Discussão de caso Insuficiências Medulares e HPN Sandra Fátima Menosi Gualandro Disciplina de Hematologia e Hemoterapia Faculdade de Medicina da USP
Insuficiências medulares e Hemoglobinúria Paroxística Noturna Discussão de caso Agenda 1. HPN visão Geral 2. Apresentação do caso 3. Considerações finais
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Visão Geral
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Definição Doença clonal adquirida Hemólise intravascular Fenômenos trombóticos Graus variáveis de insuficiência da MO Incidência 1:100 000 a 1:1000 000 Qualquer idade (média = 30 anos) e ambos os sexos Sobrevida = 10 a 15 anos Remissão espontânea = 10-15%
Pancitopenia Infecções Sangramento? Insuficiência da Medula Óssea Hemólise extravascular Anemia HPN - Fisiopatologia? Colelitíase? Hemólise Intravascular Hemoglobinúria Insuficiência renal aguda e crônica Expansão clonal de células deficientes em proteínas GPI-ancoradas (Céls. HPN) Ativação inapropriada do complemento Trombose Dor abdominal Dor Lombar Cefaléia Disfunção erétil Odinofagia Fadiga Modificado de Bessler M and Hiken J. Hematology ASH Educ Program. 2008:104-10?
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Mutação Somática no gene PIG-A Homens Fenótipo HPN Mulheres Fenótipo Normal Mais de 180 mutações descritas Fenótipo HPN
Ancora GPI Membrana plasmática Retículo endoplasmático Adaptado de Brodsky RA. Blood Reviews. 2008;22:65-70
Proteínas GPI-ancoradas na superfície das células hematopoéticas Célula Tronco Hematopoética Plaquetas Eritrócitos Granulócitos Monócitos Cels B Cels T Cels NK Adaptado de Bessler M and Hiken J. Hematology Am Soc Hematol Educ Program. 2008:104-10
HPN - Bases genética e molecular Cels. hematopoéticas normais Proteína GPI- ancorada Proteína transmembrana Membrana Dupla camada lipídica Cels. hematopoéticas HPN Proteína transmembrana Membrana Dupla camada lipídica PIG-A Mutante Adaptado de Parker C. Lancet 2009; 373:758-67 Cromossoma X
HPN - Lise celular complemento-mediada Via alternativa do complemento Ativação do complemento Glóbulos vermelhos normais Glóbulos vermelhos HPN Adaptado de Parker C. Lancet 2009; 373:758-67
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Manifestações Clínicas Decorrentes da hemólise intravascular Decorrentes da trombose Decorrentes da insuficiência da medula óssea
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Apresentação Clínica 35 pacientes Hematologia HCFMUSP Anemia 25 (71%) Hemoglobinúria 19 (54%) Anemia Hemolítica 14 (40%) Anemia Aplástica 15 (43%) Sangramento 08 (23%) Trombose 05 (14%)
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Anemia Hemolítica Intravascular Exames Laboratoriais Reticulocitose bilirrubina indireta DHL Haptoglobina Hemoglobinúria e Hemossiderinúria Hiperplasia eritróide da medula óssea
Hemólise Intravascular Hemoglobinemia Hemoglobinúria Deposição de ferro nas céls. epiteliais renais Hemossiderinúria
HPN - Diagnóstico laboratorial Citometria de fluxo Granulócitos Controle normal Clone HPN
HPN - Populações I, II,III
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Classificação A. HPN Clássica B. HPN em outras doenças da MO (HPN/AA, HPN/SMD) C. HPN subclínica com outras doenças da MO (ex:pnh/aa) International PNH Interest Group Parker C, Omine M, Richards S, Nishimura J, Bessler M, Ware R, Hillmen P, Luzzatto L, Young N, Kinoshita T, Rosse W e Socié G Blood. 2005;106:3699-3709
20_Agosto_2010EUA Opções paliativas não afetam a progressão nem o risco de morbidade e mortalidade Transfusões Risco de sobrecarga de ferro Tratamento transitório da anemia Anticoagulantes Risco de hemorragia Ineficaz em muitos pacientes Estimulantes da eritropoese e Suplementação com ferro AEE podem expandir os clones e aumentar a hemólise Corticosteroides/hormônios androgênicos Nenhum estudo clínico controlado AEE = agentes estimulantes da eritropoetina. Manejo Histórico da HPN International PNH Interest Group. Blood. 2005;106:3699-3709. Hillmen P e col. Blood. 2007;110:4123-8. 18
