prestados aos doentes de Alzheimer. Este conhecimento pode ser útil na perspectiva da melhoria contínua da qualidade em saúde, neste caso especificamente em relação com os cuidados de saúde prestados a pessoas com uma doença que envolve deterioração cognitiva generalizada e progressiva, geralmente dependentes dos seus cuidadores. São estes quem acompanha o doente ao hospital e transmite aos técnicos de saúde qual o motivo do recurso ao hospital, quais os sintomas presentes, etc. Neste estudo descritivo, com carácter exploratório, pretendeu-se investigar: qual a satisfação dos cuidadores dos doentes de Alzheimer em relação à qualidade dos cuidados de saúde prestados a nível hospitalar, quais os aspectos com que os cuidadores estão mais e menos satisfeitos e que factores que influenciam essa mesma satisfação e até que ponto os cuidadores consideram que os técnicos de saúde estão informados sobre a doença de Alzheimer. A satisfação dos utentes dos serviços de saúde é a sua resposta (cognitiva e emocional) à avaliação que fazem dos cuidados que são prestados pelos técnicos de saúde durante uma experiência que tiveram num serviço de saúde na sua qualidade de utentes (Ross et al., 1987). Tendo em conta que, segundo alguns autores o facto de se prestar cuidados a um doente de Alzheimer relaciona-se com prevalência elevada de manifestações depressivas nos próprios cuidadores (Gallagher et al., 1989; cit. Dura; Stukenberg & Kiecolt-Glaser, 1990; Redinbaugh, Mac- Callum, & Kiecolt-Glaser, 1995), pretendeu-se também saber em que medida a presença de depressão poderia influenciar a percepção de qualidade dos cuidados de saúde. 2.1. Amostra 2. MATERIAL E MÉTODOS A amostra deste estudo, recolhida na Associação Portuguesa dos Familiares e Amigos dos Doentes de Alzheimer, foi constituída por 30 sujeitos de ambos os sexos (24 mulheres e 6 homens) que desempenhavam funções de cuidador de doentes de Alzheimer e que já haviam recorrido a serviços hospitalares para prestação de cuidados de saúde ao doente de quem cuidam. Maioritariamente casados, com idades compreendidas entre os 41 e os 90 anos, nível de escolaridade secundário ou superior e grau de parentesco próximo (cônjuge, filho). 2.2. Instrumentos Para avaliar a satisfação dos cuidadores foi utilizado um questionário de satisfação em relação aos cuidados de saúde hospitalares, especificamente construído com esta finalidade. Num primeiro momento foram efectuadas entrevistas com vista a obter informações que possibilitassem a construção do questionário. Num segundo momento procedeu-se ao pré-teste. Por fim, num terceiro momento, aplicou-se o questionário de satisfação aos sujeitos da amostra. Este questionário de satisfação era composto por 30 perguntas (28 fechadas e 2 abertas), divididas em cinco grupos: satisfação global com a qualidade dos cuidados hospitalares, tipo de serviço hospitalar utilizado, satisfação com a qualidade dos cuidados de saúde prestados pelos enfermeiros e pelos médicos, satisfação com a informação transmitida e, finalmente, satisfação com os cuidados prestados pelos enfermeiros quando o doente apresentava alterações do comportamento. Para avaliar a depressão foi utilizado o Inventário Depressivo de Beck (B. D. I.). 3. RESULTADOS Embora os cuidadores se mostrassem insatisfeitos com a informação sobre a doença de Alzheimer que lhes foi transmitida pelos médicos, consideraram que a informação que receberam era clara, apesar de afirmarem que médicos e enfermeiros nunca lhes disseram as mesmas coisas sobre a doença. Os cuidadores encontravam-se satisfeitos com o facto de os médicos lhes terem explicado o tratamento que o doente ia receber e a sua evolução. De facto, os cuidadores da amostra em estudo consideraram que a qualidade dos cuidados médicos prestados a nível hospitalar ao doente de Alzheimer é boa, apesar de considerarem que os médicos não só não aceitaram as informações que eles tinham para dar sobre a melhor forma de lidar com o do- 370

ente, como também nunca lhes perguntaram qual era o seu ponto de vista sobre a melhor forma de lidar com ele. Os resultados obtidos em relação à informação recebida pelos cuidadores sobre a doença de Alzheimer por parte dos médicos são concordantes com os resultados dos estudos realizados por Williams e Calnan (1991), Haley, Clair e Saulsberry (1992) e por Fortinsky e Hathaway (1990). De facto, tanto os cuidadores da nossa amostra como os cuidadores inquiridos por estes autores mostraram insatisfação em relação à quantidade de informação recebida sobre a demência. Os resultados são semelhantes aos obtidos por Larson, Nelson, Gustafson e Batalden (1996), uma vez que embora a quantidade de informação fosse pouca, a sua qualidade foi considerada boa, apresentando-se os cuidadores satisfeitos com os cuidados médicos prestados a nível hospitalar. Este grau de satisfação em relação à qualidade da informação transmitida pelos médicos poderia relacionar-se com o facto dos médicos terem ido ao encontro das expectativas dos cuidadores. Quando se analisaram as respostas dadas às questões relacionadas com a qualidade dos cuidados de enfermagem, verificou-se que em todas as questões o grau de insatisfação é superior ao grau de satisfação. As questões onde o grau de insatisfação é mais elevado dizem respeito à ausência de explicação sobre a forma como iam proceder com o doente e ao facto de os enfermeiros nunca perguntarem aos cuidadores qual o seu ponto de vista sobre a forma de lidar com o doente. Assim, a maioria dos cuidadores mostrou-se insatisfeita com a qualidade dos cuidados de enfermagem prestados a nível hospitalar. De facto, a maioria dos cuidadores considerou que os enfermeiros apresentavam uma atitude de desinteresse para com eles. Pelo contrário, as atitudes dos médicos foram consideradas como profissionais, calorosas, de preocupação e ajuda, tendo apenas um pequeno número de cuidadores considerado que os médicos monstraram desinteresse. Quando se agrupam os cuidados médicos e os cuidados de enfermagem, perguntando aos cuidadores qual é o seu grau de satisfação com a globalidade dos cuidados de saúde que o doente recebeu no hospital, estes responderam na sua maioria que estão insatisfeitos com esses cuidados. Esta insatisfação com a globalidade dos cuidados de saúde pode ser parcialmente explicada pelo facto da insatisfação dos utentes com a qualidade dos cuidados de saúde relacionar-se com insatisfação em relação ao comportamento profissional dos técnicos de saúde (Teixeira, 1996). Embora a maioria dos inquiridos não apresente níveis de depressão significativos, existe um pequeno número de cuidadores em que se verifica um grau de depressão moderado. No entanto, verificou-se que o estado emocional no momento em que responderam ao questionário não influenciou as respostas. Diferentemente do estudo de Dura, Stukenberg e Kiecolt-Glaser (1990), em que 30% dos cuidadores de doentes de Alzheimer apresentavam depressão, neste estudo isto apenas acontecia em 17% dos cuidadores. Este dado encontra-se em conformidade com os estudos referidos por Redinbaugh, MacCallum e Kiecolt-Glaser (1995) em que a prevalência de sintomas depressivos nos cuidadores de doentes de Alzheimer varia entre os 18% e os 83%. No entanto, a associação descrita por estes autores em que prestar cuidados a um doente de Alzheimer estaria associada a prevalência elevada de manifestações depressivas nos cuidadores não se verificou no nosso estudo. Em situações de internamento, a permissão para acompanhar o doente para além do horário normal das visitas é o aspecto dos cuidados hospitalares que mais agrada aos cuidadores. A banalização que muitos técnicos de saúde fazem das especificidades do doente de Alzheimer é o aspecto que mais desagrada aos cuidadores. Apenas o nível de escolaridade e o tipo de serviço hospitalar (consulta/serviço de urgência) influenciaram a satisfação. Enquanto que os cuidadores com o ensino básico encontravam-se satisfeitos com a qualidade dos cuidados médicos, os cuidadores com o ensino secundário e os cuidadores com o ensino superior encontravam-se insatisfeitos com estes cuidados. No que respeita ao tipo de serviço hospitalar a que recorreram, os cuidadores que se dirigiram às consultas e os que se dirigiram às consultas e a serviços de urgência têm uma opinião antagónica à opinião dos cuidadores que se dirigiram apenas a serviços de urgência. Os primeiros mostraram-se satisfeitos com a informação transmitida pelos médicos sobre a doença de Alzheimer e o tratamento que o doente ia receber e com a participação que tiveram nos cuidados prestados ao doente. Os 371

cuidadores que se dirigiram apenas a serviços de urgência mostravam-se insatisfeitos com estes aspectos. Sexo, idade, estado civil, situação profissional e parentesco dos cuidadores com os doentes de Alzheimer não tiveram influência nas respostas dadas pelos cuidadores. 4. CONCLUSÃO Os cuidadores de doentes de Alzheimer que foram estudados revelaram-se genericamente insatisfeitos com a qualidade dos cuidados hospitalares que são prestados aos doentes de Alzheimer, bem como com a informação transmitida pelos técnicos de saúde sobre a doença. Os cuidadores estudados estavam satisfeitos com a qualidade dos cuidados prestados pelos médicos. A insatisfação verificada com a qualidade dos cuidados prestados pelos enfermeiros parece relacionar-se com a não permissão para participarem nos cuidados hospitalares prestados ao doente. Este estudo evidenciou uma carência relativa de cuidados de saúde mais personalizados e mais orientados para a problemática específica que envolve a doença de Alzheimer. Isto poderá relacionar-se com uma certa banalização da doença de Alzheimer por parte dos técnicos de saúde, que assim agem com atitudes e comportamentos profissionalmente adequados a situações sem deterioração cognitiva. Desta forma, os cuidados de saúde que são prestados podem não ser concordantes com as expectativas dos cuidadores. As expectativas não satisfeitas provocam nos cuidadores sentimentos de frustração e incompreensão em relação ao comportamento dos técnicos de saúde, aspecto que os pode levar a concluir que esses técnicos não se encontrariam suficientemente informados sobre a doença de Alzheimer. Deste modo, para que os cuidadores apresentassem graus mais elevados de satisfação seria necessário que os técnicos de saúde conhecessem melhor as suas expectativas em relação aos cuidados de saúde prestados a nível hospitalar aos doentes de quem cuidam e permitissem a sua participação na organização dos cuidados. Os resultados obtidos mostram a importância de promover intervenções no meio hospitalar com a finalidade melhorar a qualidade dos cuidados de saúde prestados aos doentes de Alzheimer. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Dura, J., Stukenberg, K., & Kiecolt-Glaser, J. (1990). Chronic stress and depressive disorders in old adults. Journal of Abnormal Psychology, 99 (3), 284-290. Fortinsky, R., & Hathaway, T. (1990). Information and service needs among active and former family caregivers of persons with Alzheimer s disease. Gerontologist, 30 (5), 604-609. Garcia, C., Costa, C., Guerreiro, M., Leitão, O., Mendonça, A., & Umbelino, J. (1994). Estimativa da prevalência da demência e da Doença de Alzheimer em Portugal. Acta Médica Portuguesa, 7, 487- -491. Haley, W., Clair, J., & Saulsberry, K. (1992). Family caregiver satisfaction with medical care of their demented relatives. Gerontologist, 32 (2), 219-226. Larson, C., Nelson, E., Gustafson, D., & Batalden, P. (1996). The relationship between meeting patients information needs and there satisfaction with hospital care and general health status outcomes. International Journal for Quality in Health Care, 8 (5), 447-456. Mace, N., Rabins, P., Castleton, B., McEwen, E., & Meredith, B. (1992). The 36-hours day. Great Britain: Hodder & Stoughton. Redinbaugh, E., MacCallum, R., & Kiecolt-Glaser, J. (1995). Recurrent syndromal depression in caregivers. Psychology and Aging, 10 (3), 358-368. Ross, C. et al. (1987). The role of expectationa in patient satisfaction with medical care. Journal of Health Care Marketing, 7, 16-26. Teixeira, J. (1996). Comunicação e cuidados de saúde: Desafios para a Psicologia da Saúde. Análise Psicológica, 14 (1), 135-139. Williams, S., & Calnan, M. (1991). Key determinants of consumer satisfaction with general practice. Family Practice, 8 (3), 237-242. RESUMO Nesta nota de investigação os autores apresentam resultados de um estudo exploratório sobre a satisfação dos cuidadores de doentes de Alzheimer em relação aos cuidados de saúde hospitalares prestados aos doentes. Palavras-chave: Satisfação, cuidadores, doença de Alzheimer. 372

ABSTRACT The purpose of the present study was to determine caregiver s satisfaction with the Alzheimer s patients hospital care. Key words: Satisfaction, caregivers, Alzheimer s disease. 373