Editorial Editorial. Dia Mundial do Rim 2011: proteja seus rins, salve seu coração. Introdução ao dia mundial do rim 2011

Documentos relacionados
Prevenção e Tratamento da Doença Renal Crônica

Profa Dra Rachel Breg

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RENAL EM DIABÉTICOS ADULTOS*

Insuficiência Renal Crônica

DISCIPLINA DE NEFROLOGIA HOSPITAL UNIVERSITÁRIO PEDRO ERNESTO NÚCLEO INTERDISCIPLINAR DE TRATAMENTO DA DOENÇA RENAL CRÔNICA (NIT-DRC)

Por que um curso para a área de Nefrologia? Doença Renal Crônica. Frequente e grave, mas também prevenível e tratável...

Encaminhamento do paciente com Doença Renal Crônica ao nefrologista

NÚMERO: 008/2011 DATA: 31/01/2011 Diagnóstico Sistemático da Nefropatia Diabética

ENFERMAGEM DOENÇAS CRONICAS NÃO TRANSMISSIVEIS. Doenças Renais Parte 1. Profª. Tatiane da Silva Campos

ONTARGET - Telmisartan, Ramipril, or Both in Patients at High Risk for Vascular Events N Engl J Med 2008;358:

NÚCLEO INTERDISCIPLINAR DE TRATAMENTO DA DOENÇA RENAL CRÔNICA

1. Estratificação de risco clínico (cardiovascular global) para Hipertensão Arterial Sistêmica

Proteinúria. Marcus Gomes Bastos

DRC: um multiplicador do risco cardiovascular. Roberto Pecoits-Filho

O objetivo primordial do tratamento da hipertensão arterial é a redução da morbidade e da mortalidade cardiovascular do paciente hipertenso

MÓDULO TEMÁTICO. Diagnóstico e tratamento da nefropatia diabética. Introdução. Autoras:

REDUZIR A PRESSÃO ARTERIAL PARA VALORES ABAIXO DE 130 x 80 É BENÉFICO NO PACIENTE HIPERTENSO COM NEFROPATIA DIABÉTICA OU NÃO ASSOCIADA?

RESUMO. Descritores: Doença renal crônica. Programa de rastreamento. Prevenção, filtração glomerular estimada. Proteinúria.

Velhas doenças, terapêuticas atuais

O Custo do Mau Controle do Diabetes para a Saúde Pública

INDICADORES BIOQUÍMICOS DA FUNÇÃO RENAL EM IDOSOS

Medical Research Council (MRC) Study

ATENÇÃO FARMACÊUTICA À POPULAÇÃO DE MUNICÍPIOS PARAENSE COMO ESTRATÉGIA DE PREVENÇÃO DO DIABETES, HIPERTENSÃO ARTERIAL E DA DOENÇA RENAL CRÔNICA

Nefropatia Diabética. Caso clínico com estudo dirigido. Coordenadores: Márcio Dantas e Gustavo Frezza RESPOSTAS DAS QUESTÕES:

Estudo prospectivo de 2151 pacientes com doença renal crônica em tratamento conservador com abordagem multidisciplinar no Vale do Paraíba, SP

Particularidades no reconhecimento da IRA, padronização da definição e classificação.

Ensaios Clínicos Recentes em Dislipidemia: lições do ASCOT-LLA, ALLHAT-LLP e HPS

AUSÊNCIA DE EFEITO DO ÔMEGA-3 NA PREVENÇÃO DAS DOENÇAS CARDIOVASCULARES

Prevenção Secundária da Doença Renal Crônica Modelo Público

Sessão Televoter Diabetes

Prevenção na progressão da Doença Renal Crônica no paciente diabético

InsuficiênciaRenal Crônica

QUAL O NÍVEL DE PRESSÃO ARTERIAL IDEAL A SER ATINGIDO PELOS PACIENTES HIPERTENSOS?

AVALIAÇÃO DA FUNÇÃO RENAL EM PACIENTES PORTADORES DE DOENÇAS CRÔNICAS NÃO TRANSMISSÍVEIS

Há benefícios do antagonismo da aldosterona para a proteção renal?