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Tratamentos específicos Eculizumabe único tratamento medicamentoso disponível TMO alogênico único tratamento curativo
Insuficiências medulares e Hemoglobinúria Paroxística Noturna Discussão de caso Agenda 1. HPN visão Geral 2. Apresentação do caso 3. Considerações finais
Apresentação do Caso Mulher de 26 anos, natural e procedente de São Paulo (SP), recepcionista, é encaminhada para a Unidade de Fígado do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) para avaliação para transplante hepático
História Pregressa da Moléstia Atual Há 7 anos: Pancitopenia, reticulocitopenia e DHL normal Biópsia de medula óssea celularidade < 10% Diagnóstico de anemia aplástica grave Encaminhada à unidade de TMO do serviço de origem
História Pregressa da Moléstia Atual Sem doador relacionado compatível Tratada com ciclosporina Após tratamento Hb (tornou-se independente de transfusão) Leucócitos e plaquetas ( 50 000/mm 3 )
História Pregressa da Moléstia Atual Há 5 anos: progressivo de DHL Diagnóstico de HPN Episódios recorrentes de hemoglobinúria, dor abdominal, Hb e plaquetas Hipermenorragia ginecologista prescreve contraceptivo oral
Diagnóstico Plasma Hemoglobinemia e Hemoglobinúria Urina
URINA TIPO 1 CARACTERES FÍSICOS E BIOQUÍMICOS ph : 6,5 5,0 a 6,0 Reflectância e microscopia Densidade : 1.010 1015 a 1025 Glicose : ausente ausente Pigmento Biliares : Corpos Cetonicos : Sangue : ausente ausente presença Proteinas : 0,25 g/l inferior a 0,05 g/l Urobilinogenio : 1,0 mg/dl 0,2 a 1,0 mg/dl SEDIMENTO (aumento 400x) Celulas Epiteliais : Filamentos de Muco : raras presença Leucocitos : 1 /campo até 10 por campo Reflectância e microscopia Morfologia : isolados e degenerados Eritrócitos : 1 /campo até 3 por campo Reflectância e microscopia Cilindro : Cristais : Outros Elementos : ausente alguns cristais de fosfatos amorfo ausente
Hemoglobinúria hemoglobinúria hematúria Centrifugação da amostra Microscopia
Citometria de fluxo CD55/CD59 Granulócitos Eritrócitos Controle Normal Paciente Controle Normal Paciente
História Pregressa da Moléstia Atual 6 meses após diagnóstico de HPN TVP em membro inferior Anticoagulação durante 6 meses Dor abdominal persistente com admissões frequentes em serviços de emergência 2 anos após diagnóstico de HPN Dor abdominal, ascite e esplenomegalia Diagnóstico de síndrome de Budd-Chiari Encaminhada ao HCFMUSP Unidade de Transplante de Fígado para avaliação
História Pregressa da Moléstia Atual Avaliação na Unidade de Fígado TC Abdominal e angiografia portal revelaram achados crônicos de oclusão de veias suprahepáticas Sem indicação para trombólise e para transplante hepático Encaminhada ao Serviço de Hematologia do HCFMUSP
Diagnóstico TC abdominal * HCFMUSP Trombose suprahepática ramo E sem perfusão do contraste, circulação colateral (*) e esplenomegalia
Diagnóstico Angiografia Portal HCFMUSP Veia hepática sem perfusão com presença de circulação colateral
Serviço de Hematologia do HCFMUSP Iniciado anticoagulação com heparina de baixo peso molecular seguida por warfarina Apresentava alta necessidade transfusional com hipermenorragia importante Implantado DIU com progestágeno (Myrena ) com resolução do quadro
Evolução Melhora clínica praticamente assintomática Bicitopenia persistente com neutropenia e trombocitopenia ( 30000/mm 3 ) Manutenção da anticoagulação com warfarina (RNI entre 2,0 e 3,0) Clone HPN permanece constante
Hb (g/dl) DHL (U/L) Evolução DHL 6000 5000 4000 3000 2000 1000 14 12 10 8 6 4 2 0 1 2 3 4 5 6 7 8 Meses Hemoglobina 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 Meses
neutrófilos/mm3 leucócitos/mm3 Evolução 6000 Leucócitos 5000 4000 3000 2000 1000 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Meses 3500 3000 2500 2000 1500 1000 500 0 Neutrófilos 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Meses
plaquetas/mm3 Evolução 80000 Plaquetas 70000 60000 50000 40000 30000 20000 10000 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Meses Reticulócitos 4.7 to 7.3%
Caso 1- Discussão Considerando a classificação proposta pelo Grupo de Interesse em HPN como este caso seria classificado?
Paroxysmal Nocturnal Hemoglobinuria Hemoglobinúria Paroxística Noturna Classificação Dependendo do quadro clínico (predomínio de haemólise ou de falência medular), os pacientes podem ser classificados como: A. HPN clássica B. HPN em outras doenças da MO (ex. AA, SMD) C. HPN subclínica com outras doenças da MO (ex. HPN/AA) International PNH Interest Group Parker C, Omine M, Richards S, Nishimura J, Bessler M, Ware R, Hillmen P, Luzzatto L, Young N, Kinoshita T, Rosse W e Socié G Blood. 2005;106:3699-3709
Caso 1- Discussão Deveria ter sido solicitado pesquisa de clone HPN quando foi feito o diagnóstico de aplasia medular?
Diagnóstico Em quem pesquisar HPN e com que frequência? Uma vez Todos os pacientes com hemoglobinúria Todos os pacientes com hemólise inexplicada ( DHL) Todos os pacientes com trombose venosa abdominal e cerebral Todos os pacientes com trombocitopenia e macrocitose ou sinais de hemólise Repetidamente* Todos os pacientes com HPN Todos os pacientes com anemia aplástica Todos os pacientes que tiveram anemia aplástica (exceto após TMO) Todos os pacientes com SMD * Inicialmente a cada 6 meses e a seguir anualmente Adaptado de Bessler M and Hiken J. Hematology 2008; 104-110
Em quem pesquisar HPN? Serviço de Hematologia HCFMUSP 1998 to 2013 Indicação n (%) Hemólise intravascular inexplicada 107 (16,2) Citopenia (s) 493 (74,6) Pancitopenia 241 (36,5) Anemia + trombocitopenia 134 (20,3) Anemia + leucopenia 31 (4,7) Leucopenia + trombocitopenia 32 (4,8) Trombocitopenia 39 (5,9) Leucopenia 16 (2,4) Investigação de trombose 61 (9,2) Total 661 (100,0)
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Serviço de Hematologia HC-FMUSP 1998 to 2013 126 pacientes com clone HPN (19%) 55/126 pacientes (43,7%) clone >50% 57 (45,2%) - Pancitopenia 34 (26,9%) - Anemia + Trombocitopenia 14 (11,1%) - Anemia 5 (4%) - Anemia + Leucopenia 5 (4%) - Leucopenia + Trombocitopenia 5 (4%) - Trombocitopenia 1 (0,8%) - Leucopenia 5 (4%) - Hemograma normal
HPN x Anemia Aplástica Ambas são doenças raras 25 a 50% pacientes AA tem clone HPN prétratamento 80% HPN = plaquetas e/ou neutropenia AA com clone HPN Melhor evolução clínica? Menor necessidade transfusional?
HPN x Anemia Aplástica Deficiência de GPI-AP em pacientes com anemia aplástica Deficiência de GPI -AP Autor n (total) n % RBC PMN Schubert 29 12 41 1/12 12/12 (1994) Schrezenmeier 52 27 52 7/27 25/27 (1995) Griscelli 37 13 35 8/14 13/13 (1995) Yamagushi (1995) 23 01 04 ND ND Tooze (1995) Hematologia HCFMUSP (2002) 70 16 23? 16/16 31 16 52 13/16 16/16 Adaptado de Sociè e cols, 2000
Discussão O que fazer em pacientes com AA/HPN com grandes clones quanto à prevenção/tratamento de trombose?
HPN e Trombose 40% desenvolve trombose durante o curso da doença Trombose venosa potencialmente fatal particularmente em território: Cerebral Hepático Portal Mesentérico Esplênico Renal
AA/HPN clone>50% em granulócitos 12 pacientes com diagnóstico de AA com clone HPN em granulócitos > 50% 5/12 tratamento prévio com Ciclosporine A (CSA) e 6/12 Globulina Antitimocítica (ATG) + CSA 9/12 Hemólise crônica 5/12 Trombose (1 v. porta, 2 Budd-Chiari, 1AVC, 1 trombose de cateter) Tempo de seguimento 1 a 36 anos % de clone HPN - 51.2 to 96.2 Hematologia HCFMUSP, 2008
12 pacientes com AA/HPN e clone 50% Eventos Trombóticos <20 000 Plaquetas/mm 3 21 a 50 000 51 a 100 000 >100 000 8,3% 41,7% 33,3% 16,7%
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Tratamento e prevenção de trombose Trombose é a principal causa de morte na HPN Deve ser tratada prontamente É indicação formal para eculizumabe quando disponível com manutenção da anticoagulação até o momento não existem dados que permitam recomendar a suspensão da anticoagulação
Eventos Trombóticos (por 100 pac-anos) HPN e Trombose Número de eventos trombóticos antes e durante tratamento com eculizumab 45 40 35 30 25 20 15 10 5 0 39 Pre-Eculizumab N=195 P=0.0001 3 Com Eculizumab Hilmen P. Hematology 2008;116-123
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Prevenção da trombose E quando eculizumabe não está disponível?
Incidência de trombose (%) HPN e Trombose Profilaxia primária? Sem profilaxia primária com varfarina (n=56) Profilaxia primária com varfarina (n=30) Seguimento (anos) Adaptado de Hall C, Richards S, Hillmen P. Blood 2003; 102, 3587-91
Hemoglobinúria Paroxística Noturna Prevenção de trombose Serviço de Hematologia HCFMUSP Profilaxia primária (na impossibilidade de eculizumabe) Clones maiores que 50% Contagem plaquetária 100 000/mm 3 Sem contra-indicações para anticoagulação INR entre 2-3
20_Agosto_2010EUA Hemólise e trombose - fatores de risco para desfechos potencialmente fatais TMO - associado a morbidade e mortalidade significativas TMO - tem impacto significativo na qualidade de vida pós- transplante HPN - TMO TMO alogênico - recomendado para pacientes com HPN com citopenias potencialmente fatais, ou, nos raros pacientes com hemólise incapacitante ou trombose não controlada com a terapia existente (eculizumabe) 1. De Latour PF e col. Resumo 316. EBMT 2009. 2. Santarone S e col. Haematologica. 2010; 95:983-8. 3. Bieri S e col. Bone Marrow Transplantation. 2008; 42: 819 827. 4. Fraser CJ e col. Blood. 2006;108: 2867-2873. 5. Brodsky RA. Blood. 2009 113: 6522-6527 55
HPN - TMO TE tromboembolismo AA - anemia aplástica RHC crise hemolítica recorrente Peffault de Latour R e cols. Haematologica. 2012; 97:1666-73.
Conclusões deste estudo HPN - TMO Considerando os atuais resultados e a eficácia do eculizumabe, TMO alogênico não é uma opção de tratamento adequada para TE com risco de vida na HPN Pode ser uma opção para pacientes com crises hemolíticas recorrentes que vivem em países onde eculizumabe não está disponível, independente do tipo de doador HPN/AA ainda parecem ser candidatos apropriados se a doença é grave Na ausência de doador HLA idêntico, o tratamento padrão atual para AA/HPN é imunossupressão Peffault de Latour R e cols. Haematologica. 2012; 97:1666-73.
Insuficiências medulares e Hemoglobinúria Paroxística Noturna Discussão de caso Agenda 1. HPN visão Geral 2. Apresentação do caso 3. Considerações finais
Manejo da HPN Avaliação Inicial (>3meses) Principal problema: pancitopenia HPN grave Principal problema Principal problema Hemólise grave; hemólise + sintomas/ trombose HPN leve Evolução (vivendo com HPN) Doador HLAidêntico? Piorando Estável Não Sim ATG+CyA Alo-TMO Eculizumabe Medidas de suporte Modificado de Luzzatto L, Gianfaldoni G, Notaro R. Br J Haematol. 2011;153:709-20.
Lições a serem aprendidas com este caso A pesquisa de clone HPN deveria ter sido realizada ao diagnóstico de aplasia medular A paciente não deveria ter recebido contraceptivo oral A anticoagulação deveria ter sido mantida após o primeiro episódio de trombose Ela deveria ter sido investigada para trombose abdominal quando as crises de dor abdominal começaram Eculizumab (Soliris ) provavelmente seria efetivo neste caso e poderia, se disponível ao diagnóstico de HPN, mudar o prognóstico