Fatores de Risco da Doença Renal Crônica

CARACTERIZAÇÃO DO RISCO CARDÍACO EM ESTUDANTES DE ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS DO MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA

COMPORTAMENTO DA PRESSÃO ARTERIAL EM PACIENTES QUE ADERIRAM A PRÁTICA DE ATIVIDADE FÍSICA PARA O CONTROLE DA HIPERTENSÃO: RELATO DE EXPERIÊNCIA

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA. Diagnóstico precoce da doença renal crônica pela Estratégia Saúde da Família

Abordagem da Insuficiência Cardíaca na Diabetes. Novas Fronteiras

Doença renal crônica é um problema de saúde pública no Brasil. Emmanuel A. Burdmann Presidente da SBN

Miguel Gus 1, Flávio Danni Fuchs 1. Hipertensão, diabetes melito tipo 2, terapêutica.

Rede sobre estratégias para redução do consumo de sal para prevenção e controle de doenças cardiovasculares nas Américas e Caribe NOTA CONCEITUAL

XXXV Congresso Português de Cardiologia Abril ú ç

Artigo ÍNDICE DE PROTEINÚRIA EM IDOSOS COM DOENÇAS RENAIS CRÔNICAS INDEX OF PROTEINURIA IN ELDERLY PEOPLE WITH CHRONIC KIDNEY DISEASE

Perfil Epidemiológico de Pacientes Portadores de Doença Renal Crônica Terminal em Programa de Hemodiálise em Clínica de Santa Cruz do Sul - RS

O PAPEL DO MFC NA PREVENÇÃO DA DOENÇA RENAL CRÔNICA

Jornal Brasileiro de Transplantes Jornal Oficial da Associação Brasileira de Transplante de Órgãos - ABTO Volume 13, Número 1, jan/mar 2010

Artigo. de CARDIOLOGIA do RIO GRANDE DO SUL. paciente com diabetes melito. Miguel Gus Flávio Danni Fuchs. REVISTA da SOCIEDADE

Critérios para Definir a Doença Renal Crônica

João Morais Cardiologista, Director do Serviço de Cardiologia do Hospital de Santo André, EPE, Leiria.

IMPORTÂNCIA DOS MARCADORES SÉRICOS NO ESTADIAMENTO DA DOENÇA RENAL CRÔNICA

Inibidores de SGLT-2. Acadêmica: Tauana Mara Pereira Martos

Glomerulonefrite Membranosa Idiopática: um estudo de caso

COMPLICAÇÕES RENAIS NO TRANSPLANTE HEPÁTICO

NEFROPATIA DIABÉTICA. Vinicius D. A. Delfino. Prof. Titular de Nefrologia da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Brasil

ESTUDOS DE CUSTOS DO DIABETES NO SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE BRASILEIRO

Avaliação da Função Renal em Idosos Atendidos na Estratégia de Saúde da Família

ANÁLISE DA FUNÇÃO RENAL DE HIPERTENSOS E DIABÉTICOS ANALYSIS OF RENAL FUNCTION IN HYPERTENSIVE AND DIABETIC PATIENTS

Hipertenso Diabético. Diretrizes de Atuação e Suas Dificuldades

ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO CARDIOVASCULAR

DESAFIOS DA TRS NO BRASIL OU DOENÇA RENAL CRÔNICA : É MELHOR PREVENIR

Conclusões científicas e explicação detalhada dos fundamentos científicos para as diferenças em relação à recomendação do PRAC

ATIVAÇÃO ENDOTELIAL EM PACIENTES PEDIÁTRICOS COM DOENÇA RENAL CRÔNICA

AVALIAÇÃO DA TAXA DE FILTRAÇÃO GLOMERULAR EM CÃES OBESOS RESUMO

O espectro da hipertensão arterial ao longo dos diferentes grupos etários em Angola: uma chamada para a acção. Feliciano Chanana Paquissi * 09/11/2017

Doença Renal Crônica (Pré-terapia Renal Substitutiva): Diagnóstico

SEMINÁRIO BRASILEIRO DE PREVENÇÃO QUATERNÁRIA EM APS

Análise de sobrevida do diabético em centro brasileiro de diálise Survival analysis among diabetic patients on hemodialysis in Brazil

Hipertensão Arterial e a Prevenção Quaternária

Hipertensão arterial e insuficiência cardíaca

Doença Renal Crônica (Pré-terapia Renal Substitutiva): Diagnóstico

Papel do laboratório clínico na pesquisa, controle e tratamento da DRC. Dr. Carlos Zúñiga San Martín

Resumo. José Mauro Vieira Júnior* José Hermógenes Rocco Suassuna

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA COM FUNÇÃO VENTRICULAR PRESERVADA. Dr. José Maria Peixoto

O INÍCIO DA DOENÇA RENAL NÃO MOSTRA SINAIS CLAROS, MAS A SUA ATITUDE FAZ TODA A DIFERENÇA

Doença Renal Crônica: A Grande Epidemia Deste Milênio Chronic Kidney Disease: The Great Epidemic of This Millennium

Revista Portuguesa de. Cardiologia. Portuguese Journal of Cardiology.

HIV E DOENÇA RENAL I CONGRESSO PARANAENSE DE INFECTOLOGIA. 31 março e 01 abril de 2017 Londrina - PR

Curso prático de atualização em anticoagulação oral na FANV Casos especiais. Arminda Veiga

PREVALÊNCIA DE SÍNDROME METABÓLICA EM PACIENTES HOSPITALIZADOS

Controvérsias e Avanços Tecnológicos sobre Hemoglobina Glicada (A1C)

Hipertensão; insuficiência renal crônica; inibidores da enzima conversora da angiotensina; insuficiência renal.

Combinação de fármacos

DOENÇA RENAL CRÔNICA: FREQUENTE E GRAVE, MAS TAMBÉM PREVENÍVEL E TRATÁVEL

Fatores de risco primários da Doença Renal Crônica (DRC) e recomendações das instituições

Nefropatia Diabética. Caso clínico com estudo dirigido. Coordenadores: Márcio Dantas e Gustavo Frezza

preditores de insuficiência renal crônica em pacientes de centro de referência em hipertensão arterial

Análise crítica dos Estudos ACCORD versus SPRINT Resultados e metas pressóricas

SÓDIO: VOCÊ SABIA? Compilado por Nestlé Research

Resultados 2018 e Novas Perspectivas. Fábio P. Taniguchi MD, MBA, PhD Investigador Principal

Diferenciais sociodemográficos na prevalência de complicações decorrentes do diabetes mellitus entre idosos brasileiros

Vitamina D em Pacientes Diabéticos com Doença Arterial Coronariana

Na hipertensão arterial

Artigo. de CARDIOLOGIA do RIO GRANDE DO SUL PRÁTICA CLÍNICA: NEFROPATIA DIABÉTICA E BLOQUEIO DO SISTEMA RENINA-ANGIOTENSINA-ALDOSTERONA

Combinação de fármacos

Estudo Multicêntrico de Prevalência DM Tipo 2 no Brasil 17,4 12,7 7,6% 7,6 5,5 2, TOTAL (*) Grupos etários (anos)

Epidemiologia, diagnóstico e tratamento da hipertensão arterial em pacientes com Doença Renal Crônica, no primeiro nível de atenção

Transcrição:

Editorial Editorial Dia Mundial do Rim 2011: proteja seus rins, salve seu coração Introdução ao dia mundial do rim 2011 O dia 10 de março de 2011 marcará a comemoração do 6 o Dia Mundial do Rim (DMR), um evento anual patrocinado pela Sociedade Internacional de Nefrologia e pela Federação Internacional de Fundações do Rim. Desde a sua origem em 2006, o DMR vem adquirindo cada vez mais importância, tendo se tornado o mais comemorado evento mundial associado à doença renal e o mais bem-sucedido esforço de conscientização tanto do público em geral quanto das autoridades governamentais ligadas à saúde com relação aos perigos da doença renal, em particular à doença renal crônica (DRC). Em 2011, o DMR enfatizará o significativo, embora frequentemente subestimado, papel desempenhado pela disfunção renal no aumento da doença cardiovascular (DCV) prematura, a causa mais comum de morbimortalidade no mundo. 1 Será que o foco na detecção precoce e prevenção da doença renal pode realmente melhorar a saúde cardiovascular (CV) a longo prazo? Neste editorial, esperamos veicular a mensagem de que uma maior atenção aos rins pode realmente melhorar os desfechos de saúde a longo prazo ao reduzir tanto a doença renal quanto a cardiovascular, devendo, portanto, ser um componente central de qualquer estratégia global de saúde que vise a reduzir o enorme e crescente peso das doenças não comunicáveis (DNCs) crônicas. A doença cardiovascular e os rins A DCV é a mais comum das DNCs crônicas que têm impacto na mortalidade global. A DCV sozinha é responsável por cerca de 30% de todas as mortes no mundo e 10% de toda a vida saudável perdida por doença. 1 Embora tenha havido uma certa redução na mortalidade por DCV nos países desenvolvidos, tal redução não foi relatada nos países em desenvolvimento, nas minorias populacionais em desvantagem étnica e social, e nem em indivíduos com DRC concomitante. 2,3 A presença de DRC aumenta significativamente o risco de um evento CV tanto em diabetes quanto em hipertensão. 4,5 No entanto, ainda é pouco o fato de que a DRC sozinha é um forte fator de risco para DCV, a despeito da existência de diabetes, hipertensão ou qualquer outro fator de risco convencional para DCV. 6,7 Isso é particularmente verdadeiro na presença de um aumento na proteinúria, um importante alvo de qualquer programa de detecção de DRC. 6-9 Há muito já se conhece o aumento de 20 a 30 vezes de DCV em pacientes com doença renal avançada, mas o aumento do risco de DCV associado a menores graus de comprometimento da função renal só foi definitivamente demonstrado em 2004. Go et al. relataram uma associação independente e gradual da TFG com risco de morte, eventos CV e hospitalizações em um estudo populacional com mais de mil indivíduos. 6 Esse dramático aumento no risco de DCV associado à DRC deve-se realmente à DRC ou apenas reflete a coexistência de diabetes ou hipertensão na maioria desses pacientes? O efeito independente da DRC isolada já foi bem documentado em vários estudos. 7 O risco de morte cardíaca está aumentado em 46% em indivíduos com TFG entre 30 e 60 ml/min (DRC estágio III) independentemente da presença dos tradicionais fatores de risco 15

CV, incluindo diabetes e hipertensão. 10 O risco aumentado de eventos e mortalidade CV em indivíduos acima de 55 anos apenas com DRC é equivalente a, ou até maior do que, aquele observado em pacientes com diabetes ou infartos miocárdicos prévios. 11 Tanto a população geral 6,12 quanto a de alto risco 13,14 exibem um aumento no risco de DCV na presença de DRC. Tal elevação de risco para DCV não se limita aos idosos em voluntários com idade média de 45 anos, o risco de infarto miocárdico, acidente vascular cerebral e mortalidade devida a todas as causas dobrou naqueles com DRC. 14 Proteinúria e risco CV Ao se considerar a importância da recomendação de triagem para DRC juntamente com os fatores de risco convencionais para DCV em indivíduos selecionados, os dados mostram que o risco de DCV acha-se melhor correlacionado com proteinúria (albuminúria) do que apenas com a TFG. Isso é de particular importância, uma vez que a proteinúria é quase sempre um marcador de doença renal e não um fator de risco convencional para DCV. 6,8,9,15 Com relação à proteinúria como preditor de DCV tardia, o estudo PREVEND mostrou uma relação linear direta entre albuminúria e risco de morte CV na população em geral, mesmo em níveis de excreção de albumina geralmente considerados dentro da normalidade (15-29 mg/dia), e tal risco aumentou mais de seis vezes quando a excreção de albumina excedeu 300 mg/dia. 8 Informações recentes da base de dados NHANES norte-americana e do Japão também mostram um efeito independente da albuminúria sobre o risco tanto de DCV quanto de mortalidade devida a todas as causas em todos os níveis de TFG. 15,16 Em pacientes com insuficiência cardíaca congestiva, mas sem diabetes, hipertensão ou redução da TFG, a elevação da albumina urinária prediz mortalidade tanto CV quanto devida a todas as causas. 17 Resultados semelhantes são obtidos quando se estudam pacientes com doença coronária ou infartos miocárdicos prévios, nos quais a proteinúria conferiu maior risco de mortalidade do que a TFG reduzida, embora ambos exerçam um impacto adverso nos desfechos. 18 É importante ressaltar que a possibilidade de um evento CV é significativamente aumentada, assim como o tempo necessário para o seu desenvolvimento é significativamente acelerado pela presença de proteinúria em todos os níveis de TFG. 19 Em indivíduos não diabéticos com níveis normais de creatinina sérica submetidos a intervenções coronarianas percutâneas, cerca de 78% têm DRC demonstrável quando examinados de maneira mais rígida para função renal (TFGe, proteína urinária). 20 A presença de DRC não é apenas um potencial fator de aceleração do desenvolvimento de doença coronária nesses pacientes, mas também foi associada ao aumento de outros riscos, incluindo complicações hemorrágicas, nefropatia por contraste, re-estenose e morte. 10 Hoje, vários estudos confirmam que a proteinúria é um fator de risco gradativo para DCV independente de TFG, hipertensão e diabetes, e que tal risco se estende a espectros de excreção de albumina geralmente considerados normais. 21,22 Além disso, esse elevado risco CV foi bem demonstrado em vários estudos, nos quais apenas fitas reagentes foram utilizadas para investigar aumento da excreção de proteína. 6,18,23 16

A despeito da preocupação de que a DRC diagnosticada através apenas de redução da TFG identifique predominantemente adultos mais idosos com risco aumentado devido apenas à idade, 24 a ligação com proteinúria como um fator de risco independente para mortalidade CV foi confirmada por meta-análise de 22 estudos de coorte, com população geral, separados, e tanto para indivíduos mais idosos (> 65) quanto mais jovens de várias nacionalidades e grupos raciais. 23 O tratamento de drc pode reduzir DCV? Por fim, e mais importante, a partir de uma perspectiva clínica, há dados sugestivos de que intervenções que tenham o rim como alvo e que são destinadas a reduzir a proteinúria e a retardar a progressão de DRC possam também reduzir o risco de DCV. O benefício dos IECAs e/ou BRAs para frear a progressão de DRC diabética e não diabética estabelecida já foi bem documentado. 25-29 Com relação à diminuição da progressão, a incidência de DCV em DRC é bastante maior com perda mais rápida da TFG independentemente de outros fatores de risco, sugerindo que as intervenções que retardam a progressão também podem reduzir a DCV. 19 Há relato de redução de 44% na mortalidade CV ao longo de quatro anos em pacientes investigados de uma população geral sem fatores de risco, exceto o aumento de albumina na urina, e tratados com IECA tendo o rim por alvo. 30 Tal efeito foi primariamente observado em indivíduos com taxas de excreção de albumina > 50 mg/dia em um estudo piloto, e a intervenção mostrou-se custo-efetiva naquela população. 31 Os desfechos CV foram significativamente reduzidos na proporção direta da redução da albuminúria com IECA, e a albuminúria provou ser o único preditor de desfecho CV. 32 Outros estudos também demonstraram que alterações na proteinúria (em diabéticos) são melhores preditores de desfecho do que as alterações na pressão arterial (PA) obtidas com os IECAs. 33 O benefício potencial de terapias tendo o rim por alvo foi recentemente enfatizado por observações de que doses maiores do que as necessárias de bloqueadores do sistema renina-angiotensina (SRA) para apenas controlar a PA podem reduzir a proteinúria independentemente dos efeitos na PA ou TFG, e que a adição de diuréticos ou restrição de sal, duas intervenções de baixo custo, podem aumentar ainda mais o efeito redutor de proteinúria do bloqueio do SRA. 34,35 Não há ainda dados disponíveis que permitam afirmar que a investigação para DRC e subsequentes intervenções reduzam a mortalidade CV e sejam custo-efetivas em indivíduos mais jovens (< 55). 36 Entretanto, sabe-se hoje que: a albuminúria é um melhor preditor de eventos renais e cardiovasculares do que apenas a PA isolada; a redução da proteinúria tem um efeito reno e cardioprotetor maior do que a redução da PA isolada; e a identificação de DRC pode melhorar os desfechos CV. Conclusão Com a proximidade das comemorações do 6 o Dia Mundial do Rim em 10 de março de 2011, vale a pena observar que, até a última década, a doença renal era vista pela maioria das autoridades governamentais e de saúde pública como confinada aos pacientes com doença renal avançada, felizmente uma condição rara, já que o enorme custo da terapia 17

renal substitutiva consome de modo desproporcional os escassos recursos da saúde, estando muito aquém das possibilidades de países habitados por mais de 80% da população mundial (37,38). A mudança foi grande. Hoje sabemos que a doença renal não é rara 10% da população apresenta evidência de disfunção renal. E sabemos que tais indivíduos merecem atenção, não apenas porque alguns evoluirão para doença renal avançada, mas porque apresentam um risco bastante aumentado de morte prematura devido a DCV, a maior e mais dispendiosa ameaça à assistência à saúde enfrentada em nível global. 1 Ao mesmo tempo em que progredimos no tratamento da maioria dos fatores de risco CV tradicionais, a DRC surge como mais um causador de substancial toxicidade vascular independente. Felizmente, também há boas notícias. Os biomarcadores de DRC (proteinúria, TFGe) são de detecção fácil e de baixo custo, e um deles, a proteinúria, aparece cedo na evolução de doença vascular generalizada. Assim, programas de detecção e prevenção tendo o rim como alvo parecem oferecer uma valiosa oportunidade para a instituição de medidas preventivas precoces que vão além das tradicionais abordagens cardioprotetoras. Hoje existe prova irrefutável de que a inclusão de triagem seletiva para DRC em programas de saúde global destinados primariamente à redução de DCV vai melhorar de maneira significativa os desfechos não apenas da doença renal, mas, sobretudo, de DNCs, como diabetes e DCV, que dominam as futuras estratégias de assistência à saúde. Os caminhos para que isso seja alcançado já foram apresentados tanto para países desenvolvidos 39,40 quanto para países em desenvolvimento. 1,41 No entanto, a efetiva implementação de tais estratégias só vai ocorrer quando o público em geral e a comunidade renal trabalharem em conjunto para convencer as autoridades de saúde de que isso se trata de interesse público. Temos esperança de que a comemoração em todo o mundo do Dia Mundial do Rim 2011 seja uma oportunidade para reforçar a mensagem de que a doença renal é de fato comum, nociva, mas tratável, e que a proteção de seus rins é uma importante estratégia de saúde que pode salvar seu coração. William G Couser, MD Sociedade Internacional de Nefrologia Miguel C Riella, MD Federação Internacional de Fundações do Rim e Comitê Diretivo do Dia Mundial do Rim 2011 (Georgi Abraham, Paul Berkens, John Feehally, Guillermo Garcia Garcia, Jan Lantik, Dan Larsen, Philip Li, Mark Murphy, Bernardo Rodriguez-Iturbe) Referências 1. World Health Organization. Preventing Chronic Diseases: A Vital Investment: WHO Global Report. 2005. 2008-2013 action plan for the global strategy for the prevention and control of noncommunicable diseases: prevent and control cardiovascular diseases, cancers, chronic respiratory diseases and diabetes. WHO Global Report, 2005. 2. Anderson GF, Chu E. Expanding priorities Confronting chronic disease in countries with low income. N Engl J Med 2007 356: 209-211. 18

3. Narayan KM, Ali MK, Koplan JP. Global noncommunicable diseases-where worlds meet. N Engl J Med 2010; 363:1196-8. 4. Ritz E, Bakris G, World Kidney Day Organising Committee. World Kidney Day: hypertension and chronic kidney disease. Lancet 2009; 373:1157-8. 5. Atkins RC, Zimmet P, ISN-IFKF World Kidney Day Steering Committee. Diabetic kidney disease: act now or pay later. Nat Rev Nephrol 2010; 6:134-6. 6. Go AS, Chertow GM, Fan D, McCulloch CE, Hsu CY. Chronic kidney disease and the risks of death, cardiovascular events, and hospitalization. N Engl J Med 2004; 351:1296-305. 7. Tonelli M, Wiebe N, Culleton B et al. Chronic kidney disease and mortality risk: a systematic review. J Am Soc Nephrol 2006; 17:2034-47. 8. Hillege HL, Fidler V, Diercks GFH et al., for the PREVEND study group. Urinary albumin excretion predicts cardiovascular and noncardiovascular mortality in general population. Circulation 2002; 106:1777-82. 9. Klausen K, Borch-Johnsen K, Feldt-Rasmussen B et al. Very low levels of microalbuminuria are associated with increased risk of coronary heart disease and death independently of renal function, hypertension, and diabetes. Circ 2004; 110:32-35. 10. van Domburg RT, Hoeks SE, Welten GMJM, Chonchol M, Elhendy A, Poldermans D. Renal insufficiency and mortality in patients with known or suspected coronary artery disease. J Am Soc Neph 2008; 19:158-63. 11. Rashidi A, Sehgal AR, Rahman M, O Connor AS. The case for chronic kidney disease, diabetes mellitus, and myocardial infarction being equivalent risk factors for cardiovascular mortality in patients older than 65 years. Am J Cardiol 2008; 102:1668-7. 12. McCullough PA, Li S, Jurkovitz CT et al., for the Kidney Early Evaluation Program Investigators. CKD and Cardiovascular Disease in Screened High-Risk Volunteer and General Populations: The Kidney Early Evaluation Program (KEEP) and National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES) 1999-2004. Am J Kidney Ds 2008; 51, S38-S45. 13. McCullough PA, Jurkovitz CT, Pergola PE et al.; for the KEEP Investigators. Independent components of chronic kidney disease as a cardiovascular risk state: results from the Kidney Early Evaluation Program (KEEP). Arch Intern Med 2007; 167:1122-9. 14. McCullough PA, Li S, Jurkovitz CT et al.; for the KEEP Investigators. Chronic kidney disease: prevalence of premature cardiovascular disease and relationship to short-term mortality. Am Heart J 2008; 156:277-83. 15. Astor BC, Hallan SI, Miller ER 3rd, Yeung E, Coresh J. Glomerular filtration rate, albuminuria, and risk of cardiovascular and all-cause mortality in the US population. Am J Epidemiol 2008; 167:1226-33. 16. Irie F, Iso H, Sairenchi T et al. The relationships of proteinuria, serum creatinine, glomerular filtration rate with cardiovascular disease mortality in Japanese general population. Kidney Int 2006; 69:1264-71. 17. Granger CB, Swedberg K, Pfeffer MA, Yusuf S, McMurray JJ; for the CHARM Investigators Individuals at Increased renal risk. J Amer Soc Nephrol 2009; 20:852-862. 18. Tonelli M, Jose P, Curhan G, Sacks F, Braunwald E, Pfeffer M; Cholesterol and Recurrent Events (CARE) Trial Investigators. Proteinuria, impaired kidney function, and adverse outcomes in people with coronary disease: analysis of a previously conducted randomised trial. BMJ 2006; 332:1426. 19. Matsushita K, Selvin E, Bash LD, Franceschini N, Astor BC, Coresh J. Change in estimated GFR associates with coronary heart disease and mortality. J Am Soc Nephrol 2009; 20:2617-24. 20. Malyszko J, Bachorzewska-Gajewska H, Malyszko JS et al. Prevalence of chronic kidney disease in elderly patients with normal serum creatinine levels undergoing percutaneous coronary interventions. Gerontol 2010; 56:51-4. 21. Hemmelgarn BR, Manns BJ, Lloyd A et al.; Alberta Kidney Disease Network. Relation between kidney function, proteinuria, and adverse outcomes. JAMA 2010; 303:423-9. 22. Gansevoort RT, de Jong PE. The case for using albuminuria in staging chronic kidney disease. J Amer Soc Nephrol 2009; 20:465-68. 19

23. Chronic Kidney Disease Prognosis Consortium. Association of estimated glomerular filtration rate and albuminuria with all-cause and cardiovascular mortality in general population cohorts: a collaborative meta-analysis. Lancet 2010; 375:2073-81. 24. Abdelhafiz AH, Brown SH, Bello A, El Nahas M Chronic kidney disease in older people: physiology, pathology or both? Nephron Clin Pract 2010; 116:19-24. 25. Brenner BM, Cooper ME, de Zeeuw D et al. Effects of losartan on renal and cardiovascular outcomes in patients with type 2 diabetes and nephropathy. N Engl J Med 2001; 345:861-9. 25. Ruggenenti P, Perna A, Gherardi G et al. Renoprotective properties of ACE-inhibition in nondiabetic nephropathies with non-nephrotic proteinuria. Lancet 1999; 354:359-64. 26. Ruggenenti P, Perna A, Gherardi G, Gaspari F, Benini R, Remuzzi G. Renal function and requirement for dialysis in chronic nephropathy patients on long-term ramipril: REIN follow-up trial. Gruppo Italiano di Studi Epidemiologici in Nefrologia (GISEN). Ramipril Efficacy in Nephropathy. Lancet 1998; 352:1252-6. 27. The GISEN Group (Gruppo Italiano di Studi Epidemiologici in Nefrologia). Randomised placebo-controlled trial of effect of ramipril on decline in glomerular filtration rate and risk of terminal renal failure in proteinuric, non-diabetic nephropathy. Lancet 1997; 349:1857-63. 28. The ESCAPE trial group: Strict blood pressure control and progression of renal failure in children. New Engl J Med 2009; 361:1639-50. 29. Asselbergs FW, Diercks GF, Hillege HL et al., for the Prevention of Renal and Vascular Endstage Disease Intervention Trial (PREVEND IT) Investigators. Effects of fosinopril and pravastatin on cardiovascular events in subjects with microalbuminuria. Circulation 2004; 110 :2809-16. 30. Atthobari J, Asselbergs FW, Boersma C et al.; PREVEND IT Study Group. Cost-effectiveness of screening for albuminuria with subsequent fosinopril treatment to prevent cardiovascular events: A pharmacoeconomic analysis linked to the prevention of renal and vascular endstage disease (PREVEND) study and the prevention of renal and vascular endstage disease intervention trial (PREVEND IT). Clin Ther 2006; 28:432-44. 31. de Zeeuw D, Remuzzi G, Parving HH et al. Albuminuria: a therapeutic target for cardiovascular protection in type 2 diabetic nephropathy. Circulation 2004; 110 :921-7. 32. Eijkelkamp WB, Zhang Z, Remuzzi G et al. Albuminuria is a target for renoprotective therapy independent from blood pressure in type II diabetic patients with nephropathy. Post hoc analysis from the Reduction in End Points in NIDDM with the Angiotensin II Antagonist Losartan (RENAAL) trial. J Am Soc Nephrol 2007; 18:1540-6. 33. Muirhead N, Rene de Cotret P, Chiu A, Pichette V, Tobe S; SMART (Supra Maximal Atacand Renal Trial) Investigators. Supramaximal dose of candesartan in proteinuric renal disease. J Am Soc Nephrol 2009; 20:893-900. 34. Vogt L, Waanders F, Boomsma F, de Zeeuw D, Navis G. Effects of dietary sodium and hydrochlorothiazide on the antiproteinuric efficacy of losartan. J Am Soc Nephrol 2008; 19:999-1007. 35. Fried L. Are we ready to screen the general population for microalbuminuria? J Am Soc Nephrol 2009; 20:686-688. 36. El Nahas M. the global challenge of chronic kidney disease. (Nephrology Forum) Kidney Int 2005; 68:2918-29. 37. Barsoum RS. Chronic Kidney disease in the developing world. New Engl J Med 2006; 354:997-9. 38. Levey AS, Schoolwerth AC, Burrows NR, Williams DE, Stith KR, McClellan W; Centers for Disease Control and Prevention Expert Panel. Comprehensive public health strategies for preventing the development, progression, and complications of CKD: report of an expert panel convened by the Centers for Disease Control and Prevention. Am J Kidney Dis 2009; 53:522-35. 39. James MT, Hemmelgarn, BR, Tonelli, M. Early recognition and prevention of CKD. Lancet 2010; 379:1296-309. 40. Perico N, Bravo RF, De Leon FR, Remuzzi G. Screening for chronic kidney disease in emerging countries: feasibility and hurdles. Nephrol Dial Transplant 2009; 24:1355-8. 